Sumário: 1.Introdução. 2.Ativismo Judicial. 2.1.Conceito. 2.2.Ativismo Judicial versus Judicialização. 2.3.Origem. 2.4.Histórico. 2.5.Ativismo Judicial no Brasil. 3.Conclusão. 4.Referências. 5.Anexos.
1. Introdução
O Supremo Tribunal Federal representa a mais alta corte de justiça do Brasil, sua definição mais comum entre os juristas, é a de cúpula do Poder Judiciário, já que atende pelo órgão máximo de justiça do País. As funções delegadas ao STF se encontram inicialmente no art. 102 da Carta Magna, o dispositivo cita inúmeras competências do órgão, entre elas estão, principalmente, a de processar e julgar, originalmente, a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; as infrações penais comuns cometidas pelo Presidente da República, Vice-presidente, membros do congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador – Geral da República, conforme dispostos no inciso I, alíneas ‘’a’’ e ‘’b’’, além disso e de igual relevância, é responsável pela arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente da própria Constituição (§1° do mesmo artigo). Em grau de recurso, sua principal atribuição é julgar as decisões recorrentes que contrariem dispositivo da Constituição, de acordo com o inciso III, alínea ‘’a’’. Nessa breve análise dos dispositivos constitucionais, podemos observar que incumbe, primordialmente, ao Supremo o importante papel de guardião do nosso ordenamento pátrio, completando-o e desenvolvendo-o.
Importante mudança ocorreu nas atribuições do STF com a Emenda Constitucional n°. 45 de 2004, ela ampliou a atuação do órgão incumbindo-lhe a possibilidade de, após inúmeras e reiteradas decisões sobre uma mesma matéria constitucional, aprovar as chamadas súmulas vinculantes, que unificam o entendimento do caso e repercutem nas instâncias inferiores como força de lei. O artigo 103-A incorporado com a Emenda, permite tal fenômeno, que abrange aos demais órgãos do Poder Judiciário, as administrações públicas e nas esferas federal, estadual e municipal.
Esse advento, aliado a inúmeros casos em que o Supremo atuou, que serão tratados posteriormente, trouxe reflexões e indagações a respeito da atuação do órgão, que deixa de ter seu enfoque em casos particulares, para incorporar uma face que trata de decisões gerais, abstratas e padronizadas, o que leva ao referido ativismo judicial, tratado neste artigo.
2. Ativismo Judicial
2.1. Conceito
Segundo o professor Elival da Silva Ramos (2010, p. 129), o Ativismo Judicial é “o exercício da função jurisdicional para além dos limites impostos pelo próprio ordenamento que incumbe, institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer atuar. Resolvendo litígios de feições subjetivas (conflitos de interesse) e controvérsias jurídicas de natureza objetiva (conflitos normativos)”. Isto é, o Ativismo ocorre quando, além de solucionar a lide dos interesses privados, o juiz tem que sanar falhas na legislação interpretando a ora extensiva, ora restritivamente, para conseguir dirimir o que inicialmente foi pedido: o conflito de interesses.
Para dar luz ao entendimento, o Ministro Luís Roberto Barroso (2008, p. 6) traz que a postura ativista é manifestada por meio de condutas como:
(i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas.
Além dessas questões, Luis Machado Cunha e William Marshall, defendem que o ativismo tem quatro dimensões: (i) ativismo contra majoritário, que é quando o Poder Judiciário agem como legislador negativo, não aceitando decisões dos democraticamente eleitos; (ii) ativismo jurisdicional, quando o Judiciário corrige, altera ou complementa leis ou atos normativos; (iii) ativismo criativo, quando há a interpretação, seja extensiva ou restritiva, de uma norma; e (iv) ativismo remedial, imposição, do Poder Judiciário, de obrigações positivas aos outros Poderes.
2.2. Ativismo Judicial versus Judicialização
Em uma análise superficial, Ativismo e Judicialização parecem ser a mesma coisa, porém, como ressalta Barroso (2008, p. 6) “a judicialização e o ativismo são primos”. São dois os pontos principais de antagonismo. O primeiro é quanto a origem, a do ativismo judicial apesar de ser incerta, a maioria dos doutrinados a colocam na proatividade da Suprema Corte Americana como nos casos de segregação racial, invalidações de leis sociais, entre outros. Já a origem da judicialização vem do neoconstitucionalismo, que surgiu na Europa juntamente com a Segunda Guerra Mundial, dando uma liberdade maior de interpretação aos tribunais e tornando os conflitos políticos de grande repercussão problema para o Judiciário resolver, como mostra Uadi Lâmmego Bulos (2017). O segundo ponto de divergência é a forma de aplicação. O ativismo judicial deve ser aplicado a casos em que a legislação é insuficiente para a resolução da lide, geralmente utiliza a interpretação expansiva. Paralelamente, a judicialização está sendo usada em algumas questões políticas e/ou sociais, envolvendo o Poder Judiciário, através de provocação, quando a repercussão é grande. Sendo assim, a judicialização é um modelo constitucional onde é positivada essa atitude que deve ser provocada. Diferente o ativismo judicial, que é discricionário do juiz, ou seja, não é normalizada essa postura e o juiz não é provocado a fazê-lo, ele faz por entender que interpretando a lei a solução do conflito será mais justa.
2.3. Origem
Como já dito, não há certeza quanto a origem do ativismo judicial, mas a maioria dos pesquisadores apontam para os Estados Unidos da América como “principiante” no uso do ativismo. O juiz Warren, líder da Suprema Corte America (de 1953 a 1969), foi bem marcante, dando, ao longo da sua carreira, diversas decisões ativistas, por exemplo, o famoso caso Mabury versus Madison, cujo deu nome ao ativismo judicial através do controle difuso de constitucionalidade, alastrando essa prática para países neoconstitucionalistas. No entanto a palavra ativismo foi usada a primeira vez 1947, nos Estados Unidos também, pelo historiador e democrata Arthur Schlesinger Jr., em seu caso que falava sobre a Suprema Corte.
2.4. Histórico
Com uma redemocratização acentuada e novos modelos constitucionais pós Segunda Guerra Mundial, os Estados autoritários foram se transformando em um Estado Democrático de Direito, que buscava aferir à população maior participação e mais direitos e garantias. Lenio Streck (2007, p. 6) afirma que depois da Segunda Guerra aumentou-se a preocupação e atenção para temas sociais, observando uma terceira forme de Estado de Direito, cujo visa a defesa da democracia e dos direitos fundamentais causando um avanço às Constituições, que antes era voltadas as necessidades de proteção do Poder absolutista, e do estado intervencionista. No Brasil, chegou com a postura pós-positivista a qual, segundo Barroso (2008), “busca ir além da legalidade escrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito [...]. A interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma teoria de justiça”.
2.4. Ativismo Judicial no Brasil
Não é possível dizer o momento histórico exato em que o STF começou a se valer do ativismo, tendo em vista que, além dos fatos já mencionados, devido a um conjunto de fatores, quais sejam, principalmente, a promulgação de uma nova Constituição, que trouxe avanços aos direitos e as políticas e a mudança social que fez com que os cidadãos buscassem cada vez mais a proteção de seus direitos, resultaram numa mudança significativa no modo de agir do Supremo, que expandiu seu poder de interpretação, para criação de direitos, inclusive de interesse político, mostrando atuar em um poder político-normativo.
O Supremo Tribunal Federal, nessa era do ativismo judicial, age ampliando o alcance das normas constitucionais, isso se dá, muitas vezes, segundo Barroso (2012), pela omissão do Poder Legislativo e Público, que faz com que o Supremo prolate decisões que suprem essas lacunas e ainda trazem uma inovação à ordem jurídica de caráter normativo.
Ainda de acordo com Barroso (2012), o papel do STF como já visto, é de ultimo interprete da Carta Magna, sendo assim, seu papel é guardar e proteger os direitos fundamentais e princípios constitucionais, portando, não se trata de política, mas sim de assegurar os interesses sociais, o que faz com que, na omissão dos poderes competentes ou na falta de norma constitucional, o judiciário tome uma posição que resguarde os interesses da Constituição e da democracia, assim como o próprio ordenamento o confiou.
Para exemplificar melhor como se da a atuação do Supremo Tribunal Federal no ativismo judicial, vejamos alguns casos de grande repercussão, que certamente, encaminharam o comportamento atual do nosso sistema jurídico.
Podemos destacar de início o caso bem comentado de fidelidade partidária, o STF, se posicionou afirmando que, as vagas dos candidatos no Congresso pertenciam ao partido político, assim, por consequência, abrangeu-se um novo pressuposto de perda de mandato, a migração dos eleitos de partido. E assim o fez em nome do princípio democrático. Porém, em jurisprudência, o STF decidiu, em exceção, que candidatos eleitos por sistema majoritário, não perdem o mandato pela mudança partidária, alegando que isso violaria a soberania popular (jurisprudência em anexo).
De igual repercussão e holofotes foi o caso da vedação do nepotismo aos Poderes da União, primeiramente o STF declarou a constitucionalidade da Resolução ne 7, de 2005, do CNJ, que tratava da proibição de nomeação de parentes até o terceiro grau de membros do judiciário, se embasando nos princípios da moralidade e impessoalidade. Posteriormente, pela análise de um único caso, o STF instituiu a Súmula Vinculante n° 13, que sanou todas as dúvidas a respeito do tema.
De diferente abordagem, o caso das cláusulas de barreiras, ao invés de tratar de aplicação direta da Constituição, se valendo dos princípios constitucionais a casos não contemplados expressamente, desta vez, utilizou-se da declaração de inconstitucionalidade de ato normativo, ‘’o STF ao julgar as ADIs 1.351 e 1.354, entendeu inconstitucionais os dispositivos da Lei n. 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos) que instituíram a chamada “cláusula de barreira”, a qual “restringia o direito ao funcionamento parlamentar, o acesso ao horário gratuito de rádio e televisão e a distribuição dos recursos do Fundo Partidário” (Notícias STF, 07.12.2006 – 20h29).’’ (LENZA,2016, p.1869).
Inúmeros são os casos que poderiam ser abordados, pois o ativismo do Supremo aumenta progressivamente, mas esses escolhidos foram os primeiros de grande repercussão. Também, são exemplo de casos muito debatidos, a Lei da Ficha limpa, onde a Corte declarou a retroatividade lei; as ações de pedidos de medicamentos não incorporados pelo SUS, onde o judiciário infere diretamente no Poder Público; a união homoafetiva, uma nova concepção, qual a Constituição não zela especificamente, e o Supremo então, expandiu as interpretações da Magna Carta para abarcar novas exigências sociais, entre outros.
3. Conclusão
Com a análise do panorama atual do País e entendendo um pouco mais das funções, ações e os casos do Supremo Tribunal Federal, pode se destacar que, as mudanças são necessárias para o andamento social, a Lei e sua interpretação, precisam evoluir junto com a sociedade, para não se torna retrógrada, na omissão dos poderes competentes e em respeito para com nossa Constituição Federal, seus princípios e a democracia, a interferência da Suprema Corte, enquanto não ultrapassar esses limites, é válida; porém, exageros nessa mediação não são saudáveis, para não desviar seu foco principal que é de guardar a Constituição e a intercessão nas competências dos demais poderes pode difundir sua real necessidade.
Quando bem realizada a jurisdição do Supremo traz mais uma garantia à sociedade, do que um problema, conservando e prosperando os direitos fundamentais, expandindo a aplicação dos princípios aos novos acontecimentos da sociedade, pode ser uma das soluções aos entraves sociais, mas não há como contestar que estamos em uma era do ativismo judicial, com grande participação do Supremo Tribunal Federal.
4. Referências
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BARROSO, L.R. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Disponível em: https://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Selecao.pdf. Acesso em 24/07/2018.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.
BULOS, U. L. Curso de direito constitucional. 10. Ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
CUNHA, Jose Ricardo, Ativismo Judicial, Limites e Possibilidades. Disponível em: http://www.esmarn.org.br/cursos/aperfeiçoamento. Acesso em: 20/09/2018.
HORBACH, C.B. É preciso definir a função do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2014-mar-22/observatorio-constitucional-preciso-definir-funcao-supremo-tribunal-federal. Acesso em 25/07/2018. COLUNA
LENZA, P. Direito Constitucional Esquematizado. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
RAMOS, E. S. Ativismo judicial: parâmetros dogmáticos. 1. Ed. São Paulo: Saraiva,2010.
SEMER, M. Barroso e o ativismo no STF. Disponível em: http://blogsemjuizo.com.br/barroso-e-o-ativismo-no-stf/. Acesso em 24/07/2018.