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Balas na escola e consumidores mirins

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Você se lembra da sua alfabetização? E dos primeiros anos na escola? As indagações que faço guardam relação direta com o tema que pretendo abordar neste artigo e não apresentam nenhuma novidade tão expressiva.

Várias questões jurídicas fazem parte do dia a dia da escola. Muitas vezes, entretanto, passam desapercebidas tanto pelos alunos e seus responsáveis, quanto pelos integrantes do estabelecimento de ensino.


Ao visitar o site do Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) – http://www.uol.com.br/idec – seguindo a navegação, cheguei à revista "Consumidor S.A. ON LINE" onde, na edição de fevereiro de 2000 (nº 47), encontrei uma interessante matéria sobre a relação da criança com a cantina e a importância desta para a formação da consciência daquela enquanto consumidora.

O Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11.9.90) foi, ao longo dos últimos 10 anos, incorporado ao dia a dia daqueles que não tem o hábito do manuseio das leis, por não trabalhem diretamente com elas, como o fazem os operadores do Direito quase diariamente.

Questões práticas fazem parte do nosso cotidiano enquanto consumidores. A observação, por exemplo, da data de validade de determinado produto no supermercado é uma preocupação que se desenvolveu a partir da conscientização dos direitos do consumidor.

A breve matéria "ESCOLA DO CONSUMIDOR MIRIM", contida na revista virtual, apresenta orientações interessantes que possibilitam uma dupla leitura: por um lado, a preocupação na formação do consumidor mirim. Do outro lado, com a leitura que faço enquanto advogado das escolas particulares, a preocupação que deve ter o estabelecimento de ensino onde também funciona uma cantina. Vamos ao texto e aos comentários que passo a fazer, tendo por objetivo final a atividade preventiva em favor dos estabelecimentos de ensino.


  • Se a criança for bem orientada, comprar o lanche na cantina é um aprendizado de consumo consciente.

Se um dos objetivos da educação fundamental, por exemplo, é a formação do educando para o exercício da cidadania, não resta qualquer dúvida quanto a possibilidade de seu desenvolvimento, inclusive, por ocasião da compra do lanche na cantina. Algumas escolas optam por levar as turmas ao supermercado, onde as crianças recebem orientações quanto aos cuidados que devem ter ao realizarem as compras, assim como passam a ter a noção do valor do dinheiro. É evidente que o aprendizado de tais questões é gradativo. Os pais podem, ao seu turno, durante a própria ida ao supermercado, abordar questões que auxiliem na formação de seus filhos. Neste contexto, "ensinar a comparar os preços", "recusar a compra de produto cuja embalagem esteja danificada", são apenas alguns dos exemplos sobre a questão.

  • A cantina escolar, por ser um estabelecimento que vende alimentos, está sujeita às normas sanitárias, que exigem a presença de um responsável técnico pelo estabelecimento, uniformes completos com troca diária, uso de boas práticas de higiene pessoal e dos alimentos, cuidados no armazenamento de produtos e descarte de lixo.

Neste ponto, em particular, o estabelecimento de ensino que opta por realizar a terceirização da sua cantina, deve ter atenção redobrada, pois, perante o seu pequeno consumidor, assim como para toda a comunidade acadêmica, também será responsável pelos desdobramento da relação aluno & cantina.

  • Visite a cantina da escola ou informe-se com a diretoria sobre as medidas sanitárias tomadas para garantir aos alunos um lanche sem riscos.

Como medida informativa, o próprio estabelecimento de ensino poderia afixar nas dependências da cantina informações sobre as medidas sanitárias tomadas para garantir aos alunos um lanche sem riscos.

Confesso que, ao assistir uma palestra tendo como tema "Treinamento para Manipuladores de Alimentos", achei o assunto muito interessante. Para a minha realidade, onde encontro em meu dia a dia de trabalho questões de direito, pude perceber através das informações desenvolvidas pelo palestrante Ronaldo Lucas da Silva, uma outra leitura sobre o assunto, que também resulta em desdobramentos próprios do mundo do Direito. Algumas dessas questões, passo a destacar. Por não ser especialista no assunto, alerto, desde logo, que meu objetivo é tão somente demonstrar a importância da questão e a sua vinculação com o direito. Assim, reveste-se o artigo de orientações de ordem preventiva para os estabelecimentos de ensino.

          A higiene alimentar visa:

  • proteger os alimentos contra contaminações (bactérias, organismos estranhos, venenos, etc.);
  • destruir, nos alimentos, toda e qualquer bactéria prejudicial à saúde, por meio do cozimento adequado ou de outros processos; e, dentre outros aspectos,
  • inibir a multiplicação das bactérias prejudiciais a saúde além de um determinado limite, no qual ocorre a doença do consumidor, assim como a prevenção do apodrecimento do próprio produto.

Neste contexto, os manipuladores de alimentos, além da preocupação com a higiene alimentar devem observar com rigor a higiene pessoal, ter a noção exata do que são as bactérias e dos procedimentos de higiene alimentar e higiene pessoal, bem como o real significado do que seja intoxicação alimentar, como forma de ter a consciência necessária de sua responsabilidade no manuseio dos alimentos.

Dentre as conseqüências da falta de higiene, que podem ser destacadas tanto para o estabelecimento de ensino quanto para os funcionários da cantina, estão as seguintes:

  • interdição do estabelecimento
  • perda do emprego (por parte do funcionário da cantina)
  • pesadas multas e custos legais (para a própria cantina/estabelecimento de ensino)
  • perda de sua reputação (desgaste junto aos alunos, pais e responsáveis – propaganda negativa)
  • pagamento de indenizações às vítimas
  • epidemias de intoxicações e até mortes
  • desperdício de produtos alimentícios
  • baixo moral e falta de orgulho no trabalho

Como se depreende, da questão de uma cantina no estabelecimento de ensino podem resultar vários desdobramentos de ordem legal.

  • Oriente a criança a ficar de olho na limpeza do estabelecimento, procurar a data de validade dos alimentos e recusar produtos de aparência duvidosa.

O estabelecimento de ensino deve desenvolver nos educandos a consciência de seus direitos enquanto consumidores. Assim, numa relação transparente, deve realizar as orientações pertinentes. Afixar uma placa com tais orientações na cantina é uma medida educativa que demonstra a preocupação tanto com a qualidade do produto que é servido quanto com o respeito ao consumidor mirim.

  • Estipule uma quantia semanal de dinheiro para a criança usar na cantina. Assim, ela aprende a controlar seus gastos.

A questão do dinheiro está relacionada ao contexto familiar. Nada impede, contudo, que a própria escola desenvolva atividades como a que citei inicialmente, a do exemplo da escola que leva seus alunos ao supermercado como forma de conscientização para o consumo.

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Segundo a lei, "consumidor é toda a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final". A relação com o consumidor mirim deve ser muito especial, tanto pelo contexto da relação de consumo quanto pela própria função do estabelecimento de ensino, que é a educação.

Lembro-me, com saudades, da primeira moeda que ganhei do meu pai para comprar balas na escola e de suas valiosas lições...

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Sobre o autor
Carlos Alberto Lima de Almeida

advogado, professor universitário, especialista em Direito Processual Civil, mestre em Educação

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Carlos Alberto Lima. Balas na escola e consumidores mirins. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 41, 1 mai. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/743. Acesso em: 28 mar. 2024.

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