Capa da publicação Ampliação do colegiado de julgamento: divergências sobre o art. 942 do CPC
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Da interpretação e abrangência da técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015:

uma análise sobre as teses fixadas pelo TJPE em sede de IAC e os primeiros posicionamentos do STJ acerca do referido dispositivo

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14/09/2019 às 16:00
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7. Ampliação do julgamento no agravo interno em apelação ou em agravo de instrumento

Pelo fato de o art. 942 do CPC/2015 não fazer menção ao agravo interno, poder-se-ia imaginar que a técnica de ampliação do colegiado prevista no mencionado dispositivo legal não incidiria no julgamento de tal recurso.

Contudo, conforme bem observaram Marco Aurélio Peixoto e Rodrigo Becker,

no julgamento de agravo interno, quer em razão de decisão monocrática em apelação, quer em função de decisão monocrática em agravo de instrumento contra decisão parcial de mérito, acaso admitido ou provido, resulta no julgamento da apelação ou do agravo de instrumento, razão pela qual, se a ausência de unanimidade resultar do mérito destes, deve sim ser o caso de aplicação da técnica[14].  

Essa também é o entendimento de Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha:

O relator pode, nos termos do art. 932, IV e V, do CPC, negar seguimento ou já dar provimento a recurso, em decisão isolada. Nesses casos, o relator julga, sozinho, o mérito do recurso, já lhe negando ou lhe dando provimento.  Dessa decisão cabe agravo interno, a ser julgado pelo colegiado competente para o julgamento da apelação ou do agravo de instrumento.

Se, ao examinar o agravo interno em apelação, o órgão fracionário proferir julgamento não unânime, deverá ser aplicado o art. 942 do CPC e haver a convocação de mais dois julgadores, a fim de que se tenha prosseguimento. É que, nesse caso, a apelação está sendo julgado no agravo interno, atraindo a incidência do referido dispositivo.

(...)

Quando o agravo interno for interposto contra a decisão do relator que julga o agravo de instrumento, a aplicação do art. 942 do CPC somente se dará se o julgamento for por maioria de votos para alterar a decisão proferida pelo juízo de primeira instância. Julgado o agravo de instrumento no agravo interno, com a reforma, por maioria de votos, da decisão do juízo de primeiro grau, devem ser convocados mais dois julgadores para que haja prosseguimento do julgamento, com a composição ampliada[15].

Sobre essa questão, quando do julgamento do IAC nº 495116-8, o Órgão Especial do TJPE fixou as seguintes teses jurídicas, as quais restaram numeradas como a décima primeira e décima segunda:

Incidirá o artigo 942, do CPC, em julgamento não unânime de agravo interno em apelação, desde que a divergência guarde pertinência com o conteúdo do apelo;

Incide o artigo 942, do CPC, no julgamento não unânime de agravo interno em agravo de instrumento, quando reformar a decisão interlocutória de primeiro grau que antecipou parcela de mérito.

Convém registrar que, na hipótese de o julgamento, por maioria de votos, referir-se à admissibilidade do agravo interno, não se chegando a examinar a apelação ou o agravo de instrumento, não há de ser aplicada a regra decorrente do art. 942 do CPC/2015.


8. Ampliação do julgamento na ação rescisória

Aplica-se, ainda, a técnica do art. 942 do CPC/2015 ao julgamento não unânime proferido em ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença (art. 942, § 3º, I, do CPC/2015).

É pertinente registrar que, mesmo na hipótese de rescisão parcial, deve-se aplicar a técnica do art. 942 do CPC/2015 ao julgamento de procedência da ação rescisória. Nesse sentido, o enunciado 63 da I Jornada de Direito Processual Civil, do Conselho da Justiça Federal: “A técnica de que trata o art. 942, § 3º, I, do CPC aplica-se à hipótese de rescisão parcial do julgado”.

Nota-se que, da mesma forma que ocorre com o julgamento não unânime do agravo de instrumento, o legislador também limitou a aplicação da técnica prevista art. 942 do CPC/2015 no âmbito da ação rescisória.

Isso porque a mencionada técnica de ampliação do colegiado somente incidirá na ação rescisória quando for acolhido o pedido de rescisão da sentença.

É importante esclarecer que é a divergência verificada no juízo rescindente (desfazimento da coisa julgada) que acarreta a aplicação da regra do art. 942 do CPC/2015, e não a do juízo rescisório (rejulgamento da causa).

De acordo com Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha,

Da mesma forma que ocorre com o julgamento não unânime do agravo de instrumento, o art. 942 do CPC tem aplicação mais restrita no âmbito da ação rescisória: somente incide quando acolhido o pedido de rescisão da decisão rescindenda.

É preciso, porém, observar que há um detalhe, no caso da ação rescisória, que diferencia a aplicação do art. 942 do CPC. No caso da apelação e do agravo de instrumento contra decisão de mérito, outros julgadores são convocados para participar do julgamento. Não é isso que ocorre na ação rescisória. Nesta, não há convocação de novos julgadores. Há, em vez disso, uma transferência de competência: a ação rescisória, acolhida por maioria de votos, deve ter seu julgamento interrompido para que tenha prosseguimento “em órgão de maior composição previsto no regimento interno” (CPC, art. 942, § 3º, I)[16]. 

Além disso, é pertinente deixar claro que, se a ausência de unanimidade for registrada no julgamento do juízo rescindente, o órgão de maior composição previsto no regimento interno irá decidir não apenas sobre o juízo rescindente, mas também sobre o juízo rescisório.

Sobre esse ponto, quando do julgamento do IAC nº 495116-8, o Órgão Especial do TJPE fixou a seguinte tese jurídica, a qual restou numerada como a segunda tese:

O órgão colegiado de maior composição, para o qual foi deslocada a competência para julgar a ação rescisória, exercerá o juízo rescindente, e, se disso for o caso, o juízo rescisório, rejulgando a causa por completo.

Contudo, é importante frisar que a técnica de ampliação do colegiado prevista no art. 942 do CPC/2015 somente incidirá quando se tratar de ação rescisória destinada a rescindir sentença, e não acórdão. Reforça esse entendimento o fato de o inciso I do § 3º do art. 942 do CPC/2015 mencionar expressamente que a técnica de julgamento prevista neste artigo se aplica em ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença. Não houve, portanto, no mencionado dispositivo legal, previsão de aplicação da regra na hipótese de rescisão de acórdão.

Nesse sentido, a quinta tese jurídica fixada pelo Órgão Especial do TJPE no julgamento do IAC nº 495116-8: “A ação rescisória ajuizada contra acórdão, por ser da competência originária de órgão de maior composição, não atrai a incidência do artigo 942 do CPC”.

Ainda sobre a técnica de complementação de julgamento não unânime no julgamento da ação rescisória, é importante elucidar que tal regra prevista no art. 942 do CPC/2015 não se aplicará nos tribunais em que a rescisória é julgada pelo plenário ou pelo órgão especial, tendo em vista que o julgamento já se realizou no órgão de maior composição.


9. Embargos de declaração contra acórdão proferido por órgão com composição ampliada

Levando-se em consideração que os embargos de declaração devem ser julgados pelo órgão que proferiu o acórdão embargado, na hipótese de o recurso do qual se originou a decisão embargada ter sido proferido com composição ampliada, é esta mesma composição ampliada que deve julgar os aclaratórios.  

Nesse sentido, os enunciados 137 da II Jornada de Direito Processual Civil, do Conselho da Justiça Federal e 700, do FPPC, respectivamente:

Se o recurso do qual se originou a decisão embargada comportou a aplicação da técnica do art. 942 do CPC, os declaratórios eventualmente opostos serão julgados com a composição ampliada”.

O julgamento dos embargos de declaração contra o acórdão proferido pelo colegiado ampliado será feito pelo mesmo órgão com colegiado ampliado.

Outro não foi o entendimento firmado pelo Órgão Especial do TJPE no julgamento do IAC nº 495116-8, conforme se poder aferir pelo conteúdo da décima tese jurídica fixada: “Compete ao órgão colegiado de composição ampliada que proferiu o acórdão, julgar os embargos de declaração respectivos, mantidos os julgadores que participaram do ato embargado, se não estiverem afastados por qualquer motivo”.


10. Ampliação do julgamento em sede de apelação em processo de mandado de segurança

O art. 25 da Lei n. 12.016/2009 estabelece não caber, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes.

Segundo Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, tal dispostivo legal “perdeu sua eficácia normativa[17], pois não há mais embargos infringentes no sistema processual brasileiro[18]”.

Assim, levando-se em consideração que o instituto previsto no art. 942 do CPC/2015 não possui natureza recursal, a regra prevista nele aplica-se ao julgamento da apelação em mandado de segurança. Nesse sentido, o enunciado 62 da I Jornada de Direito Processual Civil, do Conselho da Justiça Federal: – “Aplica-se a técnica prevista no art. 942 do CPC no julgamento de recurso de apelação interposto em mandado de segurança”.

Contudo, é importante destacar que a técnica de ampliação do colegiado prevista no art. 942 do CPC/2015 não se aplica ao julgamento do recurso ordinário em mandado de segurança, tendo em vista que o recurso ordinário já é julgado no Supremo Tribunal Federal (STF) ou STJ por um colegiado composto por 5 (cinco) ministros, não se encaixando na hipótese prevista no aludido art. 942 do CPC/2015.


11. Questões polêmicas sobre a aplicação da técnica prevista no art.942 do CPC/2015

Consoante bem constataram Marco Aurélio Peixoto e Rodrigo Becker, uma das questões mais polêmicas sobre a aplicação da técnica de complementação de julgamento não unânime prevista no art. 942 do CPC/2015

diz respeito a como se dará a continuidade do julgamento na hipótese de se ter uma parte unânime e uma parte não unânime no julgado, isto é, se os desembargadores que haviam sido objeto de unanimidade ou se deverão restringir seus votos àquelas questões que haviam sido objeto de divergência[19].

A doutrina majoritária, por entender não ter a regra do art. 942 do CPC/2015 natureza de recurso, defende que a técnica de ampliação do colegiado não possui efeito devolutivo, “razão pela qual os novos julgadores, convocados para que o julgamento tenha prosseguimento, não estão limitados a decidir sobre o ponto divergente[20]”.

Ao se deparar com tal questão, o Órgão Especial do TJPE, no julgamento do IAC nº 495116-8, fixou as seguintes teses jurídicas, as quais restaram numeradas como a primeira e sétima teses:

O órgão colegiado de maior composição, para o qual foi deslocada a competência para julgar a ação rescisória, examinará toda a causa, inclusive as questões prévias já decididas, por unanimidade, no órgão originário.

Os julgadores convocados para o julgamento ampliado de apelação e agravo de instrumento, não estarão limitados ao capítulo da divergência, podendo votar sobre todo o objeto do recurso.

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 A Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp nº 1771815/SP, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, cuja ementa já restou transcrita acima, também trilhou nesse mesmo sentido ao assentar que “os novos julgadores convocados não ficam restritos aos capítulos ou pontos sobre os quais houve inicialmente divergência, cabendo-lhes a apreciação da integralidade do recurso”.

Naquela oportunidade, o Relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva asseverou que:

De fato, ao determinar a ampliação do número de julgadores se constatada uma divergência e facultar a revisão, o aperfeiçoamento e até a superação dos fundamentos expostos pelos julgadores na primeira sessão, o art. 942 do CPC/2015 ostenta o relevante propósito de assegurar uma análise mais aprofundada das teses contrapostas, mitigando os riscos de que entendimentos minoritários prevaleçam em virtude de uma composição conjuntural de determinado órgão fracionário julgador e garantindo que sejam esmiuçadas questões fáticas eventualmente controvertidas.

Reforça esse entendimento a parte final do caput do art. 942 do CPC/2015, que dispõe que serão convocados outros julgadores ‘em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores’.

Como referido trecho permite inferir, o intuito da norma é manter em aberto o julgamento até ulterior deliberação pelo quórum qualificado, garantindo-se a expressa possibilidade de reversão do resultado inicial.

Ademais, não se deve perder de vista que o § 2º do art. 942 do CPC/2015, ao estabelecer que “[o]s julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento”, deixou claro a intenção do legislador de que o jugamento está em aberto, razão pela qual todos os os julgadores devem examinar os pontos controvertidos e apreciar toda a controvérsia, para que, então, o julgamento seja dado por encerrado.

Logo, caso se admita o entendimento de que os julgadores convocados ou integrantes do órgão de maior composição somente podem examinar a parte não unânime da votação até então havida, teríamos um acórdão com um número de votos distintos, pois a parte unânime possuiria 3 (três) votos, enquanto a parte não unânime teria um número maior de votos, o que não pode ser admitido, pois o acórdão é um só.

Em resumo, a doutrina majoritária, bem como o entendimento firmado pelo Órgão Especial do TJPE, quando do julgamento do IAC nº 495116-8 e pela Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp nº 1771815/SP, fixaram o entendimento de que os novos julgadores convocados não estão limitados a decidir sobre os capítulos ou pontos sobre os quais houve inicialmente divergência, cabendo-lhes a apreciação da integralidade do recurso.

Ou seja, “os capítulos unânimes, antecedentes àquele em que foi instalada a divergência, não permanecerão intocáveis, podendo o órgão colegiado reabrir a discussão sobre todo objeto da causa, até mesmo reapreciar eventuais questões preliminares ou prejudiciais de mérito[21]”. 

Outra questão polêmica que restou dirimida pelo Órgão Especial do TJPE, quando do julgamento do IAC nº 495116-8, era saber se o órgão colegiado de maior composição, para o qual for deslocada a divergência, conclua por julgar procedente o pedido rescindendo, mantendo, desse modo, a posição firmada pelos dois votos majoritários na primeira fase do julgamento, e resolvendo, assim, a matéria sob divergência, prosseguiria no julgamento quanto ao juízo rescisório, ou, ao contrário, o feito retornaria para o órgão originário, considerando que, à altura, ainda não seria possível saber se haverá divergência quanto ao esse capítulo ainda não julgado.

Sobre essa questão, foram aprovadas a segunda e quarta teses jurídicas:

O órgão colegiado de maior composição, para o qual foi deslocada a competência para julgar a ação rescisória, exercerá o juízo rescindente, e, se disso for o caso, o juízo rescisório, rejulgando a causa por completo.

Incidindo a regra do inciso I do § 3º do artigo 942, do Código de Processo Civil, o órgão de maior composição, para o qual foi deslocada a competência, julgará a causa na sua inteireza, sem a participação dos julgadores do órgão[22].

Entendemos ter o Órgão Especial do TJPE acertado ao definir que o órgão de maior composição, ao assumir a competência para o julgamento da rescisória, deve exercê-la até o final do julgamento, de forma a evitar a ocorrência de inúmeras idas e vindas do caso, o que iria de encontro aos princípios da eficiência (art. 8º do CPC/2015) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF/1988).

Acreditamos que o mesmo raciocínio se aplica ao julgamento ampliado da apelação e do agravo de instrumento. Ou seja, uma vez ampliado o colegiado para o julgamento de tais recursos, a continuidade do julgamento deverá se dar até o final com o quórum mínimo de cinco julgadores.

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Jar e Silva

Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP. Assessor Técnico Judiciário do Tribunal de Justiça de Pernambuco - TJPE. Assessor do Des. Eduardo Sertório Canto.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Carlos Eduardo Jar. Da interpretação e abrangência da técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015:: uma análise sobre as teses fixadas pelo TJPE em sede de IAC e os primeiros posicionamentos do STJ acerca do referido dispositivo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5918, 14 set. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74338. Acesso em: 24 nov. 2024.

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