Qual modalidade se aplica às obras e serviços de engenharia na nova lei de licitação?

18/07/2019 às 22:41
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Identifica-se a modalidade a ser aplicada nas licitações de obras e serviços de engenharia, trazendo uma análise completa de como se efetivarão os procedimentos de disputa pelos licitantes, por força do novo projeto de lei de licitações (PL 1.292/95).

A fim de amparar este artigo àqueles que estão havidos com essa temática da nova Lei de Licitação, utilizamo-nos neste momento do atual estágio do PL nº 1292/95 que em sua versão final foi à votação no Plenário da Câmara dos Deputados em 25/06/2019 e teve seu texto base já aprovado, restando votar os destaques apensados.

Vem aí na verdade uma nova Lei que se tornará um novo estatuto, estabelecendo normas gerais de Licitação e Contratos para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal, Municípios, bem como órgãos dos poderes legislativo e judiciário em todas as esferas.

O texto propõe a revogação objetiva e direta das Leis atuais do regime licitatório e contratual, destacadamente as seguintes:

  • Lei nº 8.666/93 – Normas Gerais de Licitações e Contratos;
  • Lei nº 10.520/02 – Norma que introduziu a modalidade pregão;
  • Lei nº 12.462/11 – RDC, Lei que se denominou Regime Diferenciado de Contratações, porém só altera as licitações.

Ainda que o texto legislativo não o faça expressamente, essa nova norma geral acabará revogando uma série de Decretos, Instruções Normativas, etc., que necessitam de posicionamento de procedimentos (alguns até mencionados no próprio projeto de Lei) para adequação na utilização dessa nova norma geral.

Tranquilizando a todos: não temos Lei nova alguma ainda! Há apenas uma expectativa que este Projeto de Lei aprovado no Senado (PLS – 559/2013), que foi nos últimos anos debatido na Câmara Federal, gerando o substitutivo do Projeto de Lei nº 1292/95 com substanciais alterações, o qual após aprovado por completo na Câmara será então enviado ao Senado Federal, novamente analisado e, somente após, para Sanção Presidencial. Ou seja, “muita água passará pela ponte”, possivelmente ainda com novas alterações.

Voltando a tratativa, há muito que se questiona nas licitações para obras e serviços de engenharia a aplicação da vigente modalidade Pregão. Alguns são defensores ferozes da aplicação geral, outros nem tanto. O principal ordenador, o Tribunal de Contas da União, é claudicante, mas na prática as administrações em maioria, utilizam-se da modalidade Pregão para licitações de Projetos, pequenos serviços de engenharia, manutenções prediais e para registro de preços de serviços também de engenharia oriundos de tabelas por oferta de desconto.

As obras, principalmente de certo porte, as administrações em sua maioria ainda se subsidiam nas licitações pelas modalidades da Lei nº 8.666/93 (convite, tomada de preços e concorrência).

Neste mesmo pensamento, o CONFEA – Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, o CAU – Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, CBIC – Câmara Brasileira da Indústria da Construção, entre outras entidades, combatem com veemência a utilização do Pregão para obras e serviços de engenharia, que se traduz em “leilão de quem dá menos”, principalmente pela insegurança quando se trata de serviços de execução futura.

O CONFEA, recentemente foi incisivo e em suas atribuições oriundas da Lei nº 5.194/66, quando através da recente Resolução nº 1.116/19, estabeleceu que obras e serviços de engenharia são classificados como “serviços técnicos especializados”.

Hoje existe um verdadeiro impasse: as Administrações utilizam a modalidade Pregão para quase todos os serviços e projetos de engenharia, inclusive algumas obras e as entidades que abrangem esses específicos serviços têm intensificado procedimentos, inclusive judiciais, buscando amparo no seu entender pela não aplicação do Pregão, principalmente após a edição da Resolução CONFEA que os embasa.

Esmiuçando tal Projeto neste específico ponto, identifica-se uma enormidade de problemas quando se busca solução. Criaram-se várias novas figuras semelhantes, com definições conflitantes, tais como:

“Art.6º Para os fins desta Lei consideram-se:

XII – obra: toda atividade estabelecida, por força de lei, como privativa da profissão de arquiteto e engenheiro que implique a intervenção no meio ambiente por meio de um conjunto harmônico de ações que, agregadas, formam um todo que inova o espaço físico da natureza ou que acarreta a alteração substancial das características originais de bem imóvel;

XVIII – serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual: aqueles realizados em trabalhos relativos a:

a) estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos e projetos executivos;

b) pareceres, perícias e avaliações em geral;

c) assessorias e consultorias técnicas e auditorias financeiras e tributárias;

d) fiscalização, supervisão e gerenciamento de obras e serviços;

e) patrocínio ou defesa de causas judiciais e administrativas;

f) treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;

g) restauração de obras de arte e de bens de valor histórico;

h) controles de qualidade e tecnológico, análises, testes e ensaios de campo e laboratoriais, instrumentação e monitoramento de parâmetros específicos de obras e do meio ambiente e demais serviços de engenharia que se enquadrem na definição deste inciso;

XXI – serviços de engenharia: toda atividade ou conjunto de atividades destinadas a obter determinada utilidade, intelectual ou material, de interesse para a Administração e que, não enquadradas no conceito de obra a que se refere o inciso XII deste artigo, são estabelecidas, por força de lei, como privativas da profissão de arquiteto, engenheiro ou técnicos especializados, compreendendo:

a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tenho por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção, adequação e adaptação de bens móveis e imóveis, preservando-lhes as características originais;

b) serviço especial de engenharia: aqueles que, por sua alta heterogeneidade ou complexidade, não possam se enquadrar na definição constante da alínea “a” deste inciso;

XXII – obras e fornecimento de grande vulto: aqueles cujo valor estimado seja superior a R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais);”

Ou seja, são diversas definições que provavelmente trazem mais insegurança que soluções, criando ainda novos significados que se confundem por completo. Observem de forma exemplificativa que existem definições para: serviço de engenharia; serviço comum de engenharia; serviço especial de engenharia.

Diante deste emaranhado de definições, o Projeto de Lei tornou ainda mais difícil a tarefa interpretativa que já é árdua em definir qual modalidade se aplica em cada caso concreto.

Tentando identificar a modalidade de forma objetiva, continuando nas definições identificamos no art. 6º, XXXVIII a acepção de concorrência:

“XXXVIII – concorrência: modalidade de licitação para contratação de bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia, cujo critério de julgamento poderá ser:

a) menor preço;

b) melhor técnica ou conteúdo artístico;

c) técnica e preço;

d) maior retorno econômico;

e) maior desconto;”

Se serviços comuns e especiais de engenharia já englobam todos os serviços de engenharia, em conjunto com as obras será a modalidade de Concorrência com os critérios de julgamento a definir, a solução de nossos problemas.

Assim, deverá a modalidade Concorrência ser objetivamente utilizada em todos os serviços de engenharia e obras.

Infelizmente, se por um lado se identifica a modalidade no Projeto de Lei a qual se deve utilizar para obras e serviços de engenharia, eliminando e afastando definitivamente questionamentos pela realização de licitação na modalidade Pregão, não houve qualquer vitória dos que defendiam a utilização das modalidades tradicionais da Lei nº 8.666/93, pois também por definição explícita no art. 28 do Projeto da nova Lei, encontra-se explícito que as modalidades concorrência e pregão seguem rito procedimental comum, senão vejamos:

“Art.28. A concorrência e o pregão seguem o rito procedimental comum a que se refere o art.17, adotando-se o pregão sempre que o objeto possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado.

Parágrafo único. O pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e de serviços de engenharia e arquitetura.”

Portanto em relação a qual modalidade de licitação se apoia as obras e serviços de engenharia (todos), inexiste dúvida, sendo a modalidade Concorrência aquele que atende a disciplina legal aqui analisada. Mas observem, “... o rito procedimental comum a que se refere o art.17 ...” é o específico rito da atual modalidade Pregão.

Assim, em princípio, a modalidade está definida: CONCORRÊNCIA, porém se utilizando da sequência de fases do pregão, isto é, em regra julgamento de proposta de preços antecedendo habilitação e fase recursal única.

Na pesquisa desta temática até as entidades contrárias ao Pregão, já estavam de acordo com essa sequência que traz significativa celeridade ao certame, porém é no procedimento de apresentação de proposta deste Projeto que se identificam as diferenças, principalmente no modo de disputa, o qual o art.54, vetou sua utilização na maneira fechada e assim estabeleceu:

“Art.54. O modo de disputa poderá ser, isolada ou conjuntamente:

I – aberto, hipótese em que os licitantes apresentarão suas propostas por meio de lances públicos e sucessivos, crescentes ou decrescentes;

II – fechado, hipótese em que as propostas permanecerão em sigilo até a data e hora designadas para sua divulgação.

§1º É vedada a utilização isolada do modo de disputa fechado quanto adotados os critérios de julgamento por menor preço ou por maior desconto.”

Portanto, nas licitações de obras cujo julgamento adotado seja o critério por menor preço ou por maior desconto, os quais significam a quase totalidade dos certames, a modalidade a ser utilizada é a Concorrência, porém a sequência de fase e o modo de disputa será aberto sem exceção por meio de lances públicos e sucessivos).

Senhores, sem meias palavras, o que está posto neste Projeto de Lei, é a aplicação total da atual modalidade Pregão, com o temível “leilão de quem dá menos” contaminado pelo preço dos concorrentes na execução futura da obra. Aparentemente se utiliza do nome da modalidade Concorrência atual, muito mais para confundir do que assumir esta posição aqui apresentada.

E quanto aos serviços de engenharia, como se realizarão?  Nesses, acredita-se pela intensidade dos pertinentes argumentos do CAU, foram exceção e seguem os disciplinamentos abaixo:

“Art.35.O julgamento por técnica e preço considerará a maior pontuação obtida a partir da ponderação, segundo fatores objetivos previstos no edital, das notas atribuídas aos aspectos de técnica e de preço da proposta.

§1º O critério de julgamento de que trata o caput será escolhido quando estudo técnico preliminar demonstrar que a avaliação e a ponderação da qualidade técnica das propostas que superarem os requisitos mínimos estabelecidos no edital forem relevantes aos fins pretendidos pela Administração nas licitações para contratação de:

I – serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual, caso em que esse critério de julgamento deve ser empregado preferencialmente;”

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Soma-se a conteúdo explanado no Art.36, §2º que diz:

“Art.36

§2º Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, na licitação para contratação de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual previstos nas alíneas “a”, “d” e “h” do inciso XVIII do art.6º cujo valor estimado da contratação seja superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), o julgamento será por:

I – melhor técnica; ou

II – técnica e preço, na proporção de 70% (setenta por cento) de valoração da proposta técnica.”

As alíneas “a”, “d” e “h” do art.6º, inciso XVIII, tem o seguinte teor:

“Art.6º

XVIII - serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual: aqueles realizados em trabalhos relativos a:

a) estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos e projetos executivos;

d) fiscalização, supervisão e gerenciamento de obras e serviços;

h) controles de qualidade e tecnológico, análises, testes e ensaios de campo e laboratoriais, instrumentação e monitoramento de parâmetros específicos de obras e do meio ambiente e demais serviços de engenharia que se enquadrem na definição deste inciso;”

Ou seja, praticamente a maioria dos serviços de engenharia se enquadra nessas alíneas e parágrafo trazido acima. Sendo assim, aplica-se o critério de julgamento de técnica e preço na maioria destes serviços.

É necessário ainda somar o disciplinamento apresentado com o do Art.54, §2º do Projeto de Lei que diz:

Art.54.

§2º. É vedada a utilização do modo de disputa aberto quando adotado o critério de julgamento técnica e preço.”

Concluindo, em relação aos serviços de engenharia, o atual projeto de lei estabeleceu praticamente em regra que a modalidade será “concorrência”, o critério de julgamento será “técnica e preço” e o modo de disputa é o “fechado”, salvo as exceções.

Notadamente, em relação aos pontos aqui mencionados, houve certa discrepância dos sistemas atuais aplicados, inclusive determinados em jurisprudências do TCU, onde transformado o Projeto em Lei, as obras em regra se utilizarão do modo de disputa “aberto” com lances sucessivos (idêntico ao atual pregão) e os serviços de engenharia, destacadamente os Projetos e Fiscalizações de Obra, utilizarão também da concorrência, mas com o critério de julgamento por técnica e preço obrigatoriamente com a disputa de preço no modo “fechado”.

Não obstante essa análise em identificar antecipadamente qual modalidade e procedimentos poderão vir a ser aplicados em obras e serviços de engenharia por força da transformação do atual Projeto de Lei nº 1292/1995 em lei vigente, verificam-se avanços para a construção civil em vários pontos, como o do art. 44 que em seu §1º veda a realização de obras e serviços de engenharia sem projeto executivo e a nova modalidade “diálogo competitivo”, quando presentes inovação tecnológica ou técnica.

Registre-se apenas a temeridade, diante inclusive do quadro atual de obras mal executadas e paralisadas, sendo fato notório diante de uma proposição de escolha do executante ao se utilizar do imaginável mundo do “menor preço” através de “lances abertos” em que a contaminação influenciará e será significativa sobre os demais concorrentes, que com certeza levarão a preços cada vez mais inexequíveis e com execução futura extremamente duvidosa e arriscada na aplicação de significativas somas de recursos da sociedade.

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Sobre o autor
Alberto de Barros Lima

Advogado e Engenheiro. Mestre em Leis de Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, com mais de 35 anos de atuação na área de licitações. É autor das obras: "Como participar de licitações públicas", "As vantagens nas licitações e nas compras governamentais para as MPE´s", "As Leis de Licitações e Contratos", "Termo de Referência e Projeto Básico nas Aquisições Públicas" e "Lei nº 14.133/2021 - A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos COMENTADA". É Consultor SEBRAE na área de Políticas Públicas, onde coordenou a Elaboração da Contribuição do SEBRAE para minuta de Lei Estadual de Pernambuco e do Rio Grande do Norte de Tratamento Simplificado, Favorecido e Diferenciado para as MPE´s. Foi o conteudista dos cursos “Como Participar de Processos de Licitações” e “Sistema Integrado de Compras e Licitações Eletrônicas”, elaborados para o SEBRAE-PE, com repasse a outras unidades da Federação. Fez parte do grupo de trabalho que analisou as mudanças da Nova Lei de Licitações (PLS 559/2013) e da atualização da Lei nº 8.666/93 pelo CONFEA. Foi professor da ESA OAB sobre Licitações Públicas e membro da Comissão de Direito a Infraestrutura da OAB-PE. É diretor do SINDUSCON-PE e é Membro Conselheiro do CREA-PE. Possui vários artigos publicados referente ao tema das compras governamentais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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