Tutela antecipada antecedente e sua estabilização frente à luz do novo CPC

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o Novo CPC introduziu no sistema processual brasileiro a “estabilização da tutela de urgência antecipada”, técnica de monitorização genérica que torna estável a tutela satisfativa em procedimento antecipatório, quando não interposto o respectivo recurso

Resumo: A polêmica em torno da morosa duração dos processos tem sido uma preocupação constante das últimas reformas legislativa frente à redução da efetividade das decisões judiciais. Para enfrentar essa questão, tornou-se necessário refletir sobre a quebra do modelo neutro e único de processo de cognição plena e admitir a criação de técnicas processuais diferenciadas, a exemplo da sumarização de procedimentos que, de um lado, mitigam o contraditório e, de outro, amenizam os efeitos do tempo no processo civil. É o caso da antecipação dos efeitos da tutela e da ação monitória. Neste ínterim, o Novo Código de Processo Civil introduziu no sistema processual brasileiro a “estabilização da tutela de urgência antecipada”, técnica de monitorização genérica que torna estável a tutela satisfativa em procedimento antecipatório, quando não interposto o respectivo recurso. Assim, de acordo com o Novo CPC, a estabilização dos efeitos da tutela antecedente, ocorrida em razão da conformação do réu em relação à decisão, não faz coisa julgada, podendo o réu, rever, reformar ou invalidar tal tutela dentro do prazo de 2 (dois) anos contados a partir da data da ciência que extinguiu o processo. Este trabalho, portanto, tem por objeto, tratar das novas alterações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, no âmbito da antecipação dos efeitos da tutela. Para tanto, utilizou-se do método indutivo, aliado à documentação indireta, através do exame do tema proposto sob uma nova ótica ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras.

Palavras-chave: Tutela Antecipada Antecedente; Novo Código Processual Civil.


1. INTRODUÇÃO

De plano, é necessário informar que a antecipação de tutela se refere à imediata concessão dos efeitos executivos latu senso de provimento final. Nesse contexto, de acordo com Novo Código de Processo Civil, agora vigente, em casos de urgência, o pedido inicial de tutela antecipada poderá ser superficial, considerando apenas a situação de urgência, sem necessidade de debater pronta e ineditamente toda a matéria controvertida, de modo que, posteriormente, a petição inicial poderá ser aditada, para então completar toda a matéria a ser discutida no processo. Caso o réu não demonstre seu inconformismo a um eventual provimento de antecipação de tutela, seus efeitos serão estabilizados. Assim, após o prazo para insurgir-se contra essa decisão, ele se torna definitiva.

Entretanto, várias são as problemáticas suscitadas dessa inovação jurídica, que compõem o objeto da presente reflexão. A ciência processual deve garantir que o processo seja instrumento capaz de realizar direitos de forma efetiva, principalmente, em circunstâncias que emanam certa iminência, onde o não pronunciamento judicial, certamente, resultaria numa situação de injustiça. Trata- se de circunstâncias especiais, em que a celeridade assume papel de destaque. Segundo essa tônica, um dos propósitos do anteprojeto do Novo Código de Processo Civil consubstanciou-se em reforma legislativa no tocante às tutelas de urgência.

Destarte, o resultado foi o Código de Processo Civil de 2015 vir a possibilitar que o pedido de tutela antecipada antecedente versasse somente a respeito da urgência, relegando a um segundo momento a inteireza da controvérsia em questão, quando o autor teria a possibilidade de aditar o pedido inicial, desta vez com todos os pontos a serem analisados e, com isso, dotando a exordial da robustez argumentativa a ela inerente. Dessa forma, com o novo diploma processual, num primeiro momento, a análise seria sumária e, com base nela, seria possível conferir provimento ao pedido, ou antecipar a tutela. Contudo, o direito de ter sobre seu pedido análise de cognição exauriente não seria suprimido, vez que, após o aditamento da inicial, o processo tomaria seu curso normal.

Além disso, a nova lei foi mais adiante, trazendo, ainda, a possibilidade de, considerada a inércia do réu diante da antecipação do pedido, estabilizar os efeitos do pedido antecipado. Ou seja, com o Novo Código de Processo Civil, o autor pode: (i) indicar apenas o pedido urgente; (ii) ver deferida a antecipação do pedido; e ainda, (iii) ter estabilizados os efeitos dessa antecipação.

Propõe-se portanto, neste trabalho, formular uma despretensiosa base jurídica a fim de iniciar a discussão suscitada, e em sede de conclusão, sugerir algumas ponderações necessárias, com a viva consciência de que somente o devido aprofundamento dogmático aliado à reiterada prática forense serão capazes de determinar a melhor solução à matéria, através da análise o instituto da estabilização dos efeitos da tutela antecipada concedida em caráter antecedente previsto nos artigos 303 e 304 do novo Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015, visto que o novo código de processo civil realizou a junção do processo cautelar e da tutela antecipada; com a nova disposição, a tutela provisória é gênero do qual as tutelas de urgência: cautelar e antecipada e a tutela de evidência são espécies. Podendo ser concedidas frente à urgência ou à evidência do direito material postulado.


2. TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPATÓRIA ANTECEDENTE

A estabilização da tutela de urgência satisfativa é técnica de monitorização do processo civil brasileiro, generalizada para situações de urgência e para a tutela provisória satisfativa. Aplica-se quando a tutela é concedida em caráter antecedente e não é impugnada pelo réu, litisconsorte ou assistente simples, por recurso, hipótese em que o processo será extinto e a decisão antecipatória continuará produzindo efeitos, estabilizando-se. Não exclui o contraditório, mas o torna eventual e possibilita à defesa do demandado se transmudar em causa de pedir de uma ação nova de cognição exauriente, desestimulando o réu vencido na primeira demanda a prosseguir com a ação em casos meramente procrastinatórios. Não há resolução de mérito quanto ao pedido definitivo. A adoção do contraditório eventual e da estabilização da tutela antecipada fortalece o devido processo legal e a garantia constitucional da duração razoável do processo.

A técnica de estabilização da tutela antecipada encontra forte inspiração no direito comparado, cujo exemplo mais sólido é o instituto denominado référé, no direito francês, procedimento sumário, em contraditório, perante juízo monocrático distinto do condutor do processo principal, que pode ser instaurado de forma antecedente ou incidental, e resulta em um provimento de ordem, que não pode ser suspenso em nenhum caso, sem rígida instrumentalidade com o processo de cognição plena. A existência de um processo de mérito em curso não é pressuposto para sua concessão; ocorrências no eventual processo de fundo não o afetam e a extinção do processo de mérito não gera, a princípio, a sua extinção. Trata-se de procedimento rápido e simplificado, despido de formalismos desnecessários: dispensa-se a constituição de advogado; cita-se o demandado para comparecer a uma audiência; o procedimento será concluído com uma decisão provisória que não tem autoridade de coisa julgada.

O référé busca resolver o problema do perigo do decurso do tempo necessário para a resolução do processo de mérito e tem como função subsidiária evitá-lo, substituindo o procedimento e a decisão definitiva, sob uma lógica econômica de satisfação dos litigantes. Possui também uma função de polícia das situações manifestamente ilícitas, pois o fato de o juiz reconhecer como manifestamente ilícita determinada situação desestimula a parte perdedora de engajar o processo de mérito posteriormente.

No direito brasileiro, a estabilização da tutela antecipada foi delineada, pela primeira vez, no Projeto de Lei nº 186/2005. Nele, foi prevista a possibilidade de a tutela provisória satisfativa ser pleiteada em procedimento antecedente ou na pendência do processo, havendo estabilização dos seus efeitos caso preclusa, o réu não intentasse nova demanda exauriente ou requeresse prosseguimento da ação, no prazo, respectivamente, de 60 ou 30 dias, hipótese em que tal decisão adquiriria autoridade de coisa julgada. O referido Projeto de Lei, contudo, não foi adiante.

Posteriormente, por meio do ato nº 379/2009 do Presidente do Senado Federal, constituiu-se a comissão de juristas que elaborou o projeto de Lei n. 166/2010, aprovado naquela casa legislativa em 15 de dezembro de 2010. Seu artigo nº 280 estabelecia que, no mandado de citação da tutela provisória requerida de forma antecedente, haveria a advertência de “não impugnada a decisão ou medida liminar eventualmente concedida, ela continuaria a produzir efeitos independentemente da formulação de pedido principal pelo autor”. Para Gustavo Bohrer Paim, havia nessa regulamentação certo acanhamento do instituto, argumentando que uma simples contestação ou impugnação por qualquer meio cessaria a eficácia da medida concedida em caráter antecedente.

O CPC de 2015 dispõe no artigo 303 que nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, poderá o autor requerer a tutela antecipada em forma antecedente ao pedido de tutela final. Para Tesser (2015), o Novo Código Processual Civil inova ao permitir que a tutela antecipada de caráter satisfativo seja requerida em caráter antecedente, possibilitando que apenas o pedido de tutela de urgência dessa natureza seja deduzido, sem integral exposição de toda argumentação relativa à completa compreensão da lide. E sustenta que a nova sistemática representa verdadeira novidade, pois, no regime do CPC de 1973, a tutela antecipada somente poderia ser requerida desde que todos os argumentos e fundamentos da lide, em sua integralidade, estivessem deduzidos.

No mesmo sentido Rita Daniele Viana de Oliveira (2017), escreveu:

“[...] o CPC-2015 inovou ao prevê a possibilidade de concessão da antecipação de caráter antecedente. Assim, quando a necessidade de antecipar os efeitos da tutela se der de forma contemporânea à propositura da ação, o autor pode limitar seu pedido ao requerimento de antecipação de tutela, apenas fazendo referência ao futuro pedido principal (tutela final), com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo”.

Nos ensinamentos de Didier Jr., Braga e Oliveira (2015):

“A tutela provisória antecedente foi concebida para aqueles casos em que a situação de urgência já é presente no momento da propositura da ação e, em razão disso, a parte não dispõe de tempo hábil para levantar os elementos necessários para formular o pedido de tutela definitiva de modo completo e acabado, reservando-se a fazê-lo posteriormente, deflagrando o processo em que, futuramente, o autor pretende postular a tutela definitiva”.

Neste caso, da mesma forma, caso não esteja convencido, o juiz poderá permitir a parte que traga maiores elementos de prova através de audiência. Anota-se que pedido antecedente não significa, contudo, que a tutela será analisada liminarmente, antes da citação e da oitiva da parte contrária.

Oportunamente adverte Mitidiero (2015, p. 776.), que apenas por ser concedido provisoriamente o que pode sê-lo definitivamente: “A técnica antecipatória não pode prestar uma tutela do direito que se encontra fora da moldura da tutela final. Uma vez antecipada a tutela, essa conserva a sua eficácia na pendência do processo, só sendo oportunamente absorvida pela tutela final”.

Uma das pontuais inovações introduzidas pelo novo código do processo civil, foi sem dúvida a previsão contida no seu artigo 304, que dispõe sobre a estabilização da tutela antecipada concedida em caráter antecedente. Assim, estabeleceu-se a possibilidade de a decisão que concede tutela jurisdicional urgente antecipada continuar a produzir efeitos, sem a necessidade de sua reafirmação em um provimento de cognição exauriente:

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“Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso.

§ 1 º No caso previsto no caput, o processo será extinto.

§ 2º Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada nos termos do caput.

§ 3º A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º.

§ 4º Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2º, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida.

§ 5º O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2 º deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1 º. § 6º A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2º deste artigo”. (BRASIL, 2015)

No entanto, é importante afirmar que conforme previsão do art. 304, o legislador quis restringir a técnica da estabilização da tutela antecedente apenas à tutela antecipada, não se aplicando, assim, à tutela cautelar e à tutela de evidência.

Da interpretação literal do dispositivo, extrai-se que deverá o réu, para não ver estabilizada a tutela provisória e extinto o processo, interpor recurso de agravo de instrumento contra a decisão que concedeu a tutela de urgência antecipada em caráter antecedente. E ainda, querendo o réu somente contestar a demanda, por exemplo, a tutela provisória já estaria estabilizada e o processo estaria extinto muito provavelmente antes mesmo da audiência de tentativa de conciliação ou mediação.

Didier (2015, p. 606-607) comenta, ainda, a previsão de que a opção pela estabilização da tutela pretendida deverá ser previamente declarada pelo autor:

“A opção pela tutela antecedente deve ser declarada expressamente pelo autor (art. 303, §5°, CPC). Um dos desdobramentos disso é a possibilidade de estabilização da tutela antecipada, caso o réu seja inerte contra decisão que a conceda (art. 304, CPC). Os arts. 303. e 304 formam um amálgama. Desse modo, ao manifestar a sua opção pela tutela antecipada antecedente (art. 303, §5°, CPC), o autor manifesta, por consequência, a sua intenção de vê-la estabilizada, se preenchido o suporte fático do art. 304. O réu precisa, então, saber, de antemão, qual a intenção do autor. Se o autor expressamente declara a sua opção pelo benefício do art. 303. (nos termos do art. 303, §5°, CPC), subentende-se que ele estará satisfeito com a estabilização da tutela antecipada, caso ela ocorra. Se, porém, desde a inicial, o autor já manifesta a sua intenção de dar prosseguimento ao processo, o réu ficará sabendo que a sua inércia não dará ensejo à estabilização do art. 304”.

A estabilização da tutela antecipada é um instituto bastante novo e cuja aplicação e efetividade ainda serão testados pelos atores processuais. Trata-se de técnica aplicada a tutelas sumárias na França e na Itália, com peculiaridades tais que a análise do direito comparado, apesar de instrutiva, é insuficiente para resolver os problemas criados pela legislação pátria. O art. 303, caput, do CPC/15 autoriza a parte, nas hipóteses em que a urgência for contemporânea ao ajuizamento da ação, a se valer do benefício de requerer, em petição simplificada, medida antecipatória, indicando a lide da ação principal que, eventualmente, será ajuizada.

Por sua vez, o art. 304, caput, do CPC/15 determina que a tutela antecipada antecedente concedida nos termos do art. 303, caput, do CPC/15 se estabilizará, caso contra tal decisão não seja interposto o respectivo recurso. Esses efeitos podem ser revistos em ação proposta para desconstituí-los, cujo prazo para ajuizamento é de dois anos. Após esse lapso temporal, os efeitos não mais poderão ser desfeitos.


3. INSTITUTO DA COISA JULGADA

A coisa julgada é prevista no texto constitucional em vigor em seu art. 5º, XXXVI onde explicitamente informa que a lei não prejudicará o ato jurídico, o direito adquirido e a coisa julgada, considerados estes os três pilares da segurança jurídica, diretamente relacionados à ideia de previsibilidade dos atos estatais.

O direito positivo brasileiro tentou conceituar a coisa julgada em duas oportunidades, isso sem contar a vez no novo CPC: “Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”.

No art. 6º, em seu parágrafo terceiro da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro há o enunciado: "Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba mais recurso. A origem do termo" caso julgado "é do mencionado direito português (art. 677).

Desta forma, conclui-se que a coisa julgada não é efeito da sentença e nem qualidade dos efeitos da sentença é, em verdade, uma situação jurídica que se forma no momento em que a sentença se transforma de instável para estável.

Evidentemente o processo segue adiante em direção ao ato processual magno representado pela sentença que poderá decidir ou não o mérito da causa. Assim, a impossibilidade de recorrer acontece em virtude de não haver mais recursos cabíveis para impugnar a decisão, ou tendo esgotados todos os recursos previstos em lei, o réu perdeu o prazo para a devida interposição recursal, ou ainda, porque não se enquadra a decisão nas hipóteses que se submetem ao reexame necessário.

A coisa julgada formal incide ortodoxamente em todos os processos. Se a sentença é terminativa, ou seja, esta extingue o processo sem resolução do mérito, então não produzirá qualquer efeito externo ao processo. Posto que não haverá a coisa julgada material.

Os efeitos não se externalizaram porque o juiz não examinou a relação jurídica de direito material, significando que a sentença terminativa apesar de transitar em julgado. Portanto, se houver nova propositura da demanda, só será acolhível e possível, caso corrija o vício ou eventual falha que ensejou a extinção do processo sem resolução do mérito. É inclusive assim posicionado o novo CPC.

Enquanto que a coisa julgada formal é normalmente chamada de preclusão endoprocessual e que gera apenas efeitos intestinos. Por sua vez, somente as sentenças que conseguem julgar a relação jurídica de direito material que fora levada à apreciação do juiz, ou seja, as que julgam o mérito da causa e podem produzir diferentes efeitos, inclusive os externos.

A coisa julgada não se confunde com os efeitos sentenciais. Ela confere imutabilidade ao comando do qual se extraem os efeitos da sentença. Portanto, é um plus em relação aos efeitos, conferindo-lhes estabilidade. Além disso, A coisa julgada não imutabiliza os efeitos da sentença, mas apenas o comando sentencial de que eles provêm, pois se a relação jurídico-material for disponível, as partes, mesmo depois do trânsito em julgado, podem desconsiderar, modificar ou extinguir os efeitos da sentença, não se permitindo, entretanto, é que o Poder Judiciário emita nova sentença entre as mesmas partes e sobre o mesmo objeto.

Portanto, mesmo sendo elementos distintos, se a relação jurídica material estiver sendo analisada na segunda demanda for a mesma da primeira e, puder acarretar alteração no que já fora julgada, então, não se pode repeti-la, pois haverá coisa julgada pela identidade das relações jurídicas.

3.1. LIMITES OBJETIVOS E SUBJETIVOS

A coisa julgada está submissa a dois limites argumentativos, aptos a afastar o impedimento trazido com a eficácia preclusiva: a falta ou nulidade da citação e a divergente interpretação constitucional pelo Supremo Tribunal Federal da norma que fundamentou a decisão transitada em julgado.

Manteve o NCPC que a decisão que concede tutela antecipada não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes. (art. 304, sexto parágrafo do NCPC).

O mesmo diploma legal listou entre as alegações incumbidas ao réu a coisa julgada, conforme art. 337, VII, e no quarto parágrafo explica que há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.

Prevê ainda no art. 433. sobre a declaração de falsidade do documento quando suscitada como questão principal, constará da parte dispositiva da sentença e sobre esta incidirá também a autoridade da coisa julgada10, referindo-se à coisa julgada material. Manteve, portanto, o NCPC a coisa julgada como pressuposto processual negativo ex vi o art. 485, inciso V, juntamente com a perempção e a litispendência.

A grande novidade em relação ao Código Buzaid (mas não em relação ao CPC de 1939), prevê o art. 503. primeiro parágrafo in litteris: O disposto no caputaplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo (não precisando, mas da ação declaratória incidental que fora extinta pelo novo codex).

Adiante no art. 504. explicita-se o que não faz coisa julgada: I- os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; II - a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.

Já no art. 506. apontando para coisa julgada formal informa in litteris: A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. Reforça a indiscutibilidade o art. 507. principalmente sobre as questões já decididas a cujo respeito se operou preclusão.

Já no art. 963, inciso IV, o respeito à coisa julgada brasileira é um dos requisitos indispensáveis para a homologação de decisão estrangeira.

Também a ofensa à coisa julgada é um dos motivadores para a propositura de ação rescisória que atua sobre a decisão de mérito, transitada em julgado.

Enfim, com a ampliação dos limites objetivos da coisa julgada e também com a imposição de uma fundamentação mais complexa e atenta das decisões judiciais, venho humildemente entender que se pretende diminuir o grande fluxo de recursos que tramitam nos tribunais brasileiros. Pretendendo empreender maior celeridade processual com apoio na segurança jurídica.

Os limites objetivos da coisa julgada são definidos, de regra, pelo dispositivo da sentença, não se estendendo aos motivos (ainda que importantes determinar o alcance da parte dispositiva da sentença) e a verdade dos fatos estabelecida como fundamento da decisão, ou seja, a coisa julgada atinge apenas as questões decididas em caráter principal, como dispositivo da sentença, e não a motivação sentencial, ainda que importante para determinar o alcance de sua parte dispositiva, por força do que dispõe o artigo 504 do NCPC. Além disso, a coisa julgada não atingirá também verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.

O artigo 503, caput, traz que a decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida, ou seja, nos termos do artigo 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, uma vez constituída a Coisa Julgada, nem mesmo uma lei poderá desconstituí-la.

A investigação dos limites objetivos da coisa julgada consiste na verificação daquilo que transitou em julgado, ou seja, quais as partes da sentença estão protegidas pelo manto da imutabilidade e da indiscutibilidade.

No Brasil, o atual Código de Processo Civil em seu art. 469, não deixa qualquer dúvida de que foi adotado no ordenamento pátrio a teoria de que somente a parte dispositiva da sentença faz coisa julgada, como se verifica de sua redação:

“Art. 469. Não fazem coisa julgada:

I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte

dispositiva da sentença;

II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;

III – a apreciação de questão prejudicial, decidida incidentemente no processo”. (BRASIL, 2013)

Combinando o art. 469. com o art. 458, ambos do CPC, é possível concluir que os motivos determinativos do alcance do dispositivo, a verdade dos fatos e as questões prejudiciais estão todos alojados nos fundamentos ou motivação da sentença, de sorte que somente a parte dispositiva fica recoberta pela coisa julgada material.

Isto não significa que sejam irrelevantes o relatório e a motivação da sentença na composição da decisão. Nesse sentido, Alexandre Câmara ensina que a sentença faz coisa julgada nos limites do objeto do processo, o que significa dizer, nos limites do pedido; o que não tiver sido objeto do pedido, por não integrar o objeto do processo, não será alcançado pelo manto da coisa julgada; apenas aquilo que foi deduzido no processo e, por conseguinte, objeto de cognição judicial, é alcançado pela autoridade de coisa julgada.

Igualmente, a solução da questão prejudicial que condiciona o teor da decisão do objeto da lide não faz coisa julgada. Esta poderá tornar-se objeto de demanda, desde que qualquer das partes pleiteie sua resolução como questão principal, exigindo-se, ainda, a competência do juízo.

Assim, enquanto os limites objetivos da coisa julgada buscam averiguar qual parte da sentença transita em julgado - aquilo que se reveste pelo manto da coisa julgada -, os limites subjetivos buscam saber quem será beneficiado ou prejudicado pela sentença.

Por limite subjetivo entende-se por quais pessoas estarão vinculadas à coisa julgada formada, não podendo mais discuti-la, de modo que, pela regra contida no artigo 506 do NCPC, a coisa julgada só opera perante as partes do processo em que ela se estabeleceu, sendo assim uma imposição das garantias do acesso à justiça, devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

O limite subjetivo da coisa julgada é definido pelo artigo 472, 1ª parte, do CPC (2015), que dispõe: “a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”. Tal dispositivo indica quais os sujeitos serão atingidos pela imutabilidade do comando emergente e os efeitos da sentença.

Porém, poderá, excepcionalmente, influenciar a terceiros, uma vez que a decisão judicial se revestir de ato de império do Estado. Sobre isso, o Ministro Fux fez uma interessante declaração:

“A situação de conflito submetida ao Judiciário tem os seus protagonistas, e a decisão, a fortiori, seus destinatários. Outrossim, a sentença não vive isolada no mundo jurídico, ressoando possível que uma decisão reste por atingir a esfera jurídica de pessoas que não participaram do processo”. (FUX, 2004, p. 832)

Assim, pela regra contida no artigo 506 do NCPC, a coisa julgada só opera perante as partes do processo em que ela se estabeleceu, sendo assim uma imposição das garantias do acesso à justiça, devido processo legal, contraditório e ampla defesa. Porém tal limitação não impede que os efeitos da decisão de mérito atinjam Terceiros, que poderão atingidos pelos efeitos sentenciais na proporção em que se relacionem com o objeto do litígio, podendo ter benefícios ou desvantagens, mas não ficarão impedidos de discutir em demanda própria aquele mesmo objeto processual, na medida em que detenham legitimidade e interesse para tanto, tais como os terceiros intervenientes, terceiros titulares de direitos comuns ou de direitos ou ações concorrentes e do substituto processual.

Assim, o novo código, apesar de determinar que a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não proíbe expressamente o favorecimento de terceiros, o que se poderá verificar, a depender da natureza da relação jurídica discutida. Como a doutrina vem salientando, em razão da unidade que caracteriza o novo CPC, “não será possível analisar dispositivos de modo isolado”. Nesse diapasão, como o artigo 1.068 da nova lei adjetiva conferiu nova redação ao artigo 274 do Código Civil, mas sem alterar a sua essência, que é de estender o julgamento favorável ao credor solidário alheio à relação processual, fica patenteada a possibilidade da coisa julgada ultra partes, “aquela que atinge não só as partes do processo, como também determinados terceiros.

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Sobre os autores
Mikaelle Coelho Dias Carvalho

Graduando do Curso Superior de Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus – CEULM/ULBRA.

Rubens Alves da Silva

Mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM). Professor do curso de Direito pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) – Campus de Manaus.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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