MARCO CIVIL DA INTERNET
O marco civil da internet adveio de um projeto de lei construído pelo Poder Executivo, incorporado pelo texto constitucional, que busca a garantia de pleno exercício e dois direitos fundamentais que são, direito à privacidade e liberdade de expressão. Porém, estes direitos já estão consolidados pela Constituição Federal no seu artigo 5º, incisos IV e X[1], formando uma hierarquia legislativa, que assegura os mesmos direitos acima descritos no âmbito real e no espaço virtual.
Em destaque a parte final do inciso IV supracitado, recebe ênfase no âmbito virtual, das relações interpessoais, tendo em vista a real dificuldade ainda existente na identificação da origem de mensagens anônimas com fim danoso à terceiro, impossibilitando em corrente, cessação ou ressarcimento de danos gerados, que a partir de agora devem ser combatidos através da legislação estabelecida para regulação da internet[2]. Diz o artigo mencionado, com especificação do inciso; “IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”.
Destarte, não há fundamento a crítica quanto à criação desta legislação ligado a existência de norma anterior hierarquicamente superior. Isto porque, o Marco Civil passa a incluir acesso à internet como “essencial ao exercício da cidadania”[3]. Ou seja, partindo desta concepção, dentre outros direitos sociais já previstos na constituição[4] (artigo 6º), como saúde, segurança e previdência, estão estes equiparados ao direito à internet.
Além da utilização dos direitos exibidos anteriormente como fundamento ao Marco Civil, há também nas recomendações sugeridas pelo Comitê Gestor da Internet do Brasil, materializadas no escrito “Princípios para a Governança e o Uso da Internet”[5], pontos específicos materializados em princípios.
A legislação objeto desta pesquisa baseia-se em quatro pilares fundamentais, consolidados no preambulo da lei 12.965, de 23 de abril de 2014, são eles: princípios, garantias, direitos e deveres.[6]
1.1 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
A resolução anteriormente destacada, como um dos suportes ao marco civil, traça os princípios fundamentais que estão expostos no art. 3º, da lei 12.965/14[7], quanto a constituição e sustentáculo à adequada implementação da lei.
Art. 3º A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios:
I - garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal;
II - proteção da privacidade;
III - proteção dos dados pessoais, na forma da lei;
IV - preservação e garantia da neutralidade de rede;
V - preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas;
VI - responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da lei;
VII - preservação da natureza participativa da rede;
VIII - liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios estabelecidos nesta Lei.
Parágrafo único. Os princípios expressos nesta Lei não excluem outros previstos no ordenamento jurídico pátrio relacionados à matéria ou nos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Com fidelidade ao documento, é importante que todos estes máximos sejam realçados ao leitor, não enumerados como classificação, mas ligados entre si de forma a compreender seus sentidos e situações de atuação.
Em Estado democrático de direito, os cidadãos que nele habitam e dos que nele tornam a habitar tem o direito de se locomover, debater, expor, pensa, agir. Mas, abaixo destes privilégios, algo os sustentam como o princípio da liberdade, privacidade e direitos humanos. Este retrata o uso da internet como mecanismo universal de pesquisa mas com respeito aos usuários, ferramenta que destaca o princípio da liberdade de expressão como guia, para que estes mesmos desfrutadores possam navegar com liberdade e segurança. Esta última reservada pelo princípio da privacidade do indivíduo e de respeito aos direitos humanos, base e alicerce para construir no mundo digital uma sociedade democrática pelo livre pensamento, e acima de tudo justa para que todos, sem exceção, tenham acesso à rede mundial de computadores[8].
Em linha ao dito, o princípio da governança democrática e colaborativa expõe junto a outro princípio, da universalidade, o caráter universal de acesso à internet, sem discriminação a setores diversos da sociedade, de forma a construir uma comunidade inclusiva.
Ainda que 31% dos brasileiros, dado do IBGE 2018, não tenham acesso à internet, outros 69% incorporam as redes de acesso à informação e manifestação de opinião[9], demonstrando a diversidade crenças, costumes e valores, inclusive nas últimas eleições (2018) onde se pode assegurar que as redes sociais foram, e com ênfase, o instrumento utilizado para definir o atual presidente. Este assunto será tratado exclusivamente no decorrer da pesquisa, com outros anseios que estão, inclusive, determinados no título deste estudo.
No início do último parágrafo, destacou-se um dado trazido por instituto especializado, que determina a exposição de outro princípio basilar, o da inovação. Isto porque, quando manifesta-se a ideia de que 69% dos brasileiros tem acesso à informação digital, digo digital porque ainda temos a comunicação entre pesquisador e leitor por papel, como jornais, revistas e até livros (hoje com nova atração, os e-books), pensa o caro leitor na ideia de que o brasiliano está sentado frente a uma tela de computador, digitando fervorosamente e clicando no que julga ser essencial ao seu desenvolvimento como ser pensante. Não. Aponta para ideia de outro instrumento como mecanismo de acesso a informação, o telefone celular. Mas qual o sentido do dito anterior, frente ao princípio da inovação? A obrigação das governanças da internet pela evolução e ampla difusão de novas tecnologias de acesso a informação, hoje a internet móvel.
Ao mesmo tempo que o número de indivíduos passam a ter contato com o mundo exterior, e expressam suas ideias através de publicações nas redes sociais e outros meios, como blogs e sites muitas vezes descabidos de informação, o número de convicções diferentes umas das outras aumentam, e assim o monte de endereços virtuais em que essas manifestações estão inseridas também.
Isto fica extremamente palpável quando do momento em que o indivíduo ingressa na rede social, seja qual ela for, e recebe um enxurrada de convites por meio de publicações e propagandas, para participar e entender melhor esta ou aquela forma de pensamento, ou até mesmo no mercado de consumo de mercancias. Do exposto, fundamentou-se outro princípio primordial, o da neutralidade da rede.
O núcleo objetivo da neutralidade é justamente o direito de todo o indivíduo de livre pensamento. A partir do momento em que você buscar informações sobre a política atual, está impedido o servidor de filtrar os dados acessados afim de que, quando trafegar novamente nas redes, o indivíduo seja persuadido a ingressar em diversas páginas com afinco político, comercial, religioso ou cultural. FONTE DA IDEIA
É inevitável, porém, destacar a proibição de privilégios de tráfego sem expor a ideia de inimputabilidade da rede, outro princípio. A propaganda que adveio de filtragem digital deve ser combatida do forma a atingir os responsáveis finais, e não os instrumentos pelos quais o usuário utilizou de acesso e transporte de dados. Ou seja, utilizando antecipadamente do sentido desta pesquisa, a fake news, foco de discussões e com razão durante as eleições, deve ser entendida como um instrumento construído a partir de um usuário. Este, que utilizou dos meios possíveis, as redes sociais e outras formas de interligar o indivíduo a redes de informação, para propagar as notícias falsas, deve ser responsabilizado ao invés do instrumento utilizado para propagar. FONTE DA IDEIA
Há outros princípios, em grau de julgamento, complementares em relação aos explicitados, porém merecem destaque, ainda que unificados. São os casos de funcionalidade, segurança e estabilidade, onde presam pela preservação das redes através de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e estímulo ao uso das boas práticas. Caso também padronização e interoperabilidade, onde os usuários são coparticipes do desenvolvimento funcional das redes de internet. FONTE DA IDEIA
A ponderação logo no início desta jornada cientifica traçou os pilares fundamentais donde o marco civil aufere robustez, e de pronto expôs-se os princípios presentes no artigo 3º da lei vigente. Em continuidade, verifica-se outros fundamentos, agora pelo artigo 2º da mesma lei[10], e dá-se prioridade a três pontos específicos, que serão ponderados.
De início, o inciso I e primeiro a instituir o catálogo de apreciação rigorosa. O “reconhecimento da escala mundial da rede” está, como já dito, na cabeceira dos incisos, e retrata a universalidade, diversidade (que inclusive forma o inciso III da mesma lei), o acesso a inovação, como forma de sustentação aos fundamentos dentre os principais[11]. A universalidade da internet como instrumento de desenvolvimento humano e societário, a diversidade de pensamentos constituintes das redes sociais, a inovação como gênese das diversas formas com que se pode levar a forma mais rápida e fácil de exploração do desconhecido a todos os povos, dentro outros.
Em outras palavras, reconhece-se a amplitude com que a internet concede aos usuários, de comunicação, transferência de pensamentos, transmissão de conhecimento, objetos que, em âmbito virtual, alçam proporções de escala mundial.[12]
Em corrente, temos o inciso II que relata o desenvolvimento da personalidade, direitos humanos e exercício da cidadania nos meios digitais, ambos ligados para um único fim, a igualdade aos iguais. Na sociedade atual, pode-se dizer que são moldadas as personalidades dos usuários pelo uso da internet. Se tornam combativos frente as ideias diferentes, aguerridos em desmotivar modo de pensamento contrário. Enfim, em âmbito virtual, é necessário que se mantenha a proteção, desde logo, aos direitos humanos, ao livre pensamento.[13]
Sequência, o inciso III com pluralidade e diversidade, outrora enfoques do primeiro destaque do artigo, logo após, o inciso IV com a “abertura e colaboração” (“prevê incentivar a promoção da democracia participativa, através de parcerias entre o setor público, privado e a população em geral [...]”[14]). Veja, há uma ligação muito claro entre este inciso e o princípio da padronização e interoperabilidade no usa da internet. O requisito básico para que deles buscai o alicerce necessário é a interação positiva, frisa-se, onde se tem o relacionamento dos usuários, movimentando as redes, e a colaboração de todos em seu desenvolvimento[15].
Quando se fala em “relacionamento dos usuários”, deve-se observar um ambiente em que haja interação usuário/usuário, de diversas formas distintas, não como duas pessoas que estão em ambiente próprio à manutenção das redes de confraternização de ideias, produtos, serviços, não. A ideia central é, como exemplo, o leitor e o informante, o vendedor e o consumidor, o servidor e o necessitado, o chamado feedback.
As pessoas precisam de um endereço onde encontram o que buscam, e ao mesmo tempo expressam descontentamento com o que recebem, esse é o relacionamento buscado quando se fala em abertura e colaboração.
Em continuidade, o inciso V, “a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor”, aqui claro ligação com a segunda parte do inciso e o anterior explicitado, e pôr fim, inciso VI, “a finalidade social da rede”, observe.
De todo o dito até este momento, preservou-se como preliminar a tudo explanado, a busca pelos direitos humanos, pela preservação da sociedade, até porque as redes de pesquisa configuram diversas comunidades. O inciso VI não remete a definitivamente nada diferente disto. Em suma, é fundamento relevante na questão de reconhecimento de que as redes não possuem apenas fins econômicos e individuais, remetendo ao dito momentos atrás sobre a importância do feedback nas relações, inclusive, de consumo nas interações entre usuários, buscadores e buscados. Traz a ideia de fins sociais, com acesso à cultura, ao desenvolvimento tecnológico, enfim.
Os incisos analisados de forma mais intensa que outros justifica-se apenas por haver fundamentação na própria constituição federal, trazendo valores recorrentes e notórios.
1.2 DIREITOS E GARANTIAS DOS USUÁRIOS
O direito de acesso à internet como garantia e exercício da cidadania não se configura apenas a texto de lei interpretativo e exemplificativo, mas taxativo, conforme artigo 7º, da lei 12.965/14.[16]
A partir do momento em que o consumidor adentra ao ambiente aberto com que se caracteriza as redes de internet, como efeito, as redes sociais são as primeiras opções. Nesse momento, a vida privada tem exposição, na medida e vontade subjetiva do indivíduo, além de comunicação com outros usuários e fluxo de armazenamento de arquivos, senhas e afins.
De início, a constituição federal se faz presente de forma objetiva e concreta, ao fundamentar o inciso I do artigo objeto de análise, destacando o direito a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização por danos materiais e morais decorrentes de possível violação[17].
Adiante, observa-se a inserção do Estado nas relações privadas com o destaque do inciso II à inviolabilidade e sigilo do fluxo das comunicações pela internet, salvo interceptação telefônica por ordem judicial. Nesse caso, tal regra equipara as comunicações telefônicas, objeto das interceptações, à comunicações online via internet, para fins de investigação conforme lei 9.296/96.[18] Ou seja, o usuário tem direito a inviolabilidade das suas relações via internet, salvo necessidade do Estado à esclarecimentos via investigação e procedimento criminal.
O inciso três revela situação semelhante ao anterior exposto, mas com ressalvas ao modo com que se garante o andamento do controle estatal frente a descumprimento da lei.
O dispositivo, dispõe da inviolabilidade e sigilo de suas comunicações (usuário) privadas armazenadas, salvo por ordem judicial.[19] Neste sentido, temos situação diversa ao inciso II, pelo fato de não dizer respeito a interceptação de comunicação em vias de concretização em curso, mas esta já finalizada e armazenada em terminal, como conversas registradas no aplicativo WhatsApp, por exemplo.
Há questão processual em discussão neste tópico/inciso, a situação em que a legislação “só exige que haja uma autorização judicial, não sendo necessário que se atenda ao disposto na Lei 9.296/1996”[20].
O artigo sétimo, inciso IV[21], dispõe acerca da suspensão da conexão à internet, sendo direito do usuário que ocorra somente por débito decorrente de sua utilização. Em relação a outras legislações esparsas, o Marco Civil caracterizou-se como flexível, por exemplo, quanto as possibilidades de interrupção de serviços em relação a outros regulamentos, como a Lei 8.987/1995[22], que autoriza a interrupção dos serviços por motivos além de mero inadimplemento do equivalente, mas razões de cunho técnico ou de segurança das instalações, com fulcro no artigo 6º, §3º, desta lei em análise. Em caso específico de ordem técnica, busca-se aplicar a lei 8.987/95 em analogia, ao invés do Marco Civil.[23]
Ao contratar um serviço de provedor de conexão, espera-se que se obtenha o máximo contratado, diga-se de passagem, concorrente ao estabelecido. Nesta hipótese, o usuário não está desamparado quando do inciso V, que revela, tem direito o usuário pela “manutenção da qualidade contratada da conexão à internet”[24].
Rege o princípio da obrigatoriedade dos contratos pela intangibilidade destes, representando uma força vinculante das convenções. Veja, nesse momento estimula o chamado subprincípio da força vinculante dos contratos, como uma subdivisão, em suma. Aqui, se estabelece a “autonomia da vontade”, onde “ninguém é obrigado a contratar. A ordem jurídica concede a cada um a liberdade de contratar, porém é necessário que se apresente ao contratante, todo os elementos base de contrato, de forma clara e precisa. FONTE DA IDEIA.
Os dizeres retratam, em abstrato, o inciso VI[25], que discorre, ipsis litteris, tem direito o usuário pelas “informações claras e completas constantes dos contratos de prestação de serviço, com detalhamento sobre os regimes de proteção aos registros” diversos, “bem como sobre práticas de gerenciamento da rede que possam afetar sua qualidade” (sem destaque no original). Observe a clareza com quem manifesta a ideia de esclarecimento, o inciso objeto, em relação ao contrato de serviço entre usuário e contratado, exatamente a luz do princípio regente do direito dos contratos, acima exposto.
Ao detalhar o inciso VII[26], deve-se manter cautela quanto a profundidade da análise, isto porque, em relação a este ato trata-se de conceituar e ramificar o Marco Civil, sem estabelecer critério de responsabilidade aos agentes, fato que será analisado em espaço específico.
O dispositivo traz a ideia de sigilo dos dados pessoas do usuário em favor de terceiro, salvo prévio consentimento, expresso e informado. Esta questão impacta diretamente os provedores de aplicações, como sites de busca, que se valem de informações provenientes das navegações do usuário, e a partir desta colheita de dados, programa anúncios durante a navegação deste, independente do espaço virtual que se encontre. Tal ato fere o princípio da neutralidade, arduamente esclarecido linhas atrás.
Em regra, sendo expressamente proibido o armazenamento de informações dos usuários, o inciso VIII[27] retrata as situações legais com que é permitida a “coleta, uso, armazenamento, tratamento e proteção de seus dados pessoais”, desde que informados. As situações legais estão descritas nas alíneas deste dispositivo, onde os dados poderão ser utilizados para finalidades que justifiquem sua coleta, finalidades que não sejam vedadas pela legislação vigente específica, e que inclusive estejam especificadas no contrato de prestação de serviço devidamente assinado pelas partes. Este consentimento deve estar destacado das demais cláusulas no contrato[28].
Certo de que as relações contratuais não são eternas, em sua maioria, pode requer o usuário a “exclusão definitiva dos dados pessoais que tiver fornecido a determinada aplicação de internet [...]” conforme expresso no inciso X da mesma norma.
Por fim, ante a desnecessária descrição detalhada dos incisos finais, serão explicitados de forma objetiva. Quanto a qualquer contrato devidamente assinado pelo usuário, tem este o direito ao conhecimento claro das políticas de uso dos serviços (inciso XI). Ainda que tenha dificuldades quanta a compreensão ou obtenção das especificidades, tem o direito a acessibilidade (inciso XII). Assim, toda e qualquer relação que constitua ou venha a constituir junto aos provedores de aplicação e conexão, devem ser regadas pelas normas consumeristas (inciso XIII)[29].
1.3 NEUTRALIDADE DA REDE
Durante todos os esclarecimentos produzidos durante a análise da lei objeto deste estudo, alguns princípios e alicerces aos Marco Civil foram expostos, e neste ato, a neutralidade da rede, já conceituada em alguns momentos, terá enfoque completo, ainda que reduzido em comparação a outras temáticas.
Erigida como princípio basilar (art. 3º, IV), a neutralidade da rede sustenta também o artigo 9º desta mesma lei[30] com duas disposições acerca.
A primeira disposição, em suma, retrata o objeto desta análise em relação a conexão à internet e impõe que não haja discriminação aos atos dos usuários, como por exemplo cobrar de forma diferenciada cliente que acessa mais vídeos em certo site, que outros utilizadores. Outro exemplo, sugere o impedimento à discriminação pelo fato de alguém usar terminal (dispositivo eletrônico) diferente de outro usuário, configurando cobrança desigual. Exemplificando, não pode haver diferenciação de cobranças entre dois pacotes iguais, sendo que um é utilizado por celular e outro por computador portátil.
Na segunda disposição, retrata a vedação ao bloqueio, monitoramento, filtragem e análise do conteúdo dos pacotes de dados, questão devidamente analisada anteriormente.[31]
1.4 DEFESA DE DADOS, REGISTROS E COMUNICAÇÕES
O usuário está, constantemente, a mercê das forças telemáticas pelo simples fato de que, mesmo com a criação de cartas magna da internet, nada superaria a força incompreensível do engajamento das redes mundiais e ao mesmo tempo a insegurança com quem está exposto o cidadão, do momento em que ingressa no âmbito virtual até sua possível saída, na(s) redes(s) que participa, ignorando dados e informações antes necessárias ao ingresso, hoje deixadas para trás sem o cuidado necessário contra ameaças reais.
Atualmente, por força de lei, é de responsabilidade dos provedores pela guarda e disponibilização de dados e registros de acesso a aplicações de internet pelo usuário, atendendo a preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem dos indivíduos envolvidos.[32] Assim, o responsável pela guarda, já identificado, somente disponibilizará registros de usuários, que atentam a dados pessoas e informações passíveis de identificação, mediante ordem judicial.
Ao analisar o artigo 10, da lei 12.965[33], observa-se que o dispositivo faz alusão apenas aos registros de conexão, que significam o registro dos momentos em que o usuário navegou pela internet, e de registro de acesso a aplicações de internet, por exemplo, sites que o indivíduo acessou nestes momentos[34], além de registro de dados pessoas, simplesmente dados preenchidos em formulários de sites, e por fim o conteúdo de comunicações privadas, outrora assegurados de qualquer disponibilização preservando direito individual, exceto nos casos em que são necessários à justiça.
De todos os aspectos narrados, não há menção a interceptação, ato característico perante conversas em curso que fundamento conduta punível, tendo como alvo conversas via internet. Isto porque segue a mesma regra das conversas telefônicas conforme visto na análise do artigo 7º, dos direitos do usuário.[35]
Ainda que haja segurança quanto ao direito individual de privacidade, vale mencionar que o disposto no caput do artigo objeto de análise não impede que autoridades administrativas requeiram acesso aos dados, desde que competentes para tanto (§3º).
Há quem recorde de fato envolvendo agência investigadora de ilícito dos Estados Unidos da América com autoridades executivas e agregados do República Federativa do Brasil. Na época, o sujeito primeiro intercepta comunicações feitas pelo segundo a fim de caracterizar atos ilícitos de suborno e propina envolvendo gigante estatal. Em resposta clara do atual governo da época aos atos cometidos pelo governo norte-americano, conseguiu-se aprovar o disposto no artigo 11 da Lei[36], que orienta:
Art. 11. Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros.
Ainda, o parágrafo primeiro adiciona:
§1º. O disposto no caput aplica-se aos dados coletados em território nacional e ao conteúdo das comunicações, desde que pelo menos um dos terminais esteja localizado no Brasil.[37]
Por fim, o parágrafo segundo adverte:
§2º. O disposto no caput aplica-se mesmo que as atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior, desde que oferte serviço ao público brasileiro ou pelo menos uma integrante do mesmo grupo econômico possua estabelecimento no Brasil[38]
Empresas como Facebook, apesar de tratar-se de pessoa jurídica com sede no exterior, mantém atividade em território nacional, não estão autorizadas, de forma a obedecer aos escritos do Marco Civil, de podem disponibilizar ao governo norte-americano os dados e conteúdo de comunicação coletados de ocorridos no território brasileiro, sob pena de violação à legislação vigente nacional. Caso ocorra descumprimento, poderão sofrer graves sanções, tais como a suspensão, ainda que temporária, das atividades desempenhadas, ou até mesmo a proibição de disponibilizar destes serviços em território nacional.
A título de fundamento, o artigo 11, parágrafo 3º traz:
§3º. Os provedores de conexão e de aplicações de internet deverão prestar, na forma da regulamentação, informações que permitam a verificação quanto ao cumprimento da legislação brasileira referente à coleta, à guarda, ao armazenamento ou ao tratamento de dados, bem como quanto ao respeito à privacidade e ao sigilo de comunicações.[39]
Como forma de controle, dispõe o artigo acima pela obrigação dos provedores, a possibilitar a verificação dos atos de coleta, guarda e armazenamento de dados, para que se possa apurar o cumprimento da legislação e respeito a privacidade e sigilo das comunicações.
O artigo 12, da referida lei em analise, rege as sanções aplicadas aos atos anterior mencionados, sem prejuízo de sanções cíveis, criminais ou administrativas.
Segue o artigo em questão, o seguinte:
I - advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas;
II - multa de até 10% (dez por cento) do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, considerados a condição econômica do infrator e o princípio da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção;
III - suspensão temporária das atividades que envolvam os atos previstos no art. 11; ou
IV - proibição de exercício das atividades que envolvam os atos previstos no art. 11[40]
Como mencionado, as empresas estrangeiras em operação no Brasil com sede no exterior, respondem pelos danos causados aos usuários, do momento em que infringem a regra de cautela aos dados e conteúdos privados.[41] Ainda, respondem solidariamente a filial, escritório e estabelecimento que se encontra situado em território nacional, pelo pagamento de multa mencionada no artigo objeto de estudo.
A guarda de registro de conexão encontra fundamento, ainda, no artigo 13 da lei. Como dito diversas vezes, a empresas provedores tem informações sigilosas a respeito de registro dos usuários, que apesar de protegidas, podem vir a ser requisitadas por ordem judicial.
Do artigo, exprime-se que é de responsabilidade do administrador pelo mantimento dos registros, sob sigilo, com a devida segurança ante terceiros, no prazo de um ano. Em analise, consta o artigo em respeito apenas aos registros (de conexão), sem mencionar os registros de acesso a aplicações (ambos já conceituadas em diversos momentos deste estudo). Isto porque, os provedores de conexão, onerosa ou gratuita, não podem armazenar tais registros de aplicação no sistema (art. 14).
Dispõe os parágrafos 3º do respectivo:
§3º Na hipótese do § 2o, a autoridade requerente terá o prazo de 60 (sessenta) dias, contados a partir do requerimento, para ingressar com o pedido de autorização judicial de acesso aos registros previstos no caput.[42]
Ou seja, as autoridades ou Ministério Público podem ingressar com requerimento ao provedor, a fim de buscar manutenção de guarda dos registros por 60 dias, com intuito de, ao final deste prazo pedir autorização judicial para que, assim, tenha acesso aos registros. Importante frisar que, o provedor responsável à guarda dos respectivos deverá manter sigilo em relação ao requerimento da autoridade ou Ministério Público, podendo ocorrer a perda de eficácia se o pedido de autorização judicial seja indeferido ou não protocolado no prazo de 60 dias.[43]
Ademais, salienta-se que em qualquer hipótese, a disponibilização ao requerente dos registros de que trata este artigo deverá ser precedida, como já afirmado, de autorização judicial (§5º).
Ao final, a respeito da aplicação de sanções pelo descumprimento do exposto nos parágrafos anteriores, discorre o parágrafo sexto:
§6º Na aplicação de sanções pelo descumprimento ao disposto neste artigo, serão considerados a natureza e a gravidade da infração, os danos dela resultantes, eventual vantagem auferida pelo infrator, as circunstâncias agravantes, os antecedentes do infrator e a reincidência.[44]
Finalizada as considerações acerca dos provedores de conexão, a guarda de registros de acesso confere, também, aos provedores de aplicação de internet, como Facebook. Porém, devem-se constituir, os provedores, na forma de pessoa jurídica, com atividade econômica organizada e profissionalmente, com fins lucrativos.
A modificação latente em comparação aos provedores de conexão se encontra no prazo para manter os registros sob sigilo, e ambiente assegurado ante terceiros, pelo prazo, antes de um ano, agora em relação aos provedores de aplicação, prazo de seis meses, com fulcro no artigo 15 da lei objeto de pesquisa.[45]
Há especificidade quanto ao registro sigiloso, agora em relação aos ambientes virtuais visitados pelo usuário (sites/aplicações), não somente hora ou local, como consta em requisito dos provedores de conexão.
As autoridades ou Ministério Público poderão, aqui também, ingressar com requerimento ao provedor, a fim de buscar manutenção de guarda dos registros, inclusive por prazo superior a seis meses, observado a disposição do artigo 13, parágrafos terceiro e quarto. Em qualquer situação, a disponibilidade dos registros ao requerente preceder-se-á de autorização judicial.[46]
Sobre aplicação de sanções, o descumprimento ao dispositivo assinalado, serão considerados; a) natureza e gravidade da infração, b) os danos resultantes do ato, c) enriquecimento ilícito, d) antecedentes e reincidência do infrator, além de e) circunstâncias agravantes.[47]
Importante, ao finalizar as ponderações acerca de aplicações de internet, destacar o artigo 16 desta lei (12.965/14), a respeito das vedações à guarda. Vejamos:
I - dos registros de acesso a outras aplicações de internet sem que o titular dos dados tenha consentido previamente, respeitado o disposto no art. 7o; ou
II - de dados pessoais que sejam excessivos em relação à finalidade para a qual foi dado consentimento pelo seu titular.[48]
A requisição judicial de registros, pedido normalmente complementar ao pedido de indisponibilidade de conteúdo ofensivo a honra e imagem de um indivíduo, prima por dois procedimentos posteriores, mas simples. De início, a remoção expressa do conteúdo disponível na rede, e ao fim, busca identificar o terceiro responsável pela disponibilização do conteúdo. Identificado, requererá ao magistrado que ordene ao responsável pela guarda dos registros a informar o endereço de protocolo de internet (IP), entre outros dados necessários.
Dispõe o artigo 22, da lei objeto:
Art. 22. A parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juiz que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet.[49]
Tal dispositivo obtém como propósito a diminuição dos frequentes pedidos de análise e obtenção de dados dos usuários investigados, sem na maioria das vezes, fundamento adequado para que haja divulgação, desprezando o direito à privacidade que, ainda que praticada conduta, tem o indivíduo (até que se apresente ordem judicial de magistrado competente para tanto).
Os pedidos de interceptação das comunicações através da rede sujeitam-se à Lei Federal nº 9.296/1996 que impõe o fornecimento das informações somente para casos de investigação em processos de natureza penal, desde que haja indícios de autoria ou participação do usuário na infração penal.[50]
Ao cabo que identificado o possível infrator, dar-se-á procedimento as medidas cabíveis, podendo o magistrado presidente,
A fim de evitar prejuízos ao processo e às partes, o juiz, se entender necessário, poderá determinar que o processo trâmite em segredo de justiça, limitando o acesso das pessoas às informações ali existentes.[51]
1.5 ATUAÇÃO DO PODER PÚBLICO
O governo operante do Estado, responsável administrativo, necessita estar aberto a sociedade, organizada ou não, a fim de contribuir visando o desenvolvimento da internet no país, atendendo a toda coletividade, desenhando mais uma vez, porém de forma concreta, o princípio da universalidade, constituindo o caráter universal de acesso à internet, sem discriminação a qualquer setor da sociedade.
O CGI (Comitê Gestor da Internet), fundamentado no Decreto nº 4.829/03, orienta o desenvolvimento especificado acima, além da administração das diversas especificidades características das redes de internet, como o endereço de protocolo de internet (IP), e responsável pelos regulamentos de atividades relativas a atividade como usuário de internet.[52]
Em fundamento, o artigo 24 da lei analisada neste estudo dispõe diretrizes para a atuação do poder público no desenvolvimento da internet. Vejamos alguns incisos, a título exemplificativo, “V - adoção preferencial de tecnologias, padrões e formatos abertos e livres;”, opta pela liberdade de modificação, distribuição, pelos usuários às tecnologias, subjetivando a contribuição à melhoria e desenvolvimento da internet, “VI - publicidade e disseminação de dados e informações públicos, de forma aberta e estruturada;”, já este inciso, revela o cumprimento ao princípio da transparência e acesso a informação, onde qualquer dado de natureza pública seja disponibilizado à sociedade, “VIII - desenvolvimento de ações e programas de capacitação para uso da internet;”, revela a necessidade de mão de obra especializada contribuinte ao desenvolvimento das redes no território nacional, através de programas de capacitação ao âmbito digital, e “IX - promoção da cultura e da cidadania;”, onde a internet deve ser utilizada, com intuito máximo, a promoção da cultura e cidadania.
A legislação trata, em dispositivo específico, a respeito das aplicações de internet do próprio Estado, pelos entes em destaque. Vide artigo 25:
I - compatibilidade dos serviços de governo eletrônico com diversos terminais, sistemas operacionais e aplicativos para seu acesso;
II - acessibilidade a todos os interessados, independentemente de suas capacidades físico-motoras, perceptivas, sensoriais, intelectuais, mentais, culturais e sociais, resguardados os aspectos de sigilo e restrições administrativas e legais;
III - compatibilidade tanto com a leitura humana quanto com o tratamento automatizado das informações;
IV - facilidade de uso dos serviços de governo eletrônico; e
V - fortalecimento da participação social nas políticas públicas.[53]
Na sociedade moderna, o uso da internet é praticamente fundamental, necessária inclusive nas escolas, onde seja incluída na grade pedagógica, o uso consciente da Internet, sempre visando ao desenvolvimento da sociedade.
É o que dispõe o artigo 26, quanto ao dever do Estado relacionado a educação e uso da internet:
O cumprimento do dever constitucional do Estado na prestação da educação, em todos os níveis de ensino, inclui a capacitação, integrada a outras práticas educacionais, para o uso seguro, consciente e responsável da internet.[54]
Tal regra diz respeito a inclusão digital adequada, onde requer-se acesso completo a terminais, como aumento de computadores nas escolas e redução de tributos quanto a estes, acesso a conexão, capacitação para utilização e práticas que assegurem uso consciente e responsável.
O artigo 27, especialmente o inciso III, reitera que o Estado deve fomentar o desenvolvimento de políticas públicas, em parceria com provedores, para a inclusão digital dos brasileiros, respeitando o princípio da universalidade ao destacar as minorias sociais, que por si só não tem condições de ter acesso ao computador e à Internet, como público alvo desta investida social, objetivando o avanço das comunidades, dando-lhes autonomia para o desenvolvimento do trabalho e da livre iniciativa.[55]
Ao término das ponderações, deve-se examinar os objetivos relacionados à inclusão digital adequada, sinalizada precedentemente, fundamentados no artigo 28; “O Estado deve, periodicamente, formular e fomentar estudos, bem como fixar metas, estratégias, planos e cronogramas, referentes ao uso e desenvolvimento da internet no País.”[56]
É de extrema importância que, periodicamente, esteja o Estado atualizado quanto às estratégias para que se atinja as metas de inclusão, proteção e desenvolvimento social.