Hipóteses de cabimento do recurso extraordinário

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Trata-se de uma tese relacionada ao cabimento do Recurso Extraordinário

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. TEORIA GERAL DOS RECURSOS. 1.1 Conceito de Recurso. 1.2 Juízo de Admissibilidade e de Mérito dos Recursos. 1.3 Princípios Fundamentais do Recurso. 2. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 2.1 Origem e Evolução Histórica do Recurso Extraordinário. 2.2 Função Constitucional do Recurso. 2.3 Efeito da Interposição do Recurso Extraordinário. 2.4 Procedimento do Recurso Extraordinário. 3. HIPÓTESES DE CABIMENTO. 3.1 Hipóteses de Cabimento do Recurso Extraordinario. 3.1.1 Provimento que Contraria norma Constitucional. 3.1.2 Provimento que Declara Inconstitucionalidade de Tratado ou de Lei Federal. 3.1.3 Provimento que julga válida lei ou ato de governo local contestado perante norma constitucional. 3.1.4 Provimento que declara válida lei local contestada perante lei federal. 3.2 Repercussão geral da questão constitucional. 3.3 Interposição na Turma Recursal. CONSIDERAÇÕES FINAIS. BIBLIOGRAFIA.


INTRODUÇÃO

A sociedade, em sua evolução contínua e em cada surgimento de um novo conflito seu, vem sinalizando que atualmente não clama apenas por justiça, mas também por uma prestação jurisdicional ágil, eficiente, que seja hábil a oferecer uma resposta diligente aos males levados ao Judiciário para solução.

Verificou-se ao longo de alguns anos que o sistema processual vigorante no ordenamento jurídico brasileiro passou a representar um empecilho ao desenvolvimento hígido do Judiciário e do cumprimento de sua função social.

Assim, o legislador passou a imprimir mudanças nos procedimentos, criou novos filtros, mecanismos processuais que conferem praticidade e celeridade aos julgamentos.

Inicialmente essas mudanças ocorreram de forma lenta, mas nos dias atuais são aplicadas com vitalidade. A necessidade de mudança é tamanha que já se elabora um novo Código de Processo Civil.

O objetivo primordial em todo esse movimento é propiciar maior acesso à justiça, por meio de uma razoável duração do processo. Foram inauguradas as súmulas vinculantes, a repercussão geral, a súmula impeditiva de recursos, a negativa de seguimento pelo relator, isso sem mencionar as modificações estruturais do Judiciário.

Destaca-se como um desses instrumentos de controle, em prol da celeridade, a alteração do CPC quanto ao processamento do recurso especial repetitivo. Se detectou a ocorrência em massa de idênticas questões de direito, constantemente levadas ao STJ para apreciação, sendo que o referido Tribunal já possuía entendimento pacificado sobre tal questão, mas julgando repetitivamente essas demandas.

Então se implementou a idéia de julgamento unificado de todos esses recursos com semelhantes questões de direito. Todas as regras processuais dos recursos especiais permanecem inalteradas, exceto quando há detecção de demandas repetitivas, com semelhantes questões de direito, não mais se remetendo todas ao STJ, mas tão só o recurso especial eleito como dirigente.

Os recursos especiais repetitivos representam uma oportunidade de o Judiciário de fato aproximar-se da meta almejada. Entretanto, algum reflexo essas mudanças no processamento dos recursos especiais gerarão para a sociedade.

Um deles, e o mais temido, é a falta de oxigenação da jurisprudência brasileira. As consequências podem ser sérias. Pondera-se sobre até que ponto essa forma desenfreada em busca do acesso à justiça será benéfica, se se percorre caminhos corretos, seguros, para tanto. Só não há dúvidas quanto à necessidade de mudanças.

O presente trabalho objetiva abordar sobre o Recurso Extraordinário, bem como apontar quais os seus requisitos e hipóteses de cabimento. Para tanto, desenvolve uma análise detalhada iniciando a abordagem a partir da origem dos recursos extraordinários, seus princípios norteadores, a sistemática de tais recursos no ordenamento jurídico pátrio, partindo-se, então, para um enfoque específico sobre o recurso extraordinário, seguido da conclusão deste trabalho.


1. TEORIA GERAL DOS RECURSOS

1.1 CONCEITO DE RECURSO

Antigamente no Direito Romano, as decisões eram proferidas por particulares nomeados por meio de assembleia, assim, as decisões prolatadas por estes eram irrecorríveis.

Com o tempo foi criado a figura do magistrado, bem como prerrogativas e garantias para as partes que compunham a lide, sendo que uma destas garantia fora amadurecida e denominada atualmente de devido processo legal.

Destarte, o sistema recursal surgiu na República Romana, como garantia de defesa utilizada pelas partes em face de decisão do magistrado.

Atualmente recurso pode ser interprestado como sendo um remédio voluntário. Neste sentido são os ensinamentos de José Carlos Barbosa Moreira:

“remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisão judicial que se impugna”. [1]

No mesmo sentido é o ensinamento do Professor e Doutrinador Fred Didier:

“recurso é remédio voluntário, o que exclui do âmbito de incidência do seu conceito a remessa necessária, que é regulada em dispositivo que se encontra fora do título do CPC que cuida dos recursos”. [2]

Araken de Assis assevera ainda que: “a impugnação às decisões judiciais, no direito brasileiro, ultrapassa o quadro dos recursos e das ações autônomas”.[3]

Isso é, incumbem às partes a utilização de diversos meios de impugnação à decisão judicial, valendo-se muitas vezes de sucedâneos recursais.

Para Misael Montenegro Filho:

“o recurso se qualifica como o instrumento voluntariamente utilizado pelo interessado para combater decisão manifestada pelo magistrado no curso ou no desfecho do processo, acompanhada de gravame, sem o qual o uso da espécie não se justifica, por ausência de interesse, como ocorre com os despachos, que são espécie de pronunciamentos judiciais, sem comportar ataque por meio de qualquer recurso previsto na Lei de Ritos”. [4]

Sendo assim, podemos extrair a lição de que recurso é um meio de impugnação voluntário, previsto em lei, através do qual a parte ou quem esteja legitimado a intervir na causa provoca o reexame das decisões judiciais para no mesmo processo, reformar, invalidar, esclarecer ou integrar uma decisão judicial pelo próprio magistrado que as proferiu ou por algum órgão de jurisdição superior.

1.2 JUIZO DE ADMISSIBILIDADE E DE MÉRITO DOS RECURSOS

Primeiramente, importante ressaltar sobre a questão da admissibilidade dos recursos.

A natureza jurídica dos recursos se qualificam como matéria de ordem pública, podendo ser reconhecida pelo magistrado em qualquer tempo e grau de jurisdição, independente da provocação do interessado.

Em geral, o recorrente interpõe recurso perante o órgão que proferiu a decisão atacada. Contudo há exceções, como é o caso de interposição de recurso perante órgãos diversos. Como exemplo podemos citar agravo de instrumento interposto em face de decisão proferida em primeiro grau, que deverá ser interposto diretamente no tribunal (conforme preceitua o artigo 524 CPC).

O mesmo deverá ocorrer com o Recurso Extraordinário e Especial, vez que deverão ser interpostos ao Presidente da Egrégia Corte.

São requisitos do juízo de admissibilidade: a tempestividade, preparo, legitimidade, interesse e regularidade formal.

Que tange a tempestividade, vale ressaltar que o recurso deverá ser interposto no prazo estabelecido por lei, caso contrário será tido como intempestivo.

Fred Didier preleciona que:

“O recurso deve ser interposto dentro do prazo fixado em lei. O termo inicial do prazo recursal é o da intimação da decisão (art. 506 do CPP). O prazo para a interposição do recurso é peremptório, insuscetível, por isso, de dilação convencional”. [5]

O art. 507 do Código de Processo Civil, dispõe:

“Art. 507. Se, durante o prazo para a interposição do recurso, sobrevier o falecimento da parte ou de seu advogado, ou ocorrer motivo de força maior, que suspenda o curso do processo, será tal prazo restituído em proveito da parte, do herdeiro ou do sucessor, contra quem começará a correr novamente depois da intimação”. [6]

Neste sentido são as jurisprudências pátrias, verbis:

“Processual civil. Art. 507 do cpc. Pedido de devolução de prazo. Falecimento do advogado. 1. Hipótese em que a recorrente pleiteia seja devolvido o prazo recursal para oposição destes embargos de declaração, tendo em vista o falecimento do patrono da causa. 2. O art. 507 do CPC disciplina o motivo de força maior a justificar a interrupção do prazo recursal. Ocorre que o falecimento do patrono da causa se deu em 16.11.2009, ou seja, não ocorreu durante o prazo para interposição do presente recurso, razão pela qual não se lhe aplica a restituição temporal. 3. O prazo para interposição dos embargos é peremptório, e, na ausência de causa interruptiva, o recurso apresentado após o término do prazo regular deve ser considerado intempestivo. Na hipótese, o agravo regimental foi publicado em 19.8.2010, e os embargos de declaração em 8.10.2010. Embargos de declaração não conhecidos”. [7]

(STJ - EDcl no AgRg no REsp: 1123022 SP 2009/0124234-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 23/11/2010, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/12/2010)

Sendo assim, ocorrerá interrupção do prazo temporal todas as vezes que houver qualquer motivo elencado no dispositivo retro, haverá suspensão do curso do processo, e consequentemente, do prazo para interposição de recurso.

Por outro lado, será considerado intempestivo o recurso apresentado fora do prazo, isto é, após o decorrer do prazo. Neste sentido são as jurisprudências pátrias:

“Agravo regimental. Intempestividade do recurso extraordinário. O recurso extraordinário é intempestivo, porquanto apresentado após o decurso do prazo legal, não preenchendo, pois, requisito recursal indispensável à sua admissibilidade. Agravo regimental a que se nega provimento”. [8]

(STF - ARE: 719438 RJ , Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA (Presidente), Data de Julgamento: 29/05/2013, Tribunal Pleno, Data de Publicação: Acórdão Eletrônico DJe-115 Divulg 17-06-2013 PUBLIC 18-06-2013)

“Agravo regimental no agravo de instrumento. Recurso extraordinário intempestivo. 1. É intempestivo o recurso extraordinário que não observa o prazo estabelecido na legislação de regência. 2. O ônus de fiscalizar a correta formação do instrumento é exclusivo do agravante. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento”. [9]

(STF - AI: 785318 RJ , Relator: Min. EROS GRAU, Data de Julgamento: 20/04/2010, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-086 DIVULG 13-05-2010 PUBLIC 14-05-2010 EMENT VOL-02401-13 PP-02829)

Que tange ao prazo para recorrer, importante salientar que será computado em dobro à Fazenda Pública e Ministério Público, bem como quando a demanda envolver mais de um autor ou réu com diferentes procuradores e litigantes representados por advogados dativos.

O segundo requisito do juízo de admissibilidade é o preparo. Entende-se por preparo o pagamento das custas processuais, salvo se a parte for beneficiada pela justiça gratuita.

Para Didier:

“O preparo consiste no adiantamento das despesas relativas ao processamento do recurso. À sanção pela falta de preparo oportuno dá-se o nome de deserção”. [10]

Os efeitos da deserção é tornar o recurso inadmissível. Obrigatoriamente o preparo deverá ser comprovado no momento da interposição do recurso, conforme o artigo 511 do Código de Processo Civil dispõe: “No ato de interposição do recurso, o recorrente comprovará, quando exigido pela legislação pertinente, o respectivo preparo, inclusive porte de remessa e de retorno, sob pena de deserção”. [11]

O valor do preparo é o da soma, quando for o caso, das taxas judiciária e das despesas postais.

São legalmente a efetuar o preparo: Ministério Público, União, Estados, Municípios e os beneficiários da justiça gratuita (mediante declaração de pobreza acostado à peça de ingresso ou contestação).

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Há recursos que independem de preparo, isto é, não faz necessário a comprovação de pagamento de custas e emolumentos, vez que os recursos dispensam, sendo eles: agravo retido, de instrumento, embargos de declaração e infringentes.

Quanto ao terceiro requisito de admissibilidade, legitimidade, vale destacar que são legitimados para recorrer o terceiro prejudicado, o Ministério Público (atuando como parte ou custus legis) e pela parte (desde que tenha sofrido sucumbência).[12]

Quanto ao requisito interesse, imperiosos informar que o interesse será devidamente demonstrado pela parte prejudicada, aquela que sofreu sucumbência.

Neste sentido Misael Montenegro assevera:

“O recurso só pode ser interposto por quem sofreu prejuízo com a prolação da decisão que se pretende atacar, ou seja, quem tenha perdido a ação ou deixado de ganhar tudo o que pleiteou, no caso específico do recurso de apelação. O requisito não se aplica ao Ministério Público, em decorrência do princípio da independência funcional”. [13]

Por fim, quanto a regularidade formal, importante destacar que os recursos deverão ser interpostos por meio de petição escrita, ou oral no caso de agravo retido, contendo as razões do inconformismo e do pedido de reforma ou de invalidação.

No tocante ao juízo de mérito, considera-se como sendo a pretensão recursal, podendo ser de invalidação, reforma, integração ou de esclarecimento.

Diferencia-se juízo de admissibilidade de juízo de mérito da seguinte forma: “enquanto o mérito do recurso é, em regra, sujeito a uma única apreciação (órgão ad quem), sua admissibilidade submete-se, em geral, a um duplo controle (juízos a quo e ad quem)”.[14]

É objeto do juízo de mérito: relação entre o mérito da causa e o mérito do recurso, causa de pedir do recurso e pedido do recurso.

Que tange a relação entre o mérito da causa e o mérito do recurso, imperioso destacar que o mérito é a pretensão recursal, já o mérito da causa é a decisão proferida que originou o recurso. Ambas devem estar em consonância.

A causa de pedir é a exposição dos fundamentos de fato e de direito. Fred Didier orienta que: “a causa de pedir recursal compõe-se do fato jurídico apto a autorizar a reforma, a invalidação, a integração e o esclarecimento da decisão recorrida”.[15]

Por fim, o pedido do recurso nada mais é que a pretensão do recorrente. O pedido delimita a extensão do recurso.

1.3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO RECURSO

São considerados princípios fundamentais do recurso o princípio da reformatio in pejus, duplo grau na unidade do processo, da taxatividade, da singularidade, da fungibilidade, da dialeticidade, da voluntariedade, da irrecorribilidade das decisões interlocutórias e da complementariedade.

O princípio da reformatio in pejus decorre do princípio da adstrição ou correlação e visa preserva a segurança jurídica das decisões judiciais através da vedação de reformas prejudiciais ao autor do recurso.

Deste modo, o tribunal não pode modificar a situação processual do recorrente prejudicando para pior a condição do recorrente.

O recurso é mecanismo de ajuda da parte, que em razão de sua sucumbência total ou parcial, suplica ao órgão ad quem a reversão favorável da decisão, de modo a lhe proporcionar uma situação mais benéfica. Esta é a utilidade do sistema recursal.[16]

Assim, se Ordenamento Jurídico criou um mecanismo de revisão judicial das decisões para coibir o exercício arbitrário da jurisdição e para dar à parte prejudicada a possibilidade de melhorar a sua condição no processo, não poderá a mesma sofrer prejuízos ou gravames. O máximo que pode ocorrer é ela permanecer no estado em que se encontrava antes de interpor o recurso.

O juiz ou tribunal revisor estará adstrito ao pedido do recorrente, podendo acatá-lo, melhorando sua situação, ou julgá-lo improcedente, ocasião em que o pronunciamento judicial de primeiro grau será mantido.[17]

O que é defeso é o julgamento mais gravoso, a exemplo de um caso em que o autor ingressa com uma ação de indenização por danos morais e tem seu pedido julgado parcialmente procedente, fixado o quantum da indenização na metade do valor que fora pedido na inicial.

Irresignado, o autor recorre ao Tribunal, que diminui o valor para um terço do que foi pedido na inicial. Neste caso, como o acórdão julgou extra petita (fora do que foi pedido), nula será sua decisão.

O princípio da proibição da reformatio in pejus, todavia, não tem caráter absoluto, comportando algumas exceções previstas em lei, que viabilizam a reforma prejudicial.[18]

Uma ilustração clássica refere às matérias de ordem pública, que, por sua própria natureza de norma cogente, possibilita o conhecimento de ofício pelo juiz ou tribunal, mesmo nos casos em que houver nítido prejuízo à parte recorrente.

Um exemplo pode ser extraído de um caso que envolva incompetência absoluta do juízo, como o que ocorre em uma reclamação trabalhista, interposta perante a Justiça do Trabalho, em que se pleiteia direitos rescisórios de servidor público e o juiz trabalhista defere parcialmente o pedido. Inconformado, o autor recorre da decisão.

Em sede de recurso, o Tribunal Regional do Trabalho reconhece sua incompetência em face do caráter jurídico administrativo do vínculo trabalhista, anulando todos os atos decisórios (inclusive a decisão que concedeu as verbas rescisórias) e remetendo os autos para a Justiça Comum, para que processe e julgue o caso.

Por óbvio que na hipótese citada houve nítida piora na situação processual do recorrente, haja vista que fora conhecida matéria sequer alegada na sua impugnação. Isso ocorre porque as matérias de ordem pública não se submetem ao sistema da preclusão processual, de maneira que o fato de não terem sido alegadas, em primeira ou em segunda instância, não retira da autoridade judicial a prerrogativa de sobre elas se pronunciar.

Outro ponto relevante da matéria que se deve considerar é a possibilidade do reexame necessário das decisões proferidas contra a Fazenda Pública, fenômeno este, que, embora tenha como objetivo primordial a reanálise dos pronunciamentos judiciais desfavoráveis ao Poder Público, não se trata de espécie recursal, haja vista que não advém de uma impugnação voluntária da parte, mas de uma prerrogativa processual da Administração Pública, que consiste em condição de eficácia para a validade da decisão.

Em assim sendo, proferida sentença desfavorável à Fazenda Pública, os autos devem ser remetidos automaticamente à segunda instância para reapreciação, pois do contrário, a decisão jamais poderá ser acobertada pelo manto da imutabilidade.

Neste contexto, o Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento, através de seu enunciado de súmula de número 45, no sentido de que as decisões proferidas em reexame necessário não podem agravar a condenação imposta à Fazenda Pública.

Em vista desta proposição, a jurisprudência tem se enveredado na mesma linha de raciocínio, afirmando que a instância recursal não pode agravar a situação jurídica nem mesmo em face de matéria processual de ordem pública.

Que tange ao princípio do duplo grau de jurisdição. A jurisdição é poder conferido ao Estado, para que ele, através de uma atividade substitutiva e criativa, realizada por meio de um processo, possa solucionar situações jurídicas deduzidas em juízo, impondo sua vontade, dentro dos parâmetros da lei, independentemente de aquiescência dos interessados, através de decisão insuscetível de controle externo e apta a si tornar imutável pela coisa julgada material.

O exercício desse poder, para que ocorra de forma legítima, deve sempre ser pautado na lei e nos princípios gerais que regem o direito, de modo a se coibir a atuação arbitrária e ilimitada do Judiciário.

A viga mestra que orienta esse controle é o princípio do duplo grau de jurisdição. Apesar de não ter previsão expressa na Constituição, este princípio se encontra implícito no artigo 5º, inciso LV, que assim dispõem:

“Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. [19]

O objetivo desse princípio é possibilitar a revisão do pronunciamento judicial de primeiro grau, geralmente por um órgão colegiado (Tribunal), de modo a evitar a prevalência de decisões injustas ou maculadas por algum erro formal ou material.

“[...] a prevalência do princípio do duplo grau de jurisdição assenta-se na necessidade de controle dos atos judiciais, evitando que uma injustiça ou ilegalidade prevaleça em vista da ausência de recurso adequado para combatê-la”. [20]

Vejamos a justificativa para a prevalência do multicitado princípio como de cunho político:

“Mas o principal fundamento para a manutenção do princípio do duplo grau é de natureza política: nenhum ato estatal pode ficar imune aos necessários controles. O Poder Judiciário, principalmente, onde seus membros não são sufragados pelo povo, é, dentre todos, o de menor representatividade. Não o legitimaram as urnas, sendo o controle popular sobre o exercício da função jurisdicional ainda incipiente em muitos ordenamentos, como o nosso. É preciso, portanto, que se exerça ao menos o controle interno sobre a legalidade e a justiça das decisões judiciárias. Eis a conotação política do princípio do duplo grau de jurisdição”. [21]

Assim, prolatada a sentença, o direito processual prevê a abertura de prazo para a interposição dos recursos taxativamente estabelecidos no Código de Processo Civil.

Uma vez interposta a impugnação, o processo, na maioria das hipóteses legais, é remetido para o Tribunal para ser reavaliado e julgado através de um acórdão, que também pode ser combatido pelas vias extraordinárias, quais sejam Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça e Recurso Extraordinário para o Supremo Tribunal Federal, que, no entanto, apenas podem ser interpostos quando esgotadas as vias recursais ordinárias.[22]

Percebe-se, assim, que a estrutura escalonada do Poder Judiciário brasileiro possibilita a interposição de inúmeros recursos, o que por um lado consagra um sistema de controle e fiscalização das decisões benéfico ao jurisdicionado, que passa a ter chances mais reduzidas de sofrer as conseqüências de uma sentença injusta, equivocada ou mesmo arbitrária, mas que por outro lado pode, também, acarretar, como de fato acarreta, uma procrastinação na marcha processual, em face da delonga de tempo que o julgamento dos recursos demanda, mormente, pela falta de aparato estatal.

Já o princípio da taxatividade conduz à interposição apenas dos recursos legalmente previstos no Código de Processo Civil, quais sejam apelação, agravo de instrumento, agravo retido, embargos infringentes, embargos de declaração, recurso ordinário, recurso especial, recurso extraordinário e embargos de divergência em recurso especial e em recurso extraordinário.[23]

Por ser o rol de recursos numerus clausus, isto é, por serem suas hipóteses restritas às espécies previstas na lei, não pode ser manejado qualquer tipo de impugnação diversa das que foram acima mencionadas, sob pena de não conhecimento.

No contexto recursal estabelecido pela lei processual civil, além de taxativos, os recursos gozam de singularidade (unicidade), tendo em vista que para cada tipo específico de decisão só existe um recurso correlato, salvo algumas exceções, como no caso da possibilidade de interposição simultânea de recurso especial e recurso extraordinário.

A explicação para esse fenômeno é o fato de uma mesma decisão violar texto de lei e norma constitucional. Neste caso, como a competência para proteção da lei infraconstitucional e da Constituição Federal é diversa, respectivamente Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, os recursos serão interpostos simultaneamente para estes diferentes órgãos do Poder Judiciário.

Quanto ao princípio da singularidade, importante destacar que é cabível somente uma espécie de recurso para cada tipo de decisão judicial.

Já quanto ao princípio da fungibilidade, importante ressaltar que ocorrendo interposição de um recuso inadequado, tal principio possibilitará o recebimento e admissibilidade do recurso errado, isto se não tratar de erro grosseiro.

Neste sentido é o entendimento jurisprudencial, vejamos:

“Processual civil. Princípio da taxatividade. Erro grosseiro. Inaplicabilidade do princípio da fungibilidade. Peça apresentada fora do prazo legal. 1. O sistema recursal brasileiro é regido pelo princípio da taxatividade, ou seja, apenas os recursos previstos no Código de Processo Civil serão admitidos. 2. Constitui erro grosseiro a interposição do recurso de apelação previsto no art. 513 do Código de Processo Civil com vistas a reformar a decisão monocrática que deu provimento a recurso especial da autarquia. 3. Além do erro inescusável, a petição foi apresentada fora do prazo previsto no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil, a afastar a aplicação do princípio da fungibilidade. 4. Petição não conhecida”. [24]

(STJ - PET no REsp: 1311185 RN 2012/0043080-7, Relator: Ministro Castro Meira, Data de Julgamento: 23/04/2013, T2 - Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 02/05/2013)

Quanto ao princípio da Dialeticidade, impõe à parte recorrente impugnar todos os fundamentos que justificariam a manutenção da sentença ou acórdão recorrido, sob pena de tornar o recurso rígido.[25]

O princípio da voluntariedade prevê que o recurso só será interposto por opção da parte recorrente, isto é, é um ato voluntário e não obrigatório.[26]

O da Irrecorribilidade das decisões interlocutórias, dispõe ser vedado recorrer de decisão interlocutória, podendo a parte somente apresentar recurso em caso de decisão de mérito (formal ou material).[27]

Por fim, que tange ao princípio da complementariedade, o recorrente poderá complementar a fundamentação do recurso já interposto, caso acorra modificação na decisão recorrida (como é o caso de embargos declaratório).[28]

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Monografia apresentada à faculdade de Direito/Universidade de Cuiabá como Exigência parcial para obtenção do título de bacharel em Direito sob a orientação do professor Enéas.

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