Aplicação da justiça restaurativa no ordenamento jurídico brasileiro

25/09/2019 às 23:53
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Fazer uma analise sobre a aplicação da justiça restaurativa no ordenamento jurídico brasileiro é a proposta deste trabalho de pesquisa.

 RESUMO

Fazer uma analise sobre a aplicação da justiça restaurativa no ordenamento jurídico brasileiro é a proposta deste trabalho de pesquisa. O crime e a contravenção, desde sua origem tiveram a imposição de uma pena, como a retribuição do mal aplicado, configurando a chamada justiça retributiva. Entretanto, eis que surge uma nova proposta no cenário do direito penal com o olhar mais humanizado, apresentando a ideia de uma justiça restaurativa que procura reparar o mal provocado pela infração penal através de um reequilíbrio das relações entre agressor e agredido e não a imposição da pena, apresentando em seu viés uma possibilidade de conciliação entre os indivíduos com maior participação da comunidade, de uma maneira geral. Sendo assim, se faz necessário analisar sobre a aplicação da chamada justiça restaurativa.

                  

Palavras-chave: Justiça restaurativa. Direito penal. Estado. Sociedade

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO;  2 JUSTIÇA RESTAURATIVA  2.1 HISTÓRICO E CONCEITO  2.2 OS PRINCÍPIOS E A JUSTIÇA RESTAURATIVA  2.3 A PARTICIPAÇÃO DO OFENSOR DO OFENDIDO E DA COMUNIDADE3 A TUTELA LEGAL DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO BRASIL 3.1 ANÁLISE DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO DIREITO BRASILEIRO  3.2 JUSTIÇA RETRIBUTIVA X JUSTIÇA RESTAURATIVA.  4 APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO BRASIL 4.1 DIFERENÇA ENTRE JUSTIÇA RESTAURATIVA E CONCILIAÇÃO 4.2 DESAFIOS NA APLICAÇÃO DA JUSTIÇARESTAURATIVA.CONCLUSÃO.REFERÊNCIAS

1-INTRODUÇÃO

            Para se falar a respeito da justiça restaurativa devemos antes de tudo rememorar que o direito penal é essencialmente uma garantia que visa promover a justiça penal no âmbito da coexistência pacifica dos indivíduos enquanto cidadãos participes de uma mesma sociedade. Bem sabemos que o jus puniendi do estado deve incidir sobre aquele que macula o ordenamento jurídico e prejudica a paz social, sendo assim, o sistema penal retributivo apresenta a punição visando retribuir o mal causado para manter a ordem e o desenvolvimento harmônico da sociedade.

Desse modo, temos que a pena privativa de liberdade figura em nosso sistema penal atual como uma prática constante se fazendo uma resposta ao crime no sentido de ser compreendida como uma medida eficaz para prevenir futuras condutas ilícitas e ao mesmo tempo ressocializar o infrator, o que lamentavelmente não é identificado em nosso sistema penal vigente, pois o individuo que comete um crime e é submetido ao cerceamento de sua liberdade como punição, sofre na realidade uma grande dessocialização que o transforma em um individuo passível de cometimento de novos crimes.

A violência e o castigo punitivo como uma forma de coibir a criminalidade não vem se mostrando eficaz, ao contrario, o que se verifica é a intensificação da própria violência que cada dia mais atinge a coletividade na pessoa do cidadão. Nesse contexto, temos que o modelo tradicional de justiça penal é percebido como eticamente indigesto, pois o mal é punido com outra mal, vez que, aqueles os quais deveriam ser protegidos e resguardados pelo Estado são os mais atingidos e nesse aspecto emerge um paradoxo, de um lado os cidadãos são vedados a realizar vingança privada para fazer justiça com as próprias mãos, em contra partida a aplicação da punição estatal de forma violenta não consegue conter aqueles que assumem o papel dos violadores dos direitos e garantias dos indivíduos pertencentes à coletividade.

Diante da evidente fragilidade do nosso sistema penal atual é necessário se pensar numa retificação para essas falhas em relação a uma resolução eficaz de conflito surgido com o cometimento do ilícito penal, pois os direitos constitucionais básicos não são respeitados em face de inoperância do atual sistema de justiça penal, o que o torna inaceitável eticamente e faz da ressocialização do apenado algo impossível de ser concretizado de forma eficaz. O que nos conduz a pensar que a falibilidade do nosso sistema aliado as insurgências e atrocidades, especificamente no que se refere a dignidade da pessoal humana, enquanto  principio constitucional que fundamenta o direito penal brasileiro, faz da pena de prisão na verdade um fator criminógeno.

Nesse contexto, emerge a necessidade de um novo paradigma de justiça penal, para que seja possível buscarmos aplacar as discrepâncias e falhas identificadas no atual sistema penal, o que devemos compreender que não é uma tarefa simples e nem fácil, mas de estrema necessidade diante da onda de violência e criminalidade crescente que vem imperando no atual cenário da nossa sociedade. E é exatamente devido a essa contextualização fática que ocorre o surgimento de um novo modelo de solução de conflitos chamado justiça restaurativa.

Esse trabalho de pesquisa vem, portanto, apresentar, de forma sucinta, uma análise sobre a aplicação da justiça restaurativa no cenário do Direito penal brasileiro, para tanto, na primeira seção será abordado sobre os aspectos conceituais da Justiça restaurativa bem como sua configuração e histórico.

Na segunda seção, abordaremos a respeito do surgimento da Justiça restaurativa no Brasil, destacando sobre sua implantação e a relação com a justiça retributiva enquanto sistema penal existe, notabilizando também sobre o papel do ofensor, do ofendido e da participação da comunidade de forma mais efetiva.

Por fim, na terceira seção desse trabalho trataremos a respeito da aplicação da justiça restaurativa no Brasil, analisando a respeito da relação entre essa e a conciliação e pontuar os aspectos a respeito dos desafios para implantação da justiça restaurativa no Brasil. O método utilizado foi bibliográfico.

2-O QUE É A JUSTIÇA RESTAURATIVA?

(Uma idéia que move e sempre moverá as pessoas é justamente a busca de uma justiça efetiva e humanizadora como aquela que identificamos na justiça restaurativa que traz uma nova percepção para se compreender a própria justiça.)

2.1  CONCEITO E HISTÓRICO.

Segundo Vilabaldo Cardoso Neto (2018, p 28-29): “... essa idéia de justiça surge no Canadá na década de 1970. Depois, chega aos Estados Unidos e, a partir daí, quando é cunhada a expressão “Justiça Restaurativa”, expande-se e passa a ser implementada em vários países, a partir de praticas diferenciadas. O impulso maior é dado quando, em 2002, o Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas edita a resolução 2002/12 e define orientações gerais para a utilização de procedimentos de Justiça Restaurativa em todo o mundo.”

Isso significou um grande avanço para as práticas restauradoras como uma forma diferenciada de se desenvolver uma resolução de conflito buscando uma proposta que tem na participação de todos os envolvidos a base para se chegar a um consenso que se faz curador do mal advindo do crime.

Seguindo corroborando o pensamento do autor supracitado: no Brasil, a Justiça Restaurativa ganha visibilidade a partir de 2005, em razão da parceria estabelecida entre o Ministério da Justiça e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), quando foi lançado o projeto “Promovendo Práticas Restaurativas”. Esse projeto consistiu na realização de seminários em algumas cidades brasileiras, no lançamento de obras coletivas (coletâneas de artigos) sobre o tema e na implantação de três projetos-piloto, nas cidades de São Caetano do Sul, Porto Alegre e Brasília. A partir de então, a temática passou a ser difundida por entidades dos poderes públicos e de organizações da sociedade civil. Vilabaldo Cardoso Neto (2018, p 29)

Neste plano de compreensão se identifica na justiça restaurativa novel instrumento que vem embasado na idéia de atingir de forma efetiva e prática o cenário de resolução de crimes trazendo a responsabilidade para os envolvidos diretamente no conflito e desse modo viabilizar uma possibilidade de tratar o conflito em sua amplitude destacando a celeridade que se faz tão necessária para se conceber a justiça se personificando no direito penal. 

Como afirma Silva Sánchez (2013, p 117), em muitos países, incluindo o Brasil, o expansionismo da legislação penal é uma tendência perceptível nos últimos anos. A justificativa estatal para garantir a segurança dos cidadãos, muitas vezes, é conquistada com supressão de direitos e garantias daqueles que passam a integrar o sistema penal. O Estado passa a impor, assim, o seu arsenal punitivo de forma antecipada, atuando através de relações não de necessidade, mas de probabilidade.

Eis que surge uma prática que poderia se dizer que ainda está na perspectiva de desenvolvimento de conceito definitivo.De maneira geral, temos que se trata de um processo colaborativo desenvolvido para solucionar um conflito caracterizado como delito, nesse contexto, está inserido também, uma participação expressiva do infrator, da própria vítima e da comunidade. Desse modo, o que se pretende é a oportunidade conferida ao ser humano de se fazer protagonista da resolução dos delitos

 Num aspecto de ordem prática, a mediação vítima-ofensor se constitui essencialmente em colocá-los frente a frente com uma segurança jurídica e física, para que ali seja possível um acordo em que a resolução vai além da questão de haver a punição, existe um alcance maior que ultrapassa a retribuição, como no caso de se promover uma espécie de reparação dos danos emocionais.

Assim, a fundamentação de uma justiça restauradora está baseada num procedimento de consenso que envolve todos os atingidos numa infração penal, isto é, o autor, a vitima e também em determinada circunstâncias a própria comunidade em que fazem parte. Representa de fato, por tanto uma ruptura com a tradicional absolvição do estado na relação vitima/infrator e viabiliza a possibilidade de fragmentar o dueto da função da pena restrito a retribuição e prevenção, trazendo para esse cenário a possibilidade da reparação configurando um novo enfoque de solução de uma infração penal.

Diferenciando do enfoque retribucionista a justiça restaurativa propõe um novo olhar onde o crime na verdade é um ato que atinge vitima autor e comunidade e nesse contexto a responsabilidade social pelo ocorrido é proposta concitando por tanto a comunidade para ter participação na solução do crime.

2.2     OS PRINCÍPIOS E A JUSTIÇA RESTAURATIVA.

No que diz respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana identificamos que se guarda relação com a justiça restaurativa uma vez que o processo de restauração se baseia ou se fundamenta na pessoa como o centro de referencia para resolver o conflito, isto é, a resposta para se fazer justiça reside em levar em consideração todos os aspectos que envolvem o conflito, inclusive os de ordem psicológica emocional.

O princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um dos, senão o maior princípio, do qual se irradiam todos os demais princípios, esse princípio da ao estado a obrigação de abster-se a todo e qualquer ato que atente contra a dignidade da pessoa humana, devendo agir por meio de condutas que garantam o seu funcionamento, para proporcionar a construção do individuo enquanto pessoa e ser social[1].

Seguindo na idéia de apreciarmos os princípios que estão ligados a Justiça restaurativa cabe mencionarmos também o Princípio da Voluntariedade, pois se trata de um acordo de vontades entre as partes, a escolha de participação é essencial para que seja possível dar início aos trabalhos da Justiça Restaurativa. A eficácia do acordo está fundamentada na participação voluntária.

Outro princípio que faz parte da caracterização da Justiça restaurativa é o Princípio da Informalidade, que se evidencia dentro do procedimento restaurador, pois não existem burocracias nem rituais de solenidades para as sessões restaurativas, o que permite a compreensão de que é possível realizar a efetivação do acordo de um modo mais acessível e descomplicado.

Não se identifica nesse contexto o ambiente formal do Poder Judiciário, excetuando é claro a necessidade de elaboração do acordo firmado entre os participantes que deve ser escrito em termos objetivos onde as obrigações das partes devem ser proporcionais e possíveis de serem satisfeitas e necessitam prever formas de fiscalização além de ter resguardado as garantias para o cumprimento e naturalmente ser a posteriori homologado.

Também temos o Princípio da Oportunidade, que indica a possibilidade da Justiça restaurativa incidir em diversos momentos do processo. No caso de ser realizada esta antes do oferecimento da denúncia, o requisito que deve ser analisado é a existência de indícios que possam fundamentar uma eventual sentença, isto é, materialidade e autoria. Convém destacar que Na Justiça Retributiva, como bem se sabe impera o Princípio da Indisponibilidade da Ação Penal, restringindo a possibilidade de renúncia, desistência etc. O que torna mais complexa a efetivação da resolução do conflito.

           Seguindo nesse esteio de compreensão, se faz oportuno também mencionar ainda o Princípio da Neutralidade, vez que as partes devem estar em um ambiente de neutralidade e se submeter a um procedimento sem que  nenhuma das partes seja favorecida em detrimento da outra. Desse modo será possível a ambas as partes serem ouvidas sobre a ocorrência dos fatos investigados e também suas motivações e eventuais seqüelas resultantes do ocorrido.

            Para que depois as partes juntas possam dialogar sobre a possibilidade de uma restauração. E junto a esses já mencionados, seguimos destacando outros mais que compõe a base de estruturação da Justiça restauradora. Assim, referenciamos o Princípio do Sigilo que confere às partes segurança de que tudo o que for pronunciado na sessão, não poderá ser usado a favor ou contra elas em qualquer outro lugar. Tanto é assim que se o ofensor recusar a restauração com a vítima, isso não poderá ser fundamento ou causa para agravamento da pena aplicada a ele.

Em relação ao princípio da Complementariedade, se entende que nem sempre os mecanismos da Justiça Restaurativa irão evitar um processo criminal como, por exemplo, quando um crime publico vai ao conhecimento da Policia ou das autoridades judiciárias, entretanto, ainda assim um processo restaurativo poderá ser benéfico para o ofensor que poderá fazer uma reparação extrajudicialmente a vítima, sendo-lhe aplicado devido a isso, uma pena de prisão com menor duração, o que sem dúvidas é mais benéfico.

O princípio da confidencialidade permite às partes a segurança para, com franqueza, tratarem dos seus interesses sem constrangimentos, pois no caso do processo de mediação não prosperar, as declarações não devem poder ser comunicáveis em juízo, por essa razão também nos debates, as declarações não devem ser reduzidas a escrito, imperando a oralidade que torna viável a expressão dos sentimentos dos envolvidos de forma mais sincera e com maior liberdade para mostrar o que realmente habita no coração de cada um no que se refere a ofensa causada.

No que se refere ao princípio da celeridade, temos que este também permeia a Justiça Restaurativa que consegue dá ao problema jurídico uma resposta rápida, célere e eficaz, fazendo jus ao sentido de justiça. Neste sistema as partes tendem a controlar a duração do processo, consoante a natureza, o tipo e a complexidade de cada caso, o que nos conduz a concluir que, mesmo que estas necessitem de tempo maior para chegarem a um acordo, este espaço de tempo não será maior do que aquele que da chamada justiça tradicional.

E sendo assim, a Justiça Restaurativa apresenta uma redução de custos para a máquina judiciária, bem como para as partes participantes. E aliado a tudo isso, está finalmente a necessidade de respeitar a disciplina que deve atingir o agressor e a vítima no que se refere à própria execução dos acordos. A noção de disciplina está ligada a um recurso de responsabilização das pessoas implicadas no processo em causa e ademais, permite maior acreditação social desta atividade, pois desse modo é possível compreender que a restauração está configurada em bases principiológicas sólidas.

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2.3       A PARTICIPAÇÃO DO OFENSOR, DO OFENDIDO E DA COMUNIDADE.

 O maior interesse é reparar o dano causado ao bem jurídico e para tanto todos os personagens do crime devem estar envolvidos. Existe a predominância da disponibilidade da ação social e como o foco é reparar o dano, existe uma predominância de reparação e das penas alternativas ao invés da privativa de liberdade.

Neste plano de compreensão temos que as penas, quando forem necessárias tem por corolário a proporcionalidade e a humanidade como seu manto definidor. Além disso, se evidencia nessa proposta restaurativista o espírito de assistir a vitima, isto é fazer com que suas angustias e anseios sejam levados em consideração para que esta se sinta no manto de acolhimento da justiça de uma forma mais humanizada. Nessa proposta de cenário jurídico penal se percebe que a idéia da restauração emerge como uma possibilidade de se fazer uma justiça mais próxima do cidadão.

A Justiça Restaurativa se refere a um procedimento de consenso onde as pessoas estão envolvidas de uma forma mais próxima, a vítima, o infrator, a comunidade que se fazem atores principais com participação ativa e efetiva na idéia de se estruturar soluções para que sejam curados os traumas e as feridas que foram provocadas pelo crime, na verdade o que temos são pessoas que vivenciaram o mesmo cenário, uma mesma situação traumática e agora se propõe que elas se unam ou que estejam envolvidas dentro de um mesmo contexto para que possam buscar soluções curativas para as questões que foram prejudicadas por conta do surgimento do crime.

Na verdade o que o modelo restaurativo vem a mostrar é a proposta de se buscar uma forma mais participativa, mais democrática no cenário criminal, pois além da vitima e do infrator temos a própria comunidade que se faz participe nesse e todos estão buscando o mesmo ideário de cura e modificação por conta do crime que perpassou a vida de todos os envolvidos, não se trata de um procedimento superficial simples, pois na verdade ele vai adentrar no conflito no âmbito das subjetividades e o que temos é uma nova roupagem para a solução do crime, uma espécie de busca que envolve todos aqueles que foram atingidos eisso é o diferencial maior da justiça restaurativa.

O que convém acrescentar é que, a justiça restaurativa nos coloca sobre uma nova ótica restauradora que vai muito além da idéia de retribuir o mal com o mal, estamos diante de um novo horizonte, uma nova perspectiva na efetivação da justiça. Agora o que importa é pensar sobre o reequilíbrio das relações entre agressor, agredido com envolvimento da comunidade, significa dizer que a sociedade que foi atacada em principio atingida em sua dignidade passa a desempenhar posteriormente o papel decisivo na restauração da paz social.

Nesse contexto se identifica que a responsabilidade pelo crime se dilui a todos os membros da sociedade, isto é, o fato praticado não se reputa somente ao autor, co-autor e participe, pois se entende que todos falharam na missão de viver em paz na coletividade, por isso o episodio criminoso se apresenta como uma resultante dessa falha e assim considerando que os membros da sociedade precisam resgatar a harmonia e a paz no seio da coletividade, convém aos procedimentos formais e rígidos da justiça retributiva ceder espaço na justiça restaurativa a meios informais e flexíveis fazendo prevalecer a disponibilidade da ação penal.

Nesse aspecto cabe perceber que justiça restaurativa proporciona um encorajamento ao ofensor para que este possa se responsabilizar pela conduta danosa, fazendo uma reflexão das causas e conseqüências do seu comportamento em relação aos seus convivas, para então buscar se modificar em seu modo de agir e pensar e posteriormente se habilitar a retornar para sua comunidade e ser aceito pela mesma. Tudo isso porque a justiça restaurativa pode apresentar como resultado o acarretamento do perdão mútuo entre todos os envolvidos no conflito, além de uma reparação mais efetiva para a vítima.

A justiça restaurativa vem criar um ambiente seguro no qual o ofendido se sente encorajado a se aproximar do autor da conduta ilícita, para que, possa trabalhar também os aspectos emocionais atingidos com o crime, ademais é oferecida a comunidade a chance de promover seus valores e expectativas sobre o entendimento das causas adjacentes do crime e assim poder determinar o que poderia de fato reparar o mal que foi provocado para restaurar a paz e a tranqüilidade que existia outrora.

Dessa forma se contribui para que exista o restabelecimento do bem coletivo bem como a potencialização de uma colaboração efetiva na busca da diminuição do índice de criminalidade, pois, o dever da restauração da paz pública pertence a todos e a justiça restaurativa abre passagem para a restauração do dano e lança um olhar de enfoque para as medidas substitutivas da pena privativa de liberdade resultante de sua atividade conciliatória incessante que se faz característica da justiça restauradora.

O fulcro está na assistência a vitima de um modo mais profícuo buscando trabalhar a subjetividade que está imbuída no fato criminoso, na pessoa do ofensor e do ofendido além, é claro, da própria coletividade.

3- A TUTELA LEGAL DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO BRASIL.

(Na busca de um novo horizonte para a justiça penal objetivando, sobretudo prevenir e trazer resolução aos conflitos emerge a justiça restauradora colocando as relações interpessoais com um papel de destaque n busca de reparar danos oriundos dos delitos, a proposta vem com objetivo curador das conseqüências do delito.)

3.1 JUSTIÇAS RETRIBUTIVA X JUSTIÇA RESTAURATIVA

Para aprofundar nossa analise a respeito da justiça restaurativa como uma forma diferenciada de se realizar o justo e certo para uma aplicação eficaz do direito penal se faz oportuno ressaltar que está aparece no cenário jurídico como um farol que sinaliza a necessidade urgente de se promover uma espécie de justiça efetiva que emerge ao lado da clássica justiça retributiva para nós mostrar que é possível se promover um direito humanizado.

E tudo isso não significa que seja necessário debelar a retribuição mais sim se buscar uma espécie de diluição no sentido de identificar as semelhanças e diferenças nos dois sistemas para que seja possível a coexistência de ambas no sentido de se fazer justiça. Nessa proposta de compreensão, convêm as palavras de Howard Zehr: “a Justiça Restaurativa se assemelha à Justiça Retributiva por partir de uma concepção antiga de delito, baseada no senso comum... compreendemos o comportamento socialmente nocivo como “violação de pessoas e relacionamentos interpessoais” (2012, p. 31).

Entretanto a justiça restauradora se coloca numa espécie de limiar no que se refere às respostas necessárias de combate ao crime. A proposta restauradora segue num horizonte que aponta um caminho em que as práticas judiciais se delineiam de um modo mais compreensivo ao cidadão comum e vem menos revestida pelos rituais das formalidades da justiça, se trata de uma pretensão de oferecer para aqueles que foram diretamente afetados pelo crime meios mais condizentes para se compreender e lidar com o delito.

E assim, vem permitindo que se construa uma resposta mais satisfatória que permite pensar a situação sob uma dimensão interdisciplinar onde o fenômeno do crime e a própria noção de justiça adentra de forma mais profunda na adesão de integração entre todos os envolvidos no conflito buscando uma nova perspectiva de se obter uma justiça mais efetiva, mais participativa e verdadeiramente compreendida pelo cidadão.

Assim inserida no cenário das praticas de informalização e desjudicialização propriamente ditas, especificamente no plano de exigências necessárias para se obter uma efetiva reparação que proporcione o retorno fático da paz social, a justiça restaurativa vem buscando proporcionar desse modo uma espécie de enfrentamento da crise iminente do modelo causal do crime-sansão pertinente a justiça retributiva. Este modelo retributivo que muito embora venha ao longo dos tempos aplicando estratégias de endurecimento legislativo no intuito de coibir a violência personificada nos mais variados tipos de delito, não vem obtendo êxito[2].

E mesmo com as práticas repressivas contundentes como a expansão legislativa que trás novos tipos penais traduzindo o entendimento de que para se punir de forma efetiva é preciso criminalizar mais condutas e assim reafirmando que para que se possa punir efetivamente é necessário coibir através do encarceramento. Pois persiste a noção de que o tolhimento da liberdade pode fazer com que o delinqüente consiga se reeducar e reprimir suas práticas criminosas por medo de permanecer encarcerado e mutilado no que diz respeito a sua própria dignidade humana.

Entretanto o cárcere cada vez mais se apresenta ineficaz no ideal da ressocialização, a prisão não repara nem contem a violência pelo contrario, se verifica a cada dia que esta se faz um instrumento reprodutor da mesma e assim o sistema penal vai cada vez mais se emergindo em uma grande crise que não encontra justificativa para se explicar no que diz respeito ao dever de garantir a segurança dos cidadãos.

Assim, a justiça restaurativa se apresenta com um novo cenário, trás uma nova roupagem para lhe dar com a criminalidade, apresenta um novo olhar para se tratar o crime nas suas conseqüências violadoras dos direitos dos cidadãos. Sob o manto do olhar restaurador, o ponto essencial reside na violação da relação das partes que figuram como os atores principais do delito conflituoso, o reflexo causado para os envolvidos e para a comunidade de um modo geral é que precisa ser tratado em todos os seus aspectos, incluindo as seqüelas de ordem psicológica emocional, pois o rompimento do bem estar psicossocial do cidadão devido um episódio de violência do crime é ponto fundamental a ser tratado.

Nesse sentido, é interessante notar que o processo restaurativo se sobrepõe ao processo penal e rompe com a lógica retributiva, vez que entrega o conflito ao ofensor, a vítima e a comunidade para que esses encontrem um acordo que seja favorável a todos, sobretudo, através do diálogo e do distanciamento de estereotipo que inviabilizam uma efetiva reparação do dano causado pela infração delitiva. Reside na participação efetiva dos envolvidos a satisfação maior para uma realização de justiça em que as partes e a própria comunidade são os protagonistas das soluções encontradas para se resgatar a ordem e a paz social que havia sido maculada pelo crime.

Trata-se de uma nova modalidade de resolução de conflitos, por assim dizer, pois na proposta restauradora se identifica uma novidade no que se refere a idéia de crime e justiça. Isso porque o que se pretende é mostrar que é possível efetivar a restauração de tudo que foi rompido pelo crime de uma forma que se evidencie de modo prático que é possível fazer a cura do delito envolvendo quem o produziu e quem sofreu a mácula criminosa.

3.2 A ANÁLISE DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO DIREITO BRASILEIRO.

No caso do Brasil, onde o princípio da indisponibilidade da ação penal pública é o que vigora, se evidencia que de fato a aplicação de medidas alternativas, como a proposta da justiça restaurativa encontra inviabilidades para se efetivar e alcançar uma expressão maior no cenário jurídico penal brasileiro. Contudo, ainda que exista certo entrave no que se refere a aplicação de métodos alternativos no âmbito processual penal, temos na nossa Constituição e na Lei 9099/95 uma trilha sólida de avanço no sentido de viabilizar a aplicação da justiça restaurativa. 

Assim, se lança o entendimento de que podemos identificar nos crimes de ação penal de iniciativa privada, que é disponível e a critério do ofendido a provocação da prestação jurisdicional, a possibilidade de ser possível para as partes terem a opção de escolha pelo procedimento restaurativo, perquirindo um horizonte diferenciado para se permitirem uma resolução de conflito com maior expressão de envolvimento na participação de todos os envolvidos para que dessa forma possam buscar a construção de um caminho restaurador, que não o judicial, para que desse modo possam alcançar uma justiça que vá além da mera retribuição punitiva[3].

Ademais, nos crimes de ação penal privada e pública condicionada, existe a possibilidade de ocorrer a despenalização por extinção da punibilidade através da composição civil e, nas hipóteses de ação penal pública, pode ser referenciado o encontro para se discutir uma possibilidade de pena alternativa adequada, no ambiente de um diálogo de proposta restauradora. O que nos conduz a uma compreensão nítida que estamos diante de uma configuração resolução de conflito inserida de acordo com o contexto necessário para eficácia de sua aplicação.

Nesse cenário, emerge o entendimento de que a experiência restaurativa pode ser aplicada no âmbito da conciliação bem como na transação penal, tudo isso a partir da construção de um espaço de consenso produzido por ela que permite a existência de um diálogo restaurativo, inclusive com maior alcance para atingir outros contextos como os de aspecto emocional trazidos pelas partes e que podem ser trabalhados para evoluir na idéia de se obter uma justiça restauradora também no plano emocional.

Nesse plano de entendimento que visa apresentar um viés restaurador, o art. 94, da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), consta a hipótese de procedimento restaurativo nos crimes contra idosos, pois o referido artigo diz que o procedimento da Lei 9099/95 para os crimes contra idosos a pena privativa de liberdade não passe de quatro anos, desse modo propicia a aplicação do processo restaurativo[4].

E devido essas aberturas que estão inseridas no âmbito da nossa própria legislação, o nosso Poder Judiciário vem sendo conduzido a mudar suas concepções a fim de buscar idéias alternativas para a solução de conflitos, mas agora não priorizando apenas o método tradicional de ajuizamento de processos judiciais, e sim possibilitando a via restauradora.

A prática da justiça restaurativa, funcionando faz mais de quinze anos, tem se expandido cada vez mais e se confirma de forma efetiva por intermédio do denominado Protocolo de Cooperação para a difusão da Justiça Restaurativa, firmado em agosto de 2014 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Nos Juizados da Violência Doméstica contra a Mulher, ou da Paz Doméstica, usualmente, crimes contra a liberdade pessoal ou individual[5].

Nos Juízos da Infância e Juventude, condutas equiparadas a lesões corporais (decorrentes de brigas em família, entre vizinhos, na escola); uso de droga, ameaças, contravenções penais, crimes contra a honra. Na Pesquisa - Relatório Analítico Propositivo Excepcionalmente, condutas consideradas graves, como atos inflacionais análogos à tentativa de homicídio, estupro, tráfico de drogas e furto simples e qualificado (São Paulo capital, Tatuí, Porto Alegre).Diante do que se identifica no relatório produzido pelo CNJ, a Justiça restaurativa está evoluindo e se inserindo efetivamente no cenário jurídico brasileiro ao lado da justiça retributiva[6].

4-APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO BRASIL.

(A justiça restaurativa em si se reveste de um processo democrático e é incentivada para a sua aplicação, de modo eficaz a dar resultados reais no que concerne a resolução de conflitos.)

4.1 DIFERENÇAS ENTRE JUSTIÇA RESTAURATIVA E CONCILIAÇÃO

No primeiro momento é natural que se confunda a justiça restaurativa com a conciliação, pois se tratam de fato, de métodos que procuram promover a resolução do conflito através de um acordo, de uma composição. Entretanto se faz oportuno destacar que existem expressivas diferenças nesses dois processos que tem por objetivo comum desenvolver uma restauração do que foi maculado pelo conflito[7].

Na conciliação existe a busca do acordo baseado no direito de cada um sendo que o fundamento está naquilo que expressam as normas, isto é, o conciliador vai se fundamentar na lei especificamente no que está positivado. De outra forma a justiça restaurativa tem seu fulcro nos valores das pessoas, nos seus sentimentos promovendo portando uma espécie de valorização da pessoa, na sua condição humana capaz de transformar o conflito com uma resolução curadora.

A prerrogativa é o ser que passa por uma espécie de transformação do conflito em uma resolução curadora buscando um dialogo participativo e democrático, uma via capaz de transformar a pessoa para desenvolver melhores relacionamentos no futuro e assim passar a promover efetivamente a ordem e a paz social. Sendo assim, cabe o entendimento de que é possível se criar um ambiente gregário favorável onde o diálogo propicie a restauração de uma convivência harmônica sob o manto da justiça. Não basta que existam leis para punir as injustiças, se faz necessário criar um ambiente em que se efetive o que for justo.

De todo modo, não se pode olvidar que existem filigranas de conciliação diluídas no processo restaurador, pois o propósito de conciliar se faz presente no sentido de buscar na força do diálogo o elemento eficaz para se proporcionar a sustentação de uma resolução de conflito embasada no consenso. Em comum, a conciliação é voltada para solucionar questões de ordem econômica, de maneira que se pode perceber que, nas suas disposições da legislação civil, o seu instituto versa sempre sobre direitos que admitem transação e são de ordem privada. Pode também ser voltada somente a questões de interesse processual, como exemplo, os j procedimentos criminais previstos na, já mencionada, Lei dos Juizados Especiais 9.099/1995 para os crimes de menor potencial ofensivo.

4.2 DESAFIOS NA APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO.

No que se concerne à idéia de se pensar que é possível combater a criminalidade através de uso do diálogo se evidencia a vantagem proporcionada aos envolvidos no conflito, pois como já está evidenciado, apenas a imposição de uma pena não vai tratar dos aspectos emocionais que envolvem vitima, agressor e comunidade e também a retribuição não permite a chance da vitima expressar seus sentimentos e do agressor desenvolver um conscientização sobre as conseqüências do crime praticado. Já dizia Cesare Beccaria “a finalidade das penas não é atormentar e afligir um ser sensível (...). O seu fim (...) é apenas impedir que o réu cause novos danos aos seus concidadãos e dissuadir os outros de fazer o mesmo”. (Beccaria, 2008, p. 29).

É claro que sabemos que a criminalidade forte vem incidindo cada vez mais na sociedade e tudo isso, faz com que está exija uma resposta, seja ela qual for para debelar o crime, mesmo que isso não seja eficaz aparece o temor que ergue pilares de uma forte retribuição nas situações em que a lei se efetiva e o que nos causa terror e tremor é identificar uma pressão social para que o legislativo produza cada vez mais um endurecimento das leis aumentando suas penas no afã de conter ou de promover algum tipo de combate a criminalidade, o que lamentavelmente não conduz a uma diminuição da violência, tão pouco dos crimes.

Toda via fica evidenciado que a impunidade de fato produz criminalidade, mas está evidente que não será através do endurecimento das penas que se conseguirá garantir a segurança da sociedade, pois o que de fato deveria ser refletido era se pensar numa efetivação da aplicação da lei e não buscar seu enrijecimento nas penas, bem se ver que as milhares de pessoas infratoras que são encarceradas não voltam do cárcere melhores do que foram e muito menos capazes de promover o retorno da harmonia da paz social.

Nas palavras de Vilobaldo Cardoso Neto: “Ao se fazer uma análise prévia do sistema judicial brasileiro e projetar, a partir dele, a construção de um paradigma de justiça diferente, como propõe a Justiça Restaurativa, deparamo-nos com inúmeros desafios...” Contudo, o nosso ordenamento pátrio, atualmente está buscando evidenciar as questões de aspecto humano para proporcionar à resolução do conflito de forma mais humanizada e eficaz a todos os protagonistas do sistema jurídico trazendo assim a efetivação da justiça com viés mais digno e menos precário do que se verifica no sistema retributivo.

Ademais, convém rememorar que o sistema de Justiça Penal não se positiva como o único meio de controle que a sociedade dispõe e sua atuação é orientada e limitada pelo princípio da intervenção mínima e é do nosso conhecimento que a atuação da família, escola, religião o precede. Assim, se verifica nos ambientes comunitários a potencialidade para resolução de conflitos criminais, sem que seja necessário recorrer ao controle social formal.

           No Brasil, tem havido o fortalecimento da justiça comunitária, pois a essência dos projetos de justiça comunitária é informar a população sobre seus direitos, facilitar o acesso aos meios necessários para o exercício da cidadania e, em casos de desavenças, estimular que as próprias partes as administrem. Na medida em que se transfere ao Estado toda a responsabilidade pela resolução dos conflitos, a comunidade não se fortalece nem se torna capaz de criar suas próprias soluções, o que constitui um fator de alienação.

E sendo assim, Projetos de justiça comunitária estão espalhados por quase todos os estados do país. Alguns deles contam com o apoio da Secretaria Especial dos Direitos Humanos – SEDH – da Presidência da República, através do programa Balcão de Direitos[8]. Cada vez a participação da comunidade é incentivada para que se efetivem acordos restauradores que promovam a satisfação efetiva de todos.

Desse modo, aduzimos que com a previsão contida no art. 98 da Constituição Federal de 1988, a Lei dos Juizados Especiais Criminais, como dito alhures, apresenta medidas que são compatíveis com as propostas restaurativas como a composição civil dos danos, a transação penal e a suspensão condicional do processo.Em relação à composição civil dos danos, o juiz em audiência preliminar esclarecerá sobre a possibilidade da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade, evidenciando a idéia restaurativa na composição civil dos danos.

Na transação penal as características restaurativas, aparecem na representação da vítima ou sendo o crime de ação penal pública incondicionada, o Ministério Público poderá propor medidas que se assemelham às penas restritivas de direito, não obstante a distinção quanto à natureza jurídica dos institutos. Ademais, encontramos ainda características da justiça restaurativa no instituto de suspensão condicional do processo e também é facultada ainda pelo Estatuto do Idoso[9].

O Estatuto da Criança e do Adolescente, perquirindo o mesmo objetivo das medidas não punitivas da Lei 9.099/95, traz o instituto da remissão em seu art. 126, abrindo espaço para as técnicas restaurativas. O processo, então poderá ser excluído, extinto ou suspenso, desde que a resolução do conflito tenha logrado êxito entre as partes de forma livre[10]. Convém também fazer referencia à prática restaurativa no instituto do perdão judicial, previsto no art. 107, inciso IX, e no art. 120 do Código Penal.

Sabemos que existem várias aplicações desse novo método em nosso país, pois a disseminação do processo restaurador vem se fortalecendo ao longo dos anos e configurando um instrumento eficaz favorável a resolução de conflitos de um modo humanizado e porque não dizer mais completo, pois fornece a comunidade uma possibilidade real de se fazer presente ao mesmo tempo em que se emerge como protagonista também no cenário de aplicação da justiça nesse viés restaurador. E nesse diapasão se faz oportuno mencionar a título de exemplos algumas dessas aplicações: Belo Horizonte/MG, Projeto Mediar, 2006. Campinas/SP, “Justiça e Educação – Novas Perspectivas”, 2008.

Destacamos também o Instituto Brasileiro de Justiça Restaurativa (IBJR), se trata de uma ONG que congrega advogados, defensores públicos, membros do ministério público e da magistratura, professores, estudantes, pesquisadores, psicólogos, pedagogos, sociólogos, entre outros, objetivando a expansão das práticas restaurativas.

É interessante destacar que com o advento da Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais e do Estatuto da Criança e do Adolescente as práticas restaurativas no Brasil têm sido aderidas ainda que não seja exatamente com sua especificidade, pois claro está que esse método vai muito além dos procedimentos dos juizados especiais, pois na sua base precípua repousa o resgate da convivência pacífica no ambiente afetado pelo crime, em especialmente naquelas situações em que o ofensor e a vítima fazem parte de um mesmo contexto social de convivência.

É certo também considerar que o sistema restaurativo e a crise do sistema carcerário estão diretamente ligados a questão da superlotação desumana, a situação da pseudo-reintegração do agente infrator à sociedade e tudo isso culmina com a noção de que a violência se propala com rapidez em detrimento ao combate efetivado pelo Estado. Assim, a Justiça Restaurativa figura no cenário de uma nova ordem humanizada para responder o crime de forma coesa com as conseqüências do delito, visando a restauração de todos os tipos de violação que tenha ocorrido com o bem jurídico tutelado pelo Estado, pertencente ao ofendido.

E sendo assim, podemos conceber que o sistema restaurativo se apresenta como uma espécie de transformação no cenário jurídico e cultural da sociedade hodierna. É um novo caminho a ser trilhado nas estradas do Estado Democrático de Direito observando com mais efetividade e veemência os direitos humanos. E considerando tudo que vem a justiça enfrentando em relação ao combate da violência e da crescente criminalidade, a vertente da proposta restauradora se faz uma luz na noite escura e fria do crime que pode ser debelada pela luz da restauração.

Portanto, devidamente delimitados os aspectos essenciais referentes à Justiça Restaurativa, bem como seus fundamentos ideológicos básicos e demais ponderações concernentes a concepção e aplicação desse novel instrumento destinado a restaurar de uma forma mais eficaz a paz e a ordem social com um manto de harmonia,nos resta agora refletir também que a opção por um desses modelos de viés restaurador dependerá de alguns fatores de natureza política e cultural, tendo, por exemplo, a aceitação e o amparo das agências penais bem como a existência de organizações comunitárias com base social e também as diretrizes da política de segurança pública trilhada pelo governo, dentre outros.

E assim, podemos compreender de forma nítida que os programas restaurativos inseridos no sistema criminal estatal e os situados fora dele, naturalmente têm suas fragilidades e limitações, sobretudo devido a necessidade de adequações para corroborar com a efetivação da justiça sem resvalar nas raias da ineficácia por conta da ausência de maior aparato estatal.

            E com essas lentes de visão se torna compreensível perceber que os projetos incorporados ao sistema penal podem inclusive ter seus princípios desvirtuados, por exemplo, como a noção de mitigação da autonomia das partes em relação às características centralizadoras do Estado, os programas sem vínculo com o sistema penal, de outro modo, podem apresentar um déficit de legitimidade perante a uma comunidade que inviabilize o seu sucesso.

Enfim, as possibilidades são diversas, mas uma coisa não se pode olvidar: A justiça restaurativa se faz mais próxima de proporcionar ao cidadão uma sensação de vivenciar uma reparação concreta. O ambiente diferenciado do tradicional foi criado para que a justiça possa acontecer sob uma nova ótica de cores diversas que buscam refletir um colorido de efetivação de uma espécie de restauração que veio para juntar os pedaços estilhaçados pela ofensa de uma forma que fique tão cicatrizado que ninguém diz que foi restaurado diante da satisfação obtida com o envolvimento de todos os envolvidos.

CONCLUSÃO

Ao longo desse trabalho de pesquisa buscamos apresentar considerações a respeito da Aplicação da Justiça Restaurativa no Ordenamento Jurídico Brasileiro que se apresenta como uma nova possibilidade de realização efetiva do interesse reparatório da vitima estruturada em uma construção conjunta envolvendo todos os participantes do conflito inclusive a comunidade.

Neste sentido se evidenciou que a aplicação da justiça restaurativa emerge como uma nova possibilidade de finalidade da pena, que pode ser por meio de uma imposição judicial ou compreendida como resultado de um acordo restaurativo. Dentro deste contexto o estado não deve considerar tão somente seu caráter intimidador no âmbito da aplicação efetiva de suas normas, se limitando apenas a uma reintegração do agressor mais sim voltando seu olhar também para a vítima.

Nessa esteira de pensamentos convém pensar que estamos diante de uma configuração contemporânea do tecido social que nos remete a uma compreensão inevitável a respeito de novos paradigmas existentes dentro da sociedade, por tanto se faz oportuno pensar que a função de mantença da ordem e paz exercida pelo direito penal não cabe mais ficar restrita a perspectiva tradicional.

            Então se faz fundamental o exercício desse controle a partir de uma reconstrução reparadora de integração, onde o foco de atenção sai da punição dos agentes e passa a reparação das vitimas com a conseqüente reintegração dos agressores na comunidade. Nesse aspecto a aplicação da justiça restauradora no ordenamento jurídico brasileiro encontra espaço possível dentro do direito penal vez que esse tem base garantista, se fundamenta na dignidade da pessoa humana e pode acrescentar a proposta restauradora em seu discurso de efetivação da justiça.

Diante da configuração das relações sociais hodiernas somos conduzidos a pensar que a reparação restauradora contribui de forma mais eficaz para o efetivo restabelecimento da paz jurídica, pois existe evidenciado uma espécie de compensação autônoma das necessidades de todos os envolvidos, se percebe que influencia de forma mais positiva a idéia de ressocialização do ofensor e ao mesmo tempo considera como algo essencial a reparação dos interesses da vitima.

Sendo assim se valoriza com maior expressividade a finalidade reparatória construída a partir da presença da vitima e sua consideração atuante em relação a formular mecanismos que se mostram eficazes no que diz respeito a solução dos crimes evidenciando por tanto respeito aos interesses da coletividade, promovendo assim a administração da justiça de modo mais completo.

Considerando que estamos vivendo em um mundo onde a violência e a criminalidade avançam imperiosamente contra a sociedade no que diz respeito ao seu desenvolvimento harmônico ao lado da paz social, nos deparando todo os dias com uma evidente ineficácia no que se refere a contenção dos crimes, pensar numa nova possibilidade de aplicação eficaz da justiça, envolvendo todos os atores inclusive a própria comunidade atuando no papel principal para efetivamente reparar o mal se faz um grande alento para todos os componentes da sociedade brasileira.

Promover uma reflexão de compreensão a respeito da aplicação da justiça restaurativa no ordenamento jurídico brasileiro foi o ponto essencial desse trabalho, onde concluímos que a aplicação da justiça restauradora já se faz presente no cenário jurídico penal brasileiro e a cada dia avança mais rumo a se efetivar de forma ainda mais expressiva como um novo caminho a ser seguido para chegarmos a um vislumbramento da concretude de uma justiça que de fato seja justa para todos nós!

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Presidência da República. 5 de outubro de 1988. Brasília, DF BRASIL.

Estatuto da Criança e do Adolescente, Câmera dos Deputados, Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. DOU de 16/07/1990 – ECA. Brasília, DF.

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. 2ª edição. São Paulo: Martin Claret, 2008.

HULSMAN, Louk; CELIS, Jacqueline Bernat de. Penas perdidas; o sistema penal em questão. Trad. Maria Lucia Karan. 2ª edição. Nitérói: Luam, 1997.

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD). Justiça Restaurativa. Como a Justiça Restaurativa assegura a boa prática? Uma abordagem baseada em valores, p. 269.

NETO CARDOSO, Vilobaldo. Justiça restaurativa no brasil: Potencialildades e Impasses. 1ª edição. Rio de Janeiro: Revan, 2018.

SCURO NETO, Pedro, 2000. Manual de Sociologia Geral e Jurídica (4ª edição)

(São Paulo: Saraiva).

______________, 1999. “Justiça nas Escolas: A Função das Câmaras Restaurativas,” in Leoberto N. Brancher, Maristela M. Rodrigues e Alessandra G. Vieiraeds., O Direito é Aprender (Brasília: Fundescola/Projeto Nordeste/ MEC-BIRD).

ZEHR, Howard. Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça. São Paulo: Palas Athena, 2008.

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Elaborei esse artigo com o proposito de apresentar-ló como meu trabalho de conclusão de curso.

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