Capa da publicação Tráfico privilegiado: STF garante redução às “mulas”
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Lei sobre drogas e tráfico privilegiado.

Aplicação da redução da pena prevista no art. 33, § 4°, às “mulas do tráfico” internacional

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A aplicação do tráfico privilegiado às “mulas do tráfico” é juridicamente possível? O estudo mostra que, atendidos os requisitos legais, o STF reconhece a redução da pena.

Resumo: O presente estudo discorrerá sobre a aplicação da redução da pena disposta no artigo 33 parágrafo 4° da lei 13.343/2006 às “mulas do tráfico”. Diante disso, será abordado sobre as “mulas do tráfico”, a Lei de Drogas, os princípios fundamentais da dignidade humana; da proporcionalidade e da individualização da pena e, por fim, a apresentação de algumas divergências jurisprudenciais e doutrinarias sobre a possibilidade da incidência da causa de diminuição da pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de drogas às “mulas do tráfico” internacional. Tratou-se de estudo documental e bibliográfico, recapitulando divulgações sobre o assunto no período de 2003 a 2018. O objetivo do estudo é apresentar o direito a causa de diminuição de pena ao tráfico privilegiado às “mulas do tráfico”. Conclui-se que o Supremo Tribunal Federal assentiu que havendo o preenchimento de todos os critérios legais para o reconhecimento do tráfico privilegiado, o réu faz jus a aplicação da causa de diminuição de pena.

Palavras-chave: Lei de Drogas; mulas do tráfico; redução da pena.


1. INTRODUÇÃO

A Lei de Drogas trouxe inovações ao ordenamento jurídico brasileiro, no que concerne ao tráfico de drogas, foram inseridos novos verbos quanto às condutas dos agentes, se tratando de um perfil misto e alternativo, onde a realização de mais de uma dessas condutas não implicará em concurso de crimes, apenas um delito único. (BOMFIM, 2017)

A legislação citada encaminhou uma nova política sobre drogas, humanizando o tratamento dispensado àqueles que são usuários de entorpecentes, com a moderação e ajustamento das penas, impondo punições com propósito de reinserir na sociedade e reeducar, ademais, a legislação expôs o agravo das punições para as ações como tráfico ilícito de drogas, a lei de drogas ressaltou os crimes organizados, que atualmente são classificados como delitos transnacionais. (OLIVEIRA et al., 2008)

Pretende-se abordar sobre a possibilidade da aplicação da pena prevista no art. 33. parágrafo 4° da Lei de Drogas às “mulas do tráfico” internacional, dissertando sobre quem são esses sujeitos e o contexto que os envolvem, bem como sobre a Lei n° 13.343 de 2006.

Ainda será feito uma breve abordagem sobre os princípios fundamentais delimitados para este estudo, sendo eles: o princípio da dignidade humana; da proporcionalidade e da individualização da pena e, por fim, serão expostas algumas divergências jurisprudenciais e doutrinarias sobre a possibilidade da incidência da causa de diminuição da pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de drogas às “mulas do tráfico” internacional.


2. CONSIDERAÇÕES SOBRE AS MULAS NO TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS

Consoante a Salviano (2011), os indivíduos que transportam drogas em seus corpos, de modo interno, conscientemente ou não, nos limites territoriais internacionais são classificados como as “mulas do tráfico”. Esse transporte poderá ocorrer também em malas e/ou embalagens adulteradas que são guardadas dentro das bagagens, onde a condução desses produtos ilícitos é realizada a maioria das vezes nos aeroportos internacionais. A condução pode ocorrer de modo violento, onde, na maioria das situações, se coloca o carregador em risco de morte, tendo como exemplo a introdução da droga em orifícios ou a ingestão de capsulas.

Silva (2012), indaga que na maioria dos casos, as pessoas que realizam esse modo de condução, são indivíduos com baixo poder aquisitivo, com dívidas e, mesmo existindo outros meios para garantir sua sobrevivência, se submetem a essa situação. Em contrapartida, outros fazem por ambição e busca de dinheiro fácil.

Valer-se desse perfil de pessoas para os traficantes é propício por distanciar de fiscalizações e não levantar desconfianças, observado também que se uma dessas “mulas” for apreendida, os “prejuízos” para os traficantes serão baixos. (RODRIGUES, 2018)

As “mulas” estão expostas a diversas circunstâncias negativas, elas podem ser punidas pelos traficantes quando não conseguem realizar o acordo, ou mesmo mortas. Existe a possibilidade dessas pessoas serem presas, ou quem sabe, ligarem-se cada vez mais ao universo criminoso, ademais, a ingestão da droga gera graves riscos à saúde do sujeito, quando estes pacotes podem estourar dentro do corpo e, sendo assim, o óbito será imediato. (SILVA, 2012)

Segundo Bomfim (2017), no Brasil, as mulheres presas que fazem parte do tráfico de drogas chegam ao número de dez mil. Segundo a autora, um levantamento de dados da Polícia Federal, o Ministro das Relações Exteriores e o Departamento de Narcóticos de São Paulo mostra que quase 80% dessas mulheres têm características semelhantes, tais como: fazem parte da classe média, são jovens e belas. Elas aceitam transportar as drogas através de procedimentos cirúrgicos, ocultando sob a pele substâncias como cocaína. Segundo a autora, essas mulheres recebem o pagamento que pode chegar até a 15 mil dólares.

De acordo com Rodrigues (2018), houve uma intensificação das mulheres convocadas para conduzir essas drogas nos últimos anos. Tal circunstância pode ser explicada pela crença dos traficantes de que as jovens bonitas terão maior aprovação pela polícia ao tempo da fiscalização, outra explicação é a intensificação no país da máfia nigeriana.

As “mulas” são pessoas consideradas descartáveis pelo sistema de tráfico, constituindo mão de obra baixa e rápida. (BOMFIM, 2017)

A globalização econômica ocasiona reflexos no direito penal e na criminalidade, acarretando novos meios de práticas prejudiciais à sociedade, como exemplo a facilitação da atuação dos grupos organizados que frequentemente agem com auxílio de governos desonestos. Tais práticas prejudiciais acabam por se enquadrar em crimes tipificados. (COSTA, 2014)


3. DA LEI N° 13.343 DE 2006

Antes de adentrar na referida lei e nos pontos relevantes para este estudo, se faz necessário fazer breves considerações sobre o consumo de drogas e alguns impactos deste consumo, sendo assim, o consumo de drogas ilícitas é um dos graves problemas sociais da atualidade e que tem forte impacto nos índices da saúde da população. Estudos têm indicado que o consumo de drogas ilícitas está relacionado com o aumento dos índices de violência, criminalidade e de diversas doenças. (OLIVEIRA ET AL, 2008).

De acordo com Silveira (2014), podem-se considerar substâncias psicoativas, toda substância capaz de alterar o sistema nervoso central do ser humano. Ao consumir uma substância psicoativa, o corpo passa a ser afetado, desregulando as funções mentais e físicas dos indivíduos. Tais efeitos podem alterar o nível de percepção e consciência, comportamento, e até mesmo a capacidade motora sobre o corpo. Os efeitos temporários da ação das substâncias psicoativas podem em certa medida, produzir algum tipo de prazer, ou amenizar temporariamente algum sofrimento, contudo, e em função disso, certamente causará dependência química ao usuário.

De acordo com Lucchese et al (2017), as drogas ilícitas, estão entre as substâncias psicoativas que podem causar diversos riscos à saúde humana. De acordo com pesquisas realizadas, sabe-se que o processo de dependência química aumenta gradativamente, e que é muito comum que os usuários dessas drogas, passem a buscar drogas cada vez mais fortes para se satisfizerem, e/ou em outros casos, fazem o uso cada vez mais abusivo dessas substâncias. É possível notar que o aumento das doses das drogas ilícitas, afeta imediatamente o comportamento. É comum que o indivíduo sobre o efeito de algum tipo de droga possa apresentar comportamentos agressivos, hiperatividade, e em casos mais extremos, o usuário pode entrar em estados de paranoias, alucinações e delírios.

A lei de Drogas, lei n° 11.343/2006 é uma ferramenta importante para auxiliar com as medidas punitivas cabíveis aos fatos que envolvam as diversas formas de propagar as drogas. A referida legislação trouxe também inovações ao ordenamento jurídico brasileiro, no que concerne ao tráfico de drogas, foram inseridos novos verbos no art. 33. da referida lei, sendo atualmente 18 verbos de possíveis condutas, conforme exposto:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:

I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;

II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;

III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. (BRASIL, 2006)

Esta legislação direcionou uma nova política sobre drogas, humanizando o trato legal conferido àqueles que são usuários de entorpecentes, com a moderação e ajustamento das penas, impondo punições com propósito de reinserir na sociedade e reeducar, ademais, a legislação expôs o agravo das punições para as ações como tráfico ilícito de drogas. A lei de drogas ressaltou os crimes organizados, que atualmente são classificados como delitos transnacionais. (GRECO FILHO, 2009)

Faz-se necessário abordar a previsão legal que é destaque deste estudo, relacionado ao privilégio para redução da pena, conforme artigo 33, § 4º da lei de drogas, a seguir exposto:

§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos 1 , desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. (BRASIL, 2006)

Conforme apresentado, a disposição legal ressalta que o infrator deverá atender aos critérios do artigo 33, § 4º para que o magistrado confira a ele a pena reduzida de um sexto a dois terços, sendo eles: o autor ter bons antecedentes criminais, ser réu primário, não fazer parte de organização criminosa e não se dedicar às atuações criminosas. Algo muito relevante a se destacar é que, todos os critérios exigidos no artigo devem ser preenchidos para se obter a pena reduzida, se apenas um desses critérios não for atendido, resultará na não autorização da redução da pena. (GRECO FILHO, 2009)

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A Lei de drogas criou um meio para distinguir o macrotraficante do microtraficante, sendo aquele, quem coordena e tem acesso a grandes valores monetários, controlando a organização criminosa, e os microtraficantes os que recebem ordens e são usados pelos macrotraficantes, como exemplo destes, as “mulas” e outros. (LIMA, 2016)


4. BREVES CONSIDERAÇÕES AOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

4.1. Da Dignidade Humana

A dignidade humana é por princípio inerente a todos os homens, uma vez que todos são iguais em direitos. Mesmo considerando as diferenças sociais, culturais, físicas, psicológicas e intelectuais, todas as pessoas à luz do direito são iguais na sua dignidade. (DALLARI, 2004)

O conjunto dos direitos essenciais é o que compõe a dignidade humana. E tais direitos essenciais devem ser compartilhados de forma igualitária por todos os homens. Balizada pelo fundamento da autonomia de vontade, do pensar, do sentir, do criar, de se comunicar, os homens podem exercer com dignidade a sua cidadania. (DALVI, 2008)

O princípio da dignidade humana segundo o autor Sarlet (2010) é inviolável, e esta pertence aos homens em igual proporção. O direito à dignidade e o acesso ao conjunto dos direitos essenciais e existenciais independem inclusive da conduta do homem. Mesmo aqueles que moralmente e juridicamente transgridam as normas e leis, são detentores dos mesmos princípios da dignidade humana que gozam aqueles que têm uma conduta ilibada.

Assim, a defesa da dignidade deve ser um ato de solidariedade entre os homens. Considerando o princípio de igualdade de interesses, se solidarizar com aqueles que têm a sua dignidade ameaçada, é estar defendendo o próprio princípio de igualdade de interesses, porque outrora pode ser que aquele que se solidarizou tenha sua dignidade ameaçada. Dessa forma, a construção de uma mentalidade social, onde homens sejam contumazes defensores da dignidade é uma maneira de se criar uma rede de proteção coletiva entre os homens. (COMTE, 2002)

De acordo com o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”. Fica evidente que a defesa da dignidade humana é um princípio que deve ser empreendido de forma coletiva e fraterna. Assim, a luta por igualdade de direitos são caminhos que podem garantir a liberdade e a dignidade das pessoas. (RODRIGUES, 2018)

O homem contemporâneo deve ser um homem coletivo, de acordo com o autor Ferreira Filho (2005), cada vez mais, o homem contemporâneo está afastado do seu estado selvagem. Os princípios éticos e morais constituem o bem viver entre os homens. As leis, as normas e condutas sociais devem garantir que o homem tenha uma vida digna.

Não por acaso, Nietszche (2007, p. 61), afirma que, a construção da moral, são elementos que diferenciam os homens dos animais. Ao se estabelecer a conduta, a moral aprisiona os instintos:

A fera em nós precisa ser enganada: a moral é uma mentira para que sejamos dilacerados por ela sem os erros que se encontram nos dados da moral, o homem teria permanecido animal. Assim, porém, se tomou por algo superior e se impôs leis mais severas.

A moralidade então incita os homens a viver conforme o bem, segundo as virtudes. O bem e as virtudes neste sentido devem ser vivenciados, a partir de uma perspectiva de coletividade. O agir conforme o bem, portanto, é assumir posturas e condutas, que não agridam o conjunto da sociedade em que se vive. As virtudes são colocadas a serviço do grupo social. (DALVI, 2008)

Assim, as regras da moralidade, muitas vezes são construídas pelas ideologias dominantes de uma determinada época ou sociedade, e estas devem ser vivenciadas no conjunto da sociedade em suas diversas instâncias. (COMTE, 2002)

O homem na perspectiva Kantiana não pode ser massa de manobra de interesses particulares. O fundamento da ética defendida por Emmanuel Kant entende o homem como fim de todas as coisas, e não como meio. Dessa forma, as relações humanas não se tratam de usar do outro como objeto ou coisa como meio para se alcançar objetivos particulares. O homem como fim, é ter uma visão solidária e comprometida com a sociedade. A defesa da dignidade do outro é a defesa da dignidade de todos. (KANT, 2003)

Assim, sobre o princípio da dignidade da pessoa humana, pode-se levantar algumas controvérsias. Uma delas seria o fato de sustentar se os indivíduos que cometerem condutas ilícitas ou imorais estariam destituídos de dignidade. Isso posto, nota-se que existe um sentimento social, nem sempre exposto, que deveria ser excepcional para algumas pessoas o direito a dignidade humana, entendimento do homem médio que fica evidente ser incompatível com as disposições jurídicas e políticas do Estado Democrático de Direito. (FERREIRA FILHO, 2005)

4.2. Proporcionalidade

Segundo Araújo (2011), a aplicação da redução da pena, conforme exposto na disposição legal ressalta que o infrator deverá atender aos critérios do artigo 33, § 4º para que o magistrado confira a ele a pena reduzida de um sexto a dois terços, sendo eles, conforme já exposto: o autor ter bons antecedentes criminais, ser réu primário, não fazer parte de organização criminosa e não se dedicar às atuações criminosas. Algo muito relevante a se destacar é que, todos os critérios exigidos no artigo devem ser preenchidos para se obter a pena reduzida, se apenas um desses critérios não for atendido, resultará na não autorização da redução da pena. Tais critérios realçam a viabilidade de aplicação de pena mínima de cinco anos.

No HC 111.840/ES, o Plenário do Supremo Tribunal Federal dispôs sobre a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, onde determina a aplicação do regime fechado inicial aos crimes hediondos, considera-se que o regime inicial raramente será mais gravoso que o semiaberto nas circunstâncias de crime de tráfico de entorpecentes a que se empregam os critérios de redução do § 4º do art. 33. da Lei 11.343/06. (BRASIL, 2012)

Pode-se inferir que a sanção disposta ao crime de tráfico de drogas com os critérios de redução da pena, envolve bons antecedentes criminais e ser réu primário, assim, ocorrerá a determinação de penalidades que oscilam de dois a três anos e raramente excedem quatro anos, firmando-se em regime inicial aberto ou semiaberto no máximo, substituindo a punição corporal por penalidades restritivas de direitos na maior parte das situações. Assim, o STF determinou a inconstitucionalidade da proibição legal. Para que se possa substituir a sanção corporal por penalidades restritivas de direitos, determinou também a inconstitucionalidade da exigência do regime inicial fechado e que a natureza e a quantidade de entorpecentes apreendidos não sejam pesados para determinação da pena-base e da fração de redução. (ARAÚJO, 2011)

O princípio da proporcionalidade segundo o autor Silva (2012), está sendo ferido ao atribuir ao tráfico de drogas e ao que se dispõe na previsão da minorante aqui estudada o mesmo trato conferido aos crimes hediondos. O princípio da proporcionalidade proíbe o excesso. Tal proibição é proveniente do Estado Democrático de Direito e do devido processo legal, que são disposições constitucionais, conforme exposto: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito [...]”.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. (BRASIL, 1988)

A atribuição conferida aos crimes hediondos é contraditória com as implicações penais conferidas ao infrator de bons antecedentes criminais e réu primário. (ARAÚJO, 2011)

Sob o prisma do princípio constitucional da proporcionalidade, será incompatível o tratamento como crime hediondo ao crime de tráfico de entorpecentes a que se aplica o § 4º do art. 33. da Lei de drogas. (VALE, 2009)

Atribuir a classificação de hediondo às ações do condutor de drogas não será proporcional. A ação das mulas, o tráfico privilegiado, para o autor não parece viável equiparar à gravidade da hediondez. (ARAÚJO, 2011)

4.3. A Individualização da Pena

Na Constituição da República Federal de 1988, em seu artigo 5.º, XLVI está descrito sobre o princípio da individualização:

Art. 5º. [...]

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a) privação ou restrição da liberdade;

b) perda de bens;

c) multa;

d) prestação social alternativa;

e) suspensão ou interdição de direitos. (BRASIL, 1988)

O autor Cleber Masson (2011) relata que tal disposição legal expõe que a penalidade será conferida ao infrator de modo personalíssimo, ou seja, levará em conta critérios individuais e subjetivos de cada caso. O texto legal do artigo 5°, XLVI da Carta Magna descansa sobre o princípio da justiça, onde cada pessoa receberá de acordo à sua conduta, levando-se em conta os critérios subjetivos e objetivos do delito. Tal princípio deverá orientar a dosimetria da pena, de maneira individual, para que se previna o ato injusto.

Para Machado (2010), o princípio da individualização da pena encontra-se nas esferas judiciais, legislativas e administrativas.

Na primeira fase legislativa, a punição ocorrerá de acordo à gravidade da infração penal, quanto mais severa a ação do infrator, maior será sua punição, ou poderá também ser mais branda conforme for menor a gravidade da ação delituosa. Assim, o STF decidiu no HC 118.533, que o tráfico privilegiado não integra quadro de crimes hediondos, bem como declarou ser inconstitucional o impedimento das penas alternativas no que concerne ao disposto no art. 44. da Lei de drogas. (BRASIL, 2016)

A segunda fase é a da individualização judicial, onde compete ao magistrado julgar e realizar a aplicação da sentença penal, se valendo dos meios fornecidos para fixar a pena, de acordo com art. 59. do Código Penal Brasileiro, que diz:

Art. 59. - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

O magistrado deverá observar os artigos 49 e 68 do Código Penal Brasileiro para obter o valor na penalidade de multa e ao cálculo corretamente. É nessa etapa que as “mulas do tráfico” são afetadas, visto que alguns juízes não estão alerta a todos os critérios na hora da aplicação da punição. Por fim, a fase administrativa, onde o Estado tutelará o direito de cada condenado, visando atenção na punição, na prevenção e na ressocialização, por meio da individualização da execução penal, que está na Lei de Execuções Penais. (LUZ, 2018)

O Estado deveria evitar o número de encarceramento em massa. O Ministro Ricardo Lewandowski, no HC 118.533 dispôs:

O InfoPen, do Ministério da Justiça, colacionou algumas informações, que datam de dezembro de 2004, e dão conta – e os números impressionam – que, entre as já 622.202 pessoas em situação de privação de liberdade, homens e mulheres, 28%, mais precisamente 174.216 presos ali estão por força de condenações decorrentes da aplicação da Lei de Drogas. Portanto, quase 30% desses mais de 600.000 estão presos por tráfico de drogas. Esse porcentual, se analisado sob a perspectiva do recorte de gênero, revela uma realidade ainda mais brutal: 68% são mulheres encarceradas. E hoje nós temos a quinta maior população do planeta, levando em conta o número de mulheres presas, que estão envolvidas com tipos penais de tráfico de entorpecentes ou associação para o tráfico. (BRASIL, 2017)

A demanda do sistema penitenciário poderia ser amenizada se observados os critérios da aplicação do tráfico privilegiado para os condutores de entorpecentes, em observância ao parágrafo 4.º, do artigo 33, da lei de drogas. (BRASIL, 2016)

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Sobre os autores
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Gabriela Lopes dos Santos

Palestrante da Feira Virtual do Livro da França e dos Estados Unidos, na primeira, falou da vida e obra do romancista Francês Victor Hugo e na última sobre a vida e obra de Lygia Fagundes Telles. Já participou das feiras do livro do Perú e do Uruguai. Ela é Dra. Honoris Causa em Comunicação Social pela Organização Mundial dos Defensores dos Direitos Humanos, signatária do Pacto Global da ONU; Dra. Honoris Causa em Intercâmbio Cultural Brasil-África; Certificação da Academy do Pacto Global da ONU sobre Igualdade de Gênero; Pós em Direitos Humanos; Direito Constitucional; Bacharela em Direitos Humanos com ênfase em ciências sociais pela OMDDH. Bacharela em Direito pela Faculdade UNIPAC, Campus de Teófilo Otoni. Capacitação em mediação e conciliação pelo Fórum Desembargador Eustáquio Peixoto; Experiência no Ministério Público de Minas Gerais em estágio de pós-graduação na Coordenadoria Regional das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente da Bacia do Rio Doce (Governador Valadares), atendendo 140 municípios; Experiência com Inquérito policial na Delegacia da Mulher de Teófilo Otoni. Membro da Cultive Art Littérature et Solidarite de Genebra. Membro de academias de letras nacionais e internacionais; Presidente do Instituto AMMAR MINAS e do Instituto LEX BRASIL; Diretora da Editions Cultive de Genebra; Autora de 6 livros literários, |Organizadora de 2 coletâneas cientificas internacionais; Coordenadora da Revista Científica Multidisciplinar do Instituto Nelson Mandela de Angola- África; Participação do V Simpósio de Português como língua de herança do Japão- Realizado pelo Consulado Geral do Brasil em Hamamatsu no Japão e pelo Internacional Institute of Education and Culture; ganhadora de 34 premiações nas esferas literárias, acadêmicas e artísticas no Brasil e no exterior.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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