Transfobia e Direito

Âmbito Nacional

25/02/2020 às 01:47
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A análise de Yuri Actis neste artigo busca tecer a transfobia, elucidar a desmistificação das transgeneralidades diante das novas perspectivas de ideologia de gênero e identidade de gênero, visando de toda forma problematizar a prática criminosa e a lei.

1.  Introdução; 2.   Referencial Teórico; 2.1 Definição Epistemológica: Transfobia; 2.2 Transfobia: Equívocos Científicos Justificativos; 2.3. Diferença entre Homofobia e Transfobia; 2.4 Demistificação das Novas Ideologias: Ideologia de Gênero e Identidade de Gênero; 2.5 Transgeneralidades: Diferença entre Transgênero, Transexual e Travesti; 2.6 Aplicabilidade Legislativa da Transfobia; 2.7   Tentativa de Manifestação e Informatização: Mandado de Injunção 4733-DF; 2.8 Exemplo de Política Pública: Inserção no Mercado de Trabalho; 3. Considerações Finais; 4.  Referências Bibliográficas.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

  1. IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
  2. LGBT: sigla que representa a comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros.
  3. OMS: Organização Mundial de Saúde.
  4. ONG: Organização Não Governamental.
  5. TGEU: Trangender Europe, rede europeia de organizações que apoia os direitos da população transgênera.
  6. TRANS: Termo utilizado para caracterizar uma comunidade ou indivíduo que se insere na cultura transgênera.
  7. GGB: Grupo Gay da Bahia.
  8. STF: Supremo Tribunal Federal.
  9. ABGLT: Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros.

 

Resumo

            O seguinte artigo tem como referência definir a transfobia, elucidar a desmistificação das transgeneralidades diante das novas perspectivas de ideologia de gênero e identidade de gênero, visando de toda forma problematizar a prática criminosa que não é pleiteada diretamente pela legislação brasileira. Em síntese, busca teorizar respostas e sugestões para resolução do problema. A temática abordada tem como foco retratar a prática delituosa aos transgêneros (transexuais e travestis), os danos que podem ser causados às vítimas, sejam físicos ou psíquicos, assim como abordar os fatores de causa e efeito da legislação vigente, trazer em discurso a justificativa da preocupação para existência da tipificação específica da conduta, a qual não é diretamente criminalizada. Apresentando argumentos e posicionamentos, busca-se, por manifestação, a tutela do direito que é constantemente ameaçada, o que será comprovado diante de índices e estatísticas, retratados em instância filosóficas e sociológicas para complementar o esclarecimento diante das diferenças e aleatoriedades das questões de gênero.

 

Palavras Chave: Transfobia – Direito – Desmistificação

        1.  INTRODUÇÃO

               A seguinte composição tem como meta entender e analisar a transfobia na sociedade contemporânea. De forma característica, buscará definir a prática criminal, seu enquadramento na lei brasileira, a desmistificação das vítimas, cujo busca-se problematizar quais medidas sociais e jurídicas foram aplicadas de forma eficaz para o combate à transfobia no país, trazendo de forma apodítica hipóteses educacionais. Sendo assim, a transgeneralidade explicada entre os transgêneros, travestis e transexuais, serão tecidas e exemplificadas em metodologias que buscam originalmente no âmbito social designar a solução do conflito, de medidas sociais e jurídicas (equidades legislativas e políticas públicas) para o desenvolvimento social diante das diferenças, exemplificando então as tentativas entre mandados de injunção, manifestações indiretas e posicionamentos doutrinários. A caracterização da temática está na premissa de trazer em síntese o que é a ideologia de gênero em comparação com a identidade de gênero, com isso, busca-se desenvolver uma supressão ao preconceito referente aos indivíduos que se determinam transgêneros definindo suas ramificações, logo, em coerência doutrinária será examinado as tentativas de manifestação e informatização para com a sociedade entre os alicerces do poder legislativo (dentre eles está o mandado de injunção para agravo da pena de homofobia) e executivo (políticas públicas para inserção do transgênero no mercado de trabalho), desenvolvendo então uma linha de silogismo para que as questões transfóbicas sejam elucidadas visando suprimir “prenoções” equívocas e que a causa seja uma veneração às concepções de igualdade social.

2.  Referencial Teórico

2.1 Definição Epistemológica: Transfobia

            A temática central é intitulada de diversas definições pelos arredores digitais e acadêmicos, as novas perspectivas de ideologia e identidade de gênero ainda trazem incertezas, dúvidas e disparidades teóricas no âmbito nacional para explicar o fator da transgeneralidade e o preconceito emitido às vítimas. Para Dantielli (2015), autor que reverbera as modalidades de enciclopédias discursivas, busca definir a Transfobia como:

Violência de gênero, baseada em relações de poder, colocadas em evidência em uma sociedade que sustenta o gênero masculino (homem) como elemento constituidor da ideologia dominante que interpela os indivíduos para constituí-los como sujeito-mulher, sujeito-homossexual, sujeito-bissexual, sujeito-transgênero.

Sabe-se que nos índices criminais ainda perduram na realização criminal (transfóbica) diante de diversas ramificações e características, gerando imensuráveis danos psicológicos, físicos e até a morte entre as vítimas da Transfobia. De acordo com Jaqueline Gomes, a mesma é uma aversão sem controle, repugnância entre relações intrínsecas de ódio e preconceito contra grupos ou pessoas de determinado grupo com identidades de gênero denominados transexuais, trasvestis e outros, os quais serão conceituados no decorrer do trabalho. A conduta do agente que realiza o ato não é limitada a níveis de discriminação (podem ser ilimitados tanto para a conduta quanto para o efeito), como supracitado, os atos incorrem sempre atrelados a negações de direitos, sofrimentos, circunstâncias fora dos padrões de conforto social. Destarte, os grupos atrelados aos transgêneros que serão inframencionados, tramitam-se como tópicos fundamentais para entendimento da temática e resolução hipotética do problema, discriminação e preconceito.

2.2 Transfobia: Equívocos Científicos Justificativos

É devido salientar que grande parte da sociedade que se insere na  defesa de igualdade de gênero, desenvolvimento social, e afins têm dificuldade de desmistificar as diferenças entre a identidade de gênero que adentram no conhecimento próprio e suas defesas ideológicas, sendo assim, as desmistificação dos transgêneros é uma problemática que precisa ser suprida para que o preconceito deixe de reverberar entre as gerações atuais e futuras.

A Psicologia surgida como ciência no contexto positivista da sociedade ocidental por volta do século XIX, trouxe uma ambição em ordenar o mundo a partir de denominações, classificações do que seria recomendável (normal) ou não; essa errônea função pode ser considerada como uma das justificativas iniciais para a intensificação do preconceito no período atual, como se pode perceber a partir da determinação de Foucault (1988) com seus discurso médico-legal, condizia que as práticas sexuais ou opções condenadas eram aquelas consideradas “contra a natureza”, insistiam desviar a lógica do sexo e da procriação, veiculando através do argumento que existe uma prática decente e saudável da sexualidade. O “contra a natureza” trazia uma interpretação explícita para “contra a lei”, que acabavam violando decretos tão sagrados como o casamento, estabelecidos para reger a ordem das coisas e dos seres.

Apesar de existirem organizações que se envolvem ao estudo da prática transfóbica, não se debruçaram completamente diante dos fatores históricos para sua explicação até o momento, ciente o fato da homossexualidade ser retirada do rol de doenças mentais da OMS nos anos 90,  e que a Transfobia recai principalmente em vítimas Transexuais, existem relações científicas que corroboram com contestações e definições doutrinárias ao enaltecer as diferenças como “distúrbio”, como por exemplo o conceito de transexualidade explanado pelo Dicionário de Psicanálise:

“transexualidade é um distúrbio puramente psíquico da identidade sexual, caracterizado pela convicção inabalável que tem um sujeito de pertencer ao sexo oposto” [...] para aliviar o sofrimento dos pacientes, “um tratamento hormonal e uma experiência de vida social, durante um prazo mínimo de seis meses, nos moldes do sexo desejado”. (ROUDINESCO 1998 p. 764); 

É perceptível na citação supracitada um posicionamento médico-psicanalítico que em rol moral traz insatisfação perante a comunidade transgênera, destarte o comentário proveniente e influente dos estudos mentais da ciência humana considera como “distúrbio” o que a sociedade trans naturaliza como normal no teor da sua consciência, sendo assim é necessário compreender não a penas a definição dos ramos científicos que buscam caracterizar assertivamente uma condição ou uma opção rotulada como “anormal” mas também as categorias que estão encaixadas na anatomia de formal real e interna.

            2.3  Diferença entre Homofobia e Transfobia

A Transfobia é considerada e confundida erroneamente como sinônimo de homofobia, e desde já é necessário diferenciar a forma de discriminação entre ambas. Para tanto Escórcio (2015) ressalta inicialmente a definição de Homofobia:

É o termo geral normalmente utilizado para se referir ao preconceito e à discriminação em razão de orientação sexual. No caso, pessoas que sentem-se atraídas por pessoas do mesmo sexo (gays, lésbicas ou bissexuais). Orientação sexual nada mais é do que a atração afetiva e/ou sexual que uma pessoa manifesta em realção à outra, para quem se direciona, involuntariamente, o seu desejo. Lembrando que não existe OPÇÃO SEXUAL, pois não trata-se de uma escolha. [sic].

 

            O entendimento da homofobia fica ligado à orientação sexual do indivíduo, de forma direta à atração física-afetiva. A forma identificada como espécime de rejeição, aversão, desprezo e impugnação de forma direta ou indireta aos indivíduos que estão adstritos na necessidade de serem reconhecidos como próprios e indiferentes da sociedade atual. Sendo reconhecida como um determinado medo irracional, diante da homossexualidade ou pessoa homossexual podendo muitas vezes utilizar da prática de influir inferioridade à vítima e até mesmo violência física ou verbal para repelir a insatisfação do mal interpretado, uma “anormalidade” diante da sociedade de acordo com Juliana Spinelli (2017), que reverbera o homofóbico como indivíduo que vê patologias ao homossexual.

Portanto em necessidade doutrinária de desmistificação é devido definir a Transfobia não como uma repulsa à orientação sexual, e sim em termos da identidade de gênero, que se recai em Travestis, Transexuais e Transgêneros, podendo ser esclarecido da seguinte forma:

[...] preconceito e a discriminação em razão da identidade de gênero, contra travestis e transexuais. Uma pessoa transexual possui uma identidade de gênero diferente do seu sexo biológico. Uma travesti nasce com o sexo biológico dito como masculino e tem identidade de gênero feminina, assumindo papéis de gênero diferentes daqueles impostos pela sociedade. A diferença entre ambos é que uma travesti não vê a necessidade de realizar uma cirurgia de redesignação de sexo. Ela não se incomoda com a existência de seu órgão genital.  (ESCÓRCIO, 2015).

 

            A aplicabilidade passiva da conduta Transfóbica recai entre as Transgeneralidades que serão definidas no decorrer da obra, mas desde então diferencia-se a Homofobia como sendo ligada à orientação sexual e a Transfobia à identidade de gênero. E por isso, será trazida a definição das diferenças em questão para que a síntese da problemática tenha coerência até o decorrer final do texto.~

2.4  Desmistificação das Novas Ideologias: Ideologia de Gênero e Identidade de Gênero

Para entender em quem recorre o sofrimento diante da Transfobia é necessário compreender em que ramificação cultural a vítima se encaixa, na sociedade contemporânea ocorreram embates doutrinários entre Ciência e a Cultura LGBT que tentara estabelecer uma nova ideia-teoria: a Ideologia de Gênero, que de acordo com LIMA (2015), teóricos da mesma afirmam que “ninguém nasce homem ou mulher”, onde os gêneros são construções sociais e que cada indivíduo deve construir sua própria identidade, independente do que a biologia determinasse em tendências.

De acordo com os autores supracitados, a Identidade de Gênero é relacionado não à uma construção propriamente dita como social, mas como o próprio nome diz à identificação própria do indivíduo, o gênero no qual a pessoa se identifica (seja homem ou mulher ou qualquer aleatoriedade relacionada ao papel social do gênero. De acordo com GROSSI (2017) a identidade de gênero “remete à constituição do sentimento individual de identidade”.

2.5 Transgeneralidades: Diferença entre Transgênero, Transexual e Travesti

Em suma, a transgeneralidade é uma espécie de “guarda-chuva” que abarca várias pessoas que, ao contrário das pessoas cisgênero -  que se identificam com sua identidade biológica - não se identificam com o gênero que foi atribuído ao seu nascimento. De acordo com Berg-Weger (2016) a “Transgêneros são pessoas que têm uma identidade de gênero, ou expressão de gênero diferente de seu sexo atribuído.” O transgênero também é um termo abrangente: além de incluir pessoas cuja identidade de gênero é o oposto do sexo atribuído (homens trans e mulheres trans), pode incluir pessoas que não são exclusivamente masculinas ou femininas (pessoas que são genderqueer, por exemplo, bigênero, pangênero, genderfluid ou agênero).

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O Transexual recai em outra delimitação, na condição, como ressalta Luiza Carla (2010):

Refere-se à condição do indivíduo cuja identidade de gênero difere daquela designada no nascimento e que procura fazer a transição para o gênero oposto através de intervenção médica, podendo ser redesignação sexual ou apenas feminilização/masculinização dependendo do gênero a ser transicionado (administração de hormônios e cirurgia de redesignação sexual).

A questão é que os avanços médicos permitiram que mulheres e homens transexuais pudessem adquirir uma fisiologia quase idêntica à de mulheres e homens genéticos/biológicos. Há várias definições clínicas que descrevem a condição. Em simplificação, pode ser dito que as pessoas transexuais lidam de formas diferentes, e em diferentes graus, com o gênero ao qual se identificam. Uma parte das pessoas transexuais reconhece essa condição desde pequenas, outras tardiamente, pelas mais diferentes razões, em especial as sociais, como a repressão. A resposta mais simples e completa que define as pessoas transexuais é a de que: a mulher transexual é toda pessoa que reivindica o reconhecimento como mulher. E o homem transexual é toda pessoa que reivindica o reconhecimento como homem.

O Travesti pode ser identificado como “pessoa que vivencia papéis de gênero feminino, mas não se reconhece como homem ou mulher, entendendo-se como integrante de um terceiro gênero ou de um não gênero” (CASSEMIRO, 2010). Na maioria de suas expressões, a travestilidade se manifesta em pessoas designadas do gênero masculino no nascimento, mas que objetivam a construção do feminino, através de suas roupas, acessórios, e até procedimentos estéticos, mas, não cirúrgicos.

Isso faz com que a transsexualidade e a travestilidade estejam sob o “guarda-chuva” conceitual da transgeneralidade e se tornem uma espécie de subtipo desta. Essas se referem à vivencia do gênero como identidade. A transexualidade é uma questão de identidade, logo não se relaciona com a orientação sexual. Ela é identificada pelo sujeito. Quanto à condição da Travestilidade, cumpre ressaltar que a denominação travesti é estigmatizada. Tem-se discutido a sua utilidade no mundo contemporâneo, quando se entende que as pessoas transgênero não se “travestem” no sentido original da terminologia, e que há os termos transexual e crossdresser para se referir a dimensões melhor definidas da vivência transgênero.

A transgeneralidade ainda traz em seu seio a vivência do gênero como funcionalidade, o que engloba ao seu guarda chuva diversas ramificações definidas pela Aliança de Gays e Lésbicas Contra Difamação (2010), Em primeira instância, foram definidos como crossdressers - pessoas que vestem roupa ou usam objectos associados ao sexo oposto, como por exemplo: joias, perucas, perfumes, maquiagens, por qualquer uma de muitas razões, desde vivenciar uma faceta feminina (para os homens), masculina (para as mulheres), motivos profissionais, para obter gratificação sexual, ou outras - drag queens/drag kings (transformistas) - a pessoa que se veste com roupas exageradas femininas estilizadas e drag king a pessoa que se veste como homem. A transformação em drag queen (ou king) geralmente envolve, por parte do artista, a criação de um personagem caracteristicamente cômico e/ou exagerado.

Estes trazem em seu bojo, não a identificação em sua identidade transgênero, mas a funcionalidade de uma transgeneralidade momentânea para satisfazer algum desejo pessoal, sexual ou não. A questão a evidenciar, que apesar de desconhecido os termos e diferenças ideológicas de gênero na sociedade, a forma normativa de se tutelar os direitos contra o preconceito e discriminação agressiva dos indivíduos que estão na égide dessa vivência é uma problemática que busca ser resolvida.

2.6 Aplicabilidade Legislativa da Transfobia: Fundamentos em Prol da Criminalização da Transfobia

         O Brasil é conhecido como o país que mais mata travestis no mundo, de acordo com os índices infra mencionados, entre janeiro de 2008 e março de 2014 foram registradas 604 mortes de travestis no país, segundo a pesquisa da organização não governamental (ONG), a TGEU, rede europeia de organizações que apoia os direitos da população transgênera. Também é confirmado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, corroboração ao crescimento no índice da violência, visto que ratificaram as famosas denúncias do GGB, pelo qual a cada dia uma pessoa LGBT é morta no Brasil a cada 28 horas por homofobia ou transfobia.

A ordem legislativa atual reconhece a prática da Transfobia inserida no crime de Injúria, coincidente ao artigo 140 do CPB, identificado como crime contra honra subjetiva (interna, amor próprio do agente), que se consuma com a ofensa direta ao ofendido (percepção expressa ou tácita). Proveniente o encaixe da interpretação hermenêutica, e que de forma crítica é ressaltada como uma falha para o combate à conduta e uma verdadeira conscientização social, para o autor Paulo Roberto (2016), a Transfobia tipificada no crime de injúria não traz à sociedade uma informatização digna de tutelar a igualdade da identidade de gênero entre os indivíduos que se inserem na cultura ideológica, pois nesse caso “os demais ramos do Direito não têm se mostrado aptos a punir eficientemente homofobia e transfobia”, quando atrelados uma fraca denominação e sanção Penal, para o mesmo, condiz a hipotética solução: 

Defendemos que primeiro inclua-se “orientação sexual” e “identidade de gênero” na atual Lei de Racismo (Lei n.º 7.716/89) – cujas penas são de até 3 anos e, assim, via de regra (como explicado), já admitem penas alternativas, para, somente depois, discutir-se uma reforma estrutural em todo o sistema penal. (VECCHIATTI. 2016)

 Supramencionado, a sociedade só reconhece e respeita um Direito quando ele é claro, objetivo e “verdadeiramente avisado para ser tutelado”, e dentro desse contexto é possível explanar diversas formas de manifestação direta ou indireta para que a Transfobia seja assertivamente tipificada, reconhecida como conduta grave e de efeitos intransigíveis às vítimas.

2.7 Tentativa de Manifestação e Informatização: Mandado de Injunção 4733-DF

Em 14 de setembro de 2016, foi inserido em discussão o Mandado de Injunção 4733-DF, onde Procurador Geral da República Rodrigo Janot deu o parecer enviando ao STF a afirmação de que a Homofobia e Transfobia deveriam ser considerados crimes conforme o racismo diante da impetração da ABGLT. Dentre argumentos de igualdade constitucional, foi solicitado a criminalização específica dos mesmos, considerando a declaração dos incisos XLI e XLII do Art. 5º da Constituição Federal como uma norma que não pretende assegurar completamente o direito concreto, os pedidos não foram concedidos pelos iminentes Ministros, dentre eles o Ministro Relator Ricardo Lewandoswski ressaltou que “não há em jogo direito subjetivo especificamente consagrado na Carta Magna cuja fruição esteja sendo obstada pela ausência de regulamentação legal”, em escala é percebido que não há ausência de norma regulamentadora para ele no sentido implícito da interpretação. Porém, a medida reverberou nos estudos sociais para reflexão majoritária da temática, para uma futura e mais expositiva contestação.

2.8 Exemplo de Política Pública: Inserção no Mercado de Trabalho

            A luta contra homotransfobia, em crescente atividade no Brasil, seguida de manifestações culturais, paradas LGBT, comunicações sobre igualdade de gênero, feminismo, possibilitou a abertura de organizações não governamentais que se especializassem na discussão transgênera para proteção e explicação das diferenças ao público desconhecido. Fora isso, já existem políticas públicas que buscam trazer benefícios aos transgêneros na escala do mercado de trabalho, como por exemplo, as medidas legislativas que visam eliminar a discriminação na contratação como a Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho que faz a seguinte afirmação:

“Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.” (BRASIL,2006, p.20)

É perceptível que a classe transgênera no mercado de trabalho é dominada e cerceada pelo preconceito e a discriminação, as medidas protetivas com políticas públicas também influenciam na melhoria e o combate à prática abusiva, como define Barros, a conscientização se aplica quando não só a classe passiva, mas a gestão também se adapta ás inovações culturais:

“O empregador deve limitar-se a obter dados somente no que se refere à capacidade profissional do empregado. Quando aquele que não se contenta em receber dados profissionais do candidato ao emprego e decide invadir a vida privada deste, por investigar as suas características pessoais, sem qualquer conexão com a natureza da prestação de serviços ou com a organização do trabalho, restará clara a conduta discriminatória praticada pelo empregador.” (BARROS, 2009, p.61)

Dentro da perspectiva geral, a sociedade é considerada patriarcal, prevalecedora de atitudes que visam ressaltar um padrão de comportamento, sendo assim, é necessário sempre contribuir para a desconstrução de visões conservadoras e nocivas à política social, e a inserção no mercado de trabalho a partir de políticas públicas não é uma premissa que deve ser economizada.

3.   Considerações Finais

          Os conceitos supracitados foram essenciais para explicar a definição individual de cada termo diante do tema central, contudo, a essência do Combate à Transfobia está não está apenas dogmática da sociologia, psicologia e filosofia, mas na ação efetiva para o seu combate - tipificação específica na legislação brasileira e Políticas Públicas para reflexão das diferenças convergentes. A Transfobia se decorre na supracitada impugnação do indivíduo transgênero na sociedade, diante da perda do direito que deveria ser explicitamente tutelado no código para que não ocorresse a explanação do preconceito diante das gerações presente e futuras, é realmente necessário compreender que o Direito Penal apesar de trazer na legislação vigente na tipificação para a Injúria, não se declara pertinente para quem pratica ou para a sociedade consuetudinária que desconhece a Lei em sua matéria de detalhe, justificando-se que em princípio a legislação específica traria maior brevidade para resolução e julgamento dos méritos, a explanação da temática para a cultura social contemporânea, assim como a facilidade para aplicação de políticas públicas diante da opressão marginalizada do conhecimento. Sendo assim, o propósito de trazer uma legislação mais incisiva e consistente, farão com que as pessoas tendo a possibilidade de saber  que a conduta de homofobia e transfobia existem e diferenciam-se, que as penas poderão ser impostas coercitivamente de forma mais grave, trará uma noção de estudo moral e ético na sociedade, produzindo então novos efeitos sociais atrelados à premissas de igualdade e desenvolvimento social diante das diferenças, uma visão em parte altruística que visa estabelecer asserções de segurança jurídica e tutela dos direitos. Não adianta utilizar-se do direito e da hermenêutica, da legislação implícita aos jurisprudentes se a sociedade que é o fulcro da reverência à lei não compreender suas intencionalidades e prevenções, mas desde já salientando que o agravamento da legislação não teria razão de se adentrar no catálogo racial, pois o lapso contextual fugiria da proposição (histórica-racial), mas em uma pauta ideológica ao gênero e suas ramificações.

 

  1. Referências  Bibliográficas

ARAUJO. Thiago. Assassinatos ao Gays do Brasil. Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/2014/02/13/assassinatos-gay-brasil_n_4784025.html> Acessado em 10 de Nov. de 2017 às 01:06.

BARROS, A. M. de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: LTr, 2009

Bento, Berenice. (2008). O que é transexualidade. São Paulo: Brasiliense.

BRASIL, Ministério do Trabalho. Programa Brasil, Gênero e Raça: Orientações Gerais. Brasília: Ministério do Trabalho, 2006.

CASSEMIRO, Luiza Carla. Travestilidade, Transexualidade: revisão da literatura recente das Ciências Sociais. PUC-Rio, 2010

ESCÓRCIO, Murilo. Você sabe a diferença entre transfobia e homofobia?. Blog Disponível em <http://orangeag.com.br/voce-sabe-diferenca-entre-transfobia-e-homofobia/>. Acessado em 5 de nov. de 2017 ás 13:25.

FERRARI, Juliana Spinelli. "Homofobia"; Brasil Escola. Disponível em <http://brasilescola.uol.com.br/psicologia/homofobia.htm>. Acesso em 05 de novembro de 2017 ás 13:36.

FOUCAULT, Michel. A História da Sexualidade I: a vontade de saber. São Paulo: Edições Graal, 1988.

GARCIA, Dantielli Assumpção. TRANSFOBIA – Enciclopédia Discursiva da Cidade. Disponível em <http://www.labeurb.unicamp.br/endici/index.php?r=verbete/view&id=53> Acessado em 8 de Nov. de 2017 ás 12:54.

Gay and Lesbian Alliance Against Defamation. "GLAAD Media Reference Guide – Transgender glossary of terms".  "GLAAD", USA, Maio de 2010.

GROSSI, Miriam Pillar. Identidade de gênero e sexualidade. Disponível em: <http://bibliobase.sermais.pt:8008/BiblioNET/upload/PDF3/01935_identidade_genero_revisado.pdf> (PDF). p. 8. Acessado em 05 de Nov. de 2017 ás 15:45.

JESUS, Jaqueline Gomes de; ALVES, Hailey (2010). Feminismo transgênero e movimentos de mulheres transexuais. Cronos - Revista do Programa de Pós-graduação em Ciências da UFRN. pp. 8–19. Disponível em <http://www.periodicos.ufrn.br/index.php/cronos/article/view/2150/pdf>. Acessado em 5 de nov. de 2017 ás 13:00.

LIMA, Jônatas Dias. O que é “ideologia de gênero”?- Artigo – Disponível em <http://www.gazetadopovo.com.br/ideias/o-que-e-ideologia-de-genero-0zo80gzpwbxg0qrmwp03wppl1>. Acessado em 05 de Nov. de 2017 ás 14:22.

Marla Berg-Weger (2016). Social Work and Social Welfare: An Invitation. [S.l.]: Routledge. p. 229. ISBN 1317592026. Consultado em 13 de novembro de 2016 ás 14:24.

ROUDINESCO, E. Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

STF – MI: 4733 DF, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento 23/10/2013, Data de Publicação: DJe-213 DIVULG. 25/10/2013 PUBLIC. 28/10/2013.

VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Fundamentos em prol da Criminalização da Homofobia e da Transfobia – Artigo de 2016. Disponível em < https://jota.info/artigos/fundamentos-em-prol-da-criminalizacao-da-homofobia-e-da-transfobia-07072016>. Acessado em 10 de Nov. de 2017 às 00:53.

 

 

 

Sobre o autor
Yuri Actis

Tem interesse em Direito Digital, Blockchain & Law, Tecnologia e Inovação. Coautor do Livro Direito, Economia e Tecnologia: ensaios interdisciplinares (2019). Diligenciador Jurídico na Empresa FOR1

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Orientação: SANTANA, Lara Kauark¹; ' Docente Orientadora da FTC, Advogada, Especialista em Direitos Humanos (UESB), Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB.

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