CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise de como uma forma alternativa de solução de conflitos trazida pelos princípios da Justiça Restaurativa pode melhorar a forma de como autor, vítima, bem como toda a sociedade se relaciona diante da ocorrência de um crime, onde com esta se vai muito além de uma retribuição estatal em forma de castigo ao autor do fato.
Além disso, no decorrer do primeiro capítulo, também pudemos observar que esta forma de solução de conflitos se encontra em aplicação em diversos países nas mais diversas searas e vem trazendo resultados muito satisfatórios.
Abordando-se a função a qual a Justiça Restaurativa se propõe no Brasil, verifica-se que não existe um propósito específico e exclusivo limitando a aplicação da mesma, desta forma, a mesma poderá vir a ser aplicada nos mais diversos âmbitos que dela necessitem, compactuando assim do ponto de vista percebido no presente trabalho de que a mesma em todo seu decorrer histórico passou por diversas modificações nos países que a adotaram a fim de suprir as necessidades específicas daqueles.
Deste modo, percebe-se que no Brasil a Justiça Restaurativa se faz uma interessante e necessária ferramenta para a solução de conflitos diante de toda ineficácia do sistema penal retributivo atual, onde a justiça retributiva mais têm acirrado conflitos do que buscado pacificá-los, de modo que não atende aos reais interesses dos envolvidos no fato criminoso, ocasionando total desequilíbrio de relações.
Ademais, ao analisarmos que nosso código de processo penal data da década de 40, é evidente que as necessidades abordadas naquele tempo não necessariamente se perfazem atualmente, diante de toda a evolução histórica e social que trilhamos desde então, concluindo-se que a vontade retributiva estatal não se pode sobrepor ao desejo das partes e suas necessidades.
Compreende-se que a Resolução nº 225 do Conselho Nacional de Justiça–CNJ é o marco principal acerca da introdução da Justiça Restaurativa e nosso ordenamento, e que a partir dele pode-se denotar uma clara divergência por parte dos membros do Ministério Público em aplicarem a mesma.
Ao tratarmos no segundo capítulo a respeito do Ministério Público, órgão este de suma importância em nosso país e que veio através de sua história conquistando uma posição fundamental em nosso ordenamento, pudemos compreender sua titularidade nas ações penais públicas, e notar que nestas a vontade da vítima é suprida pelo referido órgão ao buscar uma punição estatal tão somente.
Desta forma, ao adentrarmos no âmbito da obrigatoriedade ministerial, denotamos que esta é arguida como o empecilho que obsta a plena aplicação da Justiça Restaurativa em nosso ordenamento, onde é alegado a falta de discricionariedade para tal feito, ou seja, a obrigatoriedade não permite que se tome um rumo diferente diante da notícia de um crime de ação penal pública.
Mas ao nos aprofundarmos neste verdadeiro dogma em que se fundam afim de não aplicarem a Justiça Restaurativa, pudemos compreender que tal princípio é apenas uma escusa, e um dos principais e reais motivos seria o apego institucional destes membros diante de um método que dá o poder as partes e não tão somente aos membros do Ministério Público.
Referido órgão possui desta forma membros com uma visão fechada acerca da aplicação da Justiça Restaurativa, e assim não estão a aplicando, bem como possui ao mesmo tempo, membros com uma visão digamos que mais moderna e que aplicam os métodos restaurativos e defendem amplamente a sua utilização, assim demonstrando que este dogma da obrigatoriedade não é o fato impeditivo para isso.
Tanto é que no decorrer do capítulo terceiro pudemos denotar que várias espécies de mitigações já ocorreram com relação a este princípio e nem por isso foram obstadas em sua aplicação por parte do parquet como tentam o fazer com a aplicação dos princípios restaurativos.
Mitigações as quais já são aplicáveis rotineiramente, e trazem consigo uma modernização do processo penal brasileiro, que se aproxima de seus 79 anos de idade, visando acompanhar a dinâmica social atual, trazendo mais celeridade ao mesmo.
Pode-se considerar que a Justiça Restaurativa é plenamente viável e aplicável ao processo penal brasileiro, de modo mais eficaz e regrado após a resolução do Conselho nacional de Justiça-CNJ, bem como com as propostas que se encontram aguardando votação no Congresso Nacional e visam incluir a previsão de aplicação de princípios restaurativos dentro do texto do código penal e do código de processo penal, sendo estes grandes marcos para uma mudança de paradigma tão necessária nestes aspectos.
Tratando-se da oposição de parte dos membros do Ministério Público em aplica-las efetivamente, é visível que a obrigatoriedade ao ser mitigada não excluirá o órgão de suas funções, de modo que poderão realmente passar a exercer a titularidade das ações penais públicas no momento em que puderem decidir a respeito das mesmas.
Assim pudemos ter a impressão de que a Justiça Restaurativa precisa acima de tudo vencer os dogmas presentes não só por parte do parquet, mas por toda grande parte de uma sociedade que está acostumada com um sistema retributivo, onde o castigo é mais importante do que reatar laços rompidos e reestruturar um problema ocorrido.
Conseguinte a este primeiro obstáculo, é visível a grande valia que a Justiça Restaurativa trará quando efetivamente aplicada, pois, ao contrário do que muitos compreendem, não será o crime afastado da tutela jurisdicional, não importará em perda de poder dos promotores de justiça, antevisto que eles participarão e que ocorrerão respostas acerca do crime praticado, podendo implicarem em algo mais concreto ao que seria caso fosse tratado o caso somente na justiça retributiva comum.
Tais objetos impostos pela Justiça Restaurativa precisarão de um controle e regulamentação acerca de limites nos acordos ali firmados, cujos quais podem ocorrer antes durante ou até depois da aplicação da pena tradicional.
Finalizamos assim este presente trabalho com uma visão de que os princípios e valores internos do referido órgão não podem sobrepesar as necessidades sociais, prejudicando assim todo um dinamismo e modernidade proposto por tal método e que acabam por serem obstados por um mero status ministerial, de modo que após esta superação dogmática a Justiça Restaurativa será amplamente aplicada e se amoldará aos fatos que dela necessitem, trazendo o processo penal diante dos dias atuais, com humanização, participação efetiva das partes, celeridade e efetividade, conforme ocorrera nos demais que a adotaram.
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