Reflexos da sentença trabalhista em matéria previdenciária

01/04/2020 às 20:39
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Diante dos pedidos de reconhecimento de vínculo na Justiça do Trabalho e dos acordos judiciais, torna-se necessário entender qual o alcance das decisões da Justiça do Trabalho no âmbito da Justiça Federal.

Resumo

Diante dos pedidos de reconhecimento de vínculo na Justiça do Trabalho e dos acordos judiciais, torna-se necessário entender qual o alcance das decisões da Justiça do Trabalho no âmbito da Justiça Federal.

Abstract

In face of requests for recognition of a bond in the Labor Courts and judicial agreements, it is necessary to understand the scope of the decisions of the Labor Courts within the scope of the Federal Courts. Para analisar a temática, torna-se primordial esclarecer que o processo do trabalho tem princípios e regramentos diferenciados do processo civil brasileiro, como, por exemplo, a informalidade, a oralidade, a simplicidade, a primazia da realidade sobre a forma etc. Oportuno destacar que, na seara laboral, o princípio da conciliação é regra máxima. Destaca-se que é comum a existência de acordos trabalhistas, pois as verbas são de natureza alimentar. Dai porque o índice de conciliação sempre foi um ponto de destaque na Justiça do Trabalho. Observa-se até mesmo uma tendência, após o CPC de 2015, em adotar esse princípio conciliatório, viabilizando novas soluções de conflitos. A conciliação, máxima no direito do trabalho, não pode ser visto como algo errado, equivocado ou até mesmo desfavorável às decisões judiciais proferidas. Nao se pode olvidar que, muitas vezes, o acordo é necessário para que o empregado consiga receber logo as verbas rescisórias e manter sua subsistência. É majoritário, na doutrina trabalhista, sua autonomia em relação ao processo civil brasileiro. Isso se mostra essencial para que se compreenda como ocorre a colheita de provas na seara trabalhista. Não se trata de um rito processual totalmente afastado dos alicerces constitucionais. Muito pelo contrário. O processo do trabalho possui aplicação rigorosa com o devido processo legal, ampla defesa, contraditório, colheita de provas com admissibilidade de todos os meios lícitos, principalmente, uso de mídias sociais, conversas de aplicativos etc, gravações de conversas durante a jornada de trabalho etc. Isso ocorre exatamente porque, na Justiça do Trabalho, é essencial analisar a questão do que efetivamente ocorreu que ultrapassa os documentos, existindo, na seara laboral, a necessidade de ponderar a hipossuficiência do trabalhador que não se restringe ao âmbito econômico, mas que também alcança a produção de provas. Atente-se que não se trata de uma proteção desmedida, sem amparo legal. Na verdade, a relação trabalhista é tão íntima e intrínseca que os meios de provas são os mais variados, destacando-se a prova testemunhal, principalmente, quando não existe contrato de trabalho, recibos de pagamento, transferência bancária e nenhum outro meio documental de provas. Muitas vezes, a única prova existente do trabalhador é a testemunhal, valorada pela Justiça do Trabalho, de forma positiva. Como juíza do trabalho, percebi, em diversas ocasiões, a realidade de uma relação de emprego sem qualquer outro meio de prova, salvo a testemunhal. Em outras situações, existe a configuração da revelia e da confissão ficta, em que o empregador desaparece, citado em local incerto e nao sabido, sem nenhum lastro documental forte o suficiente, sendo a prova oral mais valorada. No processo do trabalho, não existe a prova tarifada, tal como mencionado na seara previdenciária, principalmente, pelo INSS que considera a necessidade de prova documental, admitindo a prova exclusivamente testemunhal somente em caso fortuito ou força maior. Essa abordagem se mostra interessante para que se perceba o enfoque evidenciado nos processos trabalhistas e nos reflexos das sentenças nas Varas da Justiça Federal e dos Juizados Especiais Federais. Imagine-se, por exemplo, um trabalhador rural que laborou por muito tempo para alguém, em uma propriedade, sem vínculo reconhecido e só tem provas testemunhais para provar o que alega. Ou até mesmo uma relação doméstica, de um cuidador de idoso. Se as testemunhas forem convincentes, o juiz do trabalho julga favoravelmente, sob o crivo de todos os requisitos do devido processo legal. Mas isso nao torna uma proteção absoluta da Justiça do Trabalho, pois o julgador analisa se estão presentes todos os requisitos de uma relação de emprego, para somente assim julgar favoravelmente. Não deve prosperar o dogma de que o empregado sempre tem razão. Não se trata disso. Mas é preciso tecer a explicação de como funciona a dinâmica de provas, bem como a análise da Justiça do Trabalho. Diante disso, considerável parte das demandas na Justiça laboral refere-se aos pedidos de reconhecimento de vínculo ou para que o juiz também reconheça um período clandestino (quando o tempo do labor desempenhado pelo trabalhador só está parcialmente anotado na CTPS). Com isso, o juiz do trabalho, durante a colheita de provas, prolata sentença pela procedência do pedido de reconhecimento, anotação na CTPS, bem como o pagamento de verbas rescisórias, férias vencidas mais um terço, 13o salários atrasados, recolhimentos de FGTS etc. Assim, as sentenças trabalhistas passam a condenar o empregador a anotar as datas de admissão e dispensa do contrato de trabalho, bem como salários e função. No entanto, quando o trabalhador recebe os respectivos salários e verbas advindas do contrato de trabalho, indaga-se o seguinte, principalmente, quando se aproxima da época de se aposentar: Qual a validade probatória da Sentença Trabalhista no âmbito do INSS para o fim de comprovação de tempo de contribuição? E mais: o reconhecimento da relação de emprego pela Justiça do Trabalho surtirá efeitos contagem de tempo para sua aposentadoria? Muito embora exista menção às sentenças trabalhistas, também deve ser assinalada a discussão quanto a existência de acordos trabalhistas. Isso porque ocorre, com frequência, acordos em que uma das regras para a transação é o reconhecimento do vínculo de emprego, até mesmo com a discriminação das verbas quanto aos recolhimentos do FGTS e com o alvará respectivo para a liberação do seguro desemprego. Diante disso, também se questiona: os acordos trabalhistas com reconhecimento de vínculo possuem o mesmo grau de confiabilidade das sentenças trabalhistas de mérito? Ou possuem para o INSS o mesmo lastro probatório? Observemos que o direito do trabalho possui realidade principiológica diferente do direito previdenciário, como dito acima. A presunção de veracidade das anotações na CTPS, segundo Súmula n. 12 pelo TST, sempre terá presunção relativa. No entanto, a jurisprudência previdenciária faz diferença de valoração entre o valor da anotação contemporânea e o registro tardio. Além disso, não pode haver renúncia deste direito sequer pelo próprio empregado, nos termos da abalizada posição de Maurício Godinho Delgado, Ministro do TST. Em suma, a anotação na CTPS do trabalhador representa No cenário trabalhista, o documento mais importante é a CTPS, na medida em que é a maior evidência dessa relação tão estreita entre estas áreas do saber. É preciso frisar que, no direito do trabalho, ainda que de forma relativa, vigora na seara laboral o princípio da proteção e da aplicação da norma mais benéfica em relação ao trabalhador no âmbito material, bem como as questões processuais com a aplicação da primazia da realidade sobre a forma. Isto porque quando um vínculo empregatício é anotado neste documento, significa dizer que foi formalizada uma relação de emprego/trabalhista, como também significa dizer que foi criada uma relação previdenciária, com a filiação ao Regime Geral de Previdência Social, ante o exercício da atividade remunerada. Afinal, há a configuração de um segurado empregado. É direito do trabalhador ter seu contrato de trabalho anotado, quando efetivamente realizado, inclusive é um direito social de natureza indisponível, até nos termos da ideia de Reforma Trabalhista, em que a anotação da CTPS é um direito de caráter absoluto não podendo sequer ser objeto de negociação coletiva, nos termos do art. 611 – B da CLT. Verifica-se, desta feita, a necessidade de analisar a definição do que é tempo de contribuição e qual a sua diferença com tempo de serviço, expondo as exigências e condições para que se qualifique determinado fato como válido para aposentadoria e as constantes mudanças na legislação. Além disso, o segurado que tem registro tardio precisa demonstrar o recolhimento do tempo de contribuição através de início de prova material que pode ser definida como LASTRO DOCUMENTAL, FORMAL, INSUFICIENTE COMO PROVA PLENA, MAS PODE DAR SUPORTE JURÍDICO AO FATO QUE SE PRETENDE COMPROVAR. Essa definição também foi confirmada pelo Enunciado 4 do Conselho de Recursos da Previdência Social. Aliás, neste enunciado, e por essa tese, invoca-se o art. 55 da Lei 8213/99 e tem como condão que uma sentença trabalhista fundamentada seria o início de prova material E CONTEMPORÂNEA. A meu ver, aqui existe a necessidade de uma dupla exigência como mencionado. Primeiramente, destacam-se as teses resistentes do INSS para que a sentença trabalhista seja suficiente por si só para fins de considerar o tempo de contribuição. Na verdade, o INSS possui uma resistência, principalmente, das sentenças homologatórias de acordo. Então diante desse cenário, quais as posições que o INSS aponta para afastar a aplicação imediata da Sentença Trabalhista? Existe alegação de que não pode ser atingido pela força da coisa julgada, bem como que não participou da lide entre as partes, e, ainda, que não houve a devida contrapartida exigida pelo regime previdenciário. Também sustenta a existência de lides simuladas como forma de burlar o regime previdenciário. O Decreto 3.048/99 que regula os benefícios enuncia em seu art. 62 que nesses casos é necessário a prova documental contemporânea aos fatos que comprovem o exercício da atividade a ser contado ou alterada. É uma espécie de tarifação de provas que não é a regra de nosso ordenamento jurídico. O referido Decreto no inciso I, art. 62, relaciona documentos, subsidiariamente ao CNIS, para a prova de tempo de contribuição, dentre os quais se destaca como prova plena a Carteira de Trabalho e Previdência Social. As anotações da CTPS valem como prova plena, não sendo ônus do segurado comprovar ou ratificar eventuais falhas na mesma, consoante súmula 12 do TST. Observe-se que essa anotação é determinada judicialmente quando das sentenças de mérito e das homologatórias de acordo. Afinal, a sentença trabalhista que reconhece o vínculo de emprego serve para fins de matéria previdenciária? Para muitos trabalhadores que laboram na informalidade ou em período clandestino a única possibilidade de ter reconhecido o seu tempo de contribuição é através da proposição de ação judicial de reconhecimento de vinculo empregatício na Justiça do Trabalho. Através da reclamação trabalhista, o empregado conseguirá a anotação da sua CTPS e a declaração judicial do tempo que efetivamente esteve a disposição do seu empregador quando ocorre a procedência do pedido. Lembre-se que se trata de pedido declaratório que não é atingido pelo manto da prescrição. Para o reconhecimento do vínculo de emprego pela Justiça do Trabalho basta estar caracterizado os requisitos exigidos no art. 3º da CLT: pessoalidade na prestação laboral, onerosidade da prestação, não eventualidade e subordinação ao empregador para que a Justiça do Trabalho declare a existência do vinculo empregatício e determine a anotação do contrato de trabalho na CTPS do empregado. Pode o Magistrado trabalhista valer-se de todo o arcabouço probatório existente no bojo de nossa legislação pátria para decidir se um empregado de fato esteve prestando serviços a um dado empregador de forma pessoal, habitual, onerosa e subordinada, nos exatos moldes do artigo terceiro do texto consolidado. Da mesma forma, incumbe ao Juiz do Trabalho a execução ex officio das contribuições previdenciárias oriundas do vínculo reconhecido, não havendo prejuízo ao INSS, na medida em que existe a cobrança das contribuições sociais das sentenças de mérito, e, com isso, fica incólume a ideia de contributividade, de contrapartida. Em outras palavras, ainda que não seja requerido pelas partes, é dever do Magistrado observar se as contribuições devidas à Previdência Social foram devidamente quitadas, quando do reconhecimento de uma prestação laboral, e, tal situação persiste após a Reforma Trabalhista. Ou seja, é evidente que existe a arrecadação, não havendo prejuízo ao sistema. Destaca-se, principalmente, que a tese do INSS sobre a existência de simulações e fraudes em processos trabalhistas não persiste, na medida em que existe a capacitação dos juízes do trabalho para averiguação de tais pontos, bem como existe, no processo trabalhista aplica-se normalmente o devido processo legal. O Juiz do Trabalho, atento ao dever de persecução da verdade, deve preferir a busca dos fatos reais sobre as formalidades do processo, uma vez que o empregador se encontra numa posição de superioridade na balança da Justiça e, valendo-se desta condição, pode modelar uma situação que o beneficie. Neste sentido, quando o Magistrado persegue a realidade dos fatos dentro do processo do Trabalho, trata-se enfim de uma aplicação prática do Princípio da Proteção, através da vertente do Princípio da Primazia da Realidade, bem como do in dúbio pro misero, aliás, muito incidente nas relações do próprio Direito Previdenciário. Existe, na doutrina previdenciária, a invocação também desse viés protetivo e, ainda, do solidarismo social. O trabalhador com vínculo empregatício reconhecido na Justiça do Trabalho terá dificuldade, na via administrativa e até em alguns tribunais, de ter esse tempo considerado como tempo de contribuição junto ao INSS. A autarquia previdenciária entende que para computo de tal período é necessário inicio de prova documental, nos termos do art. 55, §3º da Lei 8.213/91, somente se admitindo prova testemunhal em caso de força maior ou caso fortuito. Exige o INSS que além da Sentença Trabalhista o trabalhador junte documentos contemporâneos que atestem a comprovação dos fatos alegados, não sendo a Sentença em si insuficiente para garantir a consideração do tempo de contribuição. Mas será essa decisão a mais acertada, considerando a realidade do nosso país? A Jurisprudência dominante entende que a Sentença trabalhista baseada apenas em prova testemunhal, e até mesmo em confissão do empregador não possui qualquer validade no INSS, sendo necessário que a decisão do Juiz do Trabalho tenha sido subsidiada por elementos probatórios materiais, apresentados durante o processo judicial. Após a Emenda Constitucional nº 20 de 1998, é destacado que a Justiça do Trabalho tornou-se uma grande aliada na arrecadação de contribuições previdenciárias, vertendo dinheiro aos cofres públicos, evitando a sonegação e fraudes pelos empregadores. A aludida emenda constitucional designou à Justiça Laboral competência para executar as contribuições sociais decorrentes das sentenças que proferir. Mas o INSS não aceita facilmente as sentenças trabalhistas para fins de demonstração do tempo de contribuição. E quando a Justiça do Trabalho reconhece em sentença e arrecada a contribuição de todo o período reconhecido? Como não se pode considerar referida decisão como suficiente? Afinal, segundo o art. 92 da Constituição da República de 1988, a Justiça do Trabalho faz parte do Judiciário nacional, sendo uma Justiça da União especializada, nos termos do artigo 114 da Constituição da República de 1988. E as sentenças homologatórias que determinam como cláusula do acordo a anotação e o reconhecimento do vínculo de emprego? Informa-se que o INSS passou a ser intimado de todos os acordos firmados, podendo recorrer de seu teor, quando ficar evidenciado que o acordo visa exclusivamente o reconhecimento do tempo de serviço para fins previdenciários, nos termos do parágrafo único, do artigo 831, da CLT. No entanto, não se observa um papel ativo nos processos trabalhistas. Destarte, se a autarquia previdenciária fica silente, após ser devidamente intimada da decisão proferida ou do acordo homologado pela Justiça do Trabalho, não interpondo qualquer recurso, e aceita a execução de ofício das respectivas contribuições previdenciárias, o eventual vínculo empregatício reconhecido implica também o reconhecimento do respectivo tempo de serviço para fins previdenciários. Isso porque houve o devido processo legal, com a extensão do contraditório, e, portanto, não pode fechar as portas para o trabalhador/segurado. O INSS justifica sua resistência nas premissas de insegurança quanto a veracidade da matéria e que a prova material exigida é um tipo de prova tarifada, sobre a qual não se pode dispor e que referida prova há de ser contemporânea. Como dito, referida argumentação não merece amparo. Isso porque, quando o trabalhador teve seu período reconhecido, obedeceu-se ao devido processo legal. No processo do trabalho, nota-se que a prova, em considerável parte dos processos trabalhistas, é extemporânea, haja vista que o empregado somente busca o reconhecimento judicial após o fim da prestação do trabalho. Outro argumento apontado pelo INSS é de índole processual: a decisão trabalhista não pode fazer coisa julgada, vez que a autarquia não participou da lide e por isso existe um limitador da eficácia dessa decisão, não sendo obrigado a cumpri-la. Tal não prospera. Como dito, o INSS pode recorrer dos processos trabalhistas, bem como ser incluído no polo passivo das reclamações trabalhistas em todo o país, verificando, caso a caso, a existência de suposta fraude. Outro argumento é que a Justiça Federal seria a competente para as demandas previdenciárias, e que na Justiça do Trabalho não há o reexame necessário exigido nas causas que envolvem a autarquia em comento. Ora, se o INSS quer acompanhar os pedidos de reconhecimento de vínculo trabalhista, verifica-se que a competência seria da Justiça do Trabalho, pelo critério da especialidade no conflito de normas constitucionais, consoante o art. 114 da Constituição Federal de 1988. A doutrina ainda é escassa sobre o tema, mas as resistências de considerar as sentenças trabalhistas como prova suficiente fere o princípio republicano, pois o INSS cria uma zona de tensão que se instala no Poder Judiciário, causando evidente insegurança jurídica. Afinal, os Poderes devem respeitar os produtos das funções típicas de cada um deles. É do Judiciário a competência para que se julguem demandas trabalhistas. Não se pode fazer uma reanálise de uma decisão judicial na esfera administrativa. Com a formalização de um vínculo advindo pela intervenção do Judiciário, a proteção previdenciária é entregue ao trabalhador, bem como, a seus dependentes, se o caso. Com efeito, qualidade de segurado, carência, salário de contribuição, período de graça, tempo de contribuição, enfim, fenômenos previdenciários surgem com a Sentença Trabalhista e independente da vontade da autarquia. Quando, na esfera administrativa, o INSS faz exigência da prova material para convolar a sentença trabalhista dentro do Direito Previdenciário é tornar vivo no Estado brasileiro um choque institucional entre os Poderes republicanos, além de dificultar, ao arrepio da lei, o acesso ao constitucional. Para mais uma vez firmar a negativa às Sentenças Trabalhistas o INSS alega que como não foi parte do processo entre empregado e empregador não estaria obrigado a cumprir uma decisão da Justiça do Trabalho. A rigor o Poder Judiciário e o Poder Executivo o INSS pertencem ao mesmo Estado, não havendo qualquer coerência ou lógica que leve ao entendimento que o INSS não esta obrigado a cumprir as decisões trabalhistas. A meu ver, o pensamento ao contrario é permitir ao Estado negar suas próprias decisões. Diante disso, reconhecido o vinculo empregatício pela Justiça do Trabalho, a verificação do binômio contribuição - retribuição ficaria a cargo do próprio INSS que com a Sentença trabalhista em mãos, declarando efetivamente o tempo reconhecido, teria um titulo para cobrar do empregador, já que este é o sujeito passivo da obrigação tributaria, reparando assim um déficit do Erário e firmando definitivamente a condição de segurado do empregado. A Sentença Trabalhista é competente para ao apreciar a relação de emprego entregar ao cidadão também a sua condição de segurado? A meu ver, sim. No entanto, a doutrina tem sustentado que a anotação da CTPS por força de sentença trabalhista tem que ser analisada caso a caso, em virtude do desvirtuamento do ajuizamento de reclamatórias com o intuito de fraudar a Previdência Social, de modo que tem de haver provas documentais produzidas nos autos da reclamação em consonância com o disposto no art. 55, § 3º, Lei 8.213/91, para que seja considerada como início de prova material. Hodiernamente, compreende-se que a sentença trabalhista funciona como início de prova material na área previdenciária, corroborada por mais elementos probatórios, na comprovação efetiva do tempo de serviço, requerido pelo reclamante. Ademais, apesar de ambos os ramos jurídicos, direito do trabalho e previdenciário, serem ligados tão diretamente, possuem legislação diversa, o que cria a presente sistemática adotada no sistema jurídico brasileiro, no momento da comprovação do tempo de serviço e dos benefícios previdenciários daí decorrentes. Atualmente, apesar da sentença ser proferida por um Juiz togado, investido de jurisdição e vinculado a todas as formalidades de um regular processo, nas vias administrativas do INSS, tal pronunciamento estatal somente surte seus efeitos dentro da seara previdenciária. Isso tudo mediante a apresentação de pelo menos um início de prova material da relação laboral, atingindo assim, o absurdo de um órgão administrativo ter o poder de desconsiderar ou mitigar os efeitos de uma decisão judicial, em flagrante ofensa a vários princípios, e porque não dizer, da própria e esperada segurança jurídica. No caso da Sentença Trabalhista de reconhecimento de vínculo, os ares são outros, ou seja, um legítimo pronunciamento de um Poder da República atesta a existência de um fato. Ocorre que a autarquia previdenciária admite plena validade à sentença laboral apenas se esta estiver fundada em início de prova material. Por início ou indício de prova material, entende-se como aquele lastro documental, formal, indiciário, de modo a dar arrimo e suporte a algum fato a ser demonstrado. Mas é preciso fazer uma análise sociológica da posição do INSS: O poder conferido ao INSS pelo artigo 55, da Lei de Benefícios, de condicionar a decisão trabalhista de reconhecimento de vínculo empregatício, transitada em julgado, à apresentação de provas materiais do pacto laboral, para que assim possa ela produzir efeitos previdenciários, é notadamente prejudicial aos trabalhadores insertos nesta condição, visto que não podem valer-se do seu direito reconhecido judicialmente em sua plenitude, uma vez que, como já ressaltado, este vínculo empregatício não contará para fins de tempo de contribuição, carência, filiação, etc., em um eventual processo previdenciário. Passou a existir uma certa celeuma nos Tribunais, inclusive, no TRF da 1a Região, quando se observa se as sentenças trabalhistas não seriam, de fato, suficientes para fins de valorar o tempo de contribuição na esfera da Justiça Federal. Há decisões no sentido de que as teses do INSS seriam refutadas por argumentos desenvolvidos supra. Porém, há também discussões para fins de acolher a tese do INSS, principalmente, sob o aspecto legalista mencionado também. Diante disso, existe a necessidade de uniformizar a jurisprudência. Até porque é preciso trazer a todos a segurança jurídica tanto na esfera entre os poderes, como no âmago do Poder Judiciário, principalmente, para fins de que sobre um assunto tão sério não se tenha uma decisão segura para fins de pacificar o reconhecimento de vínculo, bem como a contagem como tempo de contribuição, permitindo a aposentadoria do empregado. Em um viés trabalhista, entende-se que o segurado seria duplamente punido. Num primeiro momento, porque seu empregador foi inerte, descumpriu preceitos básicos previstos no artigo 7o da Constituição Federal de 1988. Em segundo, porque, depois de conseguir provar no âmbito da Justiça do Trabalho, a sua relação de emprego, terá que ajuizar nova demanda em face do INSS para considerar como válida aquela sentença no quesito tempo de contribuição. Segundo jurisprudência dos tribunais superiores, destaca-se que o Superior Tribunal de Justiça passará a uniformizar a jurisprudência para definirse sentença trabalhista serve como prova previdenciária por si, ou seja, suficiente. Até a abordagem presente, não houve a decisão definitiva do Superior Tribunal de Justiça. Daí a necessidade de levantar o debate. Destaco a notícia no site oficial do STJ: O ministro do Superior Tribunal de Justiça Og Fernandes admitiu o processamento de pedido de uniformização de interpretação de lei apresentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre o reconhecimento de sentença homologatória trabalhista como início de prova material. O INSS ingressou com o pedido após decisão da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) que admitiu que a anotação da Carteira de Trabalho decorrente de sentença trabalhista homologatória constitui início de prova material para fins previdenciários. Para a autarquia federal, o entendimento é contrário à jurisprudência do STJ, segundo a qual é necessário haver outros elementos para provar (documentais e testemunhais) o alegado período trabalhado. Em análise preliminar, o ministro Og Fernandes reconheceu a divergência entre o acórdão e o entendimento do STJ. Determinou, assim, que os ministros da 1ª Seção do tribunal e o presidente da TNU fossem comunicados do processamento do pedido. Os interessados terão prazo de 30 dias para se manifestar sobre o assunto, e, em seguida, os autos serão remetidos ao Ministério Público Federal, que terá 15 dias para emitir parecer. Após as manifestações, a 1ªSeção decidirá sobre o mérito do pedido de uniformização de interpretação de lei feito pelo INSS. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ. Pelos argumentos supra, entende-se que as sentenças trabalhistas deveriam ser prova suficiente para que o trabalhador/segurado conseguisse computar como tempo de contribuição para fins de aposentadoria. Neste azo, haveria maior segurança jurídica ao trabalhador. Isso porque, na prática, o empregado ja é atingido pela inadimplência do empregador que nao anota seu contrato de trabalho e, com isso, deve ajuizar demanda na Justiça do Trabalho e, posteriormente, ajuizar outra demanda na Justiça Federal, porém, sem ter a certeza de que o tempo de contribuição do trabalho reconhecido na seara laboral. O questionamento se torna pertinente, na medida em que são casos que avançam nas Varas da Justiça Federal, saem das Varas da Justiça do Trabalho e está na moda se falar de temas como obediência de decisão judicial e, ainda, de republicanismo. A questão suscita debate, pois atinge sim milhões de brasileiros. Este artigo é apenas para fomentar esse debate. Aguardemos. Referências

Constituição Federal do Brasil de 1988. Disponível em: <www4.planalto.gov.br/legislação> Acesso em fevereiro. 2020.

Consolidação das leis trabalhistas. Disponível em: <www4.planalto.gov.br/legislação> Acesso em fevereiro.2020

Lei de Benefícios da Previdência Social. Disponível em: <www4.planalto.gov.br/legislação> Acesso em fevereiro. 2020.

Regulamento da Previdência Social. Disponível em: www4.planalto.gov.br/legislação Acesso em fevereiro. 2020.

SANTOS, Elvecio Moura - Reflexos da Sentença trabalhista no direito previdenciário - http://www.igdp.com.br/noticia/detalhe.php?id=592.

SALVADOR, Sergio Henrique - A eficácia da decisão trabalhista de reconhecimento de vínculo empregatício no direito previdenciário- http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13664.


 

Súmulas nº. 31 e nº. 34 da Turma Nacional de Uniformização.

Súmulas nº 12 e n. 368 do Superior Tribunal do Trabalho.

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Sobre a autora
Maria Rafaela de Castro

Juíza do Trabalho Substituta da 7a Região. Atuou como Juíza Substituta no TRT da 14a Região. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade do Porto em Portugal. Foi Membro do Ministério Público do Estado de Rondônia. Professora convidada da Escola Judicial do TRT da 7a Região e da Universidade de Fortaleza na área de Pós Graduação, além de professora de cursos preparatórios para concursos na cidade de Fortaleza.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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