II.2 – A "esfera pública" do discurso do reconhecimento
Taylor concebe o discurso do reconhecimento na modernidade como formado em dois níveis. Em um primeiro, que é o do plano íntimo, o self estabelece relações com outros significativos e forma sua identidade. Num plano social, na esfera pública, pode-se dizer que o reconhecimento se estratifica.
Com o advento do paradigma liberal, e a conseqüente passagem da honra à dignidade, houve para Taylor uma política do universalismo, com a extensão de iguais direitos a todos os cidadãos. Esse seria, segundo Rosenfeld (1995, p. 1.092), o segundo estágio de evolução do princípio da igualdade, no qual é enfatizada a correlação entre identidade e igualdade.
De outro lado, a moderna noção de identidade individual originou uma política da diferença (TAYLOR, 2000, p. 250). Cada grupo ou indivíduo quer ter reconhecida sua particular e peculiar identidade. A crítica de Taylor é que culturas majoritárias podem ter assimilado identidades particulares.
Onde a política da dignidade universal lutava por formas de não discriminação que fossem deveras "cegas" às maneiras pelas quais os cidadãos diferem, a política da diferença redefine com freqüência a não discriminação como algo que requer que façamos dessas distinções a base do tratamento diferenciado. (TAYLOR, 2000, p. 251)
Na política da dignidade, o potencial é a racionalidade humana, que informa que cada um merece respeito. Na política da diferença, o potencial é de formar e definir a própria identidade.
Taylor ressalta que recentemente a política da diferença tem requerido que tratemos com igual respeito culturas atualmente evoluídas. Não seria apenas atribuir valor igual a todos, mas atribuir valor igual àquilo que as pessoas possam ter concretamente feito desse potencial. Para ele, a política da dignidade (que requer a atribuição de valor igual a todos) entra em conflito com uma política da diferença que pede o reconhecimento de particularidades. É justamente esse conflito que não é vislumbrado por teóricos como Rawls, Dworkin e Habermas, co-partícipes (segundo Taylor) de um liberalismo [03] que através da universalização de certos pressupostos, é infenso às diferenças e acaba por ser reflexo ele mesmo de certas particularidades (como por exemplo, a cultura ocidental).
Taylor (2000, p. 259) critica Rousseau por este conceber uma política da igual dignidade por demais homogeneizante, fundada na tríade liberdade (não domínio), ausência de papéis diferenciados e um propósito comum dotado de firme coesão. Não seriam partidários de tais pensamentos os liberais acima mencionados, que seriam mais propriamente herdeiros em parte de Kant. A herança kantiana, pelo menos em Dworkin e Habermas, pode ser apreendida por suas propostas de princípios morais universalizantes, transcendentes de contexto. Distinguindo o bom do justo, estes autores aceitam que sob o código binário da moral haveriam respostas certas que independem de mundos da vida particulares. O direito é em parte impregnado pela moral (os direitos humanos são um exemplo disso) e em parte impregnado eticamente. Taylor considera que mesmo as exigências de uma moral universal são dependentes de contexto e representam um particularismo.
Tomando como exemplo o caso canadense da Emenda Meech [04], Taylor (2000, p. 265-266) irá radicalizar as propostas de Dworkin e Habermas, concebendo-as como um "tipo" de liberalismo que promove uma política inóspita à diferença, ou seja, que exige a aplicação uniforme de regras que definem direitos e que é incompatível com metas coletivas. O liberalismo procedimental é um terreno neutro às diferenças culturais e por isso estaria fadado ao insucesso nas sociedades modernas. Taylor (2000) irá propor um novo tipo de liberalismo, mais tolerante, que possa promover certas identidades culturais ao argumento de que elas merecem igual respeito, valor. "[As novas formas de liberalismo] se dispõem a sopesar a importância de certas formas de tratamento uniforme com relação à importância da sobrevivência cultural, e optar por vezes por esta última" (TAYLOR, 2000, p. 266).
Taylor (2000) lançará uma série de argumentos para que venhamos a tratar com igual valor culturas tidas por nós como inferiores. Modificamos nossos padrões, fundimos nossos "horizontes" em prol de uma nova compreensão, despida da má vontade ou do preconceito.
II.3 – A luta por reconhecimento habermasiana
Cidadãos livres e iguais resolvem unir-se sob a mesma égide através das Constituições. É a Constituição que dispõe sobre os direitos que cidadãos precisam reconhecer mutuamente uns aos outros. Segundo Habermas (2001, p. 144), o direito moderno é estruturado essencialmente sobre direitos subjetivos. É permitido fazer tudo o que não for proibido e com isso há um âmbito legal onde os sujeitos de direito podem agir livremente. Daí a separação entre direito e moral, já que nem sempre o moralmente incorreto irá gerar um efeito sobre a esfera jurídica de outrem. A esfera moral é transcendente e ela se funda em obrigações recíprocas que dizem o que é certo e o que é errado sem enraizamento algum; já a esfera do direito é situada espacial e temporalmente e possibilita que os sujeitos, na medida em que são portadores de direito subjetivos, ajam desta ou daquela maneira.
De acordo com a tradição kantiana, o direito moderno tem que lidar com a tensão entre a validade de normas jurídicas que possam ser obedecidas por respeito a elas e a facticidade de sua imposição coercitiva (HABERMAS, 2001, p. 145). "Normas jurídicas devem ser feitas de tal modo que possam ser vistas ao mesmo tempo sob aspectos diferentes como leis coativas e como leis da liberdade" (idem).
Além disso, o direito moderno é caracterizado por sua positividade, ou seja, ele precisa obter a todo tempo legitimidade, uma vez que pode ser modificado sempre pelo legislador político. Essa reivindicação de legitimidade foi correspondida duplamente na modernidade: soberania popular e direitos humanos. Através do procedimento, a soberania popular possibilita aceitabilidade racional de resultados pelas qualidades democráticas do mesmo; os direitos humanos "(...) fundamentam uma soberania das leis legítimas a partir de si mesma" (HABERMAS, 2001, p. 146).
A almejada coesão interna entre direitos humanos e soberania popular consiste assim em que a exigência de institucionalização jurídica de uma prática civil do uso público das liberdades comunicativas seja cumprida justamente por meio dos direitos humanos. Direitos humanos que possibilitam o exercício da soberania popular não se podem impingir de fora, como uma restrição. (HABERMAS, 2002, p. 292)
É justamente esse direito moderno positivo, cogente e estruturado individualisticamente, que deve lidar, agora, com experiências coletivas, relações intersubjetivas que ultrapassam a esfera do direito subjetivo atribuída a cada um.
Pode-se dizer que no paradigma social de direito, as reivindicações coletivas eram feitas com relação a bens e sua justa distribuição. Massas de trabalhadores clamavam por chances iguais de vida no meio social (HABERMAS, 2002, p. 230). Tais reivindicações são plenamente compatíveis com a estrutura de direitos acima aludida, porque esses bens ou são distribuídos individualmente ou são utilizados individualmente.
Já quando a reivindicação é por reconhecimento cultural, a situação é diferente. O reconhecimento de formas de vida e de tradições culturais marginalizadas depende em muito da forma como o sistema de direitos é compreendido.
Taylor, como mencionado, irá propor uma versão do liberalismo, chamada liberalismo 2, que, segundo Habermas, contradiz a estrutura individualista do entendimento moderno de liberdade. Para o filósofo alemão, Charles Taylor toma como incompatíveis o reconhecimento de identidades coletivas e o direito a liberdades subjetivas iguais. Nos termos do canadense, é preciso decidir sobre a precedência ou do reconhecimento da dignidade inerente a cada ser humano ou do reconhecimento no plano social. O universalismo dos direitos humanos ultrapassa e ignora as particularidades assumidas por cada comunidade cultural.
Trata-se, na verdade, de um reflexo do embate teórico entre liberais e comunitaristas. De um lado, liberais da estirpe de Rawls e Dworkin defendem um âmbito de direitos fundamentais imunes à interferência de procedimentos majoritários. Segundo esta vertente,
(...) uma democracia constitucional deve, sobretudo, assegurar os direitos fundamentais dos cidadãos, conferindo um papel proeminente à Constituição e ao sistema de direitos nela inscritos. Contra eventuais procedimentos majoritários que possam ameaçar a neutralidade liberal que assegura o espaço de desacordo razoável, a Constituição deve fixar um âmbito de liberdade imune a interferências externas indevidas. (CITTADINO, 2000, p. 183)
De outra parte, os comunitaristas dão precedência aos valores e opções culturais que uma determinada comunidade elege através de procedimentos democráticos, mesmo que em certos momentos eles coloquem de lado direitos fundamentais (os republicanos podem figurar ao lado dos comunitaristas, mas eles parecem estar mais afeitos à preponderância da própria soberania popular que a valores compartilhados em um ethos). Os comunitaristas,
(...) dão a si próprios a tarefa de revelar como a interpretação liberal dos direitos fundamentais e a defesa do judicial review são incompatíveis com uma política de reconhecimento igualitário capaz de assegurar a sobrevivência das distintas identidades culturais. (CITTADINO, 2000, p. 194)
Assim, não é difícil enxergar Taylor dentro dessa última vertente, figurando ao lado de Walzer, Kymlicka, McIntyre e outros. Vamos assumir essa premissa como correta, levando em conta o fato de que a classificação, por si só, não esclarece muito a questão (por exemplo: existem liberais que como Dworkin dão prevalência ao princípio da igualdade; outros, como Nozick, defendem "mais" o princípio da liberdade...).
Nesse diapasão, segundo Habermas (2002, p. 233), Taylor não crê numa neutralidade ética do direito e acredita ser possível que o Estado fomente certas concepções do bem. Assim, no caso de Quebec, para Taylor, o Estado estaria autorizado a proibir propagandas que não fossem veiculadas em francês, ou exigir que pais de origem francófona matriculem seus filhos em escolas francesas. Tal exigência seria incompatível com o liberalismo 1 e exigiria uma reformulação da teoria. É o que ele chama de liberalismo 2, que, na verdade, impõe restrições não a direitos fundamentais elementares, mas direitos de precedência e privilégios, passíveis de serem afastados em prol da sobrevivência "coerciva" de uma comunidade cultural.
Habermas (2002, p. 234) irá opor-se dizendo que uma teoria dos direitos, devidamente compreendida, jamais fecha os olhos para diferenças culturais. O que Taylor chama de liberalismo 1 revela um tipo de interpretação que ignora o conceito kantiano de autonomia. É um modelo de interpretação paternalista. "O liberalismo 1 ignora a eqüiprocedência das autonomias privada e pública" (HABERMAS, 2002, p. 234). Quem deve dizer sob que condições estarão ou não sendo reconhecidos são os próprios destinatários das normas. Num direito moderno caracterizado individualisticamente é impossível esperar que o Estado vá ditar como os grupos e pessoas deverão ser reconhecidos. Trata-se muito mais de uma questão de luta que de política. Hegel é bastante elucidativo para nos mostrar como o reconhecimento depende muito mais da troca de significativos numa relação intersubjetiva mútua que numa imposição unilateral.
Pessoas, inclusive pessoas do direito, só são individualizadas por meio da coletivização em sociedade. Sob essa premissa, uma teoria dos direitos entendida de maneira correta vem exigir exatamente a política de reconhecimento que preserva a integridade do indivíduo, inclusive nos contextos vitais que conformam sua identidade. Para isso não é preciso um modelo oposto que corrija o viés individualista do sistema de direitos sob outros pontos de vista normativos; é preciso apenas que ocorra a realização coerente desse viés. E sem os movimentos sociais e sem lutas políticas, vale dizer, tal realização teria poucas chances de acontecer. (HABERMAS, 2002, p. 235)
Uma concepção procedimentalista do direito visa assegurar eqüiprimordialmente a autonomia pública e privada dos cidadãos. Superando os paradigmas liberal e de bem-estar, o paradigma procedimental não torna os destinatários apenas formalmente sujeitos de direito nem tão-somente clientes de uma burocracia que lhes impõe externamente um reconhecimento indevido. Habermas ilustra isso com o exemplo das mulheres que, num primeiro momento, foram equiparadas aos homens de forma prescritiva, ignorando suas peculiaridades; num segundo momento, classificações impostas "de fora" levaram a um tipo de reconhecimento longe daquele buscado por elas.
Daí a conseqüência a ser ressaltada em nosso contexto: nenhuma regulamentação, por mais sensível que seja ao contexto, poderá concretizar adequadamente o direito igual a uma configuração autônoma da vida privada, se ela não fortalecer, ao mesmo tempo, a posição das mulheres na esfera pública política, promovendo a sua participação em comunicações políticas, nas quais é possível esclarecer os aspectos relevantes para uma posição de igualdade (HABERMAS, 1997, p. 169)
Por isso é que a compreensão de Taylor de uma inadequação do universalismo abstrato dos direitos fundamentais às peculiaridades culturais subverte a autonomia. Não é preciso criar um sistema de direitos coletivos, mas sim atentar para o nexo interno entre autonomia pública e privada que deve estar presente (HABERMAS, 2002, p. 238).
Habermas (2002) enfatiza que as lutas empreendidas nos fenômenos do feminismo, do multiculturalismo, do nacionalismo e na herança eurocêntrica do colonialismo são fenômenos distintos. O feminismo busca modificar a autocompreensão dos homens, para que haja a possibilidade de reconhecimento. Minorias étnicas e culturais, na luta por reconhecimento de suas identidades coletivas, buscam alterar a autocompreensão da cultura majoritária; essa modificação significa constituir uma sociedade aberta a qualquer cultura. O nacionalismo visa manter a identidade enquanto comunidade de ascendência comum e sob a forma de povo organizado como Estado. Por último, países outrora colonizados buscam hoje o reconhecimento devido. Taylor (2000) prevê uma solução para todos esses fenômenos sem considerar suas diferenças. Habermas (2002) não apresenta uma solução, mas um meio para se chegar a ela.
Essa solução proposta por Taylor (2000) está no campo do direito e da política. Sendo assim, o sentido jurídico a ela atribuído requer que adequemos a questão à estrutura do direito moderno. Um direito formal, individualista, coercivo, escrito por via procedimental requer, sobretudo, que seja legítimo:
Do ponto de vista normativo, não há Estado de direito sem democracia. Por outro lado, como o próprio processo democrático precisa ser institucionalizado juridicamente, o princípio da soberania dos povos exige, ao inverso, o respeito a direitos fundamentais sem os quais simplesmente não pode haver um direito legítimo: em primeira linha o direito a liberdades de ação subjetivas iguais, que por sua vez pressupõe uma defesa jurídica individual e abrangente. (HABERMAS, 2002, p. 243)
No que concerne à neutralidade ética do direito, Habermas (2002, p. 244) sustenta que uma compreensão democrática do sistema de direitos não é (nem pode ser) infensa às concepções do bem comum presentes numa sociedade situada historicamente. As normas jurídicas referem-se a contextos e só vinculam sujeitos neles inseridos. Não há como estabelecer uma ordem jurídica que não esteja impregnada por orientações concretas de valor que um conjunto de pessoas assume. O que não pode ocorrer é a dissolução do direito na política.
Isso se revela no espectro amplo das razões que desempenham um papel na formação racional da opinião e da vontade do legislador político: ao lado de ponderações morais, considerações pragmáticas e dos resultados de negociações justas e honestas, também as razões éticas desempenham um papel nos aconselhamentos e justificações de decisões políticas. (HABERMAS, 2002, p. 245)
O que o Estado não pode fazer é assumir uma certa identidade coletiva de forma a sufocar a manifestação e impedir o reconhecimento das identidades minoritárias. Ele pode sim assumir uma cultura majoritária; mas não pode pretender inculcar a apreciação por culturas minoritárias na formação do caráter das pessoas. Garantir a sobrevivência da minoria francófona através da criação de um Estado dentro de um Estado não resolve o problema. A minoria pode vir a se tornar uma outra maioria e sufocar minorias dentro dela.
E isso não depende de reformarmos nossas concepções acerca do valor de determinadas culturas tidas como inferiores. Se o sistema de direitos trabalha justamente com a impossibilidade de adentrar numa esfera que é privativa de cada indivíduo portador de direitos subjetivos, nós não precisamos que ele mude suas concepções para que outros sejam devidamente reconhecidos. Aliás, o mérito da sobrevivência de certas culturas em nossa modernidade advém justamente da possibilidade delas vincularem as pessoas através de argumentos racionais. O máximo que se pode pedir aos cidadãos é que sejam tolerantes.
Em sociedades multiculturais, a coexistência eqüitativa das formas de vida significa para cada cidadão uma chance segura de crescer sem perturbações em seu universo cultural de origem, e de também poder criar seus filhos nesse mesmo universo; ou seja, significa a chance de poder confrontar-se com sua cultura de origem – como com qualquer outra –, dar-lhe continuidade ou transformá-la, ou ainda a chance de distanciar-se com indiferença de seus imperativos, ou mesmo romper com ela, em uma atitude autocrítica, para viver a partir daí com a marca deixada por uma ruptura consciente com a tradição ou então com uma identidade cindida. (HABERMAS, 2002, p. 252)
É preciso que os cidadãos de uma sociedade pós-convencional [05] vinculem-se uns aos outros no nível de abstração suficiente a apenas mantê-los unidos, mas não que exija deles que tenham por outras culturas um sentimento de compaixão. O direito não alcança esses objetivos. A proposta de Ronald Dworkin acerca de uma comunidade de princípios ilustra bem esta questão:
Convém repetir que nada, nesse argumento, sugere que os cidadãos de uma nação, ou mesmo de uma comunidade política menor, sintam ou devam sentir entre si uma emoção que pudéssemos chamar de amor (...). É certo que não poderíamos interpretar a política de qualquer comunidade política como a expressão desse nível de interesse mútuo, e tampouco é atraente esse ideal. A rendição total da personalidade e da autonomia ali explícita deixaria às pessoas muito pouco espaço para levarem suas vidas em vez de serem levadas com elas; destruiria as próprias emoções que celebra. Nossas vidas são ricas porque são complexas conforme os níveis e a natureza das comunidades em que vivemos. Se sentíssemos por amantes, amigos ou colegas nada além do mais intenso interesse que pudéssemos sentir por todos os nossos concidadãos, isso significaria a extinção, e não a universalidade do amor. (1999, p. 258/259)
Habermas propõe um tipo de integração de cidadãos num Estado democrático de direito que não seja meramente ético, que possa transcender o contexto de seus projetos de vida particulares. A integração ética deve ser desacoplada da integração política, um tipo de pertinência abstrato o suficiente para tratar como iguais sujeitos com diferentes concepções de bem. É o que Frank Michelman e Habermas chamarão de patriotismo constitucional, ou seja, uma afinidade neutra o bastante para não assumir uma forma ética apenas, mas concreta no nível de estar devidamente situada historicamente e poder ser reconhecida por todos.
A neutralidade do direito em face das diferenciações éticas no interior do Estado pode ser explicada pelo fato de que, em sociedades complexas, não se pode mais manter coesa a totalidade dos cidadãos através de um consenso substancial acerca dos valores, mas tão-somente através de um consenso quanto ao procedimento relativo a ações jurígenas legítimas e ao exercício do poder. (...) O universalismo dos princípios jurídicos reflete-se, com certeza, em um consenso procedimental que certamente precisa estar circunscrito por um patriotismo constitucional – por assim dizer –, no contexto de uma respectiva cultura política historicamente determinada (HABERMAS, 2002, p. 254/255)