INTRODUÇÃO
O tema central deste trabalho gravita em torno do estudo das provas ilícitas no âmbito do processo penal e de sua inadmissibilidade como embasamento para ações penais e condenações. Com o advento da Constituição Federal de 1988, foram proibidas todas as provas ilícitas e sua utilização, consagrando, assim, os direitos e garantias discutidos ao longo do trabalho.
Entretanto, percebe-se que, como toda regra possui suas exceções, a vedação ao uso de provas ilícitas no processo penal tem sua aplicabilidade relativizada com base em determinadas teorias e situações que envolvem o caso concreto, conforme será analisado no presente estudo.
O trabalho inicia-se com um panorama sobre a prova no processo penal, apresentando um breve histórico de sua aplicação e passando à análise de seu conceito, objeto e finalidade, além de abordar a quem cabe o ônus probatório conforme as previsões legais.
O capítulo seguinte desenvolve um enfoque mais constitucional da matéria, expondo os princípios constitucionais aplicáveis ao processo penal e, especificamente, à prova. Esses princípios visam garantir um desenvolvimento probatório idôneo, imparcial e respeitador de direitos fundamentais, como a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal.
O quarto capítulo realiza um estudo sobre a prova ilícita e a prova ilegítima, propondo suas definições e abordando sua diferenciação, de forma a possibilitar a compreensão da aplicação da teoria da árvore envenenada. Conclui-se, então, com uma ilustração jurisprudencial sobre a aplicação dessa teoria pelo Supremo Tribunal Federal.
O capítulo final aborda, de forma específica, as possibilidades de relativização da vedação ao uso de provas penais ilegais, dispondo sobre teorias advindas do direito norte-americano que, ao serem recepcionadas pelo direito brasileiro, têm o condão de possibilitar o aproveitamento dessas provas.
O objetivo deste trabalho é proporcionar uma melhor compreensão acerca das situações em que se identifica a relativização das provas ilícitas no processo penal, explanando as teorias existentes — tanto aquelas já aceitas no ordenamento jurídico pátrio quanto as que ainda são utilizadas apenas em âmbito internacional —, por meio das quais se vislumbra a hipótese de acolhimento desse tipo de prova na persecução criminal.
Este estudo foi desenvolvido com base em pesquisas acadêmicas e doutrinárias, na legislação vigente e nos entendimentos dos tribunais brasileiros sobre o tema.
1. A PROVA NO PROCESSO PENAL
A prova é um fator que exerce importante influência na resolução de uma lide, seja para comprovar a ocorrência de um fato ou, no caso do processo penal, em geral, para demonstrar a autoria delitiva. Ela tem o condão de estabelecer quais serão os resultados desse processo.
Neste capítulo, busca-se uma abordagem sintética de sua história, partindo da análise de seu conceito, objeto e finalidade, bem como da verificação do ônus probante determinado em lei.
1.1. BREVE HISTÓRICO
Desde a antiguidade até os dias atuais, quando uma situação demandava uma intervenção acerca de ocorrências que envolviam as relações humanas e seus direitos, sempre houve uma busca por meios que comprovassem o ocorrido e pudessem solidificar o deslinde do caso. Contudo, nem sempre o que se buscou foi a verdade.
Eugênio Pacelli faz a seguinte narrativa:
Ao longo de toda a sua história, o Direito defrontou-se com o tema da construção da verdade, experimentando diversos métodos e formas jurídicas de obtenção da verdade, desde as ordálias e juízos de deus (ou dos deuses), na Idade Média, em que o acusado submetia-se a determinada provação física (ou suplício), de cuja superação, quando vitorioso, se lhe reconhecia a veracidade de sua pretensão, até a introdução da racionalidade nos meios de prova. Tourinho Filho cita os seguintes exemplos do sistema ordálico: “Havia a prova da água fria: jogado o indiciado à água, se submergisse, era inocente, se viesse à tona seria culpado […] A do ferro em brasa: o pretenso culpado, com os pés descalços, teria que passar por uma chapa de ferro em brasa. Se nada lhe acontecesse, seria inocente; se se queimasse, sua culpa seria manifesta […]”. De uma verdade inicialmente revelada pelos deuses a outra, produzida a partir da prova racional, submetida ao contraditório e ao confronto dialético dos interessados em sua valoração, o Direito, em geral, e, mais especificamente, a partir do século XVIII, com a evolução da processualização da jurisdição, o processo penal, sempre se ocupou da reconstrução judicial dos fatos tidos por delituosos. Ora com a preocupação voltada exclusivamente para a satisfação dos interesses de uma não bem definida segurança pública, ora com a atenção também dirigida para a proteção dos interesses do acusado, sobretudo quando este passou a ocupar a posição de sujeito de direitos no processo, e não de objeto do processo. (PACELLI, 2017, p. 174).
O que se pode constatar é que, nos períodos mais remotos, a “produção” de provas tinha o propósito de fundamentar as possíveis condenações. Isso pode ser observado nas palavras de Eugênio Pacelli, anteriormente transcritas, sobre os julgamentos religiosos contra as “heresias”. Nesses casos, a morte do acusado era praticamente certa, já que, para provar que não era feiticeiro, a pessoa tinha uma pedra amarrada ao pescoço e era lançada ao rio ou ao mar. Se afundasse, era considerada culpada; se flutuasse, era inocente. Esse procedimento de produção de provas não teria outro resultado além do esperado.
1.2. CONCEITO
A prova é um dos aspectos de maior relevância na persecução penal, tendo em vista que é ela que pode ter importante influência nos resultados do processo e, por conseguinte seu resultado final, deve o julgador e operador do direito respeitar todas as prescrições em torno da produção probatória a fim de evitar a ocorrência de nulidades.
Analisando a etimologicamente, o termo prova vem do latim “probatio” ou “probam” designando aquilo que demonstra a confirmação, a veracidade de um fato ou afirmação. (LIMA, 2013, p. 555).
A prova é caracterizada por ser um conjunto de atos que pode ser praticado pelo juiz e/ou pelas partes do processo, por terceiros, o qual tem como finalidade promover o convencimento e a comprovação da existência ou não de determinado fato. Norberto Avena conceitua a prova como sendo “o conjunto de elementos produzidos pelas partes ou determinados pelo juiz visando à formação do convencimento quanto a atos, fatos e circunstâncias". (AVENA, 2017, p. 315)
Na lição de Ronaldo Tanus Madeira encontra-se a seguinte definição:
A prova penal pode ser conceituada como o conjunto de fatos produzidos pelas partes, acusação e defesa, e de ofício, pelo próprio juiz, em um procedimento processual, cuja finalidade é a de estabelecer uma verdade real, e que possa, com segurança, levar o magistrado a prolatar uma decisão final da causa. (MADEIRA, 2003, p. 124).
Assim, a prova se refere ao meio empregado pelas partes, de um modo geral, para comprovar a veracidade de sua alegação e postulação, no intuito de trazer para o processo elementos que possuam a capacidade de promover o convencimento do julgador e proporcionar o embasamento do julgamento o mais próximo da realidade dos fatos.
Em geral, as provas são produzidas durante a fase instrutória do processo, trazendo aos autos elementos que tenham o condão de confirmar os fatos e direitos alegados. Porém, devem ser apresentadas e analisadas com observância de todos os preceitos legais para sua consideração, evitando assim o embasamento em provas eivadas de vícios.
1.3. OBJETO DA PROVA
Objeto da prova corresponde a toda a situação que motivou a propositura do processo em questão, são todos os fatos nele envolvidos; é também aquilo que se deseja demonstrar, que dependam de sua comprovação.
Neste sentido, se tem a afirmação de Vicente Greco Filho:
O objeto da prova são os fatos. Nem todos os fatos, porém, devem ser submetidos a atividade probatória. Em primeiro lugar, apenas os fatos pertinentes ao processo é que suscitam o interesse da parte em demonstrá-los; os fatos impertinentes, isto é, não relacionados com a causa, devem ter sua prova recusada pelo juiz, sob pena de se desenvolver atividade inútil. Além de pertinentes, só devem ser provados os fatos relevantes, que são os que podem influir, em diferentes graus, na decisão da causa. Os fatos irrelevantes são, na realidade, também impertinentes. (GRECO FILHO, 2012, p. 281).
O conjunto probatório tem como objeto de análise os fatos propostos pelas partes. Na prática, são eles que norteiam a produção das provas, possibilitando que cada parte envolvida tente comprovar o que alega, tente fundamentar a acusação ou a defesa. Fernando Tourinho Filho leciona sobre o objeto da prova:
Qual o objeto da prova? A nosso juízo, "objeto da prova" é a mesma coisa que finalidade da prova; vale dizer, portanto, que ela se destina ao convencimento do Juiz. Mas, se usarmos os termos "objeto da prova" no sentido daquilo que deve ser provado, então, todos os fatos sobre os quais versa a lide são objeto da prova. Objeto da prova é o convencimento do Juiz e objeto de prova, repita-se, é o thema probandum. É o fato a ser provado. Evidente, por outro lado, que a palavra fato, aqui, se prolonga, como diz Florian, a coisas, lugares, pessoas e documentos, levando Alcalá-Zamora a esta afirmação: é fato o que não é direito. (TOURINHO FILHO, 2010, p. 555).
Vale ressaltar que o objeto da prova não faz ligação apenas com o fato criminoso e a quem pertenceria sua autoria, mas refere-se igualmente as circunstâncias subjetivas e objetivas que podem influenciar na decisão do pleito, na responsabilidade penal e na fixação da pena.
Evidencia-se então que será considerado objeto da prova tudo aquilo que deverá ser deixado claro para o juiz, pelas partes, a fim de que se tenha o conhecimento necessário para solucionar o caso. Necessário se faz observar que apenas os fatos relevantes sobre o processo, é que são tidos como objeto de prova.
A prova poderá ser direta ou indireta, conforma ensina Júlio Fabrini Mirabete:
Quanto ao objeto, a prova pode ser direta, quando por si demonstra o fato, quando dá a certeza deles por testemunhas, documentos, etc. Ou indireta, quando comprovado um outro fato, se permite concluir o alegado diante de sua ligação com o primeiro, como na hipótese de um álibi, em que a presença comprovada do acusado em lugar diverso do crime permite concluir que não praticou o ilícito. (MIRABETE, 2001, p. 258).
Conforme demonstrado acima, apenas os fatos que deixam dúvidas, que tenham a necessidade de se comprovar, é que serão objetos de prova. Isto se dá, devido ao fato de que no processo penal, existem fatos que não precisam de prova, quais sejam: fatos axiomáticos ou intuitivos, fatos notórios, presunções legais e fatos inúteis.
Os fatos notórios são considerados como sendo aqueles fatos em que seu conhecimento faz parte da cultura da sociedade, da informação dos indivíduos inseridos em determinado meio, como exemplo, temos a verdade sabida. A presunção legal corresponde aos fatos que se pode constatar mediante a própria lei, ou, ainda, o conhecimento que decorre da ordem normal das coisas. Essa presunção é denominada em duas categorias: a presunção absoluta, que é aquela em que não é admitida prova em contrário, e a presunção relativa que é quando a presunção poderá ser afastada quando tiver prova que a contradiga. (BARBOSA, 2016).
E, por fim, fatos inúteis, são aqueles que, sendo verdadeiros ou não, não irão influenciar na busca da verdade e nem na resolução do caso. Sobre o objeto da prova, ainda é preciso estabelecer sua finalidade, pois a mesma deverá objetivar um fim, pois não se faz uma prova para nada, sem um fim específico.
1.4. FINALIDADE DA PRODUÇÃO PROBATÓRIA
A finalidade da prova refere a possibilitar o livre convencimento e a convicção sobre os fatos apresentados, para que o julgador possa embasar sua decisão. É através da produção probatória que se pode apurar a responsabilidade de um indivíduo pela conduta aventada no procedimento processual.
Para o processo penal, o objetivo da prova é convencer o julgador quanto a verdade dos fatos apresentados, resultando assim em uma possível condenação daquele que é acusado. Igualmente, a defesa deverá demonstrar que tal fato apresentado contra o réu não corresponde com a verdade, o que possibilitaria uma absolvição.
Eugênio Pacelli comenta sobre o objetivo das provas no âmbito judicial:
A prova judiciária tem um objetivo claramente definido: a reconstrução dos fatos investigados no processo, buscando a maior coincidência possível com a realidade histórica, isto é, com a verdade dos fatos, tal como efetivamente ocorridos no espaço e no tempo. A tarefa, portanto, é das mais difíceis, quando não impossível: a reconstrução da verdade. (PACELLI, 2017, p. 174).
Fica evidenciado que as provas servem para realizar o convencimento do magistrado, como também, para que a sociedade tenha certa garantia da decisão tomada pelo juiz.
É a primazia da busca pela verdade real que pode fundamentar alegações e comprovar ocorrências, assim, a finalidade especifica da prova é convencer o juiz, para que se possa encontrar a verdade “processual” com base na qual sua decisão será exarada. (NUCCI, 2014, p. 285).
No processo penal, o juiz não poderá ter dúvidas com relação à autoria do crime, e, caso isso ocorra, o réu será beneficiado, obedecendo ao princípio in dúbio pro reo. Consoante a isso, a prova produzida e apresentada nos autos será utilizada pelo juiz ou pelas partes, restando o entendimento de que a finalidade da prova diz respeito especificamente a produção de meios que fundamentem o resultado e deslinde do processo com observância aos ditames legais.
1.5. O ÔNUS PROBATÓRIO
A produção probatória desenvolvida pelas partes no decorrer do processo, bem como o ônus de produzi-la, está elencada no artigo 156 do Código de Processo Penal: “a prova da alegação incumbirá a quem a fizer, mas o Juiz poderá, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, determinar, de ofício, diligências para definir dúvida sobre o ponto relevante”. (BRASIL, 1940).
A respeito do encargo estabelecido em lei para a produção de provas, ou seja, a quem caberia o ônus probante Eugênio Pacelli expõe:
Em um processo informado pelo contraditório e pela igualdade das partes, a distribuição dos ônus probatórios deveria seguir as mesmas linhas de isonomia. Entretanto, o nosso processo penal, por qualquer ângulo que se lhe examine, deve estar atento à exigência constitucional da inocência do réu, como valor fundante do sistema de provas. Afirmar que ninguém poderá ser considerado culpado senão após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória implica e deve implicar a transferência de todo o ônus probatório ao órgão da acusação. A este caberá provar a existência de um crime, bem como a sua autoria. Há já aqui uma questão. Afirmar que cabe à acusação a prova da existência do crime significaria dizer que deve o Ministério Público (ou o querelante) comprovar a presença de todos os elementos que integram o conceito analítico de crime, ou seja, a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade? Veremos que não. E veremos também que o Direito Processual Penal, como acontece com todo o Direito, trabalha com presunções legais. (PACELLI, 2017, p. 178).
O ordenamento jurídico é claro e incontroverso em sua determinação de que o ônus probante cabe a quem interessar comprovar a constituição, modificação ou extinção de um direito. Nesse mesmo sentido, segue a explicação sobre o ônus da prova no processo penal na lição de Guilherme de Souza Nucci:
Como regra, no processo penal, o ônus da prova é da acusação, que apresenta a imputação em juízo através da denúncia ou da queixa-crime. Entretanto, o réu pode chamar a si o interesse de produzir prova, o que ocorre quando alega, em seu benefício, algum fato que propiciará a exclusão da ilicitude ou da culpabilidade, embora nunca o faça de maneira absoluta. Imagine-se que afirme ter matado a vítima, embora o tenha feito em legítima defesa. É preciso provar a ocorrência da excludente, não sendo atribuição da acusação fazê-lo, como regra, até por que o fato e suas circunstâncias concernem diretamente ao acusado, vale dizer, não foram investigados previamente pelo órgão acusatório. Saliente-se no entanto, que tal ônus de prova da defesa não deve ser levado a extremos, em virtude do princípio constitucional da presunção de inocência e, consequentemente, do in dubio pro reo. Assim, embora a acusação tenha comprovado o fato principal – materialidade e autoria –, a dúvida gerada pelas provas produzidas pelo acusado, a respeito da existência da justificativa, deve beneficiar a defesa. (NUCCI, 2014, p. 286).
Na seara processual penal, cabe ao acusador buscar comprovar a culpabilidade de quem está submetido a persecução criminal, cabendo a este último produzir provas que possa corroborar em sua defesa.
Consoante a isso, é incontroversa a compreensão de que a produção de prova cabe aquele que tem interesse em afirmar algo, esse é incumbido de provar os fatos constitutivos de seus direitos e, ao acusado cabe provar aqueles fatos extintivos e as condições impeditivas ou modificativas, cabe o ônus de provar, no caso do processo penal, sua inocência quanto a tipificação que lhe é imposta.
2. PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL
Os princípios norteiam as bases em que uma lei será moldada conforme os objetivos a ela delineados, bem como norteiam sua aplicação, estabelecem limites e prioridades em como se deve respeitar direitos, preservar o bem jurídico e se for o caso impor sanções quando necessárias nas devidas proporções.
Neste capítulo a abordagem se dá em torno dos princípios constitucionais que regulamentam o processo penal, bem como aos princípios penais aplicados a produção de provas, estabelecendo ainda os moldes em como o direito à prova constitui garantia fundamental assegurada na constituição.
2.1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
Os princípios penais a seguir abordados são encontrados na Constituição Federal de 1988 de forma explícita e implícita, e visam a garantir um sistema igualitário e cumpridor de direitos e garantias legais, individuais ou coletivas, preservando sempre a democracia e a dignidade da pessoa humana.
Em apertada síntese, o termo princípio designa a base, o inicio de algo. No âmbito jurídico representa o ponto fundamental de equilíbrio entre garantias/direitos e a aplicação da lei. (TORRES, 2014).
O Princípio da inocência constitui a garantia do estado de inocência pressupõe que até prova em contrário um indivíduo é inocente. Encontra-se previsto no artigo 5º, LVII da Constituição Federal de 1988, do qual emana o entendimento de que a menos que se tenha sentença penal condenatória transitada em julgado o acusado mantém esse estado. (BRASIL, 1988).
Anteriormente, a Constituição atual, o mencionado princípio era previsto de forma implícita através da observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, com o advento da Constituição Federal de 1988, o princípio da presunção de inocência passou a ser tutelado expressa e especificamente.
Renato Brasileiro de Lima assim relata:
Esse direito de não ser declarado culpado enquanto ainda há dúvida sobre se o cidadão é culpado ou inocente foi acolhido no art. 9o da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). A Declaração Universal de Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), em 10 de dezembro de 1948, em seu art. 11.1, dispõe: "Toda pess6a acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa''. Dispositivos semelhantes são encontrados na Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (art. 6.2), no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 14.2) e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Dec. 678/92- art. 8°, § 2°): "Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa". (LIMA, 2017, p. 43).
Tem sua aplicabilidade no curso processual relacionada, de certa forma, ao encargo de que quem acusa deve provar que a culpabilidade do acusado e, que não obstante a apresentação das provas, somente uma decisão transitada em julgado tem a capacidade de inserir esse indivíduo no rol dos culpados, alterando seu estado de inocência.
Procede do Princípio da não autoincriminação a garantia dada a quem estiver sendo investigado ou acusado de não ser obrigado a realizar ou produzir prova contra si mesmo, ou qualquer manifestação que possa lhe ser desfavorável.
Eugênio Pacelli comenta:
Atingindo duramente um dos grandes pilares do processo penal antigo, qual seja, o dogma da verdade real, o direito ao silêncio, ou a garantia contra a autoincriminação, não só permite que o acusado ou aprisionado permaneça em silêncio durante toda a investigação e mesmo em juízo, como impede que ele seja compelido – compulsoriamente, portanto – a produzir ou a contribuir com a formação da prova contrária ao seu interesse. Nesta última hipótese, a participação do réu somente poderá ocorrer em casos excepcionalíssimos, em que, além da previsão expressa na lei, não haja risco de afetação aos direitos fundamentais da pessoa. Adiante, quando tratarmos do tema relativo às provas, analisaremos as chamadas intervenções corporais (item 9.2.1.2), admitidas, em maior ou menor escala, em todo o mundo ocidental, desde que observados rígidos limites. O direito ao silêncio deflui da regra constitucional prevista no art. 5º, LXIII, da CF, e implicou a imediata revogação (implícita, por incompatibilidade) daquilo que dispunham o art. 186. (posteriormente revigorado pela Lei nº 10.792/03) e o art. 198. do CPP, pela simples e bastante razão de não se poder atribuir qualquer forma de sanção a quem esteja no exercício de um direito a ele assegurado em lei. (PACELLI, 2017, p. 35-36).
O indivíduo não poderá ser obrigado por autoridade, ou mesmo por particular, a manifestar-se pela produção de qualquer prova no sentido que possa lhe prejudicar, a deverá fazer de plena consciência e voluntariedade. Nesse caso, informações que tenha aventado e possa porventura tornar-se objeto de prova contra si não poderá ser aceita.
Os Princípios do contraditório e da ampla defesa estão previstos na Constituição Federal elenca de forma taxativa o rol de direitos e garantias fundamentais, no caso, o parágrafo LV traz consigo previsão expressa acerca dos princípios do contraditório e da ampla defesa, novamente, basilares do Estado Democrático de Direito ao estabelecer como segurança o exercício desses direitos. (TORRES, 2014).
Em termos específicos, Renato Brasileiro de Lima conceitua o princípio do contraditório como:
[...] a ciência bilateral dos atos ou termos do processo e a possibilidade de contrariá-los. De acordo com esse conceito, o núcleo fundamental do contraditório estaria ligado à discussão dialética dos fatos da causa, devendo se assegurar a ambas as partes, e não somente à defesa, a oportunidade de fiscalização recíproca dos atos praticados no curso do processo. Eis o motivo pelo qual se vale a doutrina da expressão "audiência bilateral", consubstanciada pela expressão em latim audiatur et altera pars (seja ouvida também a parte adversa). [...] Não se pode cogitar da existência de um processo penal eficaz e justo sem que a parte adversa seja cientificada da existência da demanda ou dos argumentos da parte contrária. (LIMA, 2017, p. 51).
É da observância ao princípio do contraditório, somado a outros, que se pode compreender a garantia do direito a prova, ou seja, é direito das partes de estarem cientes do andamento processual e de produzirem as provas que entenderem necessárias.
A respeito do princípio da ampla defesa Vicente Greco Filho o define da seguinte forma:
Consiste a ampla defesa na oportunidade de o réu contraditar a acusação, mediante a previsão legal de termos processuais que possibilitem a eficiência da defesa, como já se disse. Ampla defesa, porém, não significa oportunidades ou prazos ilimitados. Dentro do que a prática processual ensina, a lei estabelece os termos, os prazos e os recursos suficientes, de forma que a eficácia, ou não, da defesa dependa da atividade do réu, e não das limitações legais. O réu é também obrigado a cumprir os prazos da lei, nada podendo arguir se os deixou transcorrer sem justo motivo. A ampla defesa se traduz, em termos objetivos, englobando a instrução contraditória, em algumas soluções técnicas dentro do processo, as quais, na verdade, tornam efetiva a garantia. (GRECO FILHO, 2012, p. 95).
O contraditório e a ampla defesa estão intimamente ligados, sendo o primeiro suporte para a efetividade do segundo, sendo de forma pertinente ao estudo, uma garantia de que o acusado poderá contrariar o que lhe é imposto e dispor de todos os meios de defesa cabíveis.
Tem a finalidade essencial de garantir equilíbrio entre o poder punitivo estatal, o direito à liberdade e a presunção de inocência. (TORRES, 2014)
O Princípio da proporcionalidade prescreve a orientação no sentido de que medidas sejam tomadas conforme a situação que se apresenta, representa uma limitação de as punições devem ser impostas na medida da transgressão ocorrida, não sendo permitida penalidades cruéis e severas, bem como desnecessariamente mais gravosas em casos de menor potencial ofensivo.
Nas palavras de Renato Brasileiro de Lima:
O princípio da proporcionalidade não está previsto de maneira expressa na Constituição Federal. Porém, não há como negar sua sedes materiae na própria Carta Magna, estando inserido no aspecto material do princípio do devido processo legal (substantive due process of law)- "Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal" (CF. art. 5°, LIV). Com efeito, o exame da cláusula referente ao due process of law permite nela identificar alguns elementos essenciais à sua configuração como expressiva garantia de ordem constitucional, destacando-se, dentre eles, por sua inquestionável importância, as seguintes prerrogativas: a) direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário); b) direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação; c) direito a um julgamento público e célere, sem dilações indevidas; d) direito ao contraditório e à plenitude de defesa (direito à autodefesa e à defesa técnica); e) direito de não ser processado e julgado com base em leis ex post facto; f) direito à igualdade entre as partes; g) direito de não ser processado com fundamento em provas revestidas de ilicitude; h) direito ao benefício da gratuidade; i) direito à observância do princípio do juiz natural; j) direito ao silêncio (privilégio contra a autoincriminação); l) direito à prova; e m) direito de presença e de "participação ativa" nos atos de interrogatório judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando existentes. (LIMA, 2017, p. 84).
Mesmo não previsto de forma especifica pela Carta Constitucional, é reconhecido como princípio implícito que tem o condão de limitar os atos e o exercício do poder de punir do Estado. Tem o objetivo de equilibrar direitos individuais e anseios sociais, demonstrando que nenhum direito é absoluto e pode se sobrepor a outro. (RAMOS, 2011)
A garantia do devido processo legal caracteriza uma das bases do Estado Democrático de Direito, permitindo que a ninguém seja imputado um determinado resultado sem a ocorrência desse procedimento, sem que tenha a possibilidade de apresentar suas alegações e defesa conforme se fizer necessário. Está previsto na Constituição Federal em seu artigo 5º, LIV. (BRASIL, 1988).
Sua aplicabilidade na seara penal está relacionada ao impedimento de que se puna uma conduta como delituosa sem que se tenha uma lei que a preconize e disponha a seu respeito punição especifica, conforme artigo 5º, XXXIX da Constituição Federal. (BRASIL, 1988).
Assim leciona Victor Eduardo Rios Gonçalves:
Para toda espécie de crime deve existir lei regulamentando o procedimento para a sua apuração. Esse procedimento descrito em lei, por se tratar de matéria de ordem pública, não pode ser modificado pelas partes, que também não podem optar por procedimento diverso daquele previsto. A finalidade do dispositivo constitucional é estabelecer que o descumprimento das formalidades legais pode levar à nulidade da ação penal, cabendo aos tribunais definir quando esse error in procedendo constitui nulidade absoluta ou relativa. (GONÇALVES, 2016, p. 100).
O mencionado princípio constitucional, assegura em âmbito do processo penal, que ninguém será punido sem o procedimento competente, a devida instrução processual e a presença do contraditório e da ampla defesa.
2.2. PRINCÍPIOS PROCESSUAIS DA PROVA
O campo do ordenamento jurídico traz princípios que norteiam as mais diversas áreas de aplicação do direito e da lei em si, basilares que devem ser respeitados principalmente como forma de assegurar o exercício de direitos e garantias fundamentais do indivíduo.
Em relação a aplicação da prova no processo penal não é diferente, procede-se então a uma breve análise sobre os princípios inerentes à prova e necessários ao desenvolvimento do tema proposto conforme se vê:
Deriva do princípio da autorresponsabilidade das partes a obrigatoriedade de cada uma das partes envolvidas no processo seja responsabilizada por seus atos processuais, por uma inércia, negligência ou outras condutas, em outras palavras cada parte é responsável por formar seu conjunto probatório e buscar comprovar ao julgador os fatos que trazem aos autos.
Conforme prevê Victor Eduardo Rios Gonçalves, o princípio da autorresponsabilidade: “atribui às partes o ônus de produzir prova de suas alegações, estabelecendo que elas terão de arcar com as consequências processuais de eventual omissão”. (GONÇALVES, 2016, p. 318).
Faz uma correlação ao ônus da prova, encargo legal de prova a constituição, modificação ou extinção de um direito que se pleiteia, incumbência prevista no artigo 156 do Código de Processo Penal atribuindo as partes a obrigação de provar o que alega, cabendo ao juiz proceder a determinação de produção de provas quando entender necessário. (BRASIL, 1941).
O Princípio da audiência contraditória está intrinsecamente ligado ao princípio do contraditório, ou seja, dele provém o entendimento de que é direito de ambas partes ter total ciência dos fatos alegados e das provas produzidas pela outra, indispensável e garantida a sua presença em audiência onde a parte contrária será ouvida ou apresentará as provas por ela produzida. (RAFAELLE, 2017).
Victor Eduardo Rios Gonçalves explica:
Princípio do contraditório (ou da audiência bilateral) — estabelece a necessidade de garantir a ambas as partes o direito de presenciar a produção das provas ou de conhecer o seu teor, de manifestar -se sobre elas e, ainda, de influir no convencimento do juiz por meio da produção de contraprova. Tem como corolário o princípio da igualdade de armas, que garante aos litigantes a paridade de instrumentos processuais para a defesa de seus interesses. (GONÇALVES, 2014, p. 317).
Constitui um ato bilateral, que poderá acarretar nulidades aos atos nela praticados caso uma das partes não tenha a devida ciência de sua ocorrência.
O Princípio da aquisição ou comunhão estabelece que no momento em que a prova é produzida e juntada aos autos não é cabível o entendimento de que ela pertença unicamente a quem a produziu, na verdade passa a fazer parte de um todo, pertencendo então ao processo. Nesse sentido, cumpre apontar que o princípio da comunhão ou aquisição dos meios de prova representa a interação e relação dessas, com o processo em que são demonstradas. (RAFAELLE, 2017).
Segundo Victor Eduardo Rios Gonçalves:
Princípio da comunhão dos meios de prova (ou da aquisição da prova) — estabelece que, uma vez produzida, a prova pode socorrer qualquer das partes, independentemente de qual dos litigantes a indicou ou introduziu no processo. (GONÇALVES, 2016, p. 317).
Ainda, nas palavras de Guilherme de Souza Nucci:
Significa que a prova, ainda que produzida por iniciativa de uma das partes, pertence ao processo e pode ser utilizada por todos os participantes da relação processual, destinando-se a apurar a verdade dos fatos alegados e contribuindo para o correto deslinde da causa pelo juiz. Realmente, não há titular de uma prova, mas mero proponente. (NUCCI, 2014, p. 82).
A prova produzida poderá ser utilizada de igual forma por todas as partes integrantes daquela relação processual. Como exemplo, pode-se citar a inquirição de uma testemunha a qual pode ser procedida inclusive pela parte contrária a que a arrolou. (AKANATON, 2016).
Inicialmente cumpre apontar que a previsão processual acerca de um sistema oral provém do processo civil, mais precisamente com o advento do Código de Processo Civil de 1939, sendo que antes da promulgação dessa lei o sistema processual desenvolvia-se totalmente através da escrita, considerando a primazia da oralidade permitiria um desenrolar mais rápido ao procedimento processual. (PEREIRA, 2010, p. 10).
Do princípio da oralidade deriva a predominância da palavra falada em relação a escrita, sendo considerada a oitiva das partes e testemunhas, por exemplo. Visa garantir uma maior celeridade ao processo penal.
Conforme expõe Guilherme de Souza Nucci:
A palavra oral deve prevalecer, em algumas fases do processo, sobre a palavra escrita, buscando enaltecer os princípios da concentração, da imediatidade e da identidade física do juiz. Explica PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN que a adoção desse princípio, como regra no processo penal, seria a “grande solução para a agilização dos procedimentos criminais e, até mesmo, a maneira mais viável para a apuração da verdade real – na qual há fulcrar-se todo o processo penal – e a forma de se prestar com maior equidade e justeza a tutela jurisdicional”. (NUCCI, 2014, p. 81).
Está relacionado aos princípios da concentração dos atos processuais e da identidade física do juiz, ou seja, o magistrado que preside a instrução processual colhendo as provas, tendo contato direto com essas para formular sua decisão é o mesmo que deverá proferir a sentença. (BOTELHO, 2011).
Prevista a importância do procedimento oral, certo é que, tanto a oralidade quanto a escrita são imprescindíveis ao deslinde e registro da lide.
Pelo Princípio da publicidade é assegurado a todos os atos do processo – independentemente de seu âmbito de desenvolvimento – a publicidade, ou seja, o acesso irrestrito ao procedimento processual. A prestação da atividade jurisdicional não pode ser feita às escuras. Desta feita, igualmente, os atos probatórios devem ser publicizados.
Segundo Norberto Avena:
O princípio da publicidade, previsto expressamente no art. 93, IX, 1.ª parte, da Constituição Federal38, e no art. 792, caput, do Código de Processo Penal, representa o dever que assiste ao Estado de atribuir transparência a seus atos, reforçando, com isso, as garantias da independência, imparcialidade e responsabilidade do juiz. Além disso, consagra-se como uma garantia para o acusado, que, em público, estará menos suscetível a eventuais pressões, violências ou arbitrariedades. Conforme ensina Julio Fabbrini Mirabete, nele se incluem “os direitos de assistência, pelo público em geral, dos atos processuais, a narração dos atos processuais e a reprodução dos seus termos pelos meios de comunicação e a consulta dos autos e obtenção de cópias, extratos e certidões de quaisquer deles”. (AVENA, 2017, p. 51).
É a segurança de uma maior transparência e equidade no desenvolvido do processo, o qual pode ser averiguado tanto pelas partes envolvidas quanto por terceiros.
Nesse sentido, Renato Brasileiro de Lima:
A garantia do acesso de todo e qualquer cidadão aos atos praticados no curso do processo revela uma clara postura democrática, e tem como objetivo precípuo assegurar a transparência da atividade jurisdicional, oportunizando sua fiscalização não só pelas partes, como portada a comunidade. Basta lembrar que, em regra, os processos secretos são típicos de estados autoritários. (LIMA, 2017, p. 63).
Todavia, como toda regra tem sua exceção, cumpre ressaltar que a publicidade se torna restrita às partes diretamente envolvidas no processo, em situações que demandem segredo de justiça, por exemplo. (AKANATON, 2016).
Procede do princípio do livre convencimento motivado a garantia de que o julgador aprecie o desenvolvimento processual, bem como todas as provas produzidas e possa decidir a respeito dos fatos e circunstâncias apresentadas do modo que lhe representar mais adequado e com a devida fundamentação legal. (RAFAELLE, 2017).
Guilherme de Souza Nucci explica:
Significa que o juiz forma o seu convencimento de maneira livre, embora deva apresentá-lo de modo fundamentado ao tomar decisões no processo. Trata-se da conjunção do disposto no art. 93, IX, da Constituição (“todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade...”, grifamos) com os arts. 155, caput (“o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova...”) e 381, III (“a sentença conterá: (...) III – a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão”) do Código de Processo Penal. (NUCCI, 2014, p. 83).
Continua Victor Eduardo Rios Gonçalves:
É evidente que em um Estado de Direito os juízes devem expor as razões de fato e de direito que os levaram a determinada decisão. O texto constitucional é claro em salientar a nulidade da sentença cuja fundamentação seja deficiente. Tal deficiência é nítida quando o juiz utiliza argumentos genéricos, sem apontar nos autos as provas específicas que o levaram à absolvição ou condenação ou ao reconhecimento de qualquer circunstância que interfira na pena. Não pode o juiz se limitar a dizer, por exemplo, que a prova é robusta e, por isso, embasa a condenação. Deve apontar especificamente na sentença quais são e em que consistem estas provas. (GONÇALVES, 2016, p. 107).
É vedado ao juiz proferir decisão sem sólida e competente fundamentação nas bases legais, contudo, seu convencimento não está pré-formatado ou adstrito a um ou outro lado, ao contrário, seu entendimento será livremente formado.
2.3. O DIREITO À PROVA COMO UM DIREITO FUNDAMENTAL
Antes de adentrar a uma análise especifica a respeito da prova, cumpre finalizar essa abordagem ressaltando que o direito o direito à prova é direito fundamental conforme se vê.
O direito à prova é colocado como um dos pilares garantidores do estado democrático priorizando sempre a busca da verdade, tutelado pela Constituição Federal visa assegurar liberdade a todo indivíduo e consagra o princípio da presunção de inocência do acusado, o direito a todos os meios de defesa e ao devido processo legal. Contudo, não configura um direito absoluto.
Da mesma maneira, os princípios constitucionais que visão proteger e dar garantia a pessoa humana, visam coibir que a busca da verdade ocorra através de meios considerados ilícitos. Nesse sentido leciona Renato Brasileiro de Lima:
Mas por que se vedar a utilização da prova ilícita no processo? Aos olhos do leigo soa desarrazoado permitir-se a absolvição de um culpado pelo fato de a prova contra ele produzida haver sido obtida por meios ilícitos. Para ele, os fins justificam os meios. Não obstante tal visão (equivocada), em um Estado Democrático de Direito, a descoberta da verdade não pode ser feita a qualquer preço. Mesmo que em prejuízo da apuração da verdade, no prol do ideal maior de um processo justo, condizente com o respeite aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, não se pode admitir a utilização em um processo de provas obtidas por meios ilícitos. A eficiência processual, compreendida como a funcionalidade dos mecanismos processuais tendentes a alcançar a finalidade do processo, que é a apuração dos fatos e das responsabilidades, não pode prescindir do respeito aos direitos e garantias fundamentais, sob pena de deslegitimação do sistema punitivo. (LIMA, 2013, p. 592).
O direito à produção de provas é apontado doutrinariamente como um segmento derivado do direito à ação, bem como, pode-se dizer que decorre da observância dos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, já que esses constituem garantias de um desenrolar processual equânime em que ambas as partes possam produzir suas provas necessárias, dispor de todos os meios de defesa e estarem cientes do andamento processual.
Renato Brasileiro de Lima ainda comenta sobre esse direito:
Sob esse prisma, pode se dizer que há, para as partes, um direito à prova. Esse direito à prova (right to evidence, em inglês) funciona como desdobramento natural do direito de ação, não se reduzindo ao, direito de propor ou ver produzidos os meios de prova, mas, efetivamente, na possibilidade de influir no convencimento do juiz. Com efeito, de nada adianta o Estado assegurar à parte o direito de ação, legitimando a propositura da demanda, sem o correspondente reconhecimento do direito de provar, ou seja, do direito de se utilizar dos meios de prova necessários a comprovar, perante o órgão julgador, as alegações feitas ao longo do processo. Há de se assegurar às partes, portanto, todos os recursos para o oferecimento da matéria probatória, sob pena de cerceamento de defesa ou de acusação. (LIMA, 2013, p. 555).
O princípio da ampla defesa presente no Processo Penal significa dizer que é assegurado ao cidadão trazer junto ao processo, elementos que julgue necessários para que se possa solucionar o caso. Está previsto na Constituição Federal em seu artigo 5°, inciso LV:
Artigo 5, inciso LV: Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Princípio esse, estudo no capítulo a seguir de forma mais específica.
Ressalta-se a existência de limitações probatórias, como por exemplo, quando parentes do acusado se recusam a depor e os impedimentos dos indivíduos que precisam guardar segredo devido ao fato de sua profissão no depoimento. Igualmente, o direito à prova implica, no plano conceitual, a vasta possibilidade de utilização de qualquer meio probatório disponível. A regra é a admissão das provas; sendo que as exceções precisam ser devidamente justificadas, tendo alguma razão pertinente.
Todo o indivíduo tem o direito à produção de provas, a observância desse direito é de extrema importância ao desenvolvimento do processo, conforme dita Eugênio Pacelli:
Como decorrência do princípio e em consequência do exercício da ampla defesa, pode-se afirmar que o réu tem direito à prova. Desnecessário afirmar que igual direito assiste ao órgão da acusação, já que o direito do réu à prova tem como pressupostos a existência e o exercício do direito da acusação. O exercício desse direito à prova se estenderá a todas as suas fases, é dizer: a da obtenção, a da introdução e produção no processo e, por fim, a da valoração da prova, na fase decisória. (PACELLI, 2017, p.182)
No Processo Penal, o que se busca provar é a ocorrência ou não de um fato delituoso que pode levar a imposição de penas mais severas tais como a privação da liberdade de quem está sendo acusado, fazendo-se necessário conferir limites ao meio de prova. Desta feita, como garantia para o indivíduo do réu, se faz imprescindível a observância de normas preestabelecidas.
Nesta ótica, o limite do direito à prova possui limites, sendo que a atividade probatória não poderá ser afastada, sob a pena de ilicitude ou ilegalidade da prova obtida.
A prova, porém, para que seja utilizada como suporte para a decisão do magistrado, deverá ser obtida licitamente, através de meios que não vão contra a moral e os bons costumes. Mesmo que haja possibilidades de impor limites à prova, a regra é que a mesma possa ser produzida em sua plenitude como garantia da ampla defesa, todavia, em nosso ordenamento jurídico, existem as provas consideradas lícitas, que podem adentrar ao processo, e outras, tidas como ilícitas.