Impeachment do Presidente da República do Brasil

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04/05/2020 às 20:12
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O presente trabalho abordará à possibilidade de destituição do cargo governamental do Poder Executivo, (Impeachment do Presidente da República). Em conformidade com a Constituição Federal do Brasil de 1988.

APRESENTAÇÃO

O presente trabalho abordará à destituição do cargo governamental, do Poder Executivo, mediante decisão do Poder Legislativo, conforme estabelece a Constituição da República Federativa do Brasil.

Por se tratar o tema, de suma relevância nos últimos anos, resolvi fazer meu trabalho de conclusão de curso sobre o impeachment do Presidente da República, suas consequências e requisitos necessários para uma efetiva aplicabilidade à perda do cargo eletivo, com entendimento doutrinário e jurisprudencial.

Dessa forma, o trabalho abordará os requisitos necessários para uma efetiva aplicabilidade à perda do cargo eletivo, e suas consequências, elencando o posicionamento doutrinário e jurisprudencial.

 Primeira parte. Introdução; Impeachment de Presidente da República do Brasil; Evolução histórica do impeachment no Brasil; conceito de impeachment; Os princípios que regem o impeachment; crimes de responsabilidade do Presidente da República;

Segunda parte. O Processo de Impeachment; Denúncia; juízo de admissibilidade; competência, processo e julgamento do impeachment com posicionamento doutrinário e jurisprudencial.

Parte final. Conclusão

RESUMO

O presente trabalho tem como foco uma análise do cabimento, e do processo de Impeachment contra Presidente da Republica Federativa do Brasil as infrações político – administrativa, e os crimes conexos ao exercício do cargo, as consequências resultantes desse processo, e os requisitos necessários para sua efetiva aplicabilidade, com entendimento doutrinário e jurisprudencial. Para este trabalho foram utilizadas a: Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; Lei do Impeachment nº 1.079, de 10 de abril de 1950, Lei de Improbidade Administrativa nº 8.429, de 2 de Junho de 1992 jurisprudências e doutrinas.

Palavra chave: Impeachment - do Presidente da República Federativa do Brasil

ABSTRACT

The present work focuses on an analysis of the appropriateness, and of the Impeachment process against President of the Federative Republic of Brazil, the political and administrative infractions, and the crimes related to the exercise of the position, the consequences resulting from this process, and the necessary requirements for their effective applicability, with doctrinal and jurisprudential understanding. For this work, the following were used: Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988; Impeachment Law No. 1,079, of April 10, 1950, Administrative Improbity Law No. 8,429, of June 2, 1992 jurisprudence and doctrines.

Keyword: Impeachment - of the President of the Federative Republic of Brazil

SUMÁRIO

  1. INTRODUÇÃO........................................................................................................ 11
  2. IMPEACHMENT NO BRASIL.............................................................................. 11
    1. Evolução histórica do impeachment no Brasil....................................... 12
    2. Conceito de impeachment....................................................................... 14
    3. Crimes de responsabilidade..................................................................... 15
    4. Os princípios que regem o impeachment............................................... 21
  3. O PROCESSO DE IMPEACHMENT................................................................. 24
    1. Denúncia...................................................................................................... 24
    2. Juízo de admissibilidade........................................................................... 25
    3. Julgamento.................................................................................................. 29
CONCLUSÃO......................................................................................................... 32
REFERÊNCIA......................................................................................................... 34

IMPEACHMENT DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

  1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho aborda os crimes cometidos pelo Presidente da República - o Chefe do Poder Executivo.

Primeiramente, para processar e julgar o Presidente da República, por cometimento do crime de responsabilidade administrativa, houve a necessidade de regulamentação de uma lei especifica, conforme estabelece o parágrafo único do art. 85 da CRFB/88. Para tanto a Constituição Federal de 1988, recepcionou em boa parte a Lei nº 1.079 de 1950.

Sendo que, o processo de impeachment não é aplicado a todo e qualquer caso de ilicitude do Presidente da República, como por exemplo, nos casos estranhos à função pública.

Desse modo, o impeachment possui características próprias, só sendo cabível dentro das hipóteses legais, elencadas na Constituição Federal e em lei especial, não podendo ser aplicado como punição pessoal.

 Nos artigos 51, I, e 52, I, II, e parágrafo único da CRFB/88, elencam as formalidades para instauração de processo, processar e julgar, o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado.

  1. IMPEACHMENT NO BRASIL

No Brasil o primeiro impeachment foi do ex-presidente Luz e Café, no ano de 1955, e logo em seguida do ex-presidente Café Filho, esses dois presidentes sofreram impeachment em 1955.

Ambos passaram pelo processo de destituição do cargo por meio da Câmara dos Deputados e do Senado. Com a diferença que na época não foi utilizada a Lei do impeachment que já existia desde 1950, por estar o País diante de grave ameaça de começar uma guerra civil, o Senado resolveu destituir de imediato os referidos presidentes sem direito ao contraditório e a defesa.

No terceiro caso, o ex-presidente Fernando Affonso Collor de Mello, quando percebeu que seria processado pelo Senado Federal, resolveu renunciar, mas sua renúncia, não foi o suficiente para parar o processo. Diante da controvérsia do andamento do processo e julgamento, quando o ex-presidente já não exercia mais o cargo, a decisão de validar a decisão final do julgamento no Senado, ficou para o Supremo Tribunal Federal, que acabou por reconhecer a decisão do Senado, e declarou a destituição do cargo com inabilitação política por oito anos. [1]

O quarto caso foi o da ex-presidenta Dilma Vana Rousseff, que teve como objeto da denúncia contra ela, as acusações de desrespeito à lei orçamentária e à lei de improbidade administrativa, e suspeita de envolvimento em atos de corrupção na Petrobras, investigação que fazia parte da operação lava-jato coordenada pela Policia Federal.

A ex-presidenta Dilma Vana Rousseff foi destituída do cargo, sendo que não lhe foi aplicada a sanção de inabilitação ao cargo político, sendo essa decisão contrária ao que estabelece a Constituição Federal no art. 52, parágrafo único. [2]  

  1. Evolução histórica do impeachment no Brasil

O procedimento de impeachment surgiu na Inglaterra no século XIV, diante da necessidade da Câmara dos Comuns de responsabilizar os Ministros do Rei e Lordes, inabilitando-os dos cargos que ocupavam, sendo utilizado até os fins do século XVIII. [3]

No Brasil, a responsabilização dos chefes do Poder Público começou a se delinear na Constituição Brasileira do Império, no ano de 1824, em seu art. 133, estabelecia que:

Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsáveis
I. Por traição.
II. Por peita, suborno, ou concussão.
III. Por abuso do Poder.
IV. Pela falta de observância da Lei.
V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos Cidadãos.
VI. Por qualquer dissipação dos bens públicos.[4]

Mais tarde no ano de 1891, a Constituição Brasileira sob forte influência da Constituição Americana, estabeleceu no capitulo V, art. 54 e seguintes, e nas Leis números, 27 e 30 de 1892, as formalidades para o processo e julgamento dos crimes de responsabilidade do Presidente da República, sendo mantida nas Constituições republicanas até a atual Constituição de 1988.

A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891 estabeleceu como forma de governo, a República Federativa, sendo constituída pela união perpétua e indissolúvel das antigas províncias em Estados Unidos do Brasil (art. 1º da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891).

Trouxe em seu texto constitucional a responsabilização do Presidente por atos que atentarem contra: a existência política da União; a Constituição e a forma do Governo federal; o livre exercício dos Poderes políticos; o gozo, e exercício legal dos direitos políticos ou individuais; a segurança interna do Pais; a probidade da administração; a guarda e emprego constitucional dos dinheiros públicos; as leis orçamentárias votadas pelo Congresso.

Previu ainda, a necessidade de criar uma lei especial para definir os delitos e outra lei para regular a acusação, o processo e o julgamento nos crimes de responsabilidade do Presidente. (art. 54 parágrafos e incisos da Constituição de 1891).

Porém, a Constituição de 1891 não teve eficácia plena, faltou adequação com a realidade da época, não cumpriu o que estabeleceu em seu corpo normativo, não demorando a surgir conflitos de poderes.

Após sua promulgação, a Constituição de 1891 que estabelecerá em seu art. 1.º, caput, a eleição do Presidente e Vice-Presidente, a constituinte elegera como Presidente da República, Deodoro da Fonseca considerado o Pai da República, e, Floriano Peixoto como Vice-Presidente.[5]

O governo de Deodoro sofreu oposição liderada por Prudente de Moraes. Não havia mais crédito público, e os banqueiros estrangeiros se negavam a auxiliar o Brasil. Sem segurança, e com a oposição do Congresso, Deodoro dá o golpe de Estado.

Diante do ocorrido, é apresentada para votação, a criação da lei de responsabilidade. Essa lei, (impeachment), estabeleceria a denúncia contra o Presidente, e a suspensão de suas funções. [6]

Nesse contexto José Afonso da Silva, explica que:

A oposição, liderada por Prudente de Moraes, não conseguira impedir a eleição do Pai da República, mas impusera ao Vice-Presidente, em que se escorasse. Consumado o fato, pretendeu-se destruir o governo pelo impeachment, que dependia ainda de regulamentação. [7]

Marechal Deodoro veta o projeto de lei, e o Senado rejeita o veto do Presidente. Porém, antes mesmo que o Congresso pudesse reagir, Deodoro decretou a dissolução do Congresso em 03 (três) de novembro de 1891, por meio do decreto nº 641.

Com o Congresso dissolvido, os congressistas procuraram o apoio do Vice-Presidente Floriano Peixoto, tendo por consequência uma revolta da Armada, que resultou na renuncia do Presidente Deodoro, que preferiu renunciar ao cargo e evitar maiores tragédia.[8] Todavia, a criação dessa lei só foi suprida no ano de 1950. [9]

  1. Conceito de impeachment

O Impeachment é à prática de conduta típica e ilícita, cometida no exercício por agente público que exerce alto cargo na administração do País. Trata-se de um recurso excepcional e que demanda o acolhimento do estabelecido em normas da Constituição da República, em respeito aos princípios da democracia, sendo regulada por lei específica. Lei nº 1.079/1950, que foi recepcionada em parte pela Constituição Federal de 1988. 

Trata-se de um processo que tem por escopo o afastamento do ocupante de cargo público, por má conduta no âmbito da administração pública, cabendo ao Congresso Nacional apurar e responsabilidade os chefes do poder podendo resultar em absolvição ou afastamento e perda do cargo.

O Professor CUNHA, conceitua o crime de responsabilidade como sendo um crime próprio ou impróprio. Veja:

O crime de responsabilidade próprio é uma infração penal comum cometida por determinados agentes, julgada pelo Poder Judiciário, ao passo que o impróprio revela uma infração político-administrativa, em que a apreciação e a punição, ambas de ordem política (impeachment), são atribuídas ao Poder Legislativo. [10]

No Infopédia, a definição de impeachment, é:

(...) processo legal instaurado pelo poder legislativo para forçar a destituição do ocupante de um cargo público de superior responsabilidade (presidência da República, alta magistratura, etc.), com base em acusações de delito grave ou má conduta no exercício de funções, destituição resultante desse processo legal. [11]

  1. Crimes de responsabilidade

Primeiramente, devemos entender que existem dois tipos de classificação dos crimes que podem ser cometidos pelo Presidente da República, eles podem ser próprios ou impróprios, ou seja:

Os crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas, que só podem ser cometidos por pessoas que exerçam cargos específicos, trata-se de crime próprio, por estar vinculado ao cargo e não a pessoa.

A improbidade administrativa é infração político-administrativa, regulamentada na Lei nº 8.429/92, e nesse segmento, o art. 9º, prevê que, auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato ou função, constitui enriquecimento ilícito. [12]

Os atos de improbidade administrativa são passíveis de sanções penais, civis e administrativas, dentre elas, a perda do mandato com inabilitação para se candidatar a cargo público, (suspensão dos direitos políticos), previstas na legislação específica, nº 1.079/50, artigo 2.º; no art. 12 da Lei 8.429/92, e no artigo 37, § 4.º, da CRFB/88. Veja:

Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República. [13] (grifo nosso).
Art. 12.  Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:         (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).
I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos; [14] (grifo nosso).
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...);
§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. (grifo nosso). [15] (grifo nosso).

Em julgamento correlatado (MS nº 21.689), o Ministro Carlos Velloso, relata que:

(...). No sistema do direito anterior à Lei 1.079, de 1950, isto é, no sistema das Leis 27 e 30, de 1892, era possível a aplicação tão somente da pena de perda do cargo, podendo esta ser agravada com a pena de inabilitação para exercer qualquer outro cargo (CF de 1891, art. 33, § 3º; Lei 30, de 1892, art. 2º), emprestando-se à pena de inabilitação o caráter de pena acessória (Lei 27, de 1892, arts. 23 e 24). No sistema atual, da Lei 1.079, de 1950, não é possível a aplicação da pena de perda do cargo, apenas, nem a pena de inabilitação assume caráter de acessoriedade (CF, 1934, art. 58, § 7º; CF, 1946, art. 62, § 3º; CF, 1967, art. 44, parágrafo único; EC 1/1969, art. 42, parágrafo único; CF, 1988, art. 52, parágrafo único. Lei 1.079, de 1950, arts. 2º, 31, 33 e 34). A existência, no impeachment brasileiro, segundo a Constituição e o direito comum (CF, 1988, art. 52, parágrafo único; Lei 1.079, de 1950, arts. 2º, 33 e 34), de duas penas: a) perda do cargo; b) inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública. (...).
[MS 21.689, rel. min. Carlos Velloso, j. 16-12-1993, P, DJ de 7-4-1995.] [16]

Todavia, o Presidente da República pode cometer crimes comuns tanto por omissão como por ação. (omissivos ou comissivos). Sendo que, o crime omissivo: é quando o sujeito tem o dever de evitar um resultado concreto e não o faz, (dever de agir).

Júlio Fabbrini Mirabete ensina de forma objetiva, que os crimes por omissão:

“são os que objetivamente são descritos com uma conduta negativa, de não fazer o que a lei determina, consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica e não sendo necessário qualquer resultado naturalístico. Para a existência do crime, basta que o autor se omita quando deve agir” [17]

Nesse mesmo sentido, Figueiredo Dias, descreve de forma mais detalhada o crime por omissão. Veja:

O crime de omissão reside na violação de uma imposição legal de atuar, pelo que, em qualquer caso, só pode ser cometido por pessoa sobre a qual recaia um dever jurídico de levar a cabo uma ação imposta e esperada. Por isso, ganha a questão de determinar o círculo dos autores possíveis de um crime de omissão uma enorme importância, não só teórica mas prático normativa. Tanto mais quanto a lei, só numa minoria de casos descreve, de forma integral, os pressupostos fáticos de onde resulta o dever jurídico de atuar, enquanto na generalidade deles se basta com uma cláusula geral. [18]

Não obstante pode-se ter como exemplo os crimes cometidos pela Ex-Presidenta Dilma Vana Rousseff, como: Decretos sem autorização; Pedaladas fiscais; Petrobras e Pasadena, a omissão em relação à compra da refinaria de Pasadena[19], dentre outros.

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Ao contrário do crime omissivo, No crime comissivo, o agente pratica uma conduta típica (não permitida por lei), nesse caso há necessidade de uma ação. Por exemplo: matar alguém (art. 121, CP), mediante disparo de arma de fogo. Nesse exemplo o agente utilizou uma arma para alcançar seu objetivo.

 Posto isso, vejamos o que a lei determina como crime de responsabilidade do Presidente da República.

O art. 85, incisos I à VII da Constituição Federal de 1988, e reproduzem na integra o que estatui o art. 4.º, incisos I à VIII, da Lei Especial nº 1.079/50, os crimes de responsabilidade do Presidente da República. Veja:

                                       

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV - a segurança interna do País;
V - a probidade na administração;
VI - a lei orçamentária;
VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais. [20]

Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:
I - A existência da União;
II - O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados;
III - O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV - A segurança interna do país;
V - A probidade na administração;
VI - A lei orçamentária;
VII - A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos;
VIII - O cumprimento das decisões judiciárias (Constituição, artigo 89). [21]

Ademais, o Presidente da República e seu Vice ao assumirem os respectivos cargos, prestam o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, assim como observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil. [22] (art. 78, da CRFB/88). Veja.

Art. 78. O Presidente e o Vice-Presidente da República tomarão posse em sessão do Congresso Nacional, prestando o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil. [23]

Exemplificando: os incisos I, II, VII, da CRFB/88, e respectivamente os incisos I; II e VIII, do art. 4.º lei 1.079/50, visam proteger a integridade nacional da Federação, bem como os demais Poderes e instituições constitucionais.

Não restando dúvidas que, qualquer ato do Presidente da República, que coloque em risco a existência da União, o livre exercício do Poder Legislativo, Judiciário, e constitucionais dos Estados, em observância ao princípio da separação dos poderes.

 Assim como empregar indevidamente, ou desviar o dinheiro público, acarretará em responsabilização administrativa além de outras que poderem ser aplicadas.

O inciso III, de ambos os artigos supramencionados, estatui de forma geral, a proteção dos direitos fundamentais, contra atos do Presidente da República e seus Ministros de Estado. Trata-se de restrição imposta na Constituição Federal de 1988, para impedir que sejam restringidas ou suprimidas, as cláusulas pétreas por emenda constitucional, Valendo lembrar que os direitos e garantias individuais não são absolutos, existindo exceção. Veja o que estabelece o parágrafo 4.º do art. 60, da CRFB/88.

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais. [24]

Neste sentido, o relato do Ministro Celso de Mello no Recurso do Mandado de Segurança nº 23.452/RJ, publicado no Diário de Justiça em 12 de maio de 2000, p.20, descreve que os direitos e garantias fundamentais não tem caráter absoluto. Veja:

“OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM CARÁTER ABSOLUTO. Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das 3 liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.” [25]

Como ensina José Afonso da Silva, no Estado Democrático de Direito, as garantias constitucionais, estabelecem determinações e procedimentos, para limitar o Poder Estatal, que no caso de desrespeito será garantido à reintegração dos direitos fundamentais. Veja:

II - garantias constitucionais, que consistem nas instituições, determinações e procedimentos, mediante aos quais a própria Constituição tutela a observância ou, em caso de inobservância, a reintegração dos direitos fundamentais. São por seu lado de dois tipos: a) garantias constitucionais especiais que são, instituições constitucionais que se inserem no mecanismo de freios e contrapesos dos poderes e, assim, impedem o arbítrio, com o que constituem, ao mesmo tempo, técnicas de garantias e respeito aos direitos fundamentais; são garantias gerais precisamente porque consubstanciam salvaguardas de um regime de respeito à pessoa humana em toda dimensão; b) garantias constitucionais especiais que são as prescrições constitucionais estatuindo técnicas e mecanismos que, limitando a atuação dos órgãos estatais ou de particulares, protegem a eficácia, aplicabilidade e a inviolabilidade dos direitos fundamentais de modo especial;(...). As garantias constitucionais especiais em conjunto, caracterizam-se como imposições, positivas ou negativas, aos órgãos do Poder Público, limitativas de sua conduta, para assegurar a observância ou, no caso de violação, a reintegração dos direitos fundamentais. [26]

No Inciso IV, refere – se ao dever do Presidente da República em manter a segurança interna do país, pois trata – se de uma das atribuições como Chefe de Estado, e o seu descumprimento acarretarão em crime de responsabilidade;

O inciso V diz respeito à probidade administrativa. Significa que o Presidente da República deve respeitar os princípios que regem uma boa administração, elencados no art. 37, caput, e § 4.º da CRFB/88. Veja:

Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade (...). [27] (grifo nosso).    

Já o inciso VI trata da Lei Orçamentária do País, encontra amparo no art. 167 da CRFB/88, ao qual estabelece as diretrizes a serem cumpridas pelo chefe do Poder Executivo, sob pena de crime de responsabilidade.[28]

Por último e já mencionado anteriormente, o parágrafo único do artigo 85 da CRFB/88, enuncia que esses “crimes serão definidos em lei especial”. Vale ressaltar que, os crimes de responsabilidade estão detalhados nos artigos, 5.º a 12.º, da Lei 1.079/50.

A Lei nº 1.079, que trata dos crimes de responsabilidade, foi criada sob a vigência da Constituição de 1946, no ano de 1950, sendo a mesma, em boa parte, recepcionada pela atual CRFB/88.

OBS: O fato de ser lei especial significa que os crimes de responsabilidade são regulamentados por lei especifica, desse modo à lei especial prevalece sobre a lei geral, existindo entre elas uma hierarquia.

  1. Os princípios que regem o impeachment

Primeiramente, os princípios que norteiam o processo de impeachment visam garantir a Constituição da República Federativa do Brasil; manter e defender a população brasileira, dos arbítrios ilegais dos governantes que colocando em risco o Estado Democrático de Direito.

Dito isso, o impeachment tem como escopo, a responsabilização do Presidente da República, ou de qualquer outro funcionário de cargos de alto escalão, mediante o cometimento de grave delito ou, má conduta no exercício de suas funções.

Lembrando que a serenidade do processo, deve respeitar, o direito ao contraditório e a ampla defesa.

Nesse sentido, o Ministro Luís Roberto Barroso, em decisão da ADPF 378 relatou que:

A forma do procedimento de impeachment deve observância aos direitos e garantias do acusado, especialmente aos princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, previstos pela Constituição da República e pela Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) [<ADPF> <378 MC, rel. p/ o ac. min. Roberto Barroso, j. 16-12-2015, P, DJE de 8-3-2016.]. [29]

O processo de impeachment contra o Presidente da República tem regras especificas estabelecida na Lei nº 1.079/1950. O objetivo do processo é assegurar a efetividade dos princípios constitucionais da administração pública, responsabilizando o Presidente da República diante de má conduta ou por grave delito, cometido no exercício de suas funções.

Os princípios constitucionais constituem pressupostos de validade, e tem como fundamento, garantir a efetividade das demais normas jurídicas.

Miguel Reale conceitua os princípios como:

(...) verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições, que apesar de não serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários. [30]

Nesse mesmo sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello define principio como:

(...) mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo a tônica que lhe dá sentido harmônico. [31]

No mais, Hely Lopes Meirelles conceitua a natureza da administração pública como a de:

(...) um múnus público para quem a exerce, isto é, a de um encargo de defesa, conservação e aprimoramento dos bens, serviços e interesses da coletividade. Como tal, impõe-se ao administrador público a obrigação de cumprir fielmente os preceitos do Direito e da Moral administrativa que regem a sua atuação. Ao ser investido em função ou cargo público, todo agente do poder assume para com a coletividade ou compromisso de bem servir-la, porque outro não é o desejo do povo, como legítimo destinatário dos bens, serviços e interesses administrados pelo estado. [32]

Não existe supremacia entre os princípios, “eles são a base, o ponto de partida, a estrutura sobre a qual se constrói o ordenamento jurídico”. [33] A estrutura da administração pública tem o seu embasamento nos princípios elencados no art. 37, caput da Constituição Federal de 1988. Veja:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...);

O princípio da legalidade impõe ao agente público à obrigação de fazer o que a lei determina, a finalidade é impedir o abuso de poder do funcionário público em geral;

O princípio da impessoalidade complementa o principio da igualdade, onde todos devem ser tratados de forma isonômica, conforme o art. 5.º, caput, da Constituição Federal de 1988;

A Moralidade se pauta em agir com honestidade, integridade, boa-fé, ser ético em seus atos;

O princípio da publicidade significa que todo ato praticado por agentes públicos devem ser públicos.  (§ 1º do art. 37 da CRFB/88).

Destarte, o Presidente da República, assim como todos os funcionários públicos, tem múnus de agir conforme os princípios que regem a administração pública, e ao ignorar esses princípios, surge o impedimento de continuar a exercer o cargo público.

  1. O PROCESSO DE IMPEACHMENT

O processo de responsabilização consistiu em uma questão processual aberta, com vistas ao impedimento da continuidade do mandato eletivo do Presidente da República. Para tanto,  existem procedimentos e formalidades, estabelecidos nos artigos 14 a 38 da Lei nº 1.079/50 e nos artigos 51, I; 85 e seus respectivos parágrafos, assim como no artigo 86 e incisos.

  1.  Denúncia

Qualquer cidadão poderá denunciar o Presidente da República, por crime de responsabilidade, à Câmara dos Deputados, sendo que, a Câmara dos Deputados só poderá receber a denúncia, enquanto o denunciado estiver empossado no cargo, se por qualquer motivo, tiver deixado definitivamente o cargo, não poderá ser recebida à denúncia. (Artigos 14, 15 e 16 da Lei nº 1.079/50). Veja:

Art. 14. É permitido a qualquer cidadão denunciar o Presidente da República ou Ministro de Estado, por crime de responsabilidade, perante a Câmara dos Deputados.
Art. 15. A denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo.
Art. 16. A denúncia assinada pelo denunciante e com a firma reconhecida, deve ser acompanhada dos documentos que a comprovem, ou da declaração de impossibilidade de apresentá-los, com a indicação do local onde possam ser encontrados. Nos crimes de que haja prova testemunhal, a denúncia deverá conter rol das testemunhas, em número de cinco, no mínimo. [34]

Sobre o assunto em comento, na Ação Popular nº 595, e no Mandado de Segurança nº 21.689, o Relator Ministro Luiz Fux e o Relator Ministro Carlos Velloso, respectivamente, entendem que:

O art. 86, caput, da CF, na sua exegese, impõe não seja exigida a admissão, pelo Legislativo, da acusação criminal contra o chefe do Executivo, quando já encerrado o mandato do acusado.
[AP 595, rel. min. Luiz Fux, j. 25-11-2014, 1ª T, DJE de 10-2-2015.] [35]

(...), a Lei 27, de 1892, art. 3º, estabelecia: a) o processo de impeachment somente poderia ser intentado durante o período presidencial; b) intentado, cessaria quando o presidente, por qualquer motivo, deixasse definitivamente o exercício do cargo. A Lei 1.079, de 1950, estabelece, apenas, no seu art. 15, que a denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo. (...).
[MS 21.689, rel. min. Carlos Velloso, j. 16-12-1993, P, DJ de 7-4-1995.].  [36]

  1. Juízo de admissibilidade

O Juízo de admissibilidade começa com recebimento da queixa-crime. A Câmara dos Deputados no expediente da sessão seguinte irá ler a acusação e despachar para uma comissão especial eleita.

No prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a comissão eleita deverá se reunir, eleger seu presidente e relator, que emitirá parecer, sobre a admissibilidade da denúncia no prazo de dez dias. Nesse período poderá ser realizado as diligencias que forem necessárias. (Artigos 19 e 20, §§ 1.º e 2.º, da Lei nº 1.079/50). Veja na integra:

Art. 19. Recebida a denúncia, será lida no expediente da sessão seguinte e despachada a uma comissão especial eleita, da qual participem, observada a respectiva proporção, representantes de todos os partidos para opinar sobre a mesma.
Art. 20. A comissão a que alude o artigo anterior se reunirá dentro de 48 horas e, depois de eleger seu presidente e relator, emitirá parecer, dentro do prazo de dez dias, sobre se a denúncia deve ser ou não julgada objeto de deliberação. Dentro desse período poderá a comissão proceder às diligências que julgar necessárias ao esclarecimento da denúncia.
§ 1º O parecer da comissão especial será lido no expediente da sessão da Câmara dos Deputados e publicado integralmente no Diário do Congresso Nacional e em avulsos, juntamente com a denúncia, devendo as publicações ser distribuídas a todos os deputados.
§ 2º Quarenta e oito horas após a publicação oficial do parecer da Comissão especial, será o mesmo incluído, em primeiro lugar, na ordem do dia da Câmara dos Deputados, para uma discussão única.[37]

Será realizado debate por cinco representantes de cada partido, com duração de uma hora para cada partido. Encerrada a discussão, será submetido à votação para decidir se arquiva ou prossegue.

Sendo que a Câmara dos Deputados deve - se pronunciar, após votação mínima, (maioria simples), de dois terços de seus membros, (342 deputados), se autoriza o pedido da denúncia contra o Presidente da República, ou se recusa, conforme o art. 86, caput da CRFB/88.

O acusado tem prazo de vinte dias para contestar. Fim do prazo a comissão especial determinará as diligências que entender necessárias. Será feita a tomada do depoimento das testemunhas, de ambas as partes.

Nesse sentido, na ADPF 378, o Ministro Luís Roberto Barroso, ao votar no Processo de Impeachment. Definição da Legitimidade Constitucional do Rito Previsto na Lei Nº 1.079/1950, declarou que:

A apresentação de defesa prévia não é uma exigência do princípio constitucional da ampla defesa: ela é exceção, e não a regra no processo penal. Não há, portanto, impedimento para que a primeira oportunidade de apresentação de defesa no processo penal comum se dê após o recebimento da denúncia. No caso dos autos, muito embora não se assegure defesa previamente ao ato do Presidente da Câmara dos Deputados que inicia o rito naquela Casa, colocam-se à disposição do acusado inúmeras oportunidades de manifestação em ampla instrução processual. Não há, assim, violação à garantia da ampla defesa e aos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em tema de direito de defesa. [38]

Desse modo entende-se que o Presidente da República, pode esperar para se defender, quando for oficializada a abertura do processo no Senado Federal. Porém não há óbice, em se defender, já que é de seu interesse provar o quanto antes a sua inocência, e no mais, caso comprovada sua inocência de pronto, seria desnecessários os procedimentos seguintes.

Dito isso, em continuação aos procedimentos. Fim das diligências, no prazo de dez dias a comissão especial deverá emitir o parecer, se prossegue ou arquiva a denúncia. Na ordem do dia da sessão imediata o parecer será submetido a duas discussões, com o intervalo de 48 horas entre uma e outra.

Os representantes de cada partido terão uma hora para debater a decisão. Encerrada a discussão do parecer, faz-se a votação nominal. Se aprovado o parecer para denunciar o Presidente da República, considerar-se-á decretada a acusação pela Câmara dos Deputados.

O acusado será intimado imediatamente. Três membros eleitos pela Câmara dos Deputados irão acompanhar o julgamento do acusado. Com o recebimento da denúncia pela Casa do Senado Federal, inicia-se a segunda fase. A instauração do processo.

Decretada a acusação contra o Presidente da República, os efeitos serão imediatos, com a suspensão do exercício das funções e da metade do subsídio ou do vencimento, até final sentença. Assume o cargo, o Vice-Presidente.

Decorrido o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, e o processo não estiver concluso, cessará o afastamento, e restabelecendo do acusado a suas funções públicas normalmente.

O restabelecimento do acusado ao seu cargo público, não impede que o processo siga seus trâmites legais até o final, (art. 86, § 2º da CRFB/88).

A competência para julgar o Presidente será conforme o tipo de crime, se comum, o processo será enviado ao Supremo Tribunal Federal, ou se for de responsabilidade, o processo será enviado ao Senado Federal. (Artigos 21 a 23 da Lei 1.079/50). Para tanto deve estar condicionada à espécie de crime, se há conexão com o exercício do cargo presidencial, ou, se estranha ao exercício do mandato.

 Depois de aceita a denúncia, o Presidente da República responderá por crime comum, perante o STF, trata – se de prerrogativa de função (direito de ser julgado em foro especial), sob a condição de haver conexão entre o delito e o exercício do mandato presidencial.

Por exemplo, se o Presidente da República se apropria de bem pertencente à Administração Pública ele comete o crime de peculato (art. 312 do CP), esse crime tem conexão com o cargo de funcionário público.

Fernando Capez explica que, o peculato próprio tem por objetivo tutelar a moralidade da Administração Pública, bem como seu patrimônio. Explica ainda que:

O peculato próprio, na realidade, constitui uma apropriação indébita, só que praticada por funcionário público com violação do dever funcional. (...). antes de ser uma ação lesiva aos interesses patrimoniais da administração Pública, é principalmente uma ação que fere a moralidade administrativa em virtude da quebra do dever funcional. [39]

De outro modo, quando se tratar de infração comum estranha ao exercício do mandato, o Presidente da República, não responderá perante o STF.

Observe que, o art. 102, inciso I, alínea b, da CRFB/88, faz referência ao cargo e não a pessoa que o exerceu. Veja:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
(...);
b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;  [40]

Diante da impossibilidade temporária de responsabilizar o Presidente da República, no que se refere aos crimes estranhos à sua função, a prescrição penal ficará suspensa, até a expiração do mandato eletivo presidencial, que após, responderá por seus atos, perante a Justiça Comum, (art. 86, § 4º, da CRFB/88).

Nesse mesmo sentido, em recente decisão o Ministro Edson Fachin definiu que:

(...), III. Conclusão
6. Resolução da questão de ordem com a fixação das seguintes teses:
(I) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e

(II) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.
[Tese definida na AP 937 QO, rel. min. Roberto Barroso, P, j. 3-5-2018, DJE  265 de 11-12-2018.]  [41]

Vale ressaltar, que a imunidade do Presidente da República não é absoluta, ele só não poderá ser preso enquanto não sobrevier sentença condenatória, entretanto, não há impedimento no que se refere à responsabilização por suas palavras, opiniões e manifestações. (art. 86, § 3.º, da CRFB/88).

  1. Julgamento

Após a Câmara dos Deputados enviarem ao Senado Federal, o decreto com o processo de acusação, será remetido, cópia do processo com todo o conteúdo, ao Presidente, que será notificado a comparecer ao Senado em dia pré-fixado. (Art. 24, da Lei nº 1.079/50). Veja:

Art. 24. Recebido no Senado o decreto de acusação com o processo enviado pela Câmara dos Deputados e apresentado o libelo pela comissão acusadora, remeterá o Presidente cópia de tudo ao acusado, que, na mesma ocasião e nos termos dos parágrafos 2º e 3º do art. 23, será notificado para comparecer em dia prefixado perante o Senado.
Parágrafo único. Ao Presidente do Supremo Tribunal Federal enviar-se-á o processo em original, com a comunicação do dia designado para o julgamento. [42]

Na data pré-fixada, o Presidente comparecerá, ou enviará seu representante legal, e querendo apresentar provas em sua defesa. (Art. 25, da Lei nº 1.079/50).

Se caso o Presidente não comparecer e nem enviar um representante legal, no dia marcado, será considerado revelia, e o Presidente da comissão julgadora, responsável pelo julgamento, marcará nova data e nomeará um defensor para o acusado, ao qual terá acesso ao processo. (Art. 26, da Lei nº 1.079/50).

   No dia marcado para o julgamento, estando presentes todas as partes, o Presidente do Supremo Tribunal Federal abrirá a sessão. (Art. 27, da Lei nº 1.079/50). Veja:

Art. 27. No dia aprazado para o julgamento, presentes o acusado, seus advogados, ou o defensor nomeado a sua revelia, e a comissão acusadora, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, abrindo a sessão, mandará ler o processo preparatório o libelo e os artigos de defesa; em seguida inquirirá as testemunhas, que deverão depor publicamente e fora da presença umas das outras. [43]

Qualquer das partes poderá requerer que seja feita perguntas as testemunhas, podendo contestá-las ou impugná-las, requerer acareação, sem interrompê-las. É o que preconiza o artigo 28, da Lei nº 1.079/50. Veja:

Art. 28. Qualquer membro da Comissão acusadora ou do Senado, e bem assim o acusado ou seus advogados, poderão requerer que se façam às testemunhas perguntas que julgarem necessárias.
Parágrafo único. A Comissão acusadora, ou o acusado ou seus advogados, poderão contestar ou argüir as testemunhas, sem contudo interrompê-las e requerer a acareação. [44]

O Presidente responsável para julgar o processo, fixará o tempo, que não poderá exceder a duas horas, para o debate verbal, entre a comissão acusadora e o acusado ou os seus advogados. (Art. 29, da Lei nº 1.079/50).

Após os debates orais, as partes se retiram, e começa o debate sobre a causa da denúncia. (Art. 30, da Lei nº 1.079/50).

O artigo 31, da Lei nº 1.079/50, descreve que, findo a discussão, o Presidente do Supremo Tribunal Federal fará relatório resumido do processo, para os Senadores darem inicio ao julgamento por votação nominal.

A votação exige quórum qualificado, 2/3 maioria absoluta dos Senadores Federais. Desse modo, se a votação alcançar, o quórum qualificado de dois terços, o resultado será condenatório, porém se for inferior à 2/3 dos votos, o Presidente será absolvido.

 Sendo o resultado do julgamento absolutório, será revogado desde logo todos os efeitos produzidos em decorrência do processo, contra o Presidente da República, voltando o mesmo a ocupar o cargo presidencial. (Art. 32, da Lei nº 1.079/50)

Em caso de condenação, ficará o Presidente inabilitado por oito anos, para o exercício de função pública. É o que estabelece a Constituição Federal de 1988. Sendo que, no art. 33 da Lei 1.079/50, o tempo de inabilitação, fica a cargo do Senado Federal com a incumbência do Presidente julgador, a discricionariedade para decidir.

Por tanto há um conflito aparente entre a norma constitucional, com a norma infraconstitucional, podendo ser objeto de uma ADPF, (Arguição de Preceito Fundamental) o artigo 33 da Lei 1.079/50, por contrariar o texto legal da CRFB/88. Veja a discrepância.

Art.52. (...); Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis. [45] (grifo nosso)

Já o art. 33 estabelece que “No caso de condenação, o Senado por iniciativa do Presidente fixará o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública;”. Veja:

Art. 33. No caso de condenação, o Senado por iniciativa do Presidente fixará o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública; e no caso de haver crime comum deliberará ainda sobre se o Presidente o deverá submeter à justiça ordinária, independentemente da ação de qualquer interessado. [46]

Por fim, proferida a sentença condenatória, o Presidente da república será imediatamente destituído do cargo. (Art. 34, da Lei nº 1.079/50).

Conclusão

Diante de todo o exposto, pode se entender que desde a Constituição de 1891, já havia a previsão de responsabilizar os ocupantes dos altos cargos do governo. Pois ao se candidatarem aos respectivos cargos já era nítido, a obrigação de agir com honestidade.

Sendo que, o ocupante do cargo do Chefe do Poder Executivo, faz o juramento de: "Manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil". É o que estabelece o art. 78 da Constituição Federal de 1988.

Desse modo, ao descumprir o juramento, está indo em confronto com o que estabelece à lei, não restando outro modo, se não, a responsabilização por seus atos, dando inicio ao processo de impeachment. Esse por sua vez, tem um rito a ser seguido, que se encontra normatizado na Lei 1.079/50 e na Constituição Federal de 1988, que recepcionou em boa parte a respectiva lei.

Dentre os tipos de responsabilização, pode o Presidente responder por seus atos, só após seu mandato eletivo, quando o crime cometido não tiver conexão com o cargo que exerce, ou, em caso de conexão, será afastado até a conclusão do processo. A depender da Câmara dos deputados, que pode aceitar ou arquivar o pedido de responsabilização contra o Presidente da República. Caso entenda que deve ser aberto o processo de responsabilização, este será enviado para o Senado Federal que por sua vez poderá arquivar ou dar continuidade ao processo.

Após o julgamento, se for condenado, será imediatamente destituído de seu cargo, tendo como sanção, a inabilitação a cargo público por oito anos. Nesse ponto, existe uma divergência entre os artigos 52, parágrafo único da Constituição, com o artigo 33 da Lei 1.079/50, pois, ao contrario do que estabelece a Constituição, que fixa tempo para inabilitação a cargo público, por oito anos, na Lei que define os crimes de responsabilidade, delega ao Senado Federal, com a iniciativa do Presidente, que está na incumbência de julgar o processo, fixar o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública.

O crime de Responsabilidade, por se tratar de atos que prejudica toda a nação, deve ser mais rígido mantendo o que prevalece a Constituição, não devendo ser abrandado, e com isso passando a sensação de impunidade.

Por fim, fica a mensagem do filósofo político, Norberto Bobbio.

 “a intervenção ativa por parte dos indivíduos e dos grupos de defesa dos direitos que ainda que normativamente declarados não são sempre efetivamente protegidos”. (BOBBIO, 2006, p. 13).

REFERÊNCIA

Comentários à Constituição do Brasil / J. J. Gomes Canotilho...[et al.] - São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013. 1. BRASIL. Constituição (1988) 2. Direito Constitucional I. Canotilho, J. J. Gomes. II.Sarlet, Ingo Wolfgang. III. Streck, Lenio Luiz. IV. Mendes, Gilmar Ferreira, pag. 1286.

Capez. Fernando, Curso de Direito Penal, parte especial, vol. 3, 4ª edição, revista e atualizada. Editora Saraiva, 2006, pag. 390.

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I. ESAÚ, Elias. II. PINTO, Luiz Gonzaga de Oliveira. História do Brasil Par a Estudos Sociais, (com Organização Social e Política), edição Saraiva, 1973, páginas 130 a 134.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal - Parte Geral. 8.ª ed. São Paulo: Atlas, 1994, v.1. Rio de Janeiro: F. Briguiet, 1889. t. I. ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de Derecho Penal – Parte geral, pag. 124.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 31ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 54.

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NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação Pública e Contrato Administrativo. Imprenta Curitiba: Zenite, 2008, p. 31.

REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 11ª. ed. São Paulo: Saraiva, 1986, p. 60.

SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo, 6.° ed., rev., atual. e ampl., de acordo com a nova Constituição, 2.ª triagem - São Paulo: Ed. R.T., 1990, pags. 70 a 71; 168.

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