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Condomínio residencial no pólo ativo nos Juizados Especiais

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A polêmica a respeito da legitimidade do condomínio residencial poder ou não figurar no pólo ativo de ações perante o Juizado Especial transcendeu os limites geográficos do Estado do Rio Grande do Norte e instalou-se no país.

As turmas recursais de vários Estados têm divergido sobre a legitimidade e possibilidade do condomínio figurar no pólo ativo da ação quando se trata do procedimento optativo do Juizado Especial de Pequenas Causas.

Há entendimentos de que o condomínio pode ser parte legítima para demandar na Justiça Especial, como também há quem entenda o contrário. Atualmente, a Turma Recursal de Natal entende que o condomínio não pode demandar no Juizado Especial, enquanto os juízes de primeiro grau entendem ser possível tal situação jurídico-processual.

A previsão legal do art. 3º, II da Lei 9.099/95, remete ao art. 275, II, do CPC, as hipóteses de competência para conciliação, processo e julgamento de causas cíveis de menor complexidade.

Assim, o inciso II, do art. 275 do CPC é claro: "nas causas, qualquer que seja o valor: b) de cobrança do condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio".

          Ora, considerando-se que a Lei 9.099/95 tem natureza especial, sua interpretação deve ser extensiva, posto que foi editada para facilitar o acesso à Justiça e beneficiar a comunidade.

O que é o condomínio senão uma comunidade? Entendo que ele, como pessoa jurídica, não pode ser encarado como tal para os fins do art. 8º da Lei 9.099/95.

Primeiro porque não tem fins lucrativos. Segundo porque representa tão somente a união de pessoas físicas que visam o bem comum de seus associados, ou seja, é uma representação comunitária, não devendo jamais ser excluído da competência dos Juizados Especiais por ausência de legitimidade.

Não permitir o condomínio como autor na Justiça Especial é não fazer justiça, é, data vênia, aos que entendem contrariamente, atropelar a vontade do legislador e a função social da Lei 9.099/95, que caso não permitisse o ajuizamento de ações por condomínios, o faria expressamente, como o fez, em outros casos, como por exemplo no § 2 º do art. 3º. (1)

Dessa forma, há que se admitir o condomínio como legitimado a propor ações no Juizado Especial, porque ele, como já disse, reproduz em juízo o interesse coletivo de pessoas físicas que, juntas, procuram equilibrar a relação social advinda da junção condominial, com fito exclusivo de garantir à coletividade que o compreende a harmonia necessária ao seu bom funcionamento.

Esta harmonia só se torna perfeita quando todas as pessoas físicas que compõem o condomínio estão em dia com suas obrigações, permitindo assim o cumprimento regular das obrigações condominiais.

Não é justo, pois, que a Justiça Especial, regida pelos princípios da simplicidade, oralidade e informalidade negue ao condomínio o acesso ao Juizado Especial, mormente quando se tem conhecimento de que este é representado por uma aliança de pessoas físicas, sem fins lucrativos, e que almejam tão somente a manutenção justa e essencial de seus encargos.

Ao inadmitir o condomínio no pólo ativo, beneficia-se o condômino devedor em detrimento dos demais, vez que o condomínio, para cobrar dívida de pequena monta, terá que recorrer ao processo longo e formal da Justiça Comum, o que certamente inviabilizará a necessária reposição do equilíbrio que deve reinar entre os condôminos.

Examinando a matéria, a Egrégia Turma Recursal do Estado de Pernambuco emitiu seguinte enunciado, publicado no Diário Oficial daquele Estado no dia 26/11/98, p. 6 e 7, verbis:

          "Enunciado 009 – O condomínio residencial poderá propor ação no Juizado Especial, nas hipóteses do artigo 275, inciso II, letra "b" do CPC".

Após esses comentários, volvendo os olhos à questão legal – jurídico processual – do caso, entendo que o juiz, ao se deparar com um condomínio residencial no pólo ativo da ação, deve recorrer ao preconizado no artigo 6º da lei 9099/95 "o juiz adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e eqüânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum".

É, então, de se emprestar interpretação extensiva aos dispositivos da Lei 9099/95 e esta consiste num dos meios mais fecundos para o desenvolvimento dos princípios jurídicos e para o seu reagrupamento em sistema.

Este tipo de interpretação não é mais do que reintegração do pensamento legislativo, aplica-se a todas as normas, sejam de caráter excepcional ou penal.

Para apreender o sentido da lei, a interpretação socorre-se de vários meios. Deve-se buscar reconstruir através das palavras da lei, na sua conexão lingüística e estilística, o seu verdadeiro âmago e o seu real sentido, pois como dizia o mestre Mário Moacir Porto, "a lei não esgota o direito, assim como a partitura não corporifica a música".

E é justamente nas brilhantes lições de Mário Moacir Porto (2) que o juiz deve ter inspiração para interpretação extensiva e social da lei, pois "O que é necessário, portanto, é dar vida e calor humano ao ordenamento jurídico de nossa época. O que se impõe a nós, juízes, é um trabalho de recriação do Direito, através de uma aplicação progressiva da norma. Não basta, para o êxito da nossa tarefa, o domínio da técnica jurídica e a imparcial consciência dos nossos deveres, e para o trabalho de restauração do Direito na confiança e na estima dos homens, mas vale o arrojo dos insurgentes do que a prudência dos glosadores, mais frutifica o idealismo temerário D. Quixote do que o álgido bom senso de Sancho Pança. (...) Ao diuturno contato com as lutas e querelas entre os homens, vim a capacitar-me de que o Direito é algo mais que a norma e que, muitas vezes, há uma inconciliável contradição entre a servil aplicação da lei e a real distribuição de justiça, entre o que é certo, em face da lógica formal, e o que é verdadeiro, à luz dos reclamos da eqüidade. (...) A casa do Direito, como a casa de Deus, tem muitas moradas. Mas não há lugar, em nenhuma delas, para os medíocres de vontade e fracos de coração."

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A exposição de todas essas razões conjugam-se com o fim desejado pelo legislador quando da elaboração da Lei 9099/95, onde o que se pretende é a célere solução de pequenos litígios a custos baixos e sem burocracia.

Portanto, concluo pela legitimidade e competência do Juizado Especial para conhecer, processar e julgar as causas em que o Condomínio Residencial for parte demandante contra o condômino inadimplente.


NOTAS
  1. "§ 2º do art. 3º da Lei 9099/95: Ficam excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial".

  • Extraído do texto "Estética do Direito".
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    Sobre o autor
    Felipe Augusto Cortez Meira de Medeiros

    bacharel em Direito, juiz conciliador de Juizado Especial em Natal (RN)

    Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

    MEDEIROS, Felipe Augusto Cortez Meira. Condomínio residencial no pólo ativo nos Juizados Especiais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 34, 1 ago. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/832. Acesso em: 22 nov. 2024.

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