3. COMPLIANCE NO DIREITO BRASILEIRO
3.1. Lei Anticorrupção - Lei 12.846/12
A Lei 12.846/2013 contém 31 artigos dispostos em sete capítulos. O primeiro deles (arts. 1.º a 4.º) dispõe a respeito dos sujeitos de direito que podem ser sancionados caso incorram em alguma das condutas típicas previstas no art. 5.º dessa lei. O art. 1.º, parágrafo único, da Lei 12.846/2013, deixa claro o objeto da aplicação da lei:
“sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente”.
O art. 3.º da Lei 12.846/2013, evidencia que a aplicabilidade da lei envolve tanto pessoas jurídicas como físicas, sendo uma responsabilidade subjetiva pois se faz a necessidade de apuração da culpabilidade. O art. 5.º, trata das sanções contidas Lei 12.846/2013 como :
“(inc. I) prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; (inc. II) comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei; (inc. III) comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados; (inc. IV) no tocante a licitações e contratos:
(a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público;
(b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público;
(c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo;
(d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente;
(e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo;
(f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou
(g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública; (inc. V) dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional”.
A lei 12.846/13, lei Anticorrupção ou LAC, baseada em diversas fontes internacionais possibilitou a criação de um programa de compliance envolvendo regramento e sanções. Portanto, basicamente limitava-se a OCDE e a ONU, posteriormente o programa de compliance foi submetido à FCPA ou UKBA.
De acordo com a Lei 12.846/13 em seu parágrafo único do artigo 7º, o item VIII, trata de “mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades”, bem como a aplicabilidade de códigos de ética e de conduta:
Art. 7º Serão levados em consideração na aplicação das sanções:
I - a gravidade da infração;
II - a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;
III - a consumação ou não da infração;
IV - o grau de lesão ou perigo de lesão;
V - o efeito negativo produzido pela infração;
VI - a situação econômica do infrator;
VII - a cooperação da pessoa jurídica para a apuração das infrações;
VIII - a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica;
IX - o valor dos contratos mantidos pela pessoa jurídica com o órgão ou entidade pública lesados; e
X - (VETADO).
Parágrafo único. Os parâmetros de avaliação de mecanismos e procedimentos previstos no inciso VIII do caput serão estabelecidos em regulamento do Poder Executivo federal.
Cabe a Controladoria Geral da União, apresentar as diretrizes dos programas e informar como será feita a verificação dentro das empresas. A legislação estrangeira como FCPA e UKBA, as empresas multinacionais já tem programas bem desenvolvidas em decorrência de estarem submetidas a essas leis externas.
A legislação anticorrupção em questão, com exceção do que se refere ao compliance, trouxe como inovação em relação ao ordenamento existente, apenas a responsabilidade objetiva das empresas.
Como signatário da OCDE a partir de 1997, o Brasil incluiu no Código Penal o artigo 337-B:
“a Corrupção ativa em transação comercial internacional. Prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a funcionário público estrangeiro, ou a terceira pessoa, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício relacionado à transação comercial internacional”:
(Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002) Pena - reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002) Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário público estrangeiro retarda ou omite o ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional. (Incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)
Os avanços desembocaram na nova lei anticorrupção em razão das ações da OCDE, o que aumentou a pressão na adoção de leis visando a responsabilização de empresas por ações de corrupção.
Com a abertura comercial brasileira na década de 1990, ocorreu forte pressão da Organização das Nações Unidas e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico para a regulação do mercado interno. No ano de 1996, veio a lei de concorrência desleal e em 2011 e lei de defesa da concorrência e atualizada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica teve suas funções alteradas. No ano de 1998, veio a Lei de Lavagem de Dinheiro, com a criação do COAF - Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) em 2012e oacréscimo do artigo 337-B sobre corrupção ativa em transações comerciais internacionais.
Spinetto (2015) destaca que o Brasil tem seguido a tendência internacional com respeito a legislação anticorrupção. Rodrigues (2014) entende que a Lei nº 12.846 publicada no Diário Oficial da União de 02 de agosto de 2013, a chamada Lei Anticorrupção Empresarial “estabelece que empresas, fundações e associações passarão a responder civil e administrativamente sempre que a ação de um empregado ou representante causar prejuízos ao patrimônio público, infringir princípios da administração pública ou compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”.
Portanto, se tem a responsabilização objetiva, tanto nas esferas civil e administrativa. A Lei Anticorrupção oferece às empresas um percurso visando mitigar os desvios de conduta de seus membros e, busca minimizar os riscos punições pela pratica de atos ilícitos. (AMARAL, 2015)
A adoção de programas de Compliancebuscou estimular as empresas quanto à possibilidade de redução das penalidades eventualmente aplicadas.Assim, a Lei nº 12.846/2013, estabelece que a Administração Pública estimula às empresas a instituírem procedimentos internos de controle objetivando a prática de ilícitos.
A Lei 12.846/13, expôs as empresas brasileiras e os seus dirigentes a graves consequências, na esfera civil e administrativa, por práticas de atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira. (NEVES,2013)
3.2. Responsabilização Administrativa e Civil
Juntamente com o Código Penal, Lei de Licitações (8.666/1993) e a Lei de Improbidade Administrativa (8.429/1992), se tem um microssistema normativoque visa tutelar a administração pública, e seu patrimônio, com a observância dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, tendo por eixo a responsabilização das pessoas jurídicas.
As diversas formas de responsabilização das pessoas jurídicas demonstraram ser ineficiente para enfrentar a malversação de bens públicos, sendo necessário a adequação processual para a efetivação, evitando distorções no descompasso do direito material e o processo.
No Brasil, a jurisdição é una e o texto constitucional assegura o acesso à justiça a todos os indivíduos que sofram uma lesão, ou ameaça de direito a recorrerem ao Poder Judiciário conforme preceitua o art. 5.º, XXXV da carta magna. No entanto, essa amplitude de acesso ao Poder Judiciário, não impede que os processos de natureza administrativa observem os imperativos contidos na Constituição para a resolutividade para a solução de qualquer litígio.
Portanto, o texto constitucional estendeu a litigância no procedimento administrativo as garantias processuais do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5.º, LV). Assim, assegura o acesso amplo e irrestrito ao Poder Judiciário, e garantias como publicidade, motivação, imparcialidade etc.
O art. 3.º da Lei 9.784/1999, que traz a regulamentação do processo administrativo no âmbito da administração pública federal, possibilitar que os administrados tenham o direito a obtenção das informações necessárias de seu interesse para alegações junto ao órgão competente.
Nos arts. 8º a 15 da Lei 12.846/2013 (arts. 8.º a 15) se tem o disciplinamento do processo administrativo com vistas a apurar a responsabilização em caso de violação às condutas. No art. 8.º, caput, quanto a instauração, ela pode ocorrer de ofício ou por provocação dos interessados, quanto ao julgamento cabe à autoridade máxima do órgão em que ocorreu a prática de atos ilícitos.
Cabe a Controladoria-Geral da União, a competência a instauração de processos administrativos de responsabilização e correção de procedimentos, bem como a apuração de atos ilícitos praticados por estrangeiros. Esse procedimento é feito por servidores estáveis, que por meio de processo administrativo para apuram a responsabilidade por violação à Lei 12.846/2013.
Nesse procedimento o, o art. 10, § 1.º, traz a previsão do auxílio do Poder Judiciário quando houver a necessidade de medidas para o não comprometimento do processo tanto na fase de instrução como nas buscas e apreensões.Tais medidas decorrem da necessidade de uma apuração que instrumentalize as sanções de forma qualificada pela de ilícitos.
Portanto, na produção de provas legitimas e válidas é preciso se valer da autoridade judicial, sendo que 180 dias da contados da de instituição da comissão é necessária a conclusão e a apresentação dos relatórios para instauração do julgamento a respeito dos fatos apurados.
Com a conclusão do processo administrativo o Ministério Público é informado da existência de crimes praticados, para que a defesa da pessoa jurídica faça a defesas em 30 dias a partir da intimação. É importante ressaltar que o art. 14. da Lei 12.846/2013 trata da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, do seguinte modo:
“sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa”.
A desconsideração da personalidade jurídica é o recurso para a efetivação dos processos de execução e das sanções previstas na Lei 12.846/2013. Quanto a responsabilização patrimonial, a desconsideração da pessoa jurídica com restrição de direitos é necessária a existência do contraditório e a ampla defesa.
A Lei 12.846/2013 em seu art. 6.º determina que na esfera administrativa, que devem ser aplicadas às pessoas jurídicas em atos lesivos de forma cumulativa ou isolada:
“(inc. I) multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação; e (inc. II) publicação extraordinária da decisão condenatória”.
No caso da ausência de critério para verificação do valor do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa é será fixado entre seis mil e sessenta milhões de reais. A decisão condenatória deverá ter publicidade ampla nos meios de comunicação de grande circulação e no aonde for exercida a atividade da pessoa jurídica durante 30 dias e na rede mundial de computadores. (CAMARGO, 2018)
Além dessas sanções é possível a necessidade de reparação integral do dano causado à administração pública. Quanto aos parâmetros o art. 7.º da Lei Anticorrupção, estabelece o seguinte:
“(inc. I) a gravidade da infração; (inc. II) a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator; (inc.III) a consumação ou não da infração; (inc. IV) o grau de lesão ou perigo de lesão; (inc. V) o efeito negativo produzido pela infração; (inc. VI) a situação econômica do infrator; (inc. VII) a cooperação da pessoa jurídica para a apuração das infrações; (inc. VIII) a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica; (inc. IX) o valor dos contratos mantidos pela pessoa jurídica com o órgão ou entidade pública lesados”.
A justificação deve ser minudente com explicitação da motivação das decisões, bem como os parâmetros de aplicação.A Lei Anticorrupção tem por finalidade a condução do pais ao modelo dos pais desenvolvidos. Portanto, para além do caráter sancionatório ela busca dissuadir as práticas de lesão administração pública.
3.3. O Código de Conduta da Alta Administração e o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal
Nos dois códigos são detalhados diretrizes e princípios éticos a serem observados por funcionários públicos federais, que envolvem recebimento de presentes ou benefícios de pessoa, empresa ou entidade:
a) estiver sujeito à jurisdição regulatória do órgão a que pertença a autoridade;
b) tenha interesse pessoal, profissional ou empresarial em decisão que possa ser tomada pela autoridade em razão do cargo;
c) mantenha relação comercial com o órgão a que pertença a autoridade; ou
d) represente interesse de terceiros, como procurador ou preposto, de pessoa, empresas ou entidade compreendida nas hipóteses anteriores.
A exceção são os brindes sem valor comercial ou distribuídos como cortesia, propaganda, divulgação habitual ou eventos especiais e datas comemorativas, desde que:
a) O valor comercial do brinde não ultrapasse o valor de R$100,00 (cem reais) dados uma vez por ano pela mesma empresa e
b) A distribuição do brinde deve ser generalizada, ou seja, não se destinar exclusivamente a uma determinada autoridade.
Na esfera administrativa, a apuração e imposição dos fatos eivados de corrupção serão feitas por procedimento próprio, iniciado pela autoridade máxima dos órgãos estatais competentes. O procedimento pode culminar na imposição de:
a) Multa em dinheiro de R$ 6.000 (seis mil reais) à R$ 60.000.000 (sessenta mil reais) e de 0,1% a 20% do faturamento anual bruto, descontados os tributos, nos termos do art 6.º, I e § 4.º da Lei 12.846;2
b) Divulgação da condenação na mídia, por meios de comunicação de grande circulação, bem como no Cadastro Nacional de Empresas Punidas, o que pode representar um duro golpe na reputação da marca (vide art 6.º, II da referida lei).
As punições administrativas devem ser aplicadas conjunta ou isoladamente, de acordo com o critério de julgamento pela administração. No campo judicial, via ação própria provocada pelas pessoas jurídicas públicas envolvidas, União, Estados, Municípios e Distrito Federal, além do Ministério Público, a empresa envolvida está sujeita às seguintes sanções:
-
o perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
-
na suspensão ou interdição parcial de suas atividades;
-
na dissolução compulsória da pessoa jurídica; e
-
na proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.
São considerados na determinação e aplicação das sanções, conforme previsão do art.7.º da Lei 12.846:
a) Seriedade do crime;
b) Vantagem obtida ou pretendida;
c) Efetivação, ou não, da violação;
d) Grau de lesão, ou o perigo desta;
e) Consequência negativa da violação;
f) Situação econômica da empresa;
g) Cooperação da empresa no que tange à investigação da violação;
h) Existência de procedimentos e mecanismos internos de integridade, auditoria e incentivos para a informação de irregularidades, além da fiscalização efetiva do que é proposto por códigos de ética e condutas internas da empresa;
i) Valor dos contratos mantidos com entidade pública lesada;
j) Grau de eventual contribuição da conduta de funcionário público para o ato lesivo.
Na aplicação das sanções da nova Lei Anticorrupção é a “cooperação da pessoa jurídica para a apuração das infrações”. Assim, se considera a resposta rápida às denúncias, considerando a conveniência ecooperação voluntaria que traga elementos robustos e efetiva.
Portanto, as punições podem ocorrer nas esferas, a administrativa e a judicial, de forma independentemente, onde os procedimentos e penalidades são diversas em conformidade ao devido processo legal e suas garantias. Assim, os programas de compliance são importantes na prevenção de problemas e redução de sanções.
Na lei são previstos mecanismos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia na dosimetria da pena. Além da corrupção stricto sensu, são considerados ilícitos os atos praticados a licitações e contratos. Por isso, é preciso a criação de programas efetivos de prevenção. (CAMARGO, 2018)
Outro instrumento previsto na lei é o Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP), que oferece a publicidade às punições aplicadas em conformidade com a Lei 12.846, possibilitando assim a consulta de informações sobre instituições empresariais. É um mecanismo de repressão e de combate à corrupção, e inibe pessoas jurídicas de cometerem novos crimes.
Existe também na Lei Anticorrupção a possibilidade de acordos de leniência entre as pessoas jurídicas com a Controladoria-Geral da União (CGU) no âmbito do Poder Executivo Federal, assim como atos lesivos praticados contra a administração pública estrangeira. O art.16 da lei, traz os seguintes requisitos para o programa de leniência são:
a) A empresa precisa manifestar interesse em cooperar e procurar o Poder Público, sendo a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para apuração do ato ilícito;
b) A empresa precisa cessar o envolvimento nas condutas corruptas e seu envolvimento na infração investigada a partir da data da propositura do acordo;
c) A proponente deve admitir sua participação no ilícito e cooperar plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo.
Os benefícios, por sua vez, são os seguir:
a) As multas podem ser reduzidas em até 2/3 (dois terços) de seu valor;
b) Todas as demais sanções (excluindo-se a restituição) são abolidas;
c) Isenção da pessoa jurídica da sanção de publicação extraordinária da decisão condenatória;
d) Isenção da proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicos e de instituições financeiras públicas.
É importante destacar que “os efeitos do acordo de leniência serão estendidos às pessoas jurídicas que integram o mesmo grupo econômico, de fato e de direito, desde que firmem o acordo em conjunto, respeitadas as condições nele estabelecidas”, O § 5.º do art.16 estabelece que a “proposta de acordo de leniência somente se tornará pública após a efetivação do respectivo acordo, salvo no interesse das investigações e do processo administrativo. No entanto, a Lei 12.846/2013 pode favorecer o crime que busca enfrentar, se não observar os seguintes critérios:
-
O processo administrativo será decidido pela autoridade máxima do órgão que o instaurou, posto normalmente ocupado por um político ou funcionário comissionado;
-
A decisão dele não precisa estar vinculada ao parecer dos servidores da comissão julgadora;
-
O procedimento pode ser prorrogado indefinidamente; e
-
Não há chance de recurso. Pelo exposto, não existe um sistema de controle que garanta aos particulares que não haverá uma aplicação errada da lei. Além disso, a falta de um órgão centralizado, ou uma autoridade especializada para aplicar a lei de forma consistente nos diversos entes federativos promoverá uma gigantesca pulverização – o Brasil tem mais de 5.500 municípios.
Cabe as autoridades estipular os valores no término do processo.
3.4. A Lei Federal nº 13.303/2016: a obrigatoriedade do programa de compliance no âmbito das empresas estatais
A Lei 13.303/2016, “dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. No entanto, não disciplina todoo funcionamento das empresas estatais.
No caso, do regime patrimonial de bens, regime de pessoal, obrigações civis e comerciais, finanças e contabilidade, são regulados pela Lei 6.404/1976. Essencialmente a Lei 13.303/2016 trata da organização societária (arts. 1.º a 26), licitações e contratos (arts. 28-84), controle interno e externo (arts. 85-90). O escopo de validade é “toda e qualquer empresa pública e sociedade de economia mista da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.
A inexistência de conflito decorre das circunstâncias de áreas de competência delimitadas constitucionalmente. Assim, não cabe falar em hierarquia das leis, no nosso sistema constitucional. Portanto, de forma sintética é importante esclarecer:
a) na ordem jurídica brasileira, desde uma perspectiva interna, coexistem leis nacionais (editadas pela União com vigência em todo o território nacional), leis federais (editadas pela União com vigência limitada ao âmbito do governo federal), leis estaduais (editadas pelos Estados com vigência limitada ao âmbito dos respectivos territórios estaduais), leis municipais (editadas pelos Municípios com vigência limitada ao âmbito dos respectivos territórios municipais) e leis distritais (editadas pelo Distrito Federal com vigência limitada ao âmbito do governo distrital);
b) é a Constituição Federal que distribui as competências legislativas entre os vários entes federados; c) não existe hierarquia entre leis nacionais, leis federais, leis estaduais e leis municipais, senão uma diferenciação em matéria de competências constitucionais, cabendo, a cada uma, dispor acerca dos assuntos que lhe foram reservados pela Constituição Federal, na extensão ali determinada. 5. Pois bem. Partindo-se daí e volvendo a atenção ao caso particular da Lei 13.303/2016, importa checar qual seu fundamento constitucional de validade para então concluir-se pelo seu caráter federal ou nacional. Nesse sentido, verifica-se que o Legislador Constituinte distribuiu as competências legislativas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, quanto à titularidade, em três grandes grupos: privativas, residuais e concorrentes. Competências privativas são aquelas cuja titularidade recai apenas sobre um nível de governo: federal, estadual ou municipal.5 Competências residuais são aquelas que cabem a Estados, Distrito Federal ou Municípios, por exclusão, ou seja, por não terem sido expressamente cometidas a outro ente federado. Competências concorrentes são aquelas atribuídas, conjuntamente, a todos os entes federados, assegurando-se à União a competência de editar as normas gerais sobre determinada matéria, restando a Estados, Distrito Federal e Municípios suplementar as normas federais, adaptando-as às peculiaridades locais.
No caso da Lei 13.303/2016, a regra constitucional está diretamente vinculada ao art. 173, “que com ressalvas estabelece que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária a segurança nacional ou interesse coletivo relevante”.
Cabe a lei estabelecer “o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias na exploração da atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços”, dispondo sobre:
I – sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;
II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;
III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;
IV – a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários;
V – os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.§ 2.º As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado. § 3.º A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade. § 4.º – lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. § 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com suanatureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.”
A Lei 13.303/2016 reconhece as empresas estatais como forma de ação estatal no domínio econômico, conforme o art. 173. da CF/1988, situando no direito econômico, e competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal conforme art. 24, I, do texto constitucional.
Quanto as normas gerais sobre licitações e contratos contidas nos arts. 28. a 84 da Lei 13.303/2016, e modalidades, para a Administração Direta e Indireta, incluindo empresas estatais, são competência privativa da União de acordo com o art. 22, XXVII, da Carta Magna.
Já os arts. 1.º a 26 da Lei 13.303/2016 tratam da organização societária das estatais, tipificadas no direito comercial, com competência legislativa é privativa da União conforme o art. 22, I, da Constituição Brasileira.
Quanto a função social o art. 27. da Lei 13.303/2016) e a fiscalização das estatais contidas nos arts. 85-90 da Lei 13.303/2016 estão inseridos no inc. I do § 1.º do art. 173, com competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal no que concerne a legislar sobre direito econômico art. 24, I e arts. 22, I e XXVII, 24, I, e 173, Portanto:
a) a Lei 13.303/2016 tem validade nacional, sendo aplicável às empresas estatais federal, estaduais, municipais e do Distrito Federal;
b) em matéria de direito civil e comercial (arts. 1.º a 26), a competência legislativa é privativa da União (CF/1988 (LGL/1988/3), art. 22, I);
c) em matéria de licitações e contratos (arts. 28. a 84), cabe legislação suplementar de Estados, Municípios e Distrito Federal, valendo as regras da Lei 13.303/2016 como normas gerais (CF/1988 (LGL/1988/3), arts. 22, XXVII);
d) em matéria de função social e fiscalização das empresas estatais (arts. 27. e 85-90), incide a competência do direito econômico (CF/1988 (LGL/1988/3), arts. 24, I, e 173), cabendo legislação suplementar de Estados, Municípios e Distrito Federal (CF/1988 (LGL/1988/3), arts. 24, I e § 2.º, e 30, II).
A Lei 13.303/2016 relaciona a atividade econômica com o serviço público na perspectiva de atividade econômica contida no art. 173. da Constituição Federal deve ser entendida em seu sentido estrito, como espécie do gênero “atividade econômica em sentido amplo”, portanto diverso dos serviços públicos citados no art. 175. do texto maior.
Assim sendo, o “estatuto jurídico” previsto naquele art. 173. não alberga às empresas estatais prestadoras de serviço público do art. 175. Como leciona José Afonso da Silva:
“De acordo com o Estatuto Jurídico das Empresas Estatais cabe a lei estabelecer (...). No (§1.º do art. 173) a Constituição atribui à lei ordinária o estabelecimento do estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, seja daquelas que explorem atividade econômica de produção e de comercialização de bens, como daquelas que prestem serviços. Entenda-se esta última cláusula: empresas públicas e de economia mista que explorem a atividade econômica de prestação de serviços. Trata-se, pois, da atividade do terceiro setor da economia, não da prestação de serviços públicos, que não é exploração de atividade econômica e nem pode estar sujeita aos condicionamentos do caput – imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, conforme definido em lei-, pois que esses elementos são da essência dos serviços públicos.”
Essa lógica tem repercussões diversas pois as empresas estatais prestadoras de serviços públicos tem imunidade tributária recíproca do art. 150, VI, “a”, do texto constitucional, podendo ser beneficiadas tributariamente, são equiparadas à Fazenda Pública nas execuções judiciais quanto a impenhorabilidade de bens e aplicação do regime de precatório.
No caso das estatais que exploram “atividades econômicas em sentido estrito”, às quais se deve aplicar um certo “regime jurídico próprio das empresas privadas”, conforme o art. 173, §1.º, II, da Constituição Federal o dispositivo não alcança às estatais prestadoras de serviços públicos, de acordo com a doutrina e jurisprudência.
Na mesma direção aponta Lucas Rocha Furtado (2015):
“A Constituição Federal, em seu art. 22, inciso XXVII, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.º 19, confere à União competência privativa para legislar sobre normas gerais sobre licitações e contratos administrativos. Dispõe o texto constitucional, nos seguintes termos: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, §1.º, III; Da leitura da disposição constitucional supra, depreende-se que, para o seu fiel cumprimento, deveriam vigorar dois diplomas legais, ambos dispondo sobre normas gerais e aprovados pela União. O primeiro seria aplicável às administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados e Municípios; o segundo, relativo às empresas públicas e sociedades de economia mista. O objetivo dessa separação no tratamento a ser dado às licitações e aos contratos firmados pelas entidades referidas pelo art. 37, XXI (Administração direta, autarquias e funções públicas), e àqueles realizados pelas entidades referidas pelo art. 173, §1º (empresas públicas e sociedades de economia mista), todos da Constituição Federal, é, indiscutivelmente, o de buscar para as empresas estatais que exploram atividade econômica regras menos rígidas ou formalistas que aquelas previstas na Lei n.º 8.66/93. Até o presente momento, no entanto, a lei referida pelo art. 173, §1º, da Constituição Federal não foi aprovada. Sendo a licitação, à luz dos princípios da legalidade e da impessoalidade, a regra, a inexistência de lei específica relativa às empresas públicas e sociedades de economia mista referida pelo art. 173, §1º, da Constituição Federal, obriga destarte a que todas as entidades e órgãos da Administração Pública se submetam ao que preceitua a Lei nº 8.666/93. Assim, enquanto não for elaborada essa nova legislação, todas as entidades da Administração Pública direta, autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista de todas as esferas de governo (federal, estadual ou municipal) devem continuar a seguir as regras contidas na Lei nº 8.666/93.”
Portanto, existe por parte da doutrina o reconhecimento do art. 22, XXVII, da Constituição Federal inserida por meio da Emenda Constitucional 19/1998, que autoriza a edição de regras licitatórias especiais para as empresas estatais, e que são diversas das aplicadas aos órgãos da Administração Direta, autarquias e fundações públicas.
O Poder Executivo Federal, por meio da Instrução Normativa Conjunta CGU∕ MP nº 001, de 10 de maio de 2016, dispôs sobre controles internos, gestão de riscos e governança.
Na Instrução, determina-se que: Os órgãos e entidades do Poder Executivo federal deverão implementar, manter, monitorar e revisar os controles internos da gestão, tendo por base a identificação, a avaliação e o gerenciamento de riscos que possam impactar a consecução dos objetivos estabelecidos pelo Poder Público. Os controles internos da gestão se constituem na primeira linha (ou camada) de defesa das organizações públicas para propiciar o alcance de seus objetivos.
Os procedimentos passam por um accountability com evidencia das responsabilizações das decisões e das ações implementadas, considerando a salvaguarda dos recursos públicos, imparcialidade e consideração dos riscos, calculados e verificados por auditorias internas, visando a melhoria dos processos.
Assim, as auditorias internas funcionam como uma proteção nas organizações por meio de avaliações e aprimoramento buscando a eficiência e eficácia para mitigar riscos.
3.5. As Linhas de Defesa no Gerenciamento de riscos e controles.
O modelo de linhas de defesa é importante pois permite o gerenciamento dos riscos e pode ser utilizado em qualquer organização, independentemente de seu tamanho ou complexidade. O modelo evidencia os riscos e aperfeiçoa os controles, aumentando a eficácia no gerenciamento.
A primeira linha de defesa envolve os gerentes operacionais que devem atuar em ações corretivas na resolutividade de problemas em processos e controles. Portanto, cabe a ela a responsabilidade pelos controles internos e verificação dos riscos cotidianamente.
Portanto, os gestores identificam, avaliam, e controlam os riscos, contribuindo para melhorar as políticas internas e assegurando que as atividades desenvolvidas estejam compatíveis com os objetivos da organização. Os gestores são a primeira linha de defesa em virtude da proximidade com a execução das atividades da organização. Logo, são os primeiros a identificar os problemas na execução das atividades e definem e implementam os controles.
Logo, é a responsável pela avaliação, controle e mitigação dos riscos por meio de procedimentos e políticas internas, com o uso de controles de gestão e de supervisão. (IIA, 2013)
Na segunda linha de controle se tem comitê que monitora a implementação de práticas de gerir riscos auxiliando a gerência operacional na definição de metas e possibilidades de exposição ao risco considerando a instituição como um todo. Foca leis e regulamentos aplicáveis, e está ligada à alta administração e, ao órgão de governança. Comumente monitora os riscos financeiros. Assim, a segunda linha de defesa é essencial mas precisa estar alinhada aos órgãos de governança no que concerne aos riscos e dos controles internos. (IIA, 2013)
Na segunda linha de defesa se tem a unidade de gestão de riscos, que tem por função monitorar e contribuir para a implementação de práticas de gestão de risco e de compliance, monitora as atividades da instituição considerando leis e regulamentos, os riscos financeiros, e a antifraude e anticorrupção.
A segunda linha de defesa tem maior liberdade que a primeira linha de defesa. São gestores de risco por natureza e tem o poder de intervenção e implementação dos controles.
A terceira linha trata das orientações e capacitação nos processos de gerenciamento de riscos, além de facilitar práticas de gerenciamento de riscos. Faz o alerta a gerência operacional de questões relativas a marco regulatório e de riscos, além de monitorar e adequar o controle interno, em conformidade com leis e regulamentos.
Na terceira linha de defesa se tem a auditoria interna da organização, que realiza a avaliação objetiva e independente da eficiência e eficácia dos controles internos, tanto no que concerne ao risco como a governança. Portanto, atua na eficiência e eficácia, na salvaguarda dos ativos, comunicação interna, conformidade de leis, regulamentos e contratos.
Os auditores internos fornecem avaliações amplas para a governança e para à alta administração quanto a eficácia da governança, do gerenciamento de riscos e dos controles internos, apoiando a primeira e a segunda linhas de defesa no alcance do gerenciamento de riscos e controle.
A Metodologia IFAC (International Federation of Accountants) traz a compreensão que as avaliações de impacto considerem o impacto financeiro, a viabilidade dos objetivos da organização, o impacto político. Assim, se tem o estabelecimento de uma matriz ou mapa de riscos nas escalas alto, médio e baixo (PADOVEZE e BERTOLUCCI, 2008).