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Os precatórios e o endividamento irresponsável.

Uma história mal contada

01/11/1999 às 01:00
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A celeuma provocada pelo endividamento pelos Estados de Pernambuco, de Santa Catarina e de Alagoas com a emissão de Títulos da Dívida Pública, admitido no artigo 33 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988, autorizados pelo Senado Federal e aprovados pelo Banco Central do Brasil que, forrados em obrigações decorrentes de Precatórios Judiciais existentes na época da Constituição de 1988, estão sendo contestados, porquanto estes Entes Públicos não tinham qualquer endividamento e não se quadraram com o que autoriza a Norma de Adaptação do Sistema Constitucional anterior com o atual.

A celeuma decorre da fraude praticada pelos Estados de Pernambuco, de Alagoas e de Santa Catarina, quando sobreveio a Constituinte de 1988, o Governador Orestes Quércia, para solucionar o impasse da enorme dívida originária dos precatórios (falava-se em 3 bilhões), utilizou-se desta para estabelecer uma moratória, em favor das Fazendas Públicas, diligenciando para que se fizesse incluir na Constituição Federal o artigo 33 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988, que (a) permitia o parcelamento dos débitos judiciais dos precatórios existentes em ate oito prestações; (b) delegava aos titulares dos Poderes Executivos a possibilidade de emitirem títulos para gerar recursos, a fim de que fossem estes negociados no Mercado Financeiro, gerando recursos para o pagamento dos precatórios.

O Deputado Federal José Genoíno e o Vereador José Eduardo Martins Cardoso, ambos do Partido dos Trabalhadores, no Jornal O Estado de São Paulo, na seção Espaço Aberto, Caderno A, página 2, da edição do dia 28 de dezembro de 1996, em termos acres, com o título acima, fizeram publicar artigo onde se valem da fraude para estender a questão para o Município de São Paulo, exigindo que a Comissão instaurada no Senado Federal estenda a apuração abrangendo este Município e enfatizam que quando entrou em vigor a Constituição de 1988, ninguém percebeu que um simples dispositivo inserido nas suas Disposições Transitórias poderia ser responsável, em curto espaço de tempo, pela prática de um ardiloso golpe capaz de comprometer o controle do endividamento público em todo o País. Realmente, dizem os articulistas, ninguém supunha que, ao se estabelecer que Estados e municípios poderiam emitir títulos da dívida pública para o pagamento de dívidas judiciais, os precatórios (conforme estabelece o artigo 37 das Disposições Transitórias da Constituição Federal), se desse oportunidade, a governadores e prefeitos, de agir de forma ilegal e inescrupuloza. Ou o digno Deputado José Genuíno tem memória curta, ou falta com a verdade real em seu articulado e peca por afirmar o que todos previam, ou pelo menos todos os constituintes foram alertados de forma contundente por este articulista, enfaticamente.

Não se trata aqui de vir afirmar eu não disse que isto ia ocorrer. A questão é outra. Na Assembléia Constituinte de 1988, quando se delineavam os termos que vieram a resultar na redação do artigo 33 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988, um Grupo de Advogados (o Articulista, José Eduardo Ferreira Netto, José Pimentel de Assis Moura, Vicente Paulillo e outros) deslocou-se para Brasília e, em sucessivas reuniões com Deputados que estavam defendendo o dispositivo mencionado, entre eles, José Genuíno, José Serra e outros, foi enfatizado o risco que havia na regra que estava em formação e enfatizado que geraria uma fraude, da qual os Executivos iam se valer, para emitir títulos que iriam ocasionar distorções óbvias, no mercado financeiro, podendo gerar, até uma crise institucional, já que os valores iriam ser desviados para outros fins - como veio a acontecer.

Nessa ocasião, coordenava a redação deste dispositivo, que interessava ao Governo do Estado de São Paulo (ocupado por Orestes Quércia), o Secretário Alberto Goldemann, com quem o Grupo se reuniu e enfatizou-se o risco que havia, exigindo-se uma alteração no texto para aprimorar o controle do privilégio que estava sendo concedido para as Fazendas Públicas. Iguais providências foram enfatizadas a todos os líderes das bancadas, especialmente, ao Deputado José Genuino.


          Voltando a São Paulo, fiz amplo artigo, que veio a ser publicado no Jornal da Tarde, onde enfatizava o que estava sendo aprovado levaria a distorções o artigo 33 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988 teria que ser alterado, nele enfatizava a necessidade de ser modificada a redação do texto, por se prestar a interpretação dúbia, que, por certo, geraria uma fraude com afronta aos Princípios da Moralidade Administrativa, encaminhando a todos os Constituintes cópia do trabalho e verberando o texto em debate.

Não se culpe o Senado, e muito menos o Banco Central do Brasil, pelos atos de improbidade administrativa gerados pela redação do artigo 33 Ato das Disposições Transitórias, da Constituição de 1988. Porquanto a redação do dispositivo é que foi desastrosa e o Nobre Deputado José Genuíno não venha dizer que ninguém o alertou. Alertou-se-o sim e ele é que não ouviu. Ele e muitos outros que hoje vêm dizer que há fraude. Há, evidentemente, como vem enfatizando o Jornal O Estado, porém a origem decorre da falta de critério na redação ambígua, imprecisa, aberrante e desconectada com os Princípios de Transparência, de Publicidade e de Honestidade dos Atos Administrativos que se fez na redação do artigo 33 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988.

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Assim, se nova moratória houver a façam aprovar - o que é um mal necessário, porquanto, da forma como está são impagáveis os débitos das Fazendas Públicas no montante em que atingiram - sem contudo, autorizar a emissão de Títulos, só deferindo o parcelamento (em quatro, ou mesmo mais pagamentos dos precatórios pendentes de resgate na ocasião em que for aprovada esta emenda ao artigo 33 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988), dizendo uma frase simples, que os débitos devem ser atualizados de juros e de correção da expressão monetária (acolher a coisa julgada anterior), na ocasião dos pagamentos (para evitar os atos atentatórios à moralidade pública), editando Ato Administrativo para esclarecer a data e forma de pagamento (princípio da transparência), aproveitando os mesmos precatórios, sem necessidade de emissão de outros (para acolher o Princípio de Economia Processual).

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Sobre o autor
Joaquim de Almeida Baptista

Advogado e economista em São Paulo. Autor de "O Código das locações urbanas" (Jurídica Editora, 1993), "Impenhorabilidade do bem de família vista pelos tribunais" (Editora Edipro, 1993), "Código do Consumidor interpretado" (Editora Iglu, 1997 - 2ª edição - ampliada), "Dos embargos do devedor e da exceção de pré-executividade nos tribunais - Jurisprudência - Modelos práticos (casos concretos)" (Editora Iglu, 2000 - 1ª edição).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BAPTISTA, Joaquim Almeida. Os precatórios e o endividamento irresponsável.: Uma história mal contada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 36, 1 nov. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/839. Acesso em: 18 nov. 2024.

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