SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Conceito de Dano Pessoal; 3. A reparação do dano moral; 4. Arbitramento do dano moral; 5. Conclusão; 6. Referências bibliográficas.
1. Introdução
Não restam dúvidas de que o dano pessoal é um dos temas mais atraentes na seara jurídica para a investigação científica, pois ainda muito há que se tratar desse instituto cuja história doutrinária nos revela momentos de profundos choques entre renomados autores, uns favoráveis ao seu ressarcimento, outros ferrenhos negadores da possibilidade de sua indenização. Fato é, porém, que no Brasil a Constituição da República de 1988, em seu art. 5º, V e X, veio pacificar essa antiga discussão, prescrevendo a possibilidade de ressarcimento por dano moral, diferentemente de legislações como a italiana, que nada expressa sobre dano pessoal, dificultando sua aplicação e sua aceitação pelos tribunais e pelas academias. Não obstante isso persiste um problema que ainda não foi solucionado eficazmente e que precisa sê-lo, a todo custo, sob pena de se violar a segurança jurídica e até mesmo a justiça das decisões, que é o relativo à fixação do quantum a ser pago de indenização. E é sobre essa questão que nosso trabalho incide, não na tentativa de criar critérios, mas de reunir em um único espaço parte do que a doutrina vem dizendo e a jurisprudência aplicando no caso dos danos morais.
2. Conceito de dano pessoal
Preferiremos, neste trabalho, a utilização da expressão dano pessoal. Não é que ele seja contraposto ao conceito de dano moral. Pelo contrário. É que o dano pessoal pode ser físico e/ou moral, dependendo de qual direito subjetivo atingir. Por isso, nos parece mais completa a expressão, que abarca as duas formas de dano à pessoa. [01] As lesões que atingem uma pessoa são de naturezas distintas: uma de natureza física, que é aquela que viola a incolumidade corpórea e a saúde mental do indivíduo, tipificada nos Capítulos I a VI, do Título I da Parte Especial do Código Penal; e outra de natureza moral, que atinge (ou pode atingir) os sentimentos mais íntimos do ser humano, como honra, bem-estar, podendo ocasionar sensações ruins, como sofrimento, dor, angústia, humilhação etc. A principal diferença está justamente na forma de se perceber esses danos: enquanto os danos físicos são visíveis a qualquer pessoa (qualquer pessoa pode, por exemplo, visualizar um membro mutilado, uma ferida, o óbito...), os danos morais, no entanto, não podem ser visualizados, pois atingem aquilo que há de mais íntimo no homem, seus sentimentos, que não são visíveis e nem podem ser sentidos por outros indivíduos.
O Prof. Francisco Vieira Lima Neto, em artigo inédito, apresenta um interessante exemplo: imagine a situação em que alguém, internado num hospital em estado comatoso, venha ser tripudiado pela imprensa local, que vincula notícias acusando-o de corrupção e de outros crimes, sem que sequer houvesse condenação penal nesse sentido. Tem o doente direito à compensação por dano moral? Sim, terá, porque sua honra foi atingida pela notícia. Mas sentiu a vítima alguma sensação de sofrimento, dor ou humilhação? Não, não o sentiu. É por causa dessa impossibilidade de se averiguar os sentimentos negativos que se diz que ele é in re ipsa, não depende de prova da dor, sofrimento para que se configure a obrigação de indenizar. Diferentemente do dano físico, cuja lesão deverá ser provada através de perícia médica, por exemplo.
Postas essas razões, passemos ao exame do conceito de dano pessoal. Muitas são as suas definições, mas todas nos remetem a um ponto em comum: dano pessoal é aquele dano que atinge o ânimo psicológico, moral, intelectual e físico de uma determinada vítima. [02] Alguns autores, dentre eles Karl Larenz, preferem definir os danos pessoais a partir dos danos patrimoniais, considerando-os – equivocadamente – uma categoria destes, que atingem, bens imateriais, ou seja, dano pessoal é a lesão a bens jurídicos imateriais que deverá, entretanto, repercutir na esfera patrimonial da vítima. [03] A nosso ver, essa visão patrimonialista, economicista, não se adequa às tendências do Direito Civil, calcado na proteção do ser humano, fundado em direitos personalíssimos, que vão muito além dos (simples) conceitos de propriedade, posse, pecúnia. "A composição do dano patrimonial deflui de uma simples operação aritmética que tem como base a relação de causa e efeito entre o prejuízo e o evento culposo. O mesmo não é de dizer-se em relação ao dano que atinge apenas o foro íntimo da pessoa." [04] Além do mais, os danos pessoais não diminuem o patrimônio e nem frustram seu acréscimo.
Também Savatier [05] se propôs a oferecer um conceito de dano pessoal como sendo "(...) qualquer sofrimento humano que não é causado por perda pecuniária (...)", de maneira que isso representaria atentado à reputação do ofendido, à sua autoridade (legítima), ao seu puder, à sua segurança e tranqüilidade, ao seu amor estético ("amor-próprio"), à integridade de sua inteligência e às suas afeições.
Nesse conceito encontramos um outro problema, técnico, que pode colocar em risco toda a teoria do dano pessoal: o fato de que não se pode indenizar esse dano porque dor, sofrimento e honorabilidade não podem ser estimadas financeiramente. Em realidade, como veremos mais adiante, com a indenização pecuniária do dano pessoal não se objetiva ao ressarcimento, mas sim à compensação, que, é certo, não fará a situação jurídica anterior se restabelecer, senão permitirá ao vitimado amenizar o sofrimento causado pelo dano, além de fazer com que o agente sinta o mal que causou.
É por isso que preferimos o conceito de Maria Celina Bodin de Moraes [06], para quem dano pessoal é o dano que atinge e ofende a dignidade da pessoa humana. Para tanto, citamos trecho de sua obra:
"(...) afirmar que o dano moral é ‘dor, vexame, humilhação, ou constrangimento’ é semelhante a dar-lhe o epíteto de ‘mal evidente’. Através destes vocábulos, não se conceitua juridicamente, apenas se descrevem sensações e emoções desagradáveis, que podem ser justificáveis, compreensíveis, razoáveis, moralmente legítimas até, mas que, se não forem decorrentes de ‘danos injustos’, ou melhor, de danos a situações merecedoras da tutela por parte do ordenamento, não são reparáveis. (...) Se a violação à situação jurídica subjetiva extrapatrimonial acarreta, ou não, um sentimento ruim, não é coisa que o Direito possa ou deva averiguar. O que o ordenamento jurídico pode (e deve) fazer é concretizar, ou densificar, a cláusula de proteção humana, não admitindo que violações à igualdade, à integridade psico-física, à liberdade e à solidariedade (social e familiar) permaneçam irressarcidas." [07]
Sergio Cavalieri Filho [08] afirma que o "(...) dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que violação do direito à dignidade". Na verdade, agora, o problema que se põe é definir o conteúdo desta cláusula geral de tutela da personalidade: a dignidade da pessoa humana. [09] Observe que, em realidade, dor, espanto, humilhação, vergonha, injúria etc. são o conteúdo do dano moral, mas não o seu conceito, porque este é a ofensa ao(s) direito(s) personalíssimo(s).
A dignidade da pessoa humana, princípio fundamental da República Federativa do Brasil, conforme art. 1º, III, CRFB, é um valor espiritual e moral inerente à pessoa; é a necessária estima que merecem as pessoas por sua condição humana. É, enfim, a razão de ser dos direitos e garantias fundamentais, inerentes, como já dito, à personalidade humana. [10]
E é justamente quando essa dignidade da pessoa sofre algum dano causado por outrem que temos configurado o dano pessoal. Ensina Maria Celina B. de Moraes que esse dano à dignidade humana é a repercussão da ofensa a aspectos da personalidade da pessoa humana, do que se infere que, haverá dano pessoal toda vez que um direito personalíssimo da vítima for atingido em sua essência. Ou seja, o dano deve atingir direitos como vida, honra, liberdade, igualdade de tratamento, estética (feição), sigilo, intimidade, imagem, nome, incolumidade física etc, e, no magistério de Caio Mário da S. Pereira, "(...) toda lesão à integridade física ou moral da pessoa; as coisas corpóreas ou incorpóreas que são objetos de relações jurídicas; os direitos de propriedade como os direitos de crédito; a própria vida como a honorabilidade e o bom conceito de que alguém desfruta na sociedade." [11].
Veja, portanto, que o dano pessoal tem como causa a violação a um direito (subjetivo) extrapatrimonial, protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro pela cláusula de tutela da personalidade, garantida pelo art. 1º, III, da Constituição da República.
3. A reparação do dano pessoal
Postas essas premissas, do que seja o dano pessoal e de suas características, passemos para a análise da justificativa de sua reparação.
O histórico do dano moral demonstra que sua aceitação pela doutrina e, principalmente, pela jurisprudência não foi fácil. O principal problema, que deixava diversos autores desconfiados era, justamente, o da reparação. É o ensinamento de Chironi [12]: "Com è possibile resarcire pecuniariamente il dolore? Se vero e sentido, como farne la estimazione? Si risponde che lo si estima dal giudice, ma la estimazione è alora abbandonata al criterio personale del magistrata, e ciò non si concilia col carattere del risarcimento: si dice che ‘è impossibile valutare in denaro il danno morale, ma che se il magistrato non può accordare un risarcimento esatto, ciò non vuol dire non passa accordarne di esatteza, ma di impossibilità a valutare."
Segundo os irmãos Mazeaud [13], os tribunais franceses somente consideravam um esquema pecuniário quando o dano pessoal repercutisse no patrimônio da vítima, o que, sinceramente, equivale dizer que somente parecia considerável àqueles tribunais a indenização do dano patrimonial.
Deveras, a dificuldade de mensuração do dano moral e o arbitramento imposto ao agente sempre foram a maior razão de objeções feitas no passado. Porém, não será essa dificuldade razão para repelir sua compensação.
Não é o dano pessoal em si no qual se vislumbram essas dificuldades, mas em seu aspecto moral [14]. Ocorrendo um dano físico (mutilação, lesão, morte etc.) sua indenização não sucinta maiores complicações [15]. O mesmo não se diga do dano moral, visto a dificuldade de mesurar a dor, o sofrimento, a humilhação, apesar de não ser necessário provar essas sensações, posto que o dano moral é in re ipsa. "Para aceitar a reparabilidade do dano moral é preciso convencer-se de que são ressarcíveis bens jurídicos sem valor estimável financeiramente em si mesmos, pelo só fato de serem ofendidos pelo comportamento antijurídico do agente." [16]
Mas é em Sergio Cavalieri Filho [17] que encontramos o verdadeiro sentido do pagamento em dinheiro pelo dano pessoal: a condenação em dinheiro não é um lenitivo para a dor (reparação), mas uma satisfação. É a esteira seguida pelo Projeto de Lei nº 6.960/2002, que pretende acrescentar ao art. 944 do Código Civil que "a reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante." [18]
Já foi dissertado anteriormente que a reparação pecuniária do dano moral constitui não um ressarcimento pela humilhação, dor, sofrimento, mas uma compensação a todas essas sensações. Ou, como diz Georges Ripert, "Não é que as vítimas fiquem satisfeitas ou consoladas com o pagamento: o que visa à condenação é a punição do autor – tem caráter exemplar e não indenizatório." [19]
Assim é que se diz que a reparação do dano moral apresenta três funções inerentes a ela: compensatória, punitiva e social. [20] A função compensatória [21] é meramente satisfativa, pois é uma forma de compensar o lesado pelos sofrimentos ocasionados pelo agente do ato ilícito (até porque não há como aquilatar o prejuízo decorrente de dor, que é imensurável e irreparável. A função punitiva terá um sentido pedagógico para o ofensor, pois ensiná-lo-á a agir com cautela em seus atos, além de persuadi-lo em seu animus laedere. Inclusive, é importante como critério de determinação do quantum a indenizar. A função social é reflexo direto da função punitiva, pois à medida em que esta exerce papel inibidor na prática de novas ofensas, este fato tem repercussão social, produzindo reflexos igualmente pedagógicos no contexto social.
Assim, hodiernamente não há mais a discussão quanto ao dever ou não indenizar o dano moral. A contenta gira em torno, agora, dos critérios relativos à aferição do quantum a pagar como indenização. E o problema maior é a inexistência de critérios objetivos consolidados para que sejam seguidos como parâmetros. No item a seguir, apresentam-se os principais critérios apontados pela doutrina mais depurada, e outros seguidos pela jurisprudência brasileira.
4. O arbitramento do dano moral
Tendo em vista a falta de critérios consolidados para a aferição do quantum debeatur pelo dano moral, competirá ao juiz determinar, ou melhor, arbitrar [22] um valor (prudente) para a compensação do dano e punição do lesante.
Esse arbitramento, conforme Maria Helena Diniz, deve-se pautar em dois critérios: um de ordem subjetiva, pelo qual o juiz deverá examinar a posição social ou política do ofendido e do ofensor, a intensidade do animus leadere (ânimo de ofender) determinado pela culpa ou dolo; e outro de ordem objetiva, como a situação econômica do ofensor e do ofendido, o risco criado com a ação ou omissão, a gravidade e a repercussão da ofensa. "Na avaliação do dano moral o órgão judicante deverá estabelecer uma reparação eqüitativa, baseada na culpa do agente, na extensão do prejuízo causado e na capacidade econômica do responsável." [23]
Esse arbitramento, entretanto, encontra um limite, ético, inerente à atividade do magistrado, pelo qual a fixação do valor a ser pago na compensação do dano moral deverá ser guiada pelo princípio da razoabilidade [24]. Evita-se, com ele, a fixação de valores aleatórios, despreocupados com a justiça da causa. Eis que os critérios objetivos assumem importante papel na fixação do quanto a pagar. E, como ensina Venosa, somente quando o caso concreto for de dificílima solução, fugindo até mesmo dos padrões utilizados pela doutrina e jurisprudência, deverá ser admitido um critérios exclusivamente subjetivo do juiz, mas que sempre deverá agir com prudência e pautado na razoabilidade. [25]
Num passado não muito distante, a jurisprudência brasileira aplicava, analogicamente, o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/1962) e a Lei de Imprensa (Lei nº 2.250/1969), que apontaram parâmetros para a satisfação de danos de natureza extrapatrimonial. O Código Brasileiro de Telecomunicações, por exemplo, fixava valores entre 05 e 100 salários mínimos, e a Lei de Imprensa de 05 a 200 salários mínimos. [26] No entanto, cremos que esses limites não são eficazes para a determinação do quantum, pois há muitos casos em que se devem aplicar valores mais altos do que os cominados pelos referidos diplomas. [27] Além do mais, aquelas são leis especiais e não se cogita de sua aplicação em relação a matérias cíveis, de caráter geral.
Não comungamos da mesma opinião que muitos autores, que defendem uma indenização tarifada em salários mínimos como solução para a dificuldade de estimação pecuniária do dano moral e a disparidade de julgados. Não há como negar que esse artifício impediria os excessos e as indenizações vultosas, mas tarifar a indenização do dano moral ainda não é a solução adequada para encontrar-se o justo equilíbrio da compensação, já que esquemas matemáticos não são adequados para a correição de danos morais. A tarifação só traria mais problemas, e amordaçaria a distribuição da justiça. [28] A tarifação, inclusive, é o objetivo do Projeto de Lei do Senado Federal nº 150/1999, que pretende estabelecer faixas de indenização do dano moral. [29] Não corresponderia a tarifação a uma aplicação justa da jurisdição estatal, mesmo porque a moeda pode se desvalorizar e a lei se perder no tempo. O dano moral tem repercussões íntimas, que variam de indivíduo para indivíduo, de maneira que para a fixação do dano moral é preciso um estudo particular de cada caso, de cada vítima, de cada ofensor. As pessoas não vivem em um mundo padronizado; os comportamentos dão diferentes. [30]
Mas nos parece que Zavala de Gonzales [31] tem uma opinião relevante sobre o tema. Ele pondera que seria necessário considerar a teoria da regulação normativa do quantum indenizatório. Por essa solução teórica, não se fixariam máximos e mínimos para a compensação, mas deveria a norma jurídica indicar critérios objetivos ou bases que ofereçam ao magistrado margens de avaliação judicial para uma reparação eqüitativa.
Nessa pesquisa, percebemos da doutrina e de alguns julgados, alguns critérios sinalagmáticos que podem fazer as vezes de orientadores do juiz na fixação do quantum debeatur. Eles são tratados a seguir.
Deve o juiz fixar o quanto a indenizar com as máximas da experiência, tendo por standard o homem médio, o bonus pater familia, porque em se tratando de dano moral a mesma ação ou omissão pode atingir de forma diversa cada pessoa. Não são os comezinhos caprichos humanos, tampouco a rudeza de muitas pessoas – que parecem invulneráveis a tudo e todos!!! – dignos de reparabilidade pelo Direito. As brincadeiras "sem graça" entre amigos não podem causar tanta mágoa a ponto de se movimentar o aparelho jurisdicional do Estado visando à compensação. Para o homem médio essas situações não causam sofrimento, dor a ponto de se punir o outrem com uma sanção civil. Por isso, deve o juiz se sujeitar a essa análise para conceber a reparação para o caso trazido à baila.
Deve-se ponderar o teor de cada bem jurídico tutelado, pois a morte provocada de alguém querido, a honra, o bem estar, a liberdade, o sossego etc. têm pesos diferentes. Para isso, importante se faz o estudo dos reflexos pessoais e sociais, a possibilidade de reparação (material e psicológica) e a possibilidade de superação do desconforto, a duração dos efeitos. [32] E tudo isso, mais uma vez, deve ser observado sob o prisma do homem médio.
Importante critério a ser observado pelo magistrado na reparação do dano é a situação econômica, política e social dos envolvidos, vítima e ofensor. [33] Certo é que um rico não sentiria tanto o peso da indenização quanto um pobre, assim como o aumento patrimonial advindo da reparação tem repercussão diferente para ambos, da mesma forma que um político, uma pessoa jurídica ou um artista sentiriam a humilhação por um ataque à honra de forma diversa daquele anônimo, simples consumidor. A indenização não pode ser irrisória, ou seja, que não traduza punição para o ofensor e nem compensação para o lesado. [34] Esse critério também é apontado por Antonio Jeová Santos [35], que diz não se deve aceitar uma indenização meramente simbólica. Porém, não deve a compensação do dano moral aumentar vultosamente o patrimônio do ofendido – e, conseqüentemente, diminuir bruscamente o patrimônio do ofensor –,sob risco de se incorrer em enriquecimento sem causa. É até contrário aos ditames morais enriquecer às custas de um sofrimento, de uma dor, de uma perda... [36]
Entendemos que as próprias funções punitiva e social da compensação material pelo dano moral são critérios que conduzem o juiz à obtenção do quantum debeatur. Isso é fácil de compreender. O juiz deverá ter em mente a aplicação de um valor que possibilite ao ofensor e à sociedade se sentirem desestimuladas a praticarem aquele ato lesivo à dignidade da pessoa humana. "Não há dúvida que, para o homem da rua, a responsabilidade civil é bem outra coisa do que um simples instrumento de reparação de danos." [37] Esse efeito pedagógico das funções citadas deve ser avaliado quando o juiz estabelecer quanto, quando e porque pagar a indenização. É o que nos fala o seguinte julgado: "Dano moral – Indenização – Fixação do quantum que deve atender à ‘teoria do desestímulo’, segundo a qual a indenização não pode ser fonte de enriquecimento ilícito da vítima, tampouco inexpressiva a ponto de não atingir o objetivo colimado." [38] Assim, se o quantum fixado atender ao objetivo desestimulante e disciplinador da compensação, pode o juiz determiná-lo. Claro, que, para tanto, o bonus pater familia exerce, mais uma vez, papel de relevo.
Carlos Alberto Ghersi [39] diz que para a avaliação do dano moral deve-se levar em consideração a idade da vítima. Quanto a esse aspecto preferimos fazer algumas ressalvas. Claro que aquele de vida provecta que sofre um dano não pode receber uma compensação exagerada, porque isso no máximo beneficiaria a seus herdeiros, não sendo utilizado pela vítima de acordo com sua finalidade. Quando se fala de pessoas em idade jovem, no entanto, é preciso fazer a consideração da gravidade do dano, cominada com esse critério. Se o dano for de possível recuperação, de modo que não afete a vida do jovem, é possível uma indenização menor, porém o mesmo não se diga do adolescente que foi privado de ter seus pais, ou da jovem tida como profissional do sexo em uma pequena comunidade, onde pauta sua vida no recato.
Destaca Antônio Jeová Santos [40] um critério interessante e importante para a estimação do dano moral. Diz ele que se deve levar em conta o contexto econômico do país. Assim, não se pode aplicar no Brasil os altos valores concedidos a título de dano moral nos Estudos Unidos. Observe que esse critério guarda estreita relação com a proibição de enriquecimento sem causa, conforme o estabelecido nos arts. 884 a 886 do Código Civil.
Dessa maneira, a quantificação da compensação pelo dano moral deverá ser obtida com justeza, moderação, razoabilidade e bom senso, na proporção da culpa, da gravidade da ofensa e das particulares do caso sub judice, conforme estabelecido no art. 944 do Código Civil. [41]