4 PREVISÃO LEGAL
O jus postulandi é um instituto que tem como finalidade propiciar ao cidadão hipossuficiente o acesso à justiça, conferindo o direito de se auto-representar na propositura de uma ação judicial.
É cabível a aplicação do jus postulandi na Justiça do Trabalho para todas as partes envolvidas, ou seja, qualquer pessoa que deseje pode entrar com uma ação para pleitear algo, entretanto, caso o processo seja submetido ao Tribunal Superior do Trabalho, as partes terão que contratar um advogado para dar prosseguimento à ação.
O mérito desta conquista foi à possibilidade de proteger o empregado das custas processuais e dos honorários advocatícios. Nesta seara, percebe-se que a intenção do legislador, foi proteger o trabalhador para que este pudesse ter garantido o seu direito de acesso à justiça.
Segundo Alves, o acesso à justiça é muitas vezes impedido de ser exercido, por diversos fatores, dentre eles, a dificuldade do interessado em pagar um defensor, em casos que o Estado não fornece tal assistência por meio das Defensorias Públicas, como na Justiça do Trabalho, em que o empregado não conta com essa assistência.[15]
Analisando o artigo 791- A da CLT, observa-se que mesmo após a Reforma Trabalhista o entendimento sobre o jus postulandi foi mantido, ou seja, o reclamante poderá se auto-representar em juízo sem a obrigatoriedade de constituir um advogado para isso. Tal artigo dispõe a respeito do pagamento dos honorários de sucumbência pela parte vencida no processo, e assegura:
Artigo 791 A - Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.[16]
Acredita-se que este artigo não foi modificado, tendo em vista a necessidade das pessoas que possuem processos em Comarcas mais distantes puderem resolver suas demandas mais facilmente.
Martins explica que de acordo com a Súmula n.º 425 do TST, o jus postulandi só pode ser exercido nas Varas e nos Tribunais Regionais do Trabalho. Já na fase recursal, o Reclamante terá que constituir advogado para ser representado perante o TST.[17]
Apesar da facilidade encontrada, a doutrina majoritária entende que o exercício do jus postulandi na esfera trabalhista pode atrapalhar o andamento processual, haja vista que o reclamante não possui a mesma capacidade técnica de um advogado e isto pode incidir em diversos problemas, inclusive na não observância de algum direito e até mesmo de um prazo.
A Constituição Federal preconiza em seu artigo 133, in verbis: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. [18]
A atividade da advocacia está elencada no capítulo das Funções Essenciais à Justiça da Carta Magna, estando presente no artigo 133, o Princípio da Indispensabilidade da Intervenção do Advogado.
Para Martins, a ausência do advogado implica em um desequilíbrio entre as partes, pois ele é a pessoa habilitada para dirimir qualquer demanda na área jurídica. Entretanto, o autor segue aduzindo que o correto seria se tal assistência fosse fornecida pelo próprio Estado ou até mesmo pelos sindicatos de classe.[19]
Neste diapasão, vale ressaltar que a Justiça do Trabalho nunca aderiu à implantação de uma Defensoria Pública própria, isto porque cada categoria sempre foi representada por seus respectivos sindicatos onde possui seus próprios representantes legais.
Observa-se que o jus postulandi muitas vezes é questionado no que se refere à sua eficácia, pois sabe-se que na fase recursal o autor é obrigado a constituir um advogado para lhe representar perante a justiça. Tal instituto foi criado com a intenção de beneficiar àqueles cidadãos hipossuficientes que não podiam arcar com as despesas de um advogado para resolver suas demandas junto à justiça.
Todavia, essa a facilidade de acesso à justiça advinda do artigo 791 da CLT mostrou a fragilidade da parte envolvida, já que na maioria das vezes são pessoas leigas e que temem na presença do advogado da parte contrária, deixando clara a falta de condições de igualdade.
Sobre esse tema Schiavi aduz:
Com a EC 45/2004 e a vinda de outras ações para a Justiça do Trabalho que não são oriundas da relação de emprego, não mais se justificam a existência do jus postulandi, até mesmo pelo fato da complexidade das relações jurídicas que decorrem da relação de trabalho. Outrossim, na Justiça do Trabalho discute-se muito sobre legitimidade das partes, prescrições, litisconsorte, terceirização e prazos em geral. Como se nota, são fatos que na maioria das vezes somente um advogado tem conhecimento.[20]
Sendo assim, é possível afirmar que em decorrência da complexidade dos conflitos encontrados na Justiça do Trabalho, é nítida a desvantagem da parte que vai a juízo desacompanhada de um profissional habilitado. São muitas categorias profissionais, muitas particularidades, uma diversidade enorme de leis, súmulas, portarias, jurisprudências, e tudo isso demonstra a fragilidade de quem postula sozinho.
Martins acredita que nesse quesito jus postulandi trava e não soluciona o acesso à justiça, representando uma afronta aos princípios constitucionais e laborais, além de colaborar com a morosidade processual tão combatida.[21]
Impende salientar que o artigo 103 do Novo Código de Processo Civil, Lei nº 13.105/2015, é aplicado como norma subsidiária às causas trabalhistas, e este diz que a parte deve ingressar em juízo somente representado por advogado.[22] Isto causa um desconforto no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista que a CLT contempla o oposto.
Alguns doutrinadores defendem o jus postulandi e dizem que a capacidade postulatória é prevista em lei e está aí para ser utilizada por todos que dela precisem. Martins explica que “a Constituição Federal não retirou a validade das normas que autorizam a prática de atos processuais pelas partes perante a Justiça do Trabalho, conforme traz o HC 67.390-2 do STF”.[23]
Essa suposta tentativa de não recorrer ao artigo 791 da CLT, com a justificativa de qualificar e aprimorar a defesa da parte estaria de certa forma mitigando o princípio constitucional de amplo acesso à Justiça. Além disso, a Lei nº 8.906 - Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil -, traz a previsão legal da atividade da advocacia como privativa do advogado.
Apesar de inúmeras discussões sobre esse tema, e mesmo com o disposto na Constituição Federal e o Estatuto da OAB, somente após o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.127[24] é que o entendimento ficou de fato pacificado e passou a ser considerado constitucional. Já que foi concedida uma liminar deferindo que a atuação de advogado não é imprescindível na Justiça do Trabalho, bem como nos juizados.
Tal decisão foi regulamentada quando o STF declarou que além da Justiça do Trabalho, é possível também postular sozinho na justiça pleiteando nacionalidade, alimentos, habeas corpus, revisão criminal e pequenas causas nos Juizados Especiais.
Diante do exposto, observa-se que mesmo depois de tantas contestações e como o advento da Reforma Trabalhista, o artigo 791 da CLT permanece garantido no ordenamento jurídico brasileiro.
5 CONDENAÇÃO EM SUCUMBÊNCIA CONCOMITANTEMENTE AO EXERCÍCIO DO JUS POSTULANDI
O princípio do Jus Postulandi é a aptidão que se faculta a qualquer cidadão de postular perante o poder judiciário as suas pretensões. A palavra “Jus Postulandi” vem do latim “Ius postulandi”, que significa “direito de postular”.
Conforme preconiza Tucci: “honorários de sucumbência são aqueles que decorrem da condenação da parte vencida (sucumbente) diretamente ao advogado da parte vencedora, em um processo judicial.”[25] Insta salientar que os honorários de sucumbência são cumulativos com os honorários contratuais e pertencem ao advogado.
Assim, no que concerne aos honorários de sucumbência, observa-se que o Superior Tribunal de Justiça determinou que a fixação deste ocorra na data da prolação da Sentença. O Ministro Luís Felipe Salomão, através do Acórdão do REsp 1.465.535/SP explica que os honorários são uma norma de direito processual mas gera efeitos de direito material:
Observa-se, portanto, que, não obstante a taxionomia atinente aos honorários advocatícios estar prevista em norma de direito processual, o instituto enverga verdadeira natureza híbrida, notadamente ante os reflexos materiais que o permeiam. Com efeito, a doutrina reconhece que os honorários advocatícios são instituto de direito processual material, pois, apesar da previsão em diploma processual, confere direito subjetivo de crédito ao advogado em face da parte que deu causa à instauração do processo. Em suma, deve-se ressair que os honorários advocatícios possuem efeito externo ao processo, de relevante repercussão na vida do advogado e da parte sucumbente. Acrescenta-se, assim, que tal situação é apta a enquadrá-lo no âmbito do direito processual material. Interpretação contrária implicará, indubitavelmente, a ausência de reconhecimento da índole alimentar do instituto, prejudicando o direito dos advogados à remuneração pelo serviço prestado.[26]
Em outras palavras, é possível afirmar que a partir da prolação da sentença as regras do CPC serão aplicadas. Na seara trabalhista, vê-se que a lei 13.467/17 abarcou o artigo 791-A na CLT, o qual determina o pagamento dos honorários de sucumbência pela parte vencida no processo já os processos que foram ajuizados antes da vigência da Lei têm o amparo na jurisprudência do STJ.
Assim, entende-se que os processos trabalhistas em curso terão fixados os honorários de sucumbência quando a sentença for prolatada, a exemplo:
E, quanto aos honorários de sucumbência, o marco temporal a ser utilizado é o momento da prolação da sentença. Confira-se: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MARCO TEMPORAL PARA A APLICAÇÃO DO CPC/2015. PROLAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTE. IMPUGNAÇÃO DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE VERBA HONORÁRIA. MAJORAÇÃO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O recorrente alega que não há falar em direito adquirido a fim de conclamar incida o Novo Código de Processo Civil apenas às demandas ajuizadas após a sua entrada em vigor (conforme decidido pelo Tribunal a quo), porquanto, consoante estabelecido no artigo 14 do NCPC, o novel diploma normativo processual incidirá imediatamente aos processos em curso. 2. A jurisprudência desta Corte tem entendido que o marco temporal que deve ser utilizado para determinar o regramento jurídico aplicável para fixar os honorários advocatícios é a data da prolação da sentença, que, no caso, foi na vigência do Código de Processo Civil de 1973. Procedente: REsp 1.636.124/AL, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2016, Dje 27/04/2017 (AgInt no REsp 1657177 / PE AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2017/0045286-7. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES (1141). 2A. TURMA. DJe 23/08/2017).[27]
Deste modo, vê-se que consoante a jurisprudência citada, os magistrados têm entendido que os honorários sucumbenciais devem ser contados somente após a sentença proferida.
Neste diapasão, Delgado observa que a referida sentença corrobora com o entendimento mencionado, aduzindo que “que o marco temporal que deve ser utilizado para determinar o regramento jurídico aplicável para fixar os honorários sucumbenciais é a data da prolação da sentença.”[28]
Antes, porém, o CPC de 1939 em seu artigo 64 fazia referência aos honorários de sucumbência somente quando restara constatado o dolo ou a culpa da parte vencida. Contudo, a redação posterior, dispôs no artigo 64 o arbitramento dos honorários em todos os processos.
Nota-se que, tal situação se justa à nova realidade do Direito do Trabalho após a Reforma Trabalhista e a vigência da lei 13.467/17, haja vista que antes do advento da referida norma, não existia disposto na legislação trabalhista qualquer determinação para a condenação ao pagamento de honorários de sucumbência, apenas as súmulas 219, 220 e 329 do TST[29] traziam informações sobre o tema.
Delgado segue explicando que o tema honorários de sucumbência na Justiça do Trabalho não tinha uma regulamentação específica, já que somente a jurisprudência e as súmulas serviam de embasamento para as decisões. Entretanto após a lei 13.467/17 o que era exceção se transformou em regra e abarcou as hipóteses de fixação dos honorários de sucumbência na esfera trabalhista.[30]
Noutra quadra, alguns doutrinadores argumentam sobre a impossibilidade de aplicação do artigo 791-A da CLT aos processos ajuizados anteriormente à vigência da lei 13.467/17, tendo em vista a necessidade de observar as fases processuais. Sobre esse tema Silva opina:
A unicidade do processo não prejudica a autonomia dos atos processuais, sendo que cada ato praticado deve ser visto isoladamente e, desde que sejam respeitados os direitos e deveres decorrentes de cada um deles, a nova lei poderá ser aplicada aos atos subsequentes, mesmo que a fase ainda não tenha sido encerrada, mas não incidirá sobre os atos já praticados ou sobre os seus efeitos supervenientes, mesmo que surgidos apenas na vigência da lei nova, uma vez que os efeitos são indissociáveis do ato praticado ou que deixou de ser praticado.[31]
Pandelot também aduz:
Por força do princípio da aplicabilidade imediata das normas processuais, não há como afastar a incidência da lei em epígrafe aos processos em andamento, mas observadas as regras da retroatividade e do isolamento dos atos processuais, conforme dispõe o art. 14 do CPC de 2015, aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho, na forma do art. 769 da CLT. Por outro lado, o artigo citado ressalva, expressamente, os "atos praticados" e as "situações jurídicas consolidadas", demonstrando, assim, a consideração, em determinados casos, da teoria da autonomia das fases processuais, que deve ser aplicada de acordo com os princípios da segurança jurídica e da estabilidade da demanda a fim de identificar situações jurídicas consolidadas em fases processuais pretéritas em processos instaurados antes da nova lei. [32]
Sendo assim, observa-se que a aplicação das normas processuais não é absoluta, mas precisa está unificada conforme os princípios constitucionais da segurança e do devido processo legal. Para alguns, a aplicação do artigo 791-A aos processos ajuizados anteriormente à vigência da Reforma Trabalhista - lei 13.467/17- é uma afronta direta ao princípio constitucional da segurança. Isto porque a sentença condenaria a parte vencida ao pagamento de um valor que ela não sabia que teria que pagar.
Deste modo, no que concerne ao jus postulandi, pode-se afirmar que este é visto como um risco aos direitos e garantias tutelados pela Constituição, além de ser bastante questionado em relação ao pagamento dos honorários de sucumbência. Assim , pode-se dizer que existe um nexo de causalidade entre o jus postulandi e os honorários sucumbenciais, tendo em vista que observa-se a conduta praticada (neste caso a não constituição de um profissional habilitado) e a conseqüência ( possível pagamento de honorários sucumbenciais).
Silva explica que, de um modo geral, ao propor uma ação à parte analisa como esta se dará e os custos que ela terá. Além disso, cria-se uma expectativa de ganhos e de eventuais custos.[33]
Na maioria das vezes, aqueles que buscam resolver suas demandas na Justiça do Trabalho esperam receber os valores pleiteados a fim de obter vencimentos não quitados pelas empresas e desta forma amenizar os custos de despesas mensais enquanto não encontram outro emprego. Entretanto, quando se deparam com a possibilidade de ter que efetuar algum pagamento, questionam o motivo e devido a desconhecimento da lei e da falta de informação, alguns acabam até desistindo momentaneamente.
Não se pode olvidar que não há como verificar se efetivamente o fato da parte não ter obtido êxito na demanda, foi em razão dela não possuir conhecimento técnico para postular em Juízo ou por simplesmente não ter a sua pretensão fundamento jurídico. O que se pretende afirmar é que há uma discrepância na relação processual entre as partes, pois de um lado encontra-se um postulante leigo, desprovido de qualquer conhecimento jurídico e de outro lado, um técnico apto a promover a defesa dos direitos do seu cliente.