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Educação digital e Justiça:

prevenção e combate ao crime

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Enquanto os usuários do Orkut se divertem na rede de relacionamentos, alheios aos perigos a que estão sujeitos pela exposição online, o Ministério Público Federal se mantém de olhos tão abertos quanto o próprio Big Brother.

Até a presente data foram 17 pedidos de quebra de sigilo de dados de usuários feitos à Justiça, que já deferiu 12 deles. Os perfis investigados estão relacionados a crimes de ódio e à divulgação de imagens de pornografia infantil, respectivamente previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei n.o 7.716/89:

Art. 241, do Estatuto da Criança e do Adolescente

- Apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente:

Pena - reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

§ 1o Incorre na mesma pena quem:

I - agencia, autoriza, facilita ou, de qualquer modo, intermedeia a participação de criança ou adolescente em produção referida neste artigo;

II - assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens produzidas na forma do caput deste artigo;

III - assegura, por qualquer meio, o acesso, na rede mundial de computadores ou internet, das fotografias, cenas ou imagens produzidas na forma do caput deste artigo.

§ 2o A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos:

I - se o agente comete o crime prevalecendo-se do exercício de cargo ou função;

II - se o agente comete o crime com o fim de obter para si ou para outrem vantagem patrimonial.

Art. 1o, da Lei n.o 7.716/89 - Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Para este último crime, a pena é de um a três anos, mas sobe para dois a cinco anos quando o delito é cometido por meio de órgãos de comunicação social, posição na qual se enquadra o Orkut.

Por sua vez, o Google, responsável pelo Orkut, afirma que nada pode fazer para atender às investigações, uma vez que os dados estão localizados nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, e que seu escritório brasileiro não possui as informações requeridas e não tem controle sobre o Orkut.

Pelo descumprimento das ordens judiciais por parte da empresa, os Procuradores da República Sérgio Suiama e Karen Kahn, do Grupo de Combate a Crimes Cibernéticos do Ministério Público Federal em São Paulo, solicitaram à Justiça, em 16 de maio, a abertura de inquéritos policiais para apuração da responsabilidade dos diretores do Google Brasil. Os crimes objetos da investigação seriam desobediência e favorecimento pessoal, assim tipificados e apenados:

Desobediência

Art. 330, do Código Penal - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.

Favorecimento pessoal

Art. 348, do Código Penal - Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão:

Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.

§ 1º - Se ao crime não é cominada pena de reclusão:

Pena - detenção, de quinze dias a três meses, e multa.

Em último caso, o Ministério Público Federal ingressará com uma ação civil pública para pedir a desconsideração da personalidade jurídica da empresa no Brasil, tendo em vista o constante desrespeito à Justiça brasileira. A ação terá pedido de liminar para o fornecimento dos dados já requisitados, sob pena de multa.

Enquanto isso, o site de relacionamentos de maior sucesso nos Estados Unidos – MySpace.com, de propriedade da News Corporation, Inc. – também está preocupando os americanos por servir de suporte para a realização de crimes variados, principalmente os praticados por pedófilos e seqüestradores.

Após a estréia do programa "To Catch a Predator", da Dateline NBC, predomina naquele país uma sensação geral de pânico relacionada aos pedófilos que agem em sites de relacionamento. Segundo reportagem da ABC News, disponível em <http://abcnews.go.com/GMA/LegalCenter/story?id=1820774&page=1>, um em cinco adolescentes que utilizam freqüentemente a Internet já receberam convites sexuais, e 7.600 pedófilos foram presos nos últimos três anos nos Estados Unidos.

Recentemente, o deputado Michael Fitzpatrick propôs uma lei federal que proíbe que escolas e bibliotecas permitam acesso por menores de idade a sites comerciais que exijam criação de perfis, como os fóruns, salas de bate-papo, blogs, messengers, e-mails e sites de relacionamento.

Paralelamente à proposta do deputado Fitzpatrick, o procurador-geral americano Alberto Gonzales, declarou que os provedores não colaboram no combate à pornografia infantil ocorrida em seus suportes, razão pela qual enviou ao Congresso norte-americano proposta de Emeda que assegure tal colaboração. Os provedores não estariam guardando registros dos pedófilos.

A proposta exige que os websites possuam tarja de esclarecimento sobre conteúdo caso contenham informações de sexo, bem como a obrigação dos provedores comunicarem ao Departamento de Justiça a existência de pornografia infantil em seus sistemas. Os provedores que falharem no cumprimento das exigências serão severamente punidos.

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O Departamento já solicitou à Justiça norte-americana que os maiores mecanismos de busca – entre eles: Google, Yahoo, AOL e MSN – compartilhem informações sobre as pesquisas realizadas em seus sistemas. Como não nos surpreende o histórico, o Google foi o único a resistir, mais tarde concordando em colaborar sob alguns termos.

Civis também têm feito sua parte na educação digital e no combate ao crime, como Parry Aftab, conhecida como "Anjo da Internet", e Anne Collier, responsável pela ONG "Net Family News, Inc.". No Brasil, o advogado Thiago Tavares dirige a ONG Safernet, que mantém um canal de denúncias online sobre crimes contra os direitos humanos no espaço cibernético (www.safernet.org.br).

A possibilidade das crianças e adolescentes encontrarem pornografia, racismo, nazismo e outros males na rede é grande. O que vai fazer a diferença quando elas se depararem com tais situações é a decisão que irão tomar. É aqui que entra o papel da educação digital, ainda pouco aplicada no Brasil.

Neste sentido tem agido o Colégio Universitário, de Londrina, no Paraná, ao oferecer aos pais, alunos e funcionários palestras sobre o uso apropriado da Internet, as conseqüências de seu abuso e os perigos a que o usuário está sujeito. Ademais, preocupa-se em implementar uma política de uso dos computadores no âmbito escolar e remodelar seu website para melhor informar aos seus usuários.

Faz parte da educação desmistificar a idéia de que, pelo fato da Internet ser algo novo, sem fronteiras ou espaço físico, não há leis para regê-la, quando na verdade trata-se apenas de uma extensão da vida real. Atividades na comunidade online são muito similares às atividades na comunidade em que vivemos em nosso dia-a-dia. Ambas nos permitem compartilhar, comprar, comunicar, entre outros. As pessoas, as boas maneiras exigidas, os crimes e as leis aplicadas também são os mesmos.

A Internet não veio para aumentar o crime; ela é apenas mais um meio de cometimento de crimes. Uma de suas grandes vantagens, aliás, é o fato de deixar rastros dos malfeitores para que eles possam ser descobertos. Falta apenas um acordo com os provedores de conteúdo que os obrigue a guardar por tempo suficiente os dados destes usuários, bem como a cedê-los sem embaraço, conforme solicitação da Justiça.

Enquanto as autoridades fazem sua parte nas investigações e punição daqueles que não colaboram, nós, como sociedade, devemos fazer a nossa na implementação da educação digital nas escolas e lares. Está na hora de deixarmos de ser passivos e assumirmos uma posição ativa neste maravilhoso e fascinante mundo digital.

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Sobre a autora
Carolina de Aguiar Teixeira Mendes

advogada em São Paulo, diretora da ONG Council of Advocates International, com sede no Canadá

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENDES, Carolina Aguiar Teixeira. Educação digital e Justiça:: prevenção e combate ao crime. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1080, 16 jun. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8498. Acesso em: 25 abr. 2024.

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