Tendo em vista a expansão da criminalidade, os modos tradicionais de investigação já não bastavam mais para a adequada persecução penal, sendo necessárias novas técnicas de investigação para que se obtivessem melhores informações acerca do crime organizado e pudesse enfrentá-lo de maneira mais eficiente.
Uma das técnicas de investigação criminal que obteve boa aceitação (a despeito das críticas de alguns doutrinadores) foi o instituto da colaboração premiada.
Tal técnica de investigação, basicamente, se traduz em um benefício ao agente que colabora com as investigações, revelando fatos, integrantes da organização criminosa, sua organização interna, crimes praticados etc. Com sua colaboração, este delator poderá conquistar algumas benesses no que diz respeito ao cumprimento da sua pena, sendo que pode até mesmo conseguir um perdão judicial proferido pelo magistrado.
Frente a esse contexto, este trabalho irá abordar a possível afronta aos direitos fundamentais definidos na Carta Magna de 1988 por meio da colaboração premiada.
Desse modo, faz-se necessária uma análise a respeito desse instituto, que vem sendo rotineiramente usado nas investigações criminais no combate às organizações criminosas.
O réu, no direito processual penal, tem alguns direitos que devem ser respeitados em todas as fases processuais, como os direitos ao Silêncio (artigo 5º, LXIII, CF/88); do Devido Processo Legal (artigo 5º, LIV, CF/88); da Ampla Defesa e do Contraditório (artigo 5º, LV, CF/88).
Para tanto, o presente artigo, por meio de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, com uma abordagem de caráter qualitativo, visa analisar a compatibilidade do instituto da colaboração premiada em face dos direitos fundamentais elencados na Constituição Federal de 1988.
É imprescindível a proteção aos Direitos Fundamentais dos envolvidos, principalmente para que não haja nenhum tipo de excesso, ilegalidades e injustiças.
Há certa discussão doutrinária pertinente a esse tema, tendo em vista que uma parcela doutrinária defende que o instituto da colaboração premiada é compatível com os direitos fundamentais da Constituição Federal, pois não atinge nenhum direito dos delatores e que, muito pelo contrário, acaba garantindo-os.
Porém, outra parcela aduz que o instituto põe em cheque os direitos fundamentais, cerceando o delator quanto ao seu direito de permanecer em silêncio, de produzir provas contra si mesmo dentre outros, assim como vulnera o direito do delatado a um processo justo, por se tratar de um meio coercitivo, tendo em vista que põe em cheque a liberdade desse delator.
1. O INSTITUTO DA COLABORAÇÃO PREMIADA NO PROCESSO PENAL
Embrionariamente, a colaboração premiada já era tratada no âmbito processual penal brasileiro desde os anos 90.
Apesar de não ter dado à época essa nomenclatura, a Lei dos crimes hediondos (Lei 8.072/90) já versava acerca do aludido instituto no seu artigo 7º, que acrescentou ao artigo 159 do Código Penal o §4º que trazia: “§ 4º Se o crime é cometido por quadrilha ou bando, o coautor que denunciá-lo à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços." (BRASIL, 1990).
Faz-se relevante destacar que tal dispositivo não era intitulado ainda como colaboração premiada, como já foi dito anteriormente, pois se referia apenas a uma causa de diminuição de pena.
Porém, não deixava de ser um benefício ao agente caso o mesmo prestasse informações acerca do crime no âmbito de quadrilha ou bando (nomenclaturas essas que não são mais utilizadas pelo Direito Penal).
A partir desse momento, é possível afirmar que nesse contexto nasceu o instituto da colaboração premiada no processo penal.
Com a Lei 12.850/13 seu tratamento recebeu maior atenção, mormente por acolher um capítulo inteiro para versar acerca dele.
Capez (2019, p. 477) conceitua tal instituto:
Consiste na afirmativa feita por um acusado, ao ser interrogado em juízo ou ouvido na polícia. Além de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como seu comparsa.
O delator, no caso, preenchidos os requisitos legais, é contemplado com o benefício da redução obrigatória de pena, conforme Leis n. 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), 12.850/2013 (Lei do Crime Organizado), 9.807/99 (Lei de Proteção a Testemunhas) e 11.343/2006 (Lei de Drogas) Tendo em vista a complexidade e a expressiva evolução que as organizações criminosas paulatinamente desenvolveram, foi necessário o estabelecimento de novos mecanismos para combatê-las.
As tradicionais técnicas de investigação já não restavam frutíferas no combate ao crime organizado.
A esse respeito, Nucci (2018) afirma que a lei 12.850/13 serviu para que fosse possível haver uma “negociação” com 10 os acusados, com o intuito precípuo de obter informações privilegiadas acerca da organização criminosa de que o referido participava e assim, desmanchá-la.
Porém, para que essa negociação se concretizasse, seria necessário oferecer um benefício para este delator.
Nucci (2018) afirma que este benefício recebido foge à normalidade do processo penal, podendo garantir até um perdão judicial.
Insta salientar a respeito da nomenclatura que se dá ao mencionado instituto.
A lei 12.850/13 instituiu a expressão colaboração premiada como a que deve ser utilizada, porém a doutrina afirma se tratar, de maneira etimológica, de delação premiada.
Pelo fato do instituto não ter como objetivo apenas a cooperação do delator, mas descobrir dados ocultos no que diz respeito à autoria ou materialidade da infração penal, é o perfeito sentido de acusar ou denunciar alguém, fazendo mais sentido chamar de delação. NUCCI, 2019).
Neste trabalho de curso será utilizada ambas as nomenclaturas como sinônimas.
Pacelli (2019, p. 865) aduz que a referida lei parece ser a única que efetivamente institui um modelo de procedimentos para a concretização da colaboração premiada, dispondo sobre a legitimidade ativa, sobre a fase procedimental em que será cabível a colaboração e, finalmente, acerca do papel e funções atribuídas ao juiz, à polícia e ao Ministério Público nessas fases.
Desse modo, apesar de existirem outras leis que versam acerca do referido instituto (a exemplo das seguintes: Lei 9.034, de 1995, que versa sobre crime organizado; lei 9.613, de 1998, que versa sobre lavagem de dinheiro), é a Lei 12.850/13 que dispõe de maneira mais completa sobre o tema, tratando do procedimento, requisitos, benefícios etc. Nucci (2019, p.52) faz importante observação acerca da questão do benefício ao agente que presta informações sobre a organização criminosa: O valor da colaboração premiada é relativo, pois se trata de uma declaração de interessado (investigado ou acusado) na persecução penal, que pretende auferir um benefício, prejudicando terceiros.
Embora assuma a prática do crime, o objetivo não é a pura autoincriminação, mas a consecução de um prêmio.
Diante disso, é inviável lastrear a condenação de alguém baseado unicamente numa delação.
Dessa forma, é necessária uma análise mais aprofundada acerca do referido tema dentro do processo penal.
Em diversos casos, o delator não está interessado apenas em auxiliar com a investigação, mas somente no benefício que essa colaboração lhe trará, sem pensar que essas informações prestadas podem ferir direitos fundamentais, tanto dele quanto de terceiros.
Por conta disso, é necessário que essa informação prestada seja acompanhada por algum outro meio de prova, visto que o delator pode simplesmente falar de esquemas dentro da organização, crimes cometidos, planos, porém sem nenhum embasamento probatório, apenas com o intuito de “se livrar” do cárcere, ou se beneficiar com um abatimento de pena. NUCCI, 2019) Ainda nesse sentido, Nucci (2019, p. 57) complementa: O prêmio deve emergir em lugar da pena, afinal, a regeneração do ser humano torna-se elemento fundamental, antes mesmo de se pensar no castigo merecido pela prática da infração penal.
Cenas teatrais, barganhas misteriosas, delações falsas e todos os atos de vingança, sem qualquer utilidade efetiva, devem ser punidos com rigor.
Assim, é necessário que haja punições severas para aqueles delatores que prestem delações falsas, com o intuito de obter vantagens pessoais.
Essa é uma temática de extrema importância, porquanto alguns autores trazem dúvidas se o aludido instituto é ou não compatível com os direitos fundamentais.
A Lei 12.850/13 aponta os requisitos que devem ser seguidos para que a colaboração premiada possua eficácia.
Sua Seção I, versa acerca do instituto da colaboração premiada.
No artigo 4º traz a possibilidade de o magistrado conceder perdão judicial, reduzir em até 2/3 a pena restritiva de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos, caso este agente tenha vindo a prestar uma colaboração voluntária e efetiva com a investigação (BRASIL, 2013).
Porém, há de se salientar que o magistrado não tem por obrigação conceder este instituto, visto ser um ato discricionário, não podendo ser realizado de ofício, sendo necessário requerimento das partes.
Ao reforçar esta afirmação, Nucci (2019, p. 64) alega que:
O juiz não pode conceder o perdão de ofício. Logo, se houver representação do delegado, é preciso a concordância do Ministério Público; nessa hipótese, o magistrado pode concedê-lo.
Submete-se a recurso em sentido estrito (art. 581, VIII ou IX, do CPP).
Não havendo, depende-se do pleito do Ministério Público.
Se este o fizer, cabe ao juiz deferir ou indeferir.
Em relação a essa decisão, igualmente, cabe recurso em sentido estrito ao Tribunal, nos termos do art. 581, VIII ou IX, do CPp. É relevante destacar que para o magistrado conceder alguma das benesses oferecidas pelo instituto da colaboração premiada, faz-se necessário que dessa delação se obtenha alguns dos resultados pré-determinados nos incisos do artigo 4º da Lei 12.850/13, quais sejam:
I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. (BRASIL, 2013)
Ainda no artigo 4º, mesmo obedecendo aos requisitos citados anteriormente, exige-se também que seja levada em conta para a concessão do benefício a personalidade do colaborador, a natureza, a repercussão, as circunstâncias, e a repercussão social do fato criminoso, além da eficácia da colaboração, conforme preceituado no §1º do aludido artigo (BRASIL, 2013).
Com o advento dessa lei, que estruturou mais adequadamente o instituto, ele passou a ser utilizado com frequência para obtenção de informações por parte dos órgãos de investigação em relação às organizações criminosas.
Não se pode negar a importância que tal instituto teve no desencadeio de uma das maiores operações contra corrupção realizadas no Brasil, a Operação Lava Jato.
A colaboração premiada serviu como “carro chefe” para os desdobramentos da operação.
Leitão e Lima (2016, p. 788), em um estudo acerca do instituto da colaboração premiada, reafirmam o que foi dito sobre a Operação Lava Jato:
Juntamente com o novo e detalhado regramento, vimos, quase que instantaneamente, a disseminação do emprego da delação premiada como meio essencial e mesmo exclusivo de prova. Na chamada “Operação Lava Jato” as delações premiadas se sucedem, sendo mesmo a pedra angular de sustentação do edifício probatório de acusação.
A legislação, ainda dentro da Lei de combate ao crime organizado, traz um rol de direitos que terá o delator quando colaborar com as investigações.
No que tange a isso, Nucci (2019, p. 84) diz que: Preceitua o art. 5.º da Lei 12.850/2013 serem direitos do colaborador os seguintes:
“I – usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica; II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados; III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes; IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados; V – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito; VI – cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados”.
Sendo assim, o delator possui alguns direitos que devem ser respeitados após firmado o acordo de colaboração com a autoridade.
Tendo em vista as represálias que pode sofrer, foi necessário que a Lei 12.850/13 dispusesse deste rol para proteção do 13 delator, sendo que esse não será bem visto pela organização criminosa a qual fazia parte, pois pode ter entregado os esquemas, comparsas etc. desta organização.
Além desses direitos processuais penais, o delator possui também os Direitos fundamentais definidos pela Constituição Federal.
Apesar de ser um instituto que vem sendo bastante utilizado no combate às organizações criminosas, é importante que seja feita uma análise quanto os direitos constitucionais pertinentes ao tema.
Alguns autores consagrados já sinalizam em suas obras que somente a confissão do delator não pode ser utilizada para embasamento e concessão do “prêmio” (diminuição de pena ou liberdade).
Desse modo, acaba por gerar uma dúvida no âmbito constitucional: o instituto da colaboração premiada vulnera algum direito fundamental daqueles envolvidos na delação? É conhecido que a Constituição Federal de 1988 traz no rol do seu artigo 5º alguns direitos e também garantias fundamentais, que se aplicam à figura do delator e do delatado no Processo Penal.
É uma discussão um tanto quanto complexa, tendo em vista que a doutrina se divide ainda acerca dessa temática.
2. DIREITOS FUNDAMENTAIS EVENTUALMENTE VULNERADOS DIANTE DO INSTITUTO DA COLABORAÇÃO PREMIADA
Após abordar o instituto da colaboração premiada no âmbito do processo penal brasileiro, pôde-se vislumbrar que o delator possui direitos constitucionais que devem ser observados no momento em que este está prestando a sua delação.
Respeitar os direitos fundamentais dispostos na Constituição Federal é de suma importância para que se obtenha um processo digno para o acusado.
É importante destacar que há uma diferença entre Direito e Garantia.
Pode-se afirmar então que Direito fundamental é um tipo de norma que declara a existência de um direito, sendo uma norma declaratória. Por exemplo: o Direito a Vida, Direito ao contraditório, entre outros.
No que diz respeito às Garantias Constitucionais, é possível dizer que elas são normas que asseguram o exercício do direito, sendo normas assecuratórias, a exemplo o Habeas Corpus (art. 5º, LXVII, da CF/88) que assegura o direito à liberdade de locomoção e o Habeas Data (art. 5º, LXXII, da CF/88) para permitir o conhecimento de informações, dentre outros. FROTA, 2017).
Um direito fundamental que deve ser efetivado, segundo parte da doutrina, é o direito ao silêncio.
Carvalho (2019) comenta que o direito ao silêncio nada mais é que 14 a proibição de se obrigar o réu a declarar algo contra si, proibição essa que decorre do artigo 8º, nº 2, letra “g”, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
O Direito ao Silêncio está disposto no rol dos direitos fundamentais da Carta Magna de 1988, mais precisamente no artigo 5º, inciso LXIII.
Referido artigo e inciso traz que:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; (BRASIL, 1988)
Desse modo, pode-se perceber que o preso (nesse caso pode-se elencar o delator), possui o direito constitucional de permanecer em silêncio.
Esse direito deverá ser estendido ao momento da delação premiada, visto que também o delator não tem a obrigação de constituir prova contra si mesmo.
Assim, é possível vislumbrar uma conexão com o princípio da nemo tenetur se detegere, que tem como significado o direito de não produzir prova contra si mesmo.
Santos (2009) transcreve bem a importância do referido princípio dentro da Constituição Federal: O princípio "nemo tenetur se detegere" (o direito de não produzir prova contra si mesmo) está consagrado pela constituição, assim como pela legislação internacional, como um direito mínimo do acusado, sendo de fundamental importância seu cumprimento, pois este é um direito fundamental do cidadão.
Reforçando o que havia sido dito, o direito ao silêncio abrange também o aludido princípio, sendo imprescindível a efetivação destes, pois trata-se de direito fundamental do delator.
Outro direito constitucional que deve ser observado é o do devido processo legal, que também está contido na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso LIV.
Em sua redação ele traz que: art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; (BRASIL, 1988)
Assim, é possível afirmar que nenhum individuo será preso, sem que antes haja o devido processo legal.
Se trata de um instituto o qual a observância é imprescindível em qualquer espécie de processo, visto que trata de direito constitucional do acusado, pois, para que seja um processo justo, esse deverá seguir os trâmites essenciais que o Direito elenca.
Mendes (2013, p. 430) conceitua o devido processo legal da seguinte forma:
A noção de devido processo legal significa, portanto, a exigência de um processo justo. O processo justo não é apenas aquele que está formalmente preestabelecido em lei, mas o processo previsto de forma adequada e razoável para a consecução de sua finalidade primordial no Estado Democrático de Direito, que é a garantia e proteção dos direitos fundamentais.
Basicamente, o devido processo legal tem por objetivo garantir um processo justo, não apenas com base na lei, mas com base no direito como um todo, respeitando e garantindo a proteção dos direitos fundamentais.
Didier Jr (2016, p. 65) confirma o que foi dito pelo Min. Gilmar Mendes:
A locução “devido processo legal” corresponde a tradução para o português da expressão inglesa “due process of law”. Law, porém, significa direito, e não lei (“statute law”).
A observação é importante: o processo há de estar em conformidade com o direito como um todo, e não apenas em consonância com a lei.
Outros dois direitos constitucionais que devem ser respeitados pelo processo penal é o da ampla defesa e do contraditório.
Aludidos estão contidos também no rol dos direitos fundamentais, sendo esse no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988.
Esses princípios são de extrema importância para qualquer processo, tanto judicial quanto administrativo, visto que se tratam de direitos que o acusado tem para se defender e dar a sua versão acerca dos fatos que lhe são imputados.
Sobre o tema, Oliveira (2013, p. 433) registra como o direito ao contraditório é utilizado nos dias atuais:
Na visão atual, o direito fundamental do contraditório situa-se para além da simples informação e possibilidade de reação, conceituandose de forma mais ampla na outorga de poderes para que as partes participem no desenvolvimento e no resultado do processo, da forma mais paritária possível, influenciando de modo ativo e efetivo a formação dos pronunciamentos jurisdicionais.
Nesse sentido, é possível dizer que o direito fundamental do contraditório possui um papel imprescindível para que as partes tenham participação e influência 16 no bojo das decisões dos magistrados, e não somente ser uma simples oportunidade de prestar informações no processo sem prestígio na decisão final.
Nessa toada, Nucci (2015, p. 398) preceitua que “o contraditório significa a oportunidade concedida a uma das partes para contestar, impugnar, contrariar ou fornecer uma versão própria acerca de alguma alegação ou atividade contrária ao seu interesse”.
Assim, é possível dizer que, o contraditório é o direito que o acusado tem no processo penal para se defender de algum fato a ele imputado.
É a faculdade que é dada a ele para poder dar sua versão acerca desses fatos que considera errôneos e fazer dessa versão uma forma de se estabelecer uma participação efetiva no processo.
Sobre a ampla defesa Nucci (2015, p. 537) diz que “cuida-se de instrumento exclusivo do acusado para refutar a acusação estatal, no âmbito criminal, utilizandose dos mecanismos legais de maneira extensa e copiosa, buscando, acima de tudo, manter o seu estado de inocência”.
No que se refere à ampla defesa, é possível obter a definição de que este é o instrumento utilizado para que o acusado refute as alegações que estão sendo imputadas a ele.
É por meio da ampla defesa que o acusado faz a sua defesa técnica, na qual se valerá de mecanismos legais ou não expurgados pelo Direito para que possa obter sua inocência.
A despeito de distintos, o contraditório e a ampla defesa estão intimamente ligados para que se possa garantir a defesa do acusado de maneira técnica e legal.
Em poucas palavras, pode-se dizer que um complementa o outro.
Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, mais precisamente na Ação Originária (AO) nº 2275/RN, de relatoria do min. Luiz Fux, é possível vislumbrar que o acordo de colaboração premiada deve alicerçar-se nos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa:
PENAL E PROCESSO PENAL. DENÚNCIA DE PECULATO, LAVAGEM DE DINHEIRO E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA EM FACE DE DEPUTADO ESTADUAL. MAIS DA METADE DOS MEMBROS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE IMPEDIDOS. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CF, art. 102, I, n. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA. VALIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO art. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL QUANTO ÀS IMPUTAÇÕES DE PECULATO E CONSTITUIÇÃO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ATIPICIDADE DA 17 CONDUTA DESCRITA COMO LAVAGEM DE DINHEIRO. DENÚNCIA RECEBIDA PARCIALMENTE. (...)
(...)4. Na fase de deliberação quanto à possibilidade de recebimento da denúncia, na qual vigora o princípio do in dubio pro societate, afigura-se como suficiente para que se autorize a instauração da ação penal tão somente a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade.
A inicial acusatória, portanto, deve alicerçar-se em elementos probatórios mínimos que demonstrem a materialidade do fato delituoso e indícios suficientes de autoria, em respeito aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da Constituição Federal). BRASIL, 2017) Sendo assim, são esses, conforme diz o aresto do Supremo Tribunal Federal, princípios que devem ser respeitados no momento em que é iniciada a acusação, sendo que esta deve ser feita com elementos de prova mínimos, para que se busque efetivar o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.