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O princípio da dignidade da pessoa humana como resultado da luta pela democracia brasileira

29/12/2020 às 11:00

Resumo:


  • Ulysses Guimarães foi uma figura central na política brasileira, atuando como líder do MDB e PMDB, e contribuindo significativamente para a redemocratização do Brasil.

  • A luta pela democracia no Brasil foi marcada por eventos como o pacote de abril, que alterou regras eleitorais para favorecer o regime militar, e o movimento Diretas Já, que, apesar de não ter atingido seu objetivo imediato, pavimentou o caminho para a eleição de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.

  • A Constituição de 1988, promulgada sob a liderança de Ulysses Guimarães, consolidou a redemocratização do país e estabeleceu o princípio da dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A dignidade da pessoa humana é fundamento ético e jurídico do Estado brasileiro. Por que ela ocupa posição central na Constituição e no direito internacional?

A “Constituição Cidadã”, em seu primeiro artigo, consagrou a dignidade da pessoa humana como um dos pilares que sustentam o ordenamento jurídico brasileiro (CF, art. 1º., III).

Muito embora expressão “dignidade da pessoa humana” já tivesse sido utilizada anteriormente no campo da ética, da religião, da filosofia, da ciência e até mesmo do direito, é com a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU1 que essa expressão ingressa, definitivamente, no ordenamento jurídico universal.2

Assim, a dignidade da pessoa humana, como conceito jurídico indeterminado, que além de normativo é axiológico, é proclamada para o mundo pelos povos reunidos em torno da Organização das Nações Unidas.

Nota-se a importância do enunciado quando ele aparece já no preâmbulo da Declaração, como um farol a iluminar, por assim dizer, todo o texto, sendo reafirmado, logo em seguida, no seu artigo primeiro: “Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo” (primeiro considerando); e, “Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla” (quinto considerando), a Assembléia Geral das Nações Unidas proclama: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade” (art. 1°).

Após as atrocidades cometidas durante a 2ª. Guerra Mundial e o ato final da tragédia, com o lançamento da bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki, “as consciências se abriram, enfim, para o fato de que a sobrevivência da humanidade exigia a colaboração de todos os povos, na reorganização das relações internacionais com base no respeito incondicional à dignidade humana”.3

Contra os céticos, os neutros e os negadores da significação objetiva da ética e da justiça, a Declaração Universal dos Direitos Humanos acabou por fazer uma afirmação solene do valor que é o fundamento da vida social: "a dignidade inerente a todos os membros da família humana".

Afirmou-se assim, que as pessoas não são sombras, não são aparências, são realidades concretas e vivas, daí porque a Declaração fez um duplo reconhecimento: Primeiro, que acima das leis emanadas do poder dominante, há uma lei maior de natureza ética e validade universal. Segundo, que o fundamento dessa lei é o respeito à dignidade da pessoa humana, tendo em vista que a pessoa humana é o valor fundamental da ordem jurídica, sendo, portanto, a fonte das fontes do direito.4

Com pequenas diferenças a expressão “dignidade da pessoa humana” hoje se encontra positivado tendo passado a integrar o texto constitucional dos países democráticos e, por exemplar, cabe destacar que a Constituição brasileira alçou-a a dignidade a “princípio fundamental da República” (art. 1°, III), ao lado dos princípios da soberania, da cidadania, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e do pluralismo político.

Nesse cenário e para exata compreensão do princípio da dignidade suprema da pessoa humana e de seus direitos, é preciso rememorar que os avanços têm sido fruto da dor física e do sofrimento moral como resultado de surtos de violências, mutilações, torturas, massacres coletivos, enfim, situações aviltantes que fizeram nascer consciências e exigências de novas regras de respeito a uma vida digna para todos os seres humanos.5

Foi, claramente, a experiência nazista que gerou a consciência universal de que se devia preservar, a qualquer custo, a dignidade da pessoa humana, como uma conquista de valor ético-jurídico intangível.6

Assim, a dignidade humana é um valor máximo, supremo, de valor moral, ético e espiritual intangível, de tal sorte a afirmar com Paulo Otero, que o mesmo é “dotado de uma natureza sagrada e de direitos inalienáveis, afirma-se como valor irrenunciável e cimeiro de todo o modelo constitucional, servindo de fundamento do próprio sistema jurídico: O Homem e a sua dignidade são a razão de ser da sociedade, do Estado e do Direito”.7

O mais precioso valor da ordem jurídica brasileira, erigido como fundamental pela Constituição de 1988, foi a dignidade da pessoa humana, que, como consectário, impõe a elevação do ser humano ao ápice de todo o sistema jurídico, sendo-lhe atribuído o valor supremo de alicerce da ordem jurídica (art. 1°, III). A dignidade da pessoa humana, pois, serve como mola de propulsão da intangibilidade da vida do homem, dela defluindo o respeito à integridade física e psíquica das pessoas, a admissão da existência de pressupostos materiais (patrimoniais, inclusive) mínimos para que se possa viver e o respeito pelas condições fundamentais de liberdade e igualdade.8

Aliás, a dignidade, como qualidade intrínseca da pessoa humana, não está sujeita a debate, ela existe independentemente de qualquer norma positiva. A qualidade de digno é uma condição da essência e existência do ser humano e, simultaneamente, um condicionante em atuar na sociedade e desse direito inato, decorre todos os direitos personalíssimos.9


Notas

1 Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

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2 Antonio Junqueira de Azevedo. Caracterização jurídica da dignidade da pessoa humana. Revista dos Tribunais, vol. n° 797/11.

3 Fabio Konder Comparato. A afirmação histórica dos direitos humanos, p. 210.

4 André Franco Montoro. Cultura dos direitos humanos, p. 28.

5 Fabio Konder Comparato, A afirmação histórica dos direitos humanos. p. 37.

6 Rizzatto Nunes. Manual de filosofía do direito, p. 368.

7 Legalidade e administração pública - O Sentido da vinculação administrativa à juridicidade, p. 254.

8 Cristiano Chaves de Farias. A proclamação da liberdade..., UNIFACS Vol. 4, p. 9.

9 Carlos A. Ghersi. Derecho y reparación de daños, pp. 71-72.

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Sobre o autor
Nehemias Domingos de Melo

Advogado em São Paulo, palestrante e conferencista. Professor de Direito Civil, Processual Civil e Direitos Difusos nos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito na Universidade Paulista (UNIP). Professor convidado nos cursos de Pós-Graduação em Direito na Universidade Metropolitanas Unidas (FMU), Escola Superior da Advocacia (ESA), Escola Paulista de Direito (EPD), Complexo Jurídico Damásio de Jesus, Faculdade de Direito de SBCampo, Instituo Jamil Sales (Belém) e de diversos outros cursos de Pós-Graduação. Cursou Doutorado em Direito Civil e Mestrado em Direitos Difusos e Coletivos, É Pós-Graduado em Direito Civil, Direito Processual Civil e Direitos do Consumidor. Tem atuação destacada na Ordem dos Advogados Seccional de São Paulo (OAB/SP) onde, além de palestrante, já ocupou os cargos membro da Comissão de Defesa do Consumidor; Assessor da Comissão de Seleção e Inscrição; Comissão da Criança e do Adolescente; e, Examinador da Comissão de Exame da Ordem. É membro do Conselho Editorial da Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil (Ed.IOB – São Paulo) e também foi do Conselho Editorial da extinta Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor (ed. Magister – Porto Alegre). Autor de 18 livros jurídicos publicados pelas Editoras Saraiva, Atlas, Juarez de Oliveira e Rumo Legal e, dentre os quais, cabe destacar que o seu livro “Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum”, foi adotada pela The University of Texas School of Law (Austin,Texas/USA) e encontra-se disponível na Tarlton Law Library, como referência bibliográfica indicada para o estudo do “dano moral” no Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Nehemias Domingos. O princípio da dignidade da pessoa humana como resultado da luta pela democracia brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6390, 29 dez. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/85843. Acesso em: 17 dez. 2025.

Mais informações

Capítulo extraído de trabalho apresentado na Universidade de Buenos Ayres (UBA), referente ao Modulo 2 do doutorado em Direito Civil – cursado em Julho/2012, sob a orientação do Professor: Dr. Ricardo Rabinovich-Berkman.

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