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Conflito de coisas julgadas: qual sentença deve prevalecer quando há duas manifestações de mérito sobre um mesmo objeto?

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3. CONCLUSÃO

Por fim, após exposta uma breve abordagem quanto os aspectos doutrinários e jurisprudenciais no que tange o conflito sobre coisas julgadas na linha das duas vertentes, entende-se que a vertente apresentada quanto à prevalência da primeira decisão de mérito firmada sobre o objeto em questão é a orientação mais coerente e plausível segundo o ordenamento jurídico brasileiro.

Em primeiro lugar, cabe se debruçar sobre a discussão se a preexistência de coisa julgada acarretaria em vício de existência ou validade sobre uma nova decisão com o mesmo objeto discutido. Conforme já mencionado pelo professor José Eduardo Carreira Alvim17 a ausência de coisa julgada constitui-se como pressuposto negativo de validade.

Da mesma forma, se entende que o interesse de agir se faz como pressuposto positivo de validade, eis que se configura como um dos requisitos da ação, necessários para a constituição e trâmite de um processo validamente.

Portanto, se conclui, a despeito do que argumenta o Min. Paulo de Tarso Sanseverino no julgamento do Recurso Especial nº 1.354.225/RS, entende-se que a preexistência de coisa julgada gera um vício que afeta a validade da nova sentença e não o plano da existência. Entretanto, tal entendimento não nos impede de chegar à mesma conclusão firmada pelo Magistrado, assim como fez o Min. João Otavio de Noronha no julgado dos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial nº 600.811/SP e a maioria dos doutrinadores que seguem essa vertente.

Uma vez vencido a questão da dicotomia entre existência e validade, passa-se a apontar os motivos pelo qual entendemos se aplicar o entendimento da validade da primeira coisa julgada firmada sobre o objeto em questão.

Primeiramente, há de se ressaltar que a garantia da não violação da coisa julgada encontra respaldo na Constituição Federal, em seu Art. 5º, XXXVI, razão pela qual admitir que uma segunda sentença produza efeitos sobre matéria já decidida e, portanto, coberta da coisa julgada, seria aceitar que uma decisão totalmente eivada de inconstitucionalidade se sobreponha frente a uma sentença totalmente válida e revestida de boa-fé.

Outro ponto a se argumentar na sustentação de nossa posição diz respeito à própria definição de coisa julgada. Conforme definição trazida pelo próprio Código de Processo Civil, em seu Art. 502 “denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”. Tal imutabilidade, conforme já visto, tem por consequência o impedimento à propositura de nova demanda com mesmo objeto.

Assim, o nascimento de uma eventual segunda coisa julgada sobre o mesmo objeto iria de encontro com a própria definição de coisa julgada, uma vez que não há como modificar aquele que já se tornara hígida, imutável. Seria paradoxal atribuir a proteção constitucional da coisa julgada à decisão que ao mesmo tempo viola tal proteção, por não observar julgado já proferido com o mesmo objeto. Ainda, flexibilizar essa proteção constitucional abriria azo a não apenas uma segunda coisa julgada, como também a uma terceira, quarta e assim por diante.

Entender de tal maneira seria afrontar o princípio constitucional da segurança jurídica, uma vez que abriria precedentes às partes, quando sucumbentes de sua prestação jurisdicional desejada, propor novas demandas com o mesmo objeto, se utilizando da má-fé, visando nova decisão meritória a seu favor. Visando assim, se aproveitar se um possível erro ou desatenção do Poder Judiciário, ou de inércia da outra parte em não observar a já existência de coisa julgada.

Apesar de a possibilidade de a já existência de coisa julgada passar desapercebida pelo judiciário e não ser alegada pela parte contrária parecer hipótese idealizada apenas em discussões teóricas, muito presente já se encontra em nossa realidade, haja vista a quantidade de decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça nessa temática. Assim, se faz necessário extirpar esse teratológico e inconstitucional fato jurídico para inibir hipóteses onde os sucumbentes em uma determinada ação se utilizem da má-fé para atingir sua prestação jurisdicional desejada, além de garantir a segurança jurídica para aquele de boa-fé participaram da demanda.

Portanto, presente trabalho se propôs a explorar justamente os argumentos trazidos pelas duas vertentes e, em que pese a relevante argumentação trazida pelos doutrinadores e magistrados que entendem pela prevalência da última decisão de mérito, em especial acerca do esvaziamento do dispositivo normativo que lista o rol taxativo de cabimento de ação rescisória, os autores optam por reconhecer mais adequada a primeira vertente, da qual entende que a primeira coisa julgada deve subsistir, por prezar pelos princípios e normas constitucionais que acabam por se sobrepondo a qualquer outra interpretação simples da Lei.


REFERÊNCIAS

ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

ALVIM, J. E. Carreira. Teoria geral do processo. 21 ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2018.

BRASIL. Constituição, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 26 ago. 2020.

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BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial Nº 600.811 /SP, embargante: MANUEL DA SILVA MOREIRA; embargados: JOÃO ANTÔNIO MOTA, VALDECI BERNARDO CASTEGLIONI, CONSTRUDESC CONSTRUTORA DESCALVADO LTDA – Rel. Min. Og Fernandes. Brasília, julgado em 04 dez. 2019.

BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 598.148/SP, recorrente: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO; recorrido: EPICO DECORACOES LTDA – Rel. Min. Herman Benjamin. Brasília, julgado em 24 ago. 2009.

BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.354.225/RS, recorrente: ARNO PROPP DA SILVA; recorrido: FUNDAÇÃO BANRISUL DE SEGURIDADE SOCIAL – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. Brasília, julgado em 24 fev. 2015.

DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 19 ed. – Salvador: Jus Podivm, 2017.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do novo processo civil. 2. ed. - São Paulo: Malheiros, 2017.

NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 49. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I. 56. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2015.


Notas

1 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 299

2 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 19 ed. – Salvador: Jus Podivm, 2017. P. 403/409

3 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 19 ed. – Salvador: Jus Podivm, 2017. P. 402

4 ALVIM, J. E. Carreira. Teoria geral do processo. 21 ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2018. P. 230.

5 ALVIM, J. E. Carreira. Teoria geral do processo. 21 ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2018. P. 234.

6 DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do novo processo civil. 2. ed. - São Paulo: Malheiros, 2017. P. 202

7 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 338/342.

8 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 354/355.

9 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 1420/1422.

10 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 1421

11 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 6. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. P. 1421/1422

12 DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do novo processo civil. 2. ed. - São Paulo: Malheiros, 2017. P. 222

13 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I. 56. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2015. P. 1084/1086

14 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 598.148/SP, recorrente: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO; recorrido: EPICO DECORACOES LTDA – Rel. Min. Herman Benjamin. Brasília, julgado em 24 ago. 2009.

15 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.354.225/RS, recorrente: ARNO PROPP DA SILVA; recorrido: FUNDAÇÃO BANRISUL DE SEGURIDADE SOCIAL – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. Brasília, julgado em 24 fev. 2015.

16 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial Nº 600.811 /SP, embargante: MANUEL DA SILVA MOREIRA; embargados: JOÃO ANTÔNIO MOTA, VALDECI BERNARDO CASTEGLIONI, CONSTRUDESC CONSTRUTORA DESCALVADO LTDA – Rel. Min. Og Fernandes. Brasília, julgado em 04 dez. 2019.

17 ALVIM, J. E. Carreira. Teoria geral do processo. 21 ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2018. P. 230.

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Sobre o autor
Leonardo Augusto de Morais Soares

Advogado. Pós-graduado em Processo nos Tribunais Superiores na Instituição UniCEUB. Pós-graduado em Direito e Processo Tributário na Faculdade CERS. Graduado em Direito na Instituição UniCEUB. Possuo grande atuação e experiência junto aos Tribunais Superiores, com destaque para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Entusiasta dos mais diversos campos do Direito Público como Direito Eleitoral e Direito Tributário. Atuação destacada também com Direito Civil, com ênfase para as subáreas Contratual/Obrigacional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOARES, Leonardo Augusto Morais. Conflito de coisas julgadas: qual sentença deve prevalecer quando há duas manifestações de mérito sobre um mesmo objeto?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6337, 6 nov. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/86566. Acesso em: 22 nov. 2024.

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