Importunação sexual: de contravenção penal a crime comum

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Resumo:


  • A Lei 13.718/2018 introduziu o crime de Importunação Sexual no Código Penal, visando punir atos libidinosos sem violência ou grave ameaça.

  • A Importunação Sexual protege a dignidade sexual da vítima, diferenciando-se do estupro que requer violência ou ameaça, e do estupro de vulnerável que envolve menores de 14 anos ou incapazes.

  • O Princípio da Proporcionalidade é aplicado na diferenciação dos crimes sexuais, permitindo a desclassificação de penas para crimes mais brandos de acordo com a conduta do agente.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3. RETROATIVIDADE DA LEI PENAL

Novatio legis in millius representa a possibilidade de retroatividade da lei penal quando esta favorecer ao condenado. Prevê o parágrafo único do artigo 2º, Código Penal, que com o surgimento de uma nova lei favorável ao réu, independentemente de sentença condenatória transitada em julgado, esta irá ser aplicável aos fatos. Veja:

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. (g.n.)

Para que se aplique a retroatividade da lei penal é imprescindível a aplicação do princípio da proporcionalidade, vez que a conduta do agente será analisada para a desclassificação a lei mais benéfica.

Notório que a sanção do crime de importunação sexual se faz menor em comparação aos crimes sexuais mais gravosos – estupro e estupro de vulnerável. Assim, muito se questionou sobre a retroatividade da lei para a manutenção de pena daqueles condenados por esses crimes anteriormente a lei que introduziu o novo delito.

Desta forma, vale explicar que a decisão do juiz, no âmbito penal, se baseia nos fatos apresentados em queixa-crime ou denúncia, e não nos pedidos, como ocorre no âmbito civil. A isto se dá o nome de correlação. Assim, quando o juiz penal entende que a conduta do agente é divergente do pedido de condenação feito em inicial, poderá realizar a desclassificação do crime.

Em análise jurisprudencial realizada para a composição do presente artigo, verificou-se que com introdução da importunação sexual em 2019, muitos foram os casos de tentativas de desclassificação do estupro de vulnerável para o novo delito. Contudo, face ao princípio da especialidade, na Edição nº. 152: Dos crimes contra a dignidade sexual – II, da ferramenta Jurisprudência em Teses, encontrada no site do Superior Tribunal de Justiça, ficou decidido pelo descabimento da desclassificação do crime gravoso, qual seja o estupro de vulnerável, para o mais benéfico.

2) Em razão do princípio da especialidade, é descabida a desclassificação do crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do Código Penal - CP) para o crime de importunação sexual (art. 215-A do CP), uma vez que este é praticado sem violência ou grave ameaça, e aquele traz ínsito ao seu tipo penal a presunção absoluta de violência ou de grave ameaça. (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 2020)

Contudo, nada se fala quanto ao crime de estupro, deixando a entender que é possível a desclassificação para tal quando o juiz entender que o ato libidinoso diverso da conjunção carnal não se enquadra no delito previsto pelo artigo 213, do Código Penal, mas sim pela conduta disposta pelo artigo 215-A, de mesmo código.

Imperioso ressaltar que o crime de importunação sexual foi introduzido ao Código Penal após passar por uma modificação legislativa. Anteriormente a sua entrada em vigor em 2019, a importunação sexual era conhecida como importunação ofensiva ao pudor e se encontrava no artigo 61, da Lei das Contravenções Penais, qual previa “importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor: Pena – multa.”.

Desta forma, a mudança sofrida pela legislação foi para alterar a classificação da contravenção penal para um crime comum, assim como majorar a sua pena, passando de multa a reclusão. Nota-se que a modificação sofrida não se deu apenas no dizeres do artigo como também na pena.

Logo, extrai-se que é possível o pedido de revisão de pena, com fulcro no novatio legis in millius para aqueles condenados por estupro, devidos a ato libidinoso diverso da conjunção carnal, anteriormente a 2019, data em que a lei entrou em vigor. A desclassificação somente ocorrerá se o juiz penal entender, por meio dos fatos apresentados, que a ação realizada pelo condenado se enquadra na conduta mais benéfica. Contudo, para aqueles sentenciados pela contravenção penal importunação ofensiva ao pudor, até o ano de 2018, não haverá a possibilidade de retroatividade da lei, vez que só existe a possibilidade de retrocesso quando esta for em benefício do réu.


4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A criação de um novo tipo para abranger atos libidinosos diversos da conjunção carnal, em que não se fizesse uso de violência ou grave ameaça, era de grande relevância para o Direito Penal vez que, em face do Princípio da Proporcionalidade o agente só poderá ser punido na proporção de suas ações. Assim, diante do ocorrido em São Paulo ao ano de 2018, e das diversas manifestações de casos semelhantes após a sua divulgação, foi necessária a criação de um crime que pudesse ser punido de forma correta, mas que também não caracterizasse o estupro propriamente dito.

Contudo, após dois anos de vigência, é notória a necessidade de estudo pela população, e nessa se inclui magistrados, delegados, operadores do direito no geral. São inúmeros os casos de importunação sexual ainda classificados como estupro/estupro de vulnerável, e ainda maiores as tentativas de desclassificação de crimes sexuais gravosos para a conduta mais branda.

Desta feita, é imperioso ressaltar o trabalho do Superior Tribunal de Justiça em criar precedentes para a impossibilidade de desclassificação destes crimes gravosos, assim como em orientar na aplicabilidade do novo delito face ao princípio da proporcionalidade, e aos requisitos para preenchimento e qualificação de cada um dos crimes. Dito isso, tem-se como exemplo o Recurso Especial tratando do “beijo roubado” em que a violência utilizada pelo autor foi o suficiente para a diferenciação do crime de estupro ao de importunação sexual.

Ainda assim, o delito apresenta pequenas falhas, por exemplo, a possibilidade de aplicação quando se tratar de vulnerável maiores de 14 (quatorze) anos. Como já demonstrado, muito se fala no judiciário sobre as agressões aos menores, no entanto, se esquecem quanto aos demais vulneráveis. Porém, se tratando de um novo tipo inserido a pouco ao ordenamento jurídico, o surgimento de questionamentos é comum, algo que deverá ser solucionado e readequado com o passar do tempo.

No mais, considera-se que os principais objetivos do trabalho, quais sejam 1. diferenciação dos crimes sexuais; 2. demonstração da relevância da introdução de um novo tipo ao Código Penal; e 3. estudo sobre a aplicabilidade da importunação sexual no direito brasileiro, foram atendidos.


REFERÊNCIAS

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Sobre as autoras
Jéssica Cristina da Cruz Felipe

Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Una.

Paloma Pereira de Lima

Graduanda em Direito pelo Centro Universitário UNA.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo elaborado e apresentado ao Curso de Direito do Instituto de Ciências Sociais e Humanas do Centro Universitário UNA, como requisito para a aprovação.

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