1. PRINCÍPIOS INFORMATIVOS E
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO PROCESSO CIVIL
O Direito Processual Civil é definido por Arruda Alvim como o "sistema de princípios e normas que regulam o funcionamento da jurisdição civil, tendo em vista o exercício do direito de ação, que contenha lide civil, e o direito de defesa, bem como a estrutura infraconstitucional dos órgãos do Poder Judiciário e seus auxiliares e, ainda, a disciplina de todos os casos de jurisdição voluntária" (Alvim, 1997,p. 17).
No mesmo texto onde está contida a definição acima transcrita, o autor aborda a distinção existente entre princípios fundamentais e os denominados princípios informativos do Processo. Ambos necessários e encontrados no estudo do Processo Civil.
O autor entende por princípios informativos as regras predominantemente técnicas, e por conseguinte sem maiores conotações ideológicas, que se apresentam quase como axiomas, prescindindo de maiores demonstrações.
Distribui, como outros autores, tais princípios em quatro classes: lógicos; jurídicos; políticos e econômicos. Vejamos as definições de cada classe:
São princípios informativos lógicos as regras técnicas que objetivam a ordenação lógico-positivo-jurídica do processo, para que este atenda à sua finalidade primeira, qual seja, a solução dos conflitos de interesses por meio de uma sentença. Por via deles são buscados os meios mais eficazes e rápidos para se encontrar a verdade, evitando o erro.
Princípios informativos jurídicos são aquelas regras técnicas que determinam a coordenação lógica dos atos processuais e que se encontram positivadas na legislação processual. Têm por fim buscar a igualdade no processo com a obtenção de decisões justas. A alteração da legislação processual no correr do processo não prejudicam os atos praticados na vigência da anterior.
Serão políticos os princípios informativos quando se constituírem de regras técnicas que se fundam em premissas políticas, necessárias, estas últimas, para uma correta elaboração da lei e para uma aplicação adequada da mesma, o que dá ao sistema processual a vitalidade desejada. Por eles se busca o máximo de garantia social com um sacrifício mínimo da liberdade individual.
Econômicos são os princípios informativos quando compreendem técnicas que visam a máxima efetividade do processo com o desenvolvimento de um mínimo de atividade, respeitados sempre o direito de ação, de defesa e o direito material envolvido na lide. Visam tornar o processo acessível a todos em vista de seu custo e duração.
Princípios fundamentais, no texto estudado, são tidos como diretrizes nitidamente inspiradas por características políticas, com carga ideológica significativa, válidos para os sistemas ideologicamente afeiçoados aos princípios fundamentais que lhe correspondam. Desta forma, contrariamente aos princípios informativos, comportam a coexistência, no ordenamento jurídico, de princípios fundamentais antagônicos, desde que aplicados a situações distintas.
São ressaltados no texto os seguintes princípios fundamentais: princípio da igualdade, do contraditório, da disponibilidade e indisponibilidade, da oralidade e da publicidade dos atos processuais. São sub-princípios, que operam quase como requisitos de operatividade do princípio da oralidade, os seguintes: princípio da imediação, da concentração dos atos processuais, identidade física do juiz e irrecorribilidade em separado das interlocutórias.
Tais princípios fundamentais e informativos do processo devem indispensavelmente estar presentes no momento da elaboração de qualquer lei processual, vista que o desatendimento a qualquer deles gera a ilegalidade, ou mesmo à inconstitucionalidade, daquela.
São eles a garantia primeira do indivíduo contra possíveis violações a seus direitos constitucionalmente garantidos, não podendo jamais serem esquecidos no momento da criação de leis que visem regular o exercício dos direitos acima apontados.
2. OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E PRINCÍPIOS INFORMATIVOS E
OS INSTITUTOS DO PROCESSO CIVIL
A ciência processual moderna é o resultado de um longo desenvolvimento crítico que resultou num apanhado de preceitos tidos como fundamentais, que dão aos sistemas processuais modernos suas feições atuais. Alguns preceitos são acolhidos por todos os sistemas processuais, outros acolhidos por alguns e não outros.
Tais preceitos, conhecidos como princípios fundamentais do processo, distinguem-se daquelas regras técnicas que visam a melhoria do sistema processual, que são denominados princípios informativos do processo, como acima visto. Apesar disto, são aqueles influenciados por estes últimos, mesmo que de forma indireta, em todos os sistemas processuais modernos, mesmo que de diferentes matizes.
Observa-se na atualidade uma tendência à unificação das orientações que informam o processo do mundo ocidental, o que poderia ser visto como um reflexo da influência dos princípios informativos sobre os variados ordenamentos, que viria a imprimir uma mesma ideologia a todos os ordenamentos do mundo moderno.
Desta forma, para que tenham validade no ordenamento jurídico, as instituições criadas que venham a ingressas naquele devem necessariamente atender tanto ao princípios fundamentais quanto aos princípios informativos. A afronta a qualquer deles tem por conseqüência a ilegitimidade do instituto, que deverá ser afastado o ordenamento jurídico por inviabilidade de sua aplicação na sistemática processual vigente.
Muitos destes princípios fundamentais e informativos foram alçados a preceitos constitucionais, de forma que sua afronta por novos institutos processuais implicaria não apenas em ilegitimidade, mas sim em inconstitucionalidade dos mesmos.
Concluindo, no momento da elaboração de normas que criam, ou regulam diferentemente institutos preexistente, os princípios fundamentais devem ter sido observados. O mesmo acontece com os princípios instrumentais do processo, posto que objetivam viabilizar a elaboração das normas bem como a sua aplicação prática.
3. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E PRINCÍPIOS INFORMATIVOS E
O INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPARA.
O instituto da tutela antecipada foi introduzido em nosso ordenamento jurídico pela Lei 8952/94, de 13 de dezembro, com o objetivo claro de atender à necessidade premente de se descobrir novos mecanismos de agilização da prestação jurisdicional.
O excessivo formalismo do procedimento ordinário dilata o processo, postergando a prestação jurisdicional, o que, hoje em dia, é fator de grande perturbação da paz social. Várias são as soluções hoje empregadas que objetivam minimizar este problema, tais como os procedimentos sumários e especiais, dentre eles a ação monitória, onde há a simplificação do procedimento, ou ainda o julgamento antecipado da lide e, instituto que aqui trataremos, a antecipação da tutela.
Claro é que o atendimento ao princípio do devido processo legal, que inclui os princípios do contraditório, ampla defesa, etc., não deve nunca ser menosprezado em face da necessidade de celeridade e eficácia da prestação jurisdicional. Por outro lado, o excessivo formalismo não mais atende aos reclamos sociais de agilidade e eficiência na prestação da tutela jurisdicional.
O aparente antagonismo existente entre a garantia do devido processo legal e a necessidade de celeridade e eficácia na prestação jurisdicional, encontra na tutela antecipada o meio ideal para minimizá-lo.
A tutela antecipada dos efeitos da sentença de mérito é providência que tem por objetivo entregar ao autor, total ou parcialmente, a pretensão por este deduzida em juízo, ou de apenas seus efeitos.
Nos casos onde a citação do réu possa colocar em risco a efetividade do provimento jurisdicional pretendido, ou quando a urgência demonstrar a necessidade de concessão imediata da tutela, o juiz poderá concedê-la sem ouvir a parte contrária. Não há aqui atentado contra o princípio do contraditório, posto que não foi ele excluído do instituto da tutela antecipada, mas apenas postergado a um momento mais oportuno e posterior do procedimento.
A própria precariedade do provimento antecipado, que ainda não constitui decisão da causa, que só ocorrerá com a sentença de mérito, é garantia do efetivo atendimento ao princípio do devido processo legal. Isto porque o mérito será apreciado apenas após regular instrução do feito, com estrita observância do contraditório, quando então a decisão antecipada poderá ou não se tornar definitiva. Antes de apreciado o mérito, a decisão que concede a tutela antecipada é precária, podendo o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, revogar ou modificar, no todo ou em parte, a concessão feita.
A tutela antecipada em nosso ordenamento visa beneficiar apenas o autor, com o fito de agilizar a prestação jurisdicional, de forma que se faz necessário um cuidado extremo na sua aplicação sob pena de se ver ferido o princípio fundamental da igualdade entre as partes. Assim é que para a concessão da antecipação da tutela é indispensável prova inequívoca do fato ensejador do pedido, a fim de que o juiz possa ponderar os "prós e contras" de sua concessão, em confronto aos interesses do réu que serão indubitavelmente atingidos pelo provimento.
Outra garantia ao princípio da igualdade processual é a da concessão da tutela antecipada apenas quando os efeitos do ato concessivo forem reversíveis, posto que assim estão preservados os efeitos da sentença que virá ao final do processo, que ficaria prejudicada caso não fosse possível o restabelecimento a situação primitiva.
Em contra partida, a tutela antecipada confere ao economicamente mais fraco a oportunidade de ver sua pretensão concedida initio litis, o que evita que a demora do processo o faça desistir da ação, face as despesas necessária para garantir uma vitória futura e incerta. Temos aí o atendimento ao princípio fundamental da igualdade, oferecendo ao mais fraco a oportunidade de exercer seu direito de ação sem o risco de o aspecto econômico tornar inviável seu acesso à justiça.
O instituto da tutela antecipada se constitui em uma forma de agilização da prestação da tutela jurisdicional, não violando qualquer princípio fundamental, atendendo mesmo ao princípios informativos do processo, desde que sua aplicação atenda estritamente às condições e requisitos impostos pela legislação pertinente.
4. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS, PRINCÍPIOS INFORMATIVOS E
AÇÃO MONITÓRIA
A ação monitória foi introduzida no nosso ordenamento pela Lei 9.079/95, de 14 de julho, porém a muito vinham os doutrinadores fomentando por sua adoção. Topologicamente, no CPC, consta da parte que disciplina os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa, tendo ali sido acrescidos três artigos.
Pode a ação monitória ser conceituada como o meio através do qual o credor de quantia certa ou de coisa móvel determinada, cujo crédito esteja comprovado por documento hábil, objetiva a satisfação do seu crédito por meio de um provimento judicial consubstanciado num mandado de pagamento ou de entrega da coisa.
Posto que a ação monitória se desenvolve via procedimento especialíssimo, em vista da sumariedade formal da sua cognição, onde o pronunciamento jurisdicional objetivado é proferido inaudita altera parte, se poderia alegar estar violado o princípio do contraditório e da ampla defesa. É preciso sempre, em face do princípio do contraditório, que se dê ao réu a oportunidade de oferecer resistência ao pedido inicial.
Na realidade o contraditório está, nesta ação, apenas postergado a uma fase processual posterior, onde será amplamente oportunizado, de forma que o seu procedimento é entendido como apenas formalmente, e não materialmente, sumário. Se de outra forma fosse teria de ser incluído dentre os procedimentos cautelares.
Assim sendo, o contraditório existe na ação monitória, mas dependerá ele da iniciativa do devedor em provocar o autor para discutir a origem e legitimidade do crédito, donde se conclui que há uma verdadeira inversão do contraditório que, nem por isto, está excluído deste procedimento. Opondo embargos, o procedimento especial da ação monitória é transformado em procedimento comum ordinário, onde o contraditório será amplo.
Tendo sido expedido o mandado judicial para pagamento ou entrega da coisa móvel, várias podem ser as condutas do réu. Dentre elas poderá ele acatar a ordem, quando então será o processo extinto por sentença terminativa, isentando-se o demandado do pagamento de custas e honorários advocatícios (art. 1102c, § 1º).
Poderia se alegar que há aí uma afronta ao princípio da isonomia, onde a uma das partes são dadas vantagens que à outra não assiste. Isto na realidade não ocorre, posto que ao autor é dado escolher, dentre os procedimentos existentes, aquele a ser empregado na cobrança de seu crédito. Poderia ele escolher o procedimento comum, conhecido por sua demora e custosidade. Ao optar pelo procedimento monitório, fez sua escolha cônscio das conseqüências que dela se originarão, bem como das vantagens que lhe poderão advir.
Sendo que o processo é um instrumento colocado a disposição do jurisdicionado para que obtenha um bem da vida pretendido, está claro que poderá ele optar dentre os instrumentos existentes para a defesa de seus interesses. Optando o credor pelo procedimento monitório estará ele cônscio de estar renunciando a parte de seu direitos de crédito, no caso de o réu efetuar o pagamento pretendido em tempo hábil. Caso não concorde com tal renúncia a parte do seu direito de crédito, deverá ele recorrer ao procedimento comum, que segue o rito ordinário.
O princípio informativo que mais ressalta na ação monitória é o econômico, com a expressa observância do princípio do devido processo legal, atendendo aos reclamos de celeridade processual, não apenas no aspecto do direito de levar a pretensão a juízo, mas também de exigir uma prestação jurisdicional qualificada porém célere.
O princípio fundamental da igualdade deverá sempre ser resguardado com afinco pelo legislador, mas não deve ele ser levado ao extremo de servir de entrave à prestação da tutela jurisdicional, com a perpetuação da demanda ao longo do tempo, o que leva, em muitos casos, à ineficácia daquela.
A ação monitória entrou para o nosso ordenamento jurídico por via de um processo legislativo que atendeu a todos os princípios fundamentais e informativos que tornam qualquer nova instituição processual apta e eficaz aos efeitos pretendidos.
CONCLUSÃO
Tanto o instituto da tutela antecipada quanto a ação monitória, neste primeiro exame, atendem aos princípios fundamentais e informativos do processo. Alguns deles, todavia, se encontram mitigados ou mesmos postergados a um momento tardio do procedimento, o que não implica na sua exclusão ou violação.
Estando atendidos tais princípios, mesmo que por vezes uns se sobreponham aos demais, não há de se falar em ilegitimidade ou ilegalidade dos institutos acima tratados. A sua aplicação, entretanto, deverá se fazer com estrita atenção às condições impostas pelas leis que os criaram, posto que estas constam das leis em questão como garantia dos princípios aqui tratados.
Não há dúvida de que as alterações que se vêm procedendo no campo do processo civil são reflexos dos anseios da população por uma justiça mais ágil e eficaz. Só há justiça quando ao Poder Judiciário é dada condição de trabalho, evitando-se a aglomeração de ações de solução simples ou protelatórias do direito da parte, que entravam o Poder Judiciário, provocando uma demora indesejável na prolação das sentenças, retardando a prestação jurisdicional que, por vezes, quando prestada já são completamente ineficazes. Desafogando o Judiciário estaria aberto espaço para as ações complexas, que exijam uma maior elaboração por parte dos magistrados na sua solução.
BIBLIOGRAFIA
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