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2020, um ano pra entrar pra história de nossas vidas e para nos ensinar muitas lições.

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Quais as lições que o ano de 2020 deixa para nosso país, nossa sociedade, nosso povo? Foi caótico, mas do caos se pode tirar muito proveito para uma nova ordem. Ainda há esperança?

2020. Que ano!! De fato, um ano pra jamais ser esquecido por todos nós, sem dúvida alguma. Nunca, na história recente da humanidade, vivemos um ano de tamanha tribulação, em todos os aspectos. E olha que nosso povo brasileiro conhece, como nenhum outro, o que é vivenciar calamidades, sobreviver, sair sorrindo e tirar sarro do próprio infortúnio. Mas, desta vez, acredito que o sarro, o sorriso, a sátira, lamentavelmente, cederão a perplexidade sobre o que passamos nesse fatídico ano de 2020.

Certamente, foi um ano que testou nossos limites, nossa capacidade de empatia, nossa força, nossa ansiedade, que foi levada a um nível estratosférico, bem como demonstrou, sob muitos aspectos e facetas, nossa estupidez, nossa incapacidade de gerir conflitos, de superar contingências, de agir com inteligência, de sermos de fato humano para conosco e com o próximo. Sim, 2020 tem milhares de lições pra ensinar a nós brasileiros e, claro, ao mundo como um todo. A única e mais trágica certeza é a de que, infelizmente, muitos de nós não aprendeu nada e em nada irá evoluir, a não ser para o pior.

O leitor deve estar se perguntando o motivo de tamanho pessimismo nessas singelas palavras introdutórias, mas garanto não se trata de uma visão pessimista e nem de um pessimismo travestido de realismo, para tentar ser eufemístico e não correr o risco de me tornar um profeta do caos.

Não, absolutamente, não! As razões para essa visão dura, cética, pesada e avassaladora da nossa situação, numa avaliação do que foi esse ano para nós sobram, principalmente, porque demos todos os motivos e exemplos para não serem seguidos por nenhum povo ou nação. Demonstramos que, por nossa incapacidade de agirmos com inteligência, consciência do outro e do coletivo, da nossa latente falta de educação, do nosso amor pelo famigerado “jeitinho brasileiro” que tentamos dar pra tudo em nossa vida, alegando que “no fim tudo dá certo”, somos um povo indócil, de dura servis, que não sabe se comportar com decência, que desdenha do conhecimento científico, que só pensa em si, em total detrimento do outro, que fala em solidariedade, mas que não se dispõe a pratica-la de forma alguma, sob o argumento funesto do “antes ele do que eu”.

Por que digo isso? Voltemos ao início de tudo, se é que isso possa ser possível de mensurar de maneira precisa. Tivemos alertas de todas as partes do mundo para nos prepararmos, sobretudo porque, já em fevereiro, sabíamos da existência de uma situação pandêmica e, com deboche, preferimos celebrar a festa carnavalesca em todas as grandes cidades do país, do que conter nossa fome de prazer e luxúria, ainda que isso fosse custar muito de nosso povo, sobretudo, vidas. Basta lembrar que foi logo após o carnaval que começaram a surgir os casos da nova doença em nosso país e que, dias depois, o mal se alastrou em todo o território nacional, trazendo uma calamidade de saúde pública jamais vista em nossa história inteira.

Confiamos no governo mitológico de líderes que sempre nos traíram, que se arvoravam como senhores do destino da nação (e de certa maneira, eles são) para que a eles fosse relegada a missão de salvar nosso povo do caos da pandemia, porém eles demonstraram mais uma vez que são irresponsáveis, pensam em si, não tem a mínima noção do que seja o significado da palavra gestão, nos mostraram que não sabem falar a mesma língua, são jactanciosos, arrogantes, e, como sempre, pensam somente em seus mais escusos interesses e o povo que se lasque. Era um festival de bizarrices, absurdos, disparates, decisões melancólicas, desarrazoadas, tomadas somente no calor da emoção, privilegiando uns poucos em detrimento de muitos, trazendo desespero, agonia, ansiedade, desilusão, pânico, sofrimento, morte em milhões de pessoas.

Nosso governo federal, mitológico, obviamente, entrou numa briga infantil com órgãos de imprensa, pateticamente num bate boca interminável e, com menos capacidade de fazer uso da palavra, acabou, de certa maneira, perdendo essa batalha inútil para um setor que pouco fez de nobre pela nação. Aliás, nesse 2020, nessa pandemia, o que mais se viu da imprensa foi um festival de disseminação do pânico, da má informação, da ausência de conteúdo, embora alguns poucos se importassem em trazer algum conhecimento para a população em total frenesi, desespero, pavor.

Canais de televisão se aperfeiçoaram em noticiar tragédias, fazer contas de mortos, esquecendo-se de outras doenças que sempre assolaram nosso povo, como a dengue, a febre amarela, a lamentável desnutrição infantil, que foram relegadas a um plano tão inferior que chegou-se a parecer que não mais existiam em nossas tristes estatísticas de doenças, pois só se sabia noticiar mortes por Covid-19. Aliado a esse desastroso quadro, vimos televisões e jornais se preocuparem muito mais em espalhar a ideia do medo, do que em informar e contribuir para a disseminação do conhecimento, tão desdenhado e mal tratado nesse período.

Aliás, atrevo-me a dizer nunca na história desse país a educação e o conhecimento foram tão surrados e achincalhados do que em 2020, mormente em nosso país, que sempre tratou a educação como algo muito menor do que o secundário.

Aliado a esse contexto de batalha inútil (até porque, a maioria imensa das batalhas da humanidade não tem um motivo justo, nobre e nem digno) tivemos um Poder Judiciário perpetrando mau tratos às leis e à Constituição. Uma avalanche de decisões judiciais absurdas que pouco ou nada contribuíram para tentar frear a crise, sobretudo porque lastreadas em entendimentos carregados de insensibilidade e do furor da caneta de homens e mulheres que ainda teimam em se achar semideuses.

Todo esse arcabouço de tragédias não tinha como produzir nenhum resultado diferente. Fomos assolados com a pandemia. De um lado, a imprensa insiste no número de casos de contaminação, mas não informa a quantidade imensa dos que venceram a doença, nem tão pouco traz dados corretos sobre o quadro que estávamos vivendo. De outro, o governo federal que não sabe tomar as medidas adequadas e necessárias para conter as consequências da pandemia, seja na economia, seja na saúde e, mais lastimavelmente, na educação, a tão combalida e mal tratada educação brasileira. Tanto que o desdém para com a ciência assemelha-se a ignorância das bestas feras, não porque sejam burros irracionais, mas porque não saber ler ou interpretar as circunstâncias da maneira como se pede. Como esperar que eles consigam projetar saídas ou soluções? Impossível, por obvio.

Por outro lado, ainda, tivemos uma desnecessária eleição municipal, que simplesmente ignorou a pandemia, porquanto não haviam razões para sua realização nesse ano. Mas o apetite voraz de nossos representantes não permitia que se fizesse um adiamento do pleito eleitoral, sobretudo porque as “tetas das viúvas”, as prefeituras, não podem ficar sem quem as mame. Então, tivemos aglomerações, sub informação de notificação de casos de contaminação pelo novo vírus, como se nada estivesse de fato acontecendo. Um dia após o segundo turno de votação, os casos se multiplicaram e começou uma nova avalanche de medidas restritivas que custaram empregos, empresas e até vidas por todo o país.

O que podemos dizer com tudo isso? Que nosso país padece de um mal latente, corre iminente perigo de se afundar ainda mais e teima em não tomar as medidas profiláticas corretas, isto é, por falta de conhecimento, de educação, de investimentos em ciência e tecnologia, de informação séria, concreta, correta, de pudesse provocar consciência na população, nosso povo perece e continuará perecendo por mais não se sabe quanto tempo.

Votamos mal, não sabemos escolher quem nos represente nos Poderes da República, não sabemos cobrar, não sabemos protestar, filtrar informações, questionar de forma pertinente, não sabemos tomar decisões, não sabemos o significado de palavras que deveriam ser nossos princípios básicos de vida em coletividade: respeito, tolerância, empatia, cidadania, competência. Aliás, não sabemos e não queremos saber. Usamos as redes sociais para torna-las um campo de batalha ideológico, sendo que na grande maioria dos usuários, nenhum deles sabe dizer ao certo o significado do pensamento ideológico que professa e vocifera. O que se vê é um festival de achincalhamentos, intolerância, imprudência com as palavras, agressões gratuitas, pois não sabemos também o que significa dialética, democracia, queremos impor nosso modo de ver e pensar as coisas sobre o outro, ainda que isso custe até mesmo matar digitalmente o outro, desde que meu pensamento prevaleça.

Aonde vamos chegar? Continuaremos a cultuar a ignorância, a imprudência, a malandragem, a arrogância, a impertinência, a incontinência, a incongruência, a antipatia social gratuita, a intolerância, a imbecilidade? Parece que sim, lamentavelmente.

A pandemia tem muitíssimas lições para nos ensinar. Um ser invisível, microscópico, nos mostrou nossa inútil jactância, nos mostrou que somos falíveis, vencíveis, suscetíveis de sucumbir por não sabermos agir de maneira prudente, respeitosa, harmoniosa, nos mostrou que somos humanos, não na acepção da palavra que remonta a solidariedade, mas na conotação que remete a nossa fragilidade, acompanhada por uma boa dose de arrogância que nos coloca num patamar de insuperáveis, quando, na verdade, somos mais vulneráveis do que possamos imaginar.

Nosso país teve inúmeras lições, mas mostrou-se novamente incapaz de aprender porque teima em não querer ser ensinado. O mais lastimável de todos é aquele que não é ensinável. Ele vê as coisas acontecendo ao seu redor, sabe o que não deve fazer, mas ignorantemente, imbecilmente, comete os mesmos erros ou, pior, os supera, sendo levado ao caos existencial do qual ele jamais conseguirá sair sozinho.

Esperança? É uma palavra que sempre vai existir como fator impulsionador de cada um de nós. Não significa pelas palavras acima desferidas, que não haja esperança. Esperança existe uma dentro de cada um de nós, por dias melhores, por momentos, felizes, por soluções eficazes, por erradicação da pobreza, da desigualdade, do fim da criminalidade em todas as suas vertentes, pelo fim da fome, pelo fim da intolerância que leva a guerra imbecil, pelo fim das doenças e pela erradicação de mazelas que atormentam a raça humana.

Sim, esperamos. Torcemos, sonhamos, pedimos, suplicamos. Contudo, não bastam desejos, é preciso agirmos, darmos passos em direção a concretização da nossa esperança, para que ela saia do campo do imaginário e se torne real, patente, palpável, plausível, concreta, efetiva, tangível.

O Brasil precisa, urgentemente, aprender com os inúmeros erros que cometemos nessa pandemia, precisa encontrar equilíbrio, precisa se reeducar, se colocar na condição humilde de aprendiz e procurar fazer o certo. Do contrário, o caos vivido no ano de 2020 nem se compara ao pandemônio que se avizinha nos anos vindouros. Quem quiser pagar pra ver, que continue a manter-se na inércia e contribua como tem feito para a contiguidade dos desvarios e disparates que temos perpetrados por décadas, talvez séculos. Só não reclame depois, se vivo estiver pra isso.

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Desejamos um melhor ano do que o presente e moribundo 2020. Que saiamos de nossa inatividade, que sejamos ávidos por aprender, por empreender, por ganhar conhecimento, semear cultura, disseminar entendimento e que ganhemos coragem pra denunciar o descaso, a politicagem inútil, a polarização idiota que não leva a lugar nenhum, a falcatrua, a tramoia, a panaceia, a injustiça, a intolerância, o desamor, o desafeto que leva ao descarte de vidas em favor do atendimento de caprichos desonrosos, que saiamos às ruas em prol da justiça, da equidade, do respeito ao diferente, que sejamos mais francos, mais honestos, mais justos, mais educados, mais dispostos a saber viver em coletividade, respeitando a individualidade de cada um, porém sem descuidar do próximo, da natureza, a quem agredimos gratuitamente todos os dias, de forma inconsequente.

Sejamos mais humildes e dispostos a aprender com nossos mais patéticos erros, sem nunca mais repeti-los. Que não fechemos os olhos para as incoerências dos discursos, sejam e partam eles de quem quer que seja. Que tornemos em práticas ideias que ainda estão no limbo do papel e da imaginação.

O quadro é caótico. O tom é negro e acinzentado. As perspectivas, à vista do que tem sido praticado e perpetrado, não são tão animadoras, mas, como bons brasileiros que somos, que não desistamos nunca de buscar uma sociedade melhor.

Estejamos preparados para o ano vindouro. Não sabemos o que ele trará. Aliás, dia 29 de dezembro do ano passado, tínhamos sinceras expectativas de que 2020 seria maravilhoso, com promissoras esperanças para a economia nacional, o empreendedorismo, a iniciativa privada, reformas legislativas importantes, aquecimento de vários setores econômicos, mas formos surpreendidos por uma avassaladora pandemia mundial sem precedentes em nossa história. Acredito que, como lição maior, estamos mais fortalecidos, sabendo que por mais que desejemos, planejemos, contingências podem surgir do nada e impedir de concretizarmos nossos mais sinceros e lindos sonhos. Nem por isso podemos desanimar, perder a fé, desfalecer, nos entregar ao medo e ao pânico e subverter a ordem, por mais que haja um aparente e latente caos.

O Brasil pode sim mudar. Depende de cada um de nós e de como aprenderemos a partir de nossos erros e como reagiremos. Sei que o início de meu texto soa pessimista, mas não compactuo com o pessimismo. Nem com o otimismo bobo e patético. Sejamos sóbrios ao analisar tudo com a devida cautela e parcimônia. Aprender é preciso. Fazer o certo, mais ainda.

Feliz 2021!!!  

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Sobre o autor
João Ricardo Cardoso de Oliveira

Advogado, atuante nas áreas imobiliária, condominial, tributária. Parecerista e professor. Especialista em Direito Imobiliário com MBA, Direito Condominial e Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, João Ricardo Cardoso. 2020, um ano pra entrar pra história de nossas vidas e para nos ensinar muitas lições.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6392, 31 dez. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/87632. Acesso em: 16 abr. 2024.

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