1. O Código Tributário Nacional trata da responsabilidade tributária em seus artigos 121, II e 128, vejamos:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação tributária principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único – O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I- contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II- responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Art. 128. Sem prejuízo do disposto deste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação. (grifos nossos).
2. A Lei Complementar nº 116/2003, assim dispõe em seu art. 6º, § 1º:
Art. 6º. Os Municípios e o Distrito Federal, mediante lei, poderão atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação, inclusive no que se refere à multa e aos acréscimos legais.
§ 1º. Os responsáveis a que se refere este artigo estão obrigados ao recolhimento integral do imposto devido, multa e acréscimos legais, independentemente de ter sido efetuada sua retenção na fonte. (grifos nossos).
3. O terceiro vinculado ao fato gerador, no caso do imposto sobre serviços – ISS, é por excelência o tomador, uma vez que o outro pólo dessa relação obrigacional de direito privado é ocupado pelo próprio contribuinte. [1] De fato, o tomador do serviço é a pessoa ideal para ser o responsável tributário, uma vez que para adimplir a sua obrigação contratual, terá que pagar pelo serviço ao prestador, este sim, contribuinte do ISS. O tomador torna-se então responsável pelo recolhimento do imposto.
4. Pelo já dito, infere-se que o município pode criar esta responsabilidade por lei ordinária, inclusive no que tange a obrigatoriedade de retenção na fonte por parte do tomador do serviço (terceiro vinculado ao fato gerador).
5. A partir da responsabilidade tributária prevista nos artigos 121 e 128 do CTN, bem como, no art. 6, § 1º da LC nº 116/2003, podemos falar na figura de um fato gerador da substituição tributária (responsável), juntamente com o fato gerador da obrigação tributária (contribuinte). [2]
6. O responsável tributário, doravante chamado de substituto tributário é o responsável tanto pela obrigação principal quanto pela acessória, competindo-lhe praticar todos os deveres instrumentais no interesse do Fisco. Neste sentido, o substituto pode ser também obrigado por lei a fazer a chamada retenção na fonte do ISS.
7. Tanto o fato gerador da obrigação tributária quanto o fato gerador da substituição tributária hão de ser extraídos do núcleo do critério material da hipótese de incidência tributária.
8. O substituto tributário, por força de lei, deve pagar o ISS quando realiza o fato gerador da substituição tributária, e assim o faz em nome próprio, ainda que desconte o valor do contribuinte. Quando a lei municipal também o obrigue a reter o valor do contribuinte, obrigação acessória, se não o fizer passará a dever o tributo oriundo da obrigação acessória convertida em principal, art. 113, § 3º do CTN.
9. Quais os limites ao poder de instituição da substituição tributária pelos municípios? A necessária vinculação do responsável ao fato gerador, e que o fato gerador (prestação de serviços) da substituição tributária seja realizado no território do município instituidor.
10. A regra geral é a prevista na LC nº 116/2003, art. 3º, ou seja, o ISS é devido no município onde estabelecido o prestador de serviços. A primeira exceção está prevista no mesmo art. 3º, in fine, na falta de estabelecimento prestador, será devido no local do domicílio do prestador, e a segunda exceção, ainda no art. 3º, in fine, nas hipóteses dos incisos I a XXII será devido no local da prestação.
11. O Superior Tribunal de Justiça – STJ, tem posicionamentos robustos na direção da segunda exceção prevista no art. 3º, in fine da LC 116/2003, isto é, de que o ISS é devido no local efetivo da prestação e não no estabelecimento prestador, como quer em regra geral a LC nº 116/2003. Insista-se, neste particular, para o STJ a regra é a de que a tributação deva ocorrer no local da prestação.
12. Estabelecidas estas premissas, vejamos o caso particular do Município de São Paulo. Através das Leis 13.701/2003 e 14.042/2005, sobretudo por esta última, o Município de São Paulo criou a obrigação do prestador de serviço que não domiciliado em seu território, mas que preste serviços para tomador domiciliado em São Paulo, de inscrever-se no cadastro fiscal da Secretaria Municipal de Finanças, bem como, tornou substitutas tributárias do ISS, as pessoas jurídicas estabelecidas no Município e tomadoras de serviços, que deverão reter na fonte e recolher o valor do ISS quando o serviço for executado por prestadoras de serviços não inscritas no cadastro fiscal.
13. São constitucionais as leis paulistas acima citadas? A princípio sim. São Paulo pode exigir daqueles que negociam em seu território o necessário registro em seus cadastros fiscais, tal poder é ínsito ao poder de polícia administrativa prevista no art. 78 do CTN. Imputar ao substituto tributário (tomador dos serviços) o dever de reter e recolher o ISS das prestadoras não cadastradas no Município, também é constitucional desde que o serviço, fato gerador da substituição tributária, for efetivamente prestado em seu território, o que vai, inclusive, ao encontro do que já decidiu o STJ no caso paradigma do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 17.156-SE, Relator Ministro Castro Meira, 10 de agosto de 2.004.
14. Objeta-se, que São Paulo não poderia impor obrigação acessória (art. 113, § 2º do CTN) ao prestador de serviços domiciliado em outro município, como de fato o fez através da Lei 14.042/2005, art. 2º, que inseriu o art. 9-A no corpo da Lei nº 13.701/2003, a uma, porque inexiste vínculo dele com São Paulo no que concerne à obrigação principal, a duas, porque tanto a obrigação principal quanto a acessória estão umbilicalmente ligadas ao poder de tributar, que é delimitado pela área geográfica do município, logo São Paulo não pode impor obrigação acessória a contribuinte situado em outro município.
15. Não nos parece ser assim. Ainda, agora, no IV SIMPÓSIO DE DIREITO TRIBUTÁRIO DA APET (Associação Paulista de Estudos Tributários – www.apet.org.br), realizado em São Paulo, vimos de afirmar que não é necessário este vínculo entre obrigação acessória e principal, para que aquela possa ser imposta há algum contribuinte. Neste sentido leciona Celso Ribeiro Bastos [3], "A obrigação acessória é uma normatividade auxiliar que torna possível a realização da principal. É acessória no sentido de que desempenha um papel auxiliar. Não se quer dizer com essa denominação que a obrigação acessória esteja subordinada ou mesmo dependente da principal". (grifos nossos).
16. Portanto, nada impede que São Paulo exija daquele que presta serviços em seu território, a obrigação acessória de inscrição em seu cadastro fiscal. Se até mesmo um veículo registrado em um Estado da Federação, mas, que circule em outro, está sujeito à fiscalização e punição pela polícia deste último, por que não exigir o registro de uma empresa (de outro município) em município onde mantém negócios cotidianos? Ademais, o registro no cadastro paulista evita para o prestador a possibilidade da tão falada BITRIBUTAÇÃO, porquanto uma vez inscrito, não terá o ISS retido por São Paulo.
17. Adequada assim, está a lei paulista quando prevê que se o serviço estiver previsto na Lista de Serviços de que trata a lei municipal 14.042/2005, e o prestador não tenha o cadastro na Secretaria Municipal de Finanças, cabe ao tomador de serviços, na condição de substituto tributário, reter na fonte o ISS e recolher o tributo aos cofres do município de São Paulo. O fato gerador desta substituição tributária é o serviço realizado por prestador não cadastrado no município.
18. Poderia São Paulo criar novas exceções à regra geral de que o ISS é devido no local da sede do prestador, ex vi do art. 3º, cabeça, da Lei Complementar nº 116/2003?
19. Estaria ferido (invasão de competência de lei complementar) o art. 146, III e alíneas da Constituição Federal pela lei paulista nº 14.042/2005?
20. Respondemos sim à pergunta do item 18, e, não, à pergunta do item 19.
21. Explicamos: São Paulo possui competência legislativa suplementar e privativa, ex vi do art. 30, II e III, respectivamente da Constituição Federal, portanto, legislou ao encontro da melhor leitura da LC 116/2003, que é aquela feita pelo STJ. Outrossim, o Superior Tribunal de Justiça, a despeito do que consta no art. 3º da LC 116/2003, já uniformizou [4] o entendimento de que o ISS é devido no local da prestação e não na sede do prestador, por conseguinte, se os serviços elencados por São Paulo, como de responsabilidade tributária do tomador, forem de fato prestados em São Paulo, a lei municipal não poderá ser inquinada de inconstitucional, por eleger critério preconizado pelo próprio STJ.
22. Em nome do princípio jurídico do dever fundamental de pagar o justo tributo [5] não é razoável aceitarmos a existência de municípios-corsários [6], que acabam possibilitando a criação de instalações fictícias de empresas com o único escopo de evadir-se de uma tributação isonômica, do ponto de vista dos municípios da federação.
NOTAS
- Cf. Cristiano Carvalho, Responsabilidade Tributária do Tomador do Serviço, in ISS – LC 116/2003. Org. Marcelo Magalhães Peixoto e Ives Gandra da Silva Martins. Curitiba: Juruá. 2004. p. 102. Cf. Ricardo Lobo Torres. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 11ª ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2004. p. 260/261.
- In Comentários ao Código Tributário Nacional (arts. 96 a 218). Coord. Ives Gandra da Silva Martins, 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 155 Cf. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 17.156-SE. www.stj.gov.br. Cf. Roberto Wagner Lima Nogueira. Direito Financeiro e Justiça Tributária. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 115/121. Expressão cunhada por Ives Gandra da Silva Martins e Marcos Cintra, in Solução para a Guerra Fiscal do ISS. Tributário.net. São Paulo, a. 5, 22/2/2006. Disponível em: http://tributario.net/artigos/artigos_ler.asp?id=32976 acesso em 1/9/2006.