A infiltração virtual da força de segurança.

A análise da infiltração nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes com escopo na Lei 13.441/2017

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2. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO DIREITO COMPARADO

Sabemos que a infiltração dos agentes não é exclusiva do sistema jurídico brasileiro. O aparecimento desta figura ocorre em várias legislações em todo o mundo, especialmente no que diz respeito à Europa, aos Estados Unidos e a países da América Latina.

2.1. A infiltração de agentes e a lei brasileira

No sistema jurídico brasileiro, o modo de infiltração é conhecido como um meio de obtenção de provas e é a primeira vez que é proposta e discutida por meio do Projeto de Lei 3.516/1989, em seu artigo 2º, I, onde estabelece a infiltração do agente no sistema jurídico brasileiro, até então inédito, onde havia sido apresentado na época, pelo então deputado federal Michel Temer. O dispositivo foi eventualmente traduzido na Lei Comum nº 9.034/1995, que é conhecida por fornecer meios e/ou medidas operacionais para prevenir e coibir ações de organizações criminosas.

Apesar dessa substituição, o então presidente Fernando Henrique Cardoso vetou o dispositivo para controlar a penetração da droga, alegando que o dispositivo era contrário ao interesse público, porque não precisa ser obtido com antecedência do Judiciário para saber se poderia realizar a infiltração de agentes, ao contrário dos princípios estruturados pelo Código Penal, desde que os agentes estivessem expressamente autorizados a cometer crimes, excluindo a ilegalidade.

A investigação desses crimes é muito complexa porque os criminosos interagem em redes sociais fechadas, com pseudônimos e códigos, sendo extremamente difícil que a Polícia consiga descobrir onde estão ocorrendo essas comunicações e troca de material de pedofilia. A única forma de descobrir a real identidade dos criminosos e coletar provas da materialidade é conseguir fazer com que os policiais consigam ingressar e participar por um tempo dessa rede de pedófilos. Essa prática é, inclusive, utilizada em outros países do mundo, como os EUA, nos quais agentes do FBI se fazem passar por pedófilos e conseguem ter acesso aos grupos fechados que trocam esse tipo de material. Pensando nisso, foi editada a Lei nº 13.441/2017, que autoriza expressamente a infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar crimes contra a dignidade sexual de criança e de adolescente. O tema foi tratado nos arts. 190-A a 190-E do ECA que foram acrescentados pela nova Lei. (DIZER O DIREITO, 2017)

No entanto, apesar do veto do presidente, o principal órgão do sistema jurídico brasileiro, a infiltração de agentes mais uma vez foi discutida e inserida neste, com a criação do Plano Nacional de Segurança, por meio da Lei 10.217/2001, devido à forte onda de violência que atinge o estado de Rio de Janeiro, que acrescenta a Lei 9.034/1995 o art. 2°, inciso V, onde ditou a infiltração para obter evidências, mas corrigir os erros que anteriormente levaram ao seu veto, como a necessidade de obter autorização legal para infiltração.

Aduz Nucci sobre a infiltração:

Representa uma penetração, em algum lugar ou coisa, de maneira lenta, pouco a pouco, correndo pelos seus meandros. Tal como a infiltração de água, que segue seu caminho pelas pequenas rachaduras de uma laje ou parede, sem ser percebida, o objetivo deste meio de captação de prova tem idêntico perfil. (NUCCI, 2016, p 724).

Porém, depois da promulgação da Lei nº 13.441/17, o sistema jurídico brasileiro ampliou a abrangência da penetração do agente, não apenas desta forma instituído na Lei das Organizações Criminais e na Lei de Drogas, permitindo que a infiltração ocorra no âmbito virtual. A Lei 13.441/17 adiciona à Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, artigos onde passam a prever a infiltração de policiais na internet, com o intuito de apurar crimes contra dignidade sexual de crianças e adolescentes, envolvendo atividades de produção ou disseminação de imagens ou vídeos relacionados à pornografia infantil.

De certa forma, ele moderniza os meios de acesso de evidências com uma possibilidade de expansão da infiltração, não apenas usado presencialmente, expondo o agente a riscos físicos, mas sempre observando a eficácia e pode-se, eventualmente, ferir os princípios da Lei Maior do Sistema jurídico brasileiro.

2.2. Argentina

A infiltração por parte do agente na legislação Argentina se dá pela Lei 24.424/95, que alterou a Lei 23.737, onde o artigo 31 mostra a figura do agente.

A lei argentina só permite que procedimentos com penetração ocorram durante as investigações, e este recurso não pode ser usado para iniciar processos criminais.

Assim como no Brasil, a infiltração policial na Argentina deve ser previamente autorizada pelo magistrado, após a infiltração o agente deve enviar de imediato as informações de sua investigação ao tribunal autorizado, de acordo com o artigo 6° da Lei nº 24.424.

O ordenamento jurídico argentino é muito próximo do brasileiro, e os agentes infiltrados não podem se tornar pessoas físicas, ou seja, pessoas que não fazem parte das forças de segurança pública do país, pessoas que não pertencem ao setor de serviço público.

Em conformidade com a Lei nº 24.424, o agente de infiltração deve ser um “agente com brechas de segurança na atividade”. Portanto, foi descartada a possibilidade de infiltração de agentes da Polícia Federal Argentina e da Polícia Provincial.

Contrariamente a desaprovação diplomática do Brasil aos crimes cometidos pelos agentes infiltrados durante a operação, o padrão argentino é diferente. O padrão argentino optou por estabelecer a suposição de desculpas absolutas a fim de isentar os agentes infiltrantes de responsabilidade pelos crimes que possam cometer durante este período infiltração.

A lei argentina estipula que a infiltração é necessária, desde que seja uma consequência inevitável do comportamento do agente e tenha sido forçado a implantar o agente sem outras opções, ele não será punido. Em conformidade com as observações, a lei não prevê impunidade absoluta, mas segundo o artigo 7° da lei nº 24.424, que incorpora o artigo 31.3 à Lei nº 23.737, os crimes que colocam em risco a vida ou a segurança pessoal de outrem ou mesmo causam graves sofrimentos físicos ou mentais a terceiros estão excluídos de desculpas absolutas.

Nesse sentido relatam Ionéia de Souza Marques e Luiz Claudio Araújo Coelho:

Diferente do diploma brasileiro, que é omisso no que concerne aos delitos cometidos por agentes infiltrados no curso da operação, a norma argentina optou por criar uma hipótese de escusa absolutória, para isentar o agente infiltrado de responsabilidade sobre os delitos que venha cometer durante o tempo da infiltração. A lei Argentina prevê que não serão punidos os delitos necessários para que se desenvolva a infiltração, desde que sejam consequências necessárias da atuação do agente, e que o agente tenha sido compelido a cometê-los, não tendo lhe restado outra opção. Observa-se que a lei não oferece impunidade absoluta, mas exclui da escusa absolutória os delitos que coloque em risco a vida ou a integridade física de outras pessoas, ou ainda que cause grave sofrimento físico ou moral de terceiros, conforme o artigo 7o da Lei n.o 24.424, que incorpora o artigo 31,3 à lei n.o 23.737. (MARQUES, I. De S., & Coelho, L. C. A. 2012. pág. 150).

A Lei nº 24.424 estipula que, se porventura a utilização de informações obtidas por meio de infiltração judicial, essas informações serão consideradas como provas, e o agente será utilizado como testemunha da audiência. Diante dessa possibilidade, a lei prevê uma série de mecanismos de proteção aos agentes.

Para dar maior segurança aos agentes infiltrados, a lei argentina criminaliza a conduta dos servidores públicos em seu artigo 10, promovendo a divulgação de agentes para terceiros, sendo imprudente, negligente ou pela falta de observação de suas atribuições funcionais. Isso difere do ordenamento jurídico brasileiro porque nem mesmo inclui dispositivos legais nessa área.

2.3. Alemanha

Sobre o sistema jurídico alemão, nem essas leis nem o sistema jurídico brasileiro tenha uma definição clara de crime organizado, mas sua legislação define claramente o que é crime organizado, agente infiltrado denominado na língua nativa como Verdeckter Ermittler, conforme definido no §110a, II, do StPO.

Sobre o tema aduz Márcia Monassi Mougenot Bonfim:

O Verdeckter Ermittler foi introduzido no ordenamento jurídico alemão por uma lei de 15 de julho de 1992, para o combate do tráfico de drogas. A legislação alemã é digna de elogios, uma vez que estabelece os requisitos e as hipóteses de atuação do policial infiltrado. (Bomfim, 2004, pág. 21).

A lei alemã estabeleceu uma lista de crimes em que a pessoa do agente disfarçado é utilizada, não pode tomar medida sem relação aos crimes citados em sua legislação penal.

A fim de conceder e utilizar o agente infiltrado, §110b, I, do A StPO, na tradução livre, apenas diz que só será admitida com a anuência do Ministério Público, e se estas não puderem ser exigidas a tempo, as medidas serão extintas.

É importante o esclarecimento ao qual o legislador se refere com o conceito de crimes (crime de considerável importância), se referindo ao primeiro grupo de casos que autorizam a intervenção de agente infiltrado. A literatura alemã que tratou do assunto não conseguiu definir um limite claro.

A fórmula 'crime particularmente perigoso' tem sido frequentemente usada, ou argumentado que o conceito inclui aqueles crimes que afetam significativamente a paz legal ou que são capazes de minar consideravelmente o senso de segurança jurídica da população. Assim, para viabilizar a contratação de agente infiltrado, está entendido que ele se dá, pelo menos quando mencionado de crime médio, sempre considerando respeito ao princípio da proporcionalidade em cada caso concreto.

No entanto, na Alemanha, os agentes secretos não podem cometer crimes porque essas pessoas afirmam que isso não está em concordância com seus procedimentos de propagação de direitos.

Quando o procedimento termina, a verdadeira identidade do agente deve permanecer confidencial, mesmo se as evidências forem produzidas no processo, sendo isso revelado, pelos motivos que o agente em questão pode sofrer vinganças, porém não perante a autoridade judicial, que é revelada.

Na lei alemã, é feita uma diferença entre agente secreto e o agente secreto provocativo, vale a pena considerar que o agente infiltrado que extrapola seus limites torna-se um agente provocador.

2.4. Espanha

Na lei espanhola, os agentes infiltrados são regulamentados pela Ley de Enjuiciamiento Criminal (LECrim), mais exatamente em seu artigo 282. No Brasil, a infiltração de agentes é autorizada apenas a agentes estaduais, já isso não acontece na Espanha, e as operações de infiltração podem ser praticadas por pessoas diferentes daquelas nas fotos da polícia, e só podem atuar em nome do país.

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O modelo alemão foi adotado pela lei espanhola, onde estabeleceu requisitos e limites de permeabilidade e suposições de exclusão a responsabilidade do agente infiltrante.

Antes da Lei 05/99, a infiltração na presença da polícia já tinha reconhecimento na Espanha com amparo legal a exclusão da antijuridicidade atuando no cumprimento do dever legal ou no exercício regular de um direito, a Lei, portanto, aceitou a penetração policial e tentou distingui-la do “agente provocador”.

Neste sentido, a Sentença do Tribunal Supremo da Espanha, n° 2437, de 03 de novembro de 1993:

“La provocación de la infracción penal por un agente de la Autoridad es un medio de prueba incompatible con los principios generales que garantizan la legalidad del proceso, con la interdicción de la arbitrariedad y con la dignidad de la persona, pero se entiende excluida la provocación cuando la actuación del agente encubierto al instigar al hecho delictivo realmente persigue y descubre una conducta criminal anterior, el cauce por donde viene discurriendo una preexistente actividad criminal, lo cual no pasa de ser una actuación de investigación propia del cometido de la policía judicial”.(Bomfim, 2004, pág. 20).

Como várias leis em todo o mundo, a forma jurídica da Espanha que é de agentes secretos está isenta de responsabilidade criminal, está a serviço da ocultação. Mas vale a pena mencionar isso só será isento de responsabilidade criminal se for comprovado que foi necessário agir dessa forma para fins de coleta de provas, ou para os fins que se destinavam a infiltração.

Existe uma semelhança notável entre a lei espanhola e a lei alemã quanto à diferença entre penetrante e irritante, onde penetrante é admitido como meio de obtenção de provas.

Quanto às evidências na lei espanhola, tudo o que se ganha na operação de penetração é adicionado ao processo, em geral, ambas as informações relevantes e irrelevantes.

2.5. Portugal

A Lei de Processo Penal que vigora em Portugal não autoriza a utilização de métodos de obtenção de provas enganosas ou que são evasivos à vida privada do investigado, observado o disposto na lei nº 101/2001, onde existem as chamadas “Acções Encobertas” (Regime Jurídico das Acções Encobertas- RJAE), contempla a aplicação da infiltração há um certo número de crime, decidido papel preciso no Artigo 2, promova a responsabilidade dos infiltrados, mas apenas se pratique ações preparatórias, ou seja, participar de crimes cometidos pela própria organização.

Além disso, a lei portuguesa prevê especificidade na lei nº 104/2001, em seu artigo 145°, 5, onde autoriza polícia criminal estrangeira pode realizar em Portugal investigação criminal, ou seja, concede que agentes estrangeiros disfarçados atuem em favor da legislação na luta contra o crime organizado internacional.

Explica Daniel José Afonso Gomes:

Assim, está consagrada legalmente a possibilidade de serem desenvolvidas em território nacional, ações encobertas por funcionários de investigação criminal de outros Estados com estatuto idêntico ao dos funcionários de investigação criminal portugueses, embora sujeitos ao RJAE. (Gomes 2019, pág. 48).

O informante pode ser o personagem delineado por seu contorno comparado com agentes ocultos, oferecendo maior desempenho pela dificuldade de definir o seu conceito, ao atual ordenamento jurídico interno. Embora a definição dada pareça simples, o número ainda está aumentando no contexto das operações secretas, a pergunta é, quando em uma investigação está na presença do informante ou um terceiro ao qual se refere o RJAE.

Em muitos casos, os informantes que desejam cooperar com a polícia são indivíduos ligados ao mundo do crime, portanto, esta informação fornece confirmação permanente e rigorosa.

Por outro lado, a motivação do informante em cooperar com as autoridades podem ser as mais diversas, mas geralmente são baseadas em obter alguma compensação em dinheiro, vingança pessoal, senso de justiça, ou arrependimento.

Tornando-se um objeto de pesquisa de valor inegável nas investigações complexas, se o seu desempenho não for estritamente controlado, você pode facilmente "Perder" toda a investigação, tornando todas as evidências inúteis em progresso. Em certo sentido, a intervenção dos legisladores em formular regulamentos para definir o desempenho do número de informantes dentro do escopo do estudo do direito penal, estabelecendo um verdadeiro sistema de controle de denúncias.

2.6. Estados Unidos

O ordenamento jurídico norte americano tem embasamento no sistema Common Law, ou seja, as decisões dos tribunais são baseadas em casos jurídicos, e não em códigos, tendo os tribunais um importante fundamento na criação e melhoria do direito.

Os Estados Unidos da América tornaram-se um país conhecido pela penetração do agente, porque são dotados de notoriedade e possuindo muita bagagem em relação ao crime organizado, sendo o aparecimento destes agentes infiltrados muito recente.

Segundo Rafael Pacheco:

Nos Estados Unidos é a técnica mais utilizada pelo DEA (Drug Enforcement Administration) e outros organismos policiais. Sem ela, seria impossível penetrar e conduzir investigações contra as mais sofisticadas organizações de tráfico de drogas e lavagem de dinheiro no mundo. (PACHECO, 2008, pág. 108).

A semelhança com o Brasil nesse sentido é notória, onde está à infiltração está prevista tanto para o crime organizado quanto para a nova lei sobre drogas.

Tem uma disposição legal no Codeof Federal Regulations, código em que regula tais operações de infiltração e classifica as atividades que serão exercidos pelos agentes.

Nos Estados Unidos, agentes secretos, como agentes infiltrados em sua legislação, podem abranger não apenas agentes da polícia pública, mas também pessoas privadas, que são referidas como informantes, na falta de ordem judicial para realizar tal infiltração, não sendo restrito apenas a membros públicos estaduais.

Neste sistema legal, a autorização para usar operações secretas é concedida pelo supervisor de polícia e deve notificar o ministério público, oficiais de investigação criminal ou terceiros podem participar, priorizando aqueles para um controle mais fácil e a credibilidade do seu testemunho no julgamento. A figura do agente pode ser usada na prevenção e repressão ao crime.

Essas operações secretas são realizadas pelo Federal Bureau ofInvestigation (FBI), sendo competência de estes realizar, inclusive, estas infiltrações são divididas em classes nesta ordem legal, ser uma “light cover” ou “deep cover”, tudo isso depende do crime e do tempo de investigação.A “light cover”, ou também chamada infiltração de luz, não é tão exigente, o agente não precisa mudar sua identidade real para uma fictícia e sua duração não ultrapassa a marca 6 meses. A “deep cover”, ou infiltração profunda, é a aposta de infiltração de luz, maior controle é necessário, mais detalhes são necessários e o adotar uma identidade fictícia.

Sobre o autor
Carlos Henrique Rodrigues Pereira

Bacharel em Direito, Pós-Graduando em Direito Penal

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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