Após a segunda guerra mundial, com o surgimento do constitucionalismo, e o fortalecimento dos princípios fundamentais, especialmente do princípio da dignidade da pessoa humana, a medicina deixou para trás o posicionamento positivista, passando a ter um posicionamento mais humano, proporcionando ao paciente a escolha do seu tratamento. Houve uma mudança de paradigma, tendo a medicina passada a ser regulada pela bioética.
O princípio da dignidade da pessoa humana resvalou em vários âmbitos da sociedade, não só no do direito médico, mas em todos os âmbitos sociais. Esse novo formato foi marcado por um debate interdisciplinar entre a medicina e várias áreas do conhecimento: a medicina, a filosofia e a sociologia, tendo como prioridade máxima o respeito à dignidade da pessoa humana.
A autonomia que o paciente atualmente tem na escolha de seu tratamento decorre de mudanças históricas respaldadas nos princípios sociais, que estão no rol dos direitos fundamentais garantidos a todos os cidadãos.
A Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu art. 196, que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, devendo ser garantida por políticas públicas que visem à redução do risco de doença, bem como o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação de todos os cidadãos. Por seu turno, o Código Civil traz em seu art. 15 que ninguém pode ser constrangido a submeter-se a tratamento médico ou intervenção cirúrgica que resulte em risco de vida. Percebemos, por tanto, que esses artigos garantem autonomia ao paciente.
Existe, ainda, hierarquia entre o médico e o paciente na tomada de decisões para condução do tratamento, porém, é bem menos acentuada do que existia antes do surgimento do marco da bioética.
Com a pandemia do Covid-19, o respeito da autonomia na relação médico-paciente acabou sendo mitigado. A crise sanitária vivida no país e a necessidade da implantação do distanciamento social fizeram com que ocorresse uma flexibilização na forma do atendimento médico.
Passou-se a utilizar a Telemedicina, que anteriormente só era permitida na modalidade de consulta, em casos de urgência e emergência. Ocorre que, nesta modalidade, o atendimento fica prejudicado, visto que se restringe à anaminese, deixando o exame físico de ser realizado.
Permitiu-se a realização de propagandas e anúncios de tratamentos médicos, com a possibilidade até de serem parcelados os pagamentos.
Com a edição da Lei nº 13.979, de 2020, para o enfrentamento da pandemia, modificou-se drasticamente a relação médico-paciente. Em seu art. 3º, concedeu-se ao poder público o poder de fazer internações compulsórias, de obrigar o uso da máscara, de tornar a vacinação obrigatória.
Atualmente temos duas correntes de condução da pandemia do Covid-19 no Brasil. A primeira orientada pela OMS estabelecendo o isolamento social, o uso de máscara e de álcool gel, para conter a disseminação do vírus. Já a segunda, em direção oposta, orientada pelo governo federal, onde não há necessidade de distanciamento social, nem uso da máscara.
A medicina tem demonstrado, através de evidências cientificas, a importância do uso de máscara e do distanciamento social, além de necessidade da vacinação em massa.
O Brasil possui um SUS eficiente, capaz de imunizar rapidamente toda a população. Temos postos de saúde em todos os lugares do país, estando estes equipados com sala de vacinação. O que precisamos ter é a vacinação.
Infelizmente o governo federal não se propôs a comprar vacina para a população, foi de encontro ao mundo e as orientações da OMS, em vez de adquirir vacina para a imunização da população, dificultou a sua compra.
A competência para a compra de vacina é do governo federal, em concorrência com os estados e município, conforme estabelecido constitucionalmente e na Lei nº 6.259, de 1975, que estabelece, em seu art. 3º, que “Cabe ao Ministério da Saúde a elaboração do Programa Nacional de Imunizações, que definirá as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório. Parágrafo único. As vacinações obrigatórias serão praticadas de modo sistemático e gratuito pelos órgãos e entidades públicas, bem como pelas entidades privadas, subvencionadas pelos Governos Federal, Estaduais e Municipais, em todo o território nacional”.
A pretensão da União não era de comprar vacina, mas sim a de intervir nas decisões dos Estados e Municípios na condução do combate à pandemia. Os Estados e Municípios questionaram junto ao STF tal intervenção da União, tendo este esclarecido que essa competência é concorrente, ficando a cargo do governo federal a compra das vacinas.
Recentemente essa decisão foi reformada, passando os Estados e Municípios a terem autonomia na compra de vacinas. Ficou estabelecida a condição de que, caso o governo federal não tenha interesse em adquirir determinado lote de vacinas, essa compra pode ser realizada pelos Estados ou pelo os Municípios.
Infelizmente o governo federal trabalha com o negacionismo, negando a necessidade de utilização das medidas sanitárias para conter o vírus e dificultando a compra das vacinas, o que retardou todo o plano de vacinação do país.
O país vive hoje um momento de desastre na saúde, a única solução será a imunização em massa, de forma a conter a disseminação do coronavírus.
A vacinação do Covid-19 para a contenção da dispersão do vírus no país depende de um planejamento organizado e eficaz por parte do Ministério Público em parceria com os Estados e Municípios para atingir a população em geral.
Um dos motivos que levaram a situação gravíssima que vivemos hoje foi o aumento das aglomerações a partir do mês de novembro de 2020, em decorrência das eleições e das comemorações de final de ano. O vírus começou a se espalhar por todo o país, que deveria ter sido evitado.
A orientação da OMS para evitar a propagação do vírus é o distanciamento social, o uso de máscara e o uso de álcool gel, mas a falta de orientação por parte do governo federal acabou repercutindo na má conduta da população, que não utilizam os procedimentos sanitários mais adequados.
Atualmente na Bahia, temos um aumento crescente dos casos de Covid-19. O boletim epidemiológico é liberado diariamente às 17:00 hs, sendo os dados relatados no portal da transparência, sendo de acesso permitido a qualquer pessoa.
No cadastro constam todos os dados das pessoas que tiveram Covid-19 no Estado da Bahia, o número de pessoas que estão contaminadas, o número de pessoas que se recuperaram, bem como o número de óbitos.
No Brasil, em 1973, foi criado o plano de vacinação nacional para reduzir a morbimortalidade por doenças imunopreveníveis, fortalecendo a promoção, prevenção e proteção da saúde da população brasileira.
É papel do Ministério da Saúde definir o plano de imunização do país, estabelecer o público-alvo e distribuir a quantidade de vacina necessária para cada Estado.
Na Bahia, os 417 municípios têm certa liberdade para estabelecer os critérios do plano de vacinação, devendo seguir as normas principais pré-estabelecidas pelo Ministério da Saúde. Hoje temos uma quantidade insuficiente de vacinas disponíveis para imunizar a população contra a Covid-19.
Não se tem vacina para todos os brasileiros. No ano de 2020, não foi feito um planejamento adequado para adquirir as doses necessárias para vacinar a população.
O Ministério da Saúde não estabeleceu um plano de vacinação nacional eficiente. Para estabelecer os critérios prioritários a fim de se conseguir uma vacinação em massa eficaz, deveriam ser adotados os seguintes procedimentos:
- Determinar a situação epidemiológica da região e a população que será o público alvo para receber a vacina;
- Verificar a quantidade de vacinas disponível para serem aplicadas na população;
- Calcular com base na população de cada estado e município, a quantidade de vacina para ser ministrada.
Em paralelo ao plano nacional de imunização tem-se que estabelecer ações e estratégias para a operacionalização do plano estadual de vacinação, tendo como objetivo geral definir ações e logísticas operacionais para a vacinação da população local.
O Ministério da Saúde precisa estabelecer algumas diretrizes para vacinação. Deve-se observar que:
O Ministério da Saúde deve oferecer apoio às unidades federativas e aos municípios, para conjuntamente estabelecer um planejamento e a operacionalização do plano de vacinação. Ter-se-ia, assim, um envolvimento das três esferas de gestão em um esforço coordenado, uma aliança entre o SUS, à mobilização das três esferas em prol da vacinação e adesão da população para se vacinar.
Ao pensarmos em um programa de vacinação nacional, devemos observar que este plano deve estar alinhado com a autorização da ANVISA ao uso das vacinas, conforme prevêem a Lei n° 6.360/1976 e os regulamentos técnicos RDC n° 55/2010, RDC n° 348/2020, RDC n° 415/2020 e o RDC 444/2020, que estabelece o uso emergencial das vacinas no caso da Covid-19.
Hoje as vacinas disponíveis para o uso no Brasil são: Astra Zeneca, Covax e a Coronavac, ainda em pequenas quantidades para a população.
Existem outras vacinas que estão sendo negociadas pelo Ministério da Saúde como a Pfizer, Moderna, Sputnik V, Bharat Biotech, Gamaleya e Janssen.
A prioridade da compra de vacinas é do governo federal, caso o governo não queira fechar acordos pela compra das vacinas, os Estados poderão negociar diretamente com as empresas fornecedoras.
A ANVISA em janeiro de 2021 autorizou o uso emergencial da vacina do laboratório Sinovac, e no dia 18 de janeiro de 2021 iniciou-se a campanha de vacinação a nível nacional, tendo o estado da Bahia começado a sua vacinação a partir de 19 de janeiro de 2021.
A quantidade de vacina a ser distribuída é calculada com base na população de cada município.
O plano de vacinação do Brasil é divido em plano nacional e plano estadual. O plano nacional tem como objetivo geral estabelecer ações e estratégicas para a operacionalização da vacinação no país, enquanto que o plano estadual tem como objetivo geral definir ações e logísticas operacionais para a vacinação da população de sua região.
Em relação aos aspectos específicos o plano nacional de vacinação tem como objetivo apresentar qual será a população-alvo para a vacinação, criar condições mais favores de utilização desses recursos para atingir as metas de vacinação nas três esferas, além de instrumentalizar os estados e municípios, proporcionado os insumos necessários para a efetivação da vacinação.
Nos aspectos específicos, os estados têm que seguir as normas estabelecidas pelo Ministério da Saúde em relação à população-alvo, seu papel é criar condições favores para a utilização desses recursos com o objetivo de atingir as metas programadas.
O estado da Bahia é dividido em macro-regionais, essas regiões são responsáveis por áreas específicas dentro do Estado, cada macro-região está equipada e treinada para realizar a vacinação.
Atualmente no Brasil existem três vacinas disponíveis, a Coronavac, disponibilizada pelo Instituto Butantan, a AstraZeneca, disponibilizada pela Fiocruz, e a Covax. A Coronavac é uma vacina feita com o vírus inativo, sendo necessário receber duas doses com intervalo de 14 dias. A AstraZeneca é feita a partir de um adenovírus de chipanzé, sendo que necessita duas doses com intervalo de 12 semanas para que a pessoa esteja imunizada.
As vacinas AstraZeneca e Coronavac só devem ser administradas em pessoas maiores de 18 anos.
A farmacovigilância das vacinas é um estudo de controle do efeito da vacina nos indivíduos, são coletados dados de pessoas que apresentaram algum efeito adverso pós-vacina, esses efeitos adversos são relatados e ficam armazenados em um sistema conhecido como EPAV.
No EPVA são registrados os eventos adversos ocorrido da vacinação, caso alguém apresente alguma reação grave é feita uma investigação no paciente através de exames clínicos e laboratoriais, no final é anotado os dados no sistema dos EAPV, esses eventos devem ser notificados até 24 hs após a administração da vacina, conforme estabelece a Portaria n° 264/2020 do Ministério da Saúde.
Em suma, precisamos acabar com a Covid-19, e a única maneira de conter o vírus é com a vacinação em massa. O número de pessoas vítimas da Covid-19 aumenta o cada dia, o Brasil sangra, está à beira de um colapso, se não tomarmos vacina não teremos a nossa vida de volta.
Só sairemos dessa crise sanitária terrível a qual estamos vivendo se tivermos um plano de vacinação eficaz para toda população brasileira.
REFERÊNCIA
Aula Magna 2021.1 – Vacinação Covid-19: Reflexões sobre as políticas públicas de saúde – Alessandro Timbó e Márcia São Pedro – UNISBA.