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Planejamento tributário a nível doméstico

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Um breve ensaio sobre caso prático de planejamento tributário a nível doméstico.

1.    Introdução e Análise da Atividade

O planejamento tributário nada mais é que a busca pela economia de custos fiscais através de negócios jurídicos. Estes podem variar entre simples procedimentos, como o envolvimento de novas personalidades jurídicas em um negócio ou até operações financeiras complexas que vinculam uma série de empresas e subsidiárias. É destacável que se trata de uma atividade lícita e que contribui para o desenvolvimento econômico através do estímulo à concorrência entre diversos setores sociais, como os entes federativos e grandes empresas.

A análise de caso deste artigo fugirá um pouco daquilo que é usual na matéria de Planejamento Tributário, que é a realização deste por parte de grandes ou médias empresas, no caso em questão a analise será de um caso doméstico, a criação de uma empresa de administração e locação de imóveis por parte de um senhor que possui alguns imóveis como constituintes de seu patrimônio e observou a possibilidade de tornar mais eficiente a renda proveniente do aluguel que estes imóveis lhe provêm. 

A criação e manutenção de patrimônio pessoal na forma de propriedades e imóveis no Brasil possui raízes históricas, a primeira delas envolve a forte bolha inflacionária que assolou nosso país entre as décadas de 1970 e 1990, a manutenção de patrimônio em forma de moeda fiduciária nacional era inimaginável tendo em vista a volatilidade do papel-moeda e suas constantes mudanças, a moeda nacional foi substituída seis vezes até superar o mal da inflação. Tendo em vista estes fatores, a obtenção de um bem com valor intrínseco como ouro, obras de arte e imóveis se via como uma das poucas alternativas viáveis para proteger o próprio patrimônio e mirar eventuais valorizações.

Outro fator que colaborou e muito para a instituição da larga cultura de envolvimento na atividade imobiliária por parte de pessoas comuns foi a cultura da moratória na microeconomia, tendo em vista o eventual não cumprimento de obrigações contratuais, a realização de investimentos, tanto no mercado de ações de empresas nacionais, quanto no mercado de títulos públicos, se tornara de pouquíssima atratividade, favorecendo a busca por bens de valor intrínseco.

Por último, mas não menos importante, o confisco das cadernetas de poupança durante o governo de Fernando Collor também colaborou para a desconfiança de maneira forte dos investimentos em ativos de cunho financeiro, a possibilidade de não ter acesso ao capital alocado nas poupanças assustava muitos investidores de pequeno porte, mais uma vez criando uma demanda forte por investimentos de valor intrínseco e sem viabilidade de confisco em larga escala, como os imóveis.

O senhor que realizou esta prática de elisão fiscal é proprietário de seis imóveis, dois no valor de trezentos e cinquenta mil reais, dois de quatrocentos e cinquenta mil reais, um de quinhentos mil e um outro de novecentos mil reais. 

2.    O caso prático e como foi sua realização 

Durante um longo período este senhor recebia os valores relativos ao aluguel de seus imóveis como pessoa física e recolhendo as alíquotas de 27,5% do Imposto de Renda, como qualquer outra renda este viesse a ter em sua vida. O aluguel arrecadado era de cerca de nove mil e seiscentos e cinquenta mil reais, dois de mil e duzentos reais, um de mil e quatrocentos, dois no valor de mil e quinhentos reais e outro gerando dois mil e oitocentos e cinquenta reais de renda bruta, que após o recolhimento do Imposto de Renda lhe garantiam cerca de seis mil e novecentos e noventa reais.

Após uma análise pragmática de sua situação, o senhor que possuía diversos conhecimentos na área fiscal e áreas correlacionadas em virtude de sua formação superior em ciências contábeis e experiência laboral no cargo de auditor da Receita Federal, resolveu partir para a realização dos negócios jurídicos que lhe promoveriam uma economia de tributos, o almejado planejamento tributário.

A estratégia traçada envolveu a criação de uma empresa, pessoa jurídica, que se enquadrasse no regime do Simples Nacional.

 O Simples Nacional é um regime tributário que une os principiais tributos e contribuições existentes no país, em sua maioria administrados pela Receita Federal, mais o ICMS (de âmbito dos Estados e DF) e o ISS (de âmbito dos munícipios). Vale ressaltar que no caso do Distrito Federal, em virtude da não existência de municípios, tanto o ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação), quanto o ISS (Imposto sobre serviços de qualquer natureza) são recolhidos pela própria Unidade da Federação.

As vantagens do Simples Nacional derivam da relativa simplificação na apuração de valores. A apuração destes é realizada de acordo com a receita bruta da empresa nos doze últimos meses e uma outra facilidade deste é o recolhimento através de uma guia única de pagamento. A economia de tributo não é finalidade deste regime, uma vez que está vinculado ao próprio Estado, entretanto através da diferenciação das alíquotas e dos recolhimentos, a elisão fiscal (a finalidade de todo planejamento tributário) pode vir a ser alcançada.

A criação da empresa de locação e administração de imóveis seguiu o trâmite comum, passando pela elaboração de seu contrato social, documento que contem a razão social, neste caso uma Empresa Limitada, os objetivos de atuação da empresa, o ramo que esta pretende seguir, o endereço de estabelecimento de onde suas atividades serão prestadas, o capital que será aportado e consequentemente investido na atividade e quem são os sócios da mesma. Nesta etapa a ajuda de um contador ou empresa especializada para a orientação é fundamental, contudo, o senhor não demandou a ajuda de terceiros em virtude dos conhecimentos que já possuía.

Após a elaboração do contrato social, a próxima etapa se deu com a escolha do regime tributário específico para a atuação da atuação da empresa. Como ressaltado anteriormente, este fora o regime do Simples Nacional, visando a economia com custos fiscais.

A etapa seguinte consistiu no registro do nome fantasia ou marca da empresa. A priori verificou-se a existência de outros registros homônimos no site do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual), tendo a garantia de não ocorrência de empresas com a mesma razão social, seguiu-se para a determinação da classe de atividade econômica a qual a empresa desempenharia, no caso em questão, a administração de locação de imóveis. O último passo foi o registro, de fato, do nome fantasia, no próprio site do INPI. Vale ressaltar que o registro de marca foi obrigatório para a efetiva criação da empresa, entretanto, o registro não é de grande burocracia e sua consequente proteção é importante para evitar problemas de utilização indevidas de marca no futuro.

Em sequência à criação da razão social, o procedimento que a sucedeu foi o arquivamento do ato constitutivo (contrato social) da empresa na Junta Comercial, que após aprovação, possibilitou a retirada do NIRE (Número de Identificação do Registro de Empresa), necessário para a obtenção do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), todo procedimento é feito pelo site da Receita Federal. Foi nesta etapa que o regime tributário específico da empresa foi efetivamente registrado.

Após o câmbio de personalidade, passando de pessoa física a pessoa jurídica e a mudança de regime tributário, deixando de recolher os 27,5% de Imposto de Renda e entrando no regime do Simples Nacional, a economia tributária se deu em quase dois mil e oitenta reais, saindo do pagamento de dois mil seiscentos e cinquenta e três reais e setenta e cinco centavos e incidindo sobre o pagamento de míseros quinhentos e setenta e três reais, uma vantagem comparativa enorme para alguns poucos negócios jurídicos desempenhados por este senhor.

O pagamento dos quinhentos e setenta e três reais é constituído pela soma de alguns impostos e contribuições pertencentes ao Simples Nacional. Estes são: o IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica), a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), PIS (Programa de Integração Social), INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) e o ISS (Imposto Sobre Serviços), neste caso para Brasília-DF.

As alíquotas pagas são de vinte e dois reais e noventa de dois centavos para o IRPJ, cerca 0,23% do faturamento bruto com os aluguéis. Vinte reais e seis centavos com a CSLL, 0,20% da receita bruta, setenta e três reais e quarenta e seis centavos com COFINS, 0,76%, quinze reais e noventa e três centavos com o PIS, 0,01%, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta e oito centavos com o INSS, 2,57% e cento e noventa e um reais e noventa e seis centavos com ISS, para Brasília-DF, representando os quinhentos e setenta e

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três reais pagos à guia única do Simples Nacional, que convertidos em valores percentuais correspondem à uma taxa de 5,93%. 

A economia com tributos ao se comparar as taxas de 27,5% do antes pago Imposto de Renda, aos 5,93% recolhidos agora é de enorme diferença para a arrecadação do bolso do senhor com uma alíquota de menos 21,57% sobre seu faturamento bruto, cerca de cinco vezes menor que a anterior. Ressalta-se que este senhor não arca com o custo de um contador para sua empresa já que ele desempenha essa função, sem onerar a administradora e locadora de imóveis. 

3. Conclusão e Dissertação acerca da importância econômica da economia fiscal.

A economia de tributos pode não soar muito bem perante a visão estadista-fazendária, entretanto esta desempenha um papel fundamental para a saúde e o bom desempenho da economia do país, o dinheiro arrecadado com os impostos - quando não destinado à corrupção que muitas vezes tem como destino paraísos fiscais no exterior - muitas vezes é empregado em escolhas ineficientes ou pouco eficientes que não permitem o desenvolvimento espontâneo da economia ou favorece o crescimento inflacionado de determinados setores econômicos, agindo em detrimento de outros. Com menor arrecadação fiscal do Estado, a austeridade se faz necessária e com menor poder de gastos, os governantes e administradores públicos se veem obrigados a realizar escolhas mais eficientes que gerarão o aquecimento da economia e contribuirão para o enriquecimento do país. 

Com mais dinheiro no bolso, o senhor também se vê com maior poder de compra ou em outro caso, este pode optar por investir seu dinheiro, renunciando a escolhas no presente para no futuro poder ter mais capital e consequentemente consumir mais ou melhor. Independente da escolha, o país se beneficiará.

 Ao optar por efetuar o gasto imediato com o dinheiro excedente economizado com impostos, estará estimulando a produção de bens ou prestação de serviços, que além de gerar empregos, pagar mais impostos, alimentar a cadeia produtiva desde as suas etapas iniciais até as fases mais complexas, contribuirá para o desenvolvimento orgânico da economia, sem criar uma demanda artificial por determinado setor, o que no futuro geraria problemas como demissões em massa e plantas produtivas ociosas. Com a economia se desenvolvendo melhor, as pessoas economicamente ativas estarão em condição de capacitação maior e mais avançada, aumentando a qualidade das funções desempenhadas, subindo a media salarial do país e levando diretamente a um consumo melhor ou maior, que contribui para o circulo da economia, levando ao enriquecimento da nação através da injeção sempre espontânea de mais capital.

A opção por investir o dinheiro não gasto também é ótima para a economia do país. Ao optar por alocar seu dinheiro no mercado de capitais, fundos de investimentos ou bancos, este senhor estará injetando dinheiro para empreendedores ou empresas que farão uso de dinheiro emprestado à promessa do pagamento de juros para desenvolver produtos, tecnologias ou serviços que melhorarão a vida dele e de todo o país, criarão uma demanda pela contratação de mão de obra, pela qualificação desta e pagarão vencimentos no futuro. As empresas além de pagarem aos seus funcionários, criarão a necessidade de prestação de serviços por parte de outras empresas (variando desde operações logísticas e financeiras até terceirização de atividades que não cumpram com a finalidade das mesmas), o que alimentará a cadeia produtiva e contribuirá, novamente, para o desenvolvimento completo da economia e melhorando as condições socioeconômicas do país, sem qualquer necessidade de intervenção ou intermediação estatal ao longo deste processo.

Ainda que haja uma crença de uma necessidade de fornecimento de serviços por parte do Estado, tais como saúde, educação, segurança e vários outros, acreditar que limitar a economia de tributo é solução ou contribuirá para que estes serviços possam ser melhor ofertados é errôneo. Como minuciosamente explicados anteriormente, tanto o gasto imediato do dinheiro não pago ao fisco, quanto o investimento deste, alavancarão o desenvolvimento da atividade econômica, o que por si só propicia o enriquecimento da nação. Com uma nação mais rica e um maior poder de compra, mantidas as alíquotas fiscais, o consumo que agora é maior e melhor aumentará a arrecadação da fazenda pública para que esta possa destinar mais verbas às áreas de prestação de serviços que desejar.

Portanto, não há motivo racional para se proibir a economia fiscal, visto que, independentemente da posição que se tenha em relação, ela permite uma maior arrecadação tributária, o que agradaria aqueles que são pró-fazendários.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAVIE, Paulo Lemgruber Xavier Mattoso. Planejamento tributário a nível doméstico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6604, 31 jul. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/92084. Acesso em: 18 abr. 2024.

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