5. CONCLUSÃO
O que se pode concluir a partir da análise das modificações trazidas pela Lei Complementar 182/21, é que o legislador conseguiu introduzir no ordenamento jurídico uma série de possíveis soluções para problemas que há muito vinham desestimulando o investimento em startups no Brasil. É claro que, para verificar se as propostas realmente produzirão os efeitos esperados, será necessário aguardar pela entrada em vigor da lei, mas a expectativa é otimista.
No que toca o sandbox regulatório foram introduzidas alterações com vistas a reduzir a burocracia e flexibilizar o ambiente regulatório, trazendo dinamismo para a atuação de empresas emergentes como as startups, e proporcionando-lhes a chance de crescer sem a necessidade de enfrentar obstáculos de ordem puramente procedimental.
No que toca à liberdade contratual e à liquidez dos investimentos, percebe-se que, muito embora as alterações sejam mais discretas, a mudança na redação do §6º, do art. 61-A, da LC 123/06, que não mais limita a remuneração do investidor anjo a 50% dos lucros da sociedade, pode representar um incentivo significativo, pois permite a possibilidade de maiores retornos para o investidor.
No entanto, na seara tributária, o novo marco legal foi omisso, não trazendo qualquer mudança significativa.
Assim, permanece a incidência de imposto de renda em alíquotas análogas à da renda fixa para a remuneração ao investidor anjo nos contratos de participação e mútuo conversível, além de, neste último, em caso de ágio, sendo a sociedade investida uma limitada, 15%, sendo os sócios da investida pessoas físicas, até 34%, se forem pessoas jurídicas. Referidas alíquotas, especialmente as incidentes sobre a remuneração do investidor anjo, podem ser consideradas como verdadeira ofensa ao princípio da isonomia tributária, quando se considera que o investimento anjo vem sendo tratado pelo fisco como se fosse equivalente ao investimento em renda fixa, não obstante o primeiro tenha altíssimo grau de risco e o segundo tenha risco praticamente inexistente.
Por fim, a proteção do investidor anjo contra o incidente de desconsideração da personalidade jurídica foi aumentada sobremaneira, para abranger não só o art. 50 do Código Civil, mas também as hipóteses do art. 855-A da CLT, e dos os arts. 124, 134 e 135 do CTN.
Ocorre que olvidou-se o legislador de dispor sobre a caracterização eventual de grupo econômico que, nos termos do art. 2º da CLT, acarretaria na responsabilização solidária dos investidores, o que é temerário.
Omitiu-se, ademais, o legislador quanto à responsabilidade tributária do sucessor empresarial prevista no art. 133 do CTN, referente à aquisição de fundo de comércio ou estabelecimento, com continuação da atividade econômica, hipótese esta que pode restar configurada em caso de conversão do investimento em participação societária.
Portanto, entende-se que o novo marco legal foi deficitário neste aspecto.
Concluindo, em um panorama geral, a Lei Complementar 182/2021 trouxe importantes alterações que estimulam o crescimento das startups, bem como fomentam o investimento anjo. No entanto, ainda restam aspectos a serem melhorados no ordenamento jurídico pátrio para que o setor atinja seu amplo potencial.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA JÚNIOR. Jesualdo Eduardo de. A responsabilidade do investidor-anjo e o incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Revista dos tribunais. Revista do Direito Recuperacional e Empresa. vol. 7/2018. Jan - Mar. 2018. DTR\2018\10397. Disponível em: https://revistadostribunais.com.br/maf/app/widgetshomepage/resultList/document?&src=rl&srguid=i0ad82d9b0000017788086866144d667d&docguid=I925624901b7611e88e06010000000000&hitguid=I925624901b7611e88e06010000000000&spos=4&epos=4&td=10&context=38&crumb-action=append&crumb-label=Documento&isDocFG=false&isFromMultiSumm=true&startChunk=1&endChunk=1. Acesso em: 09/02/2021.
ALVES, Fábia Santos. Um estudos das Startups no Brasil. Universidade Federal da Bahia. Salvador. 2013. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/15395/1/F%c3%81BIA%20SANTOS%20ALVES.pdf. Acesso em: 29/04/2021.
BONFIM CÂNDIDO SILVA, A.; ZACHEO GARBIM, M.; REGINA FERREIRA, M. Startup: vantagens e desvantagens de empreender nesta nova modalidade de negócio . Anais do fórum de iniciação científica do unifunec, [S. l.], v. 8, n. 8, 2018. Disponível em: https://seer.unifunec.edu.br/index.php/forum/article/view/3118. Acesso em: 13 set. 2021.
BRASIL. Projeto de Lei Complementar 249/2020. Marco Legal das Start-ups. Câmara Legislativa. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1936965&filename=PLP+249/2020. Consulta em: 09/02/2021.
BRASIL. Lei Complementar 167 de 24 de Abril de 2019. Planalto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp167.htm. Acesso em 07/07/2021.
BRASIL. Lei Complementar 182 de 1o de Junho de 2021. Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador. Planalto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp182.htm. Acesso em: 07/07/2021.
BRASIL. Lei Complementar 155 de 27 de Outubro de 2016. Planalto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp155.htm. Acesso em: 07/07/2021.
BRASIL. Lei Complementar 123 de 14 de Dezembro de 2006. Planalto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm. Acesso em: 07/07/2021.
CANTAMESSA; Marco; Et al. Startup Roads to Failure. Sustainability. Torino, vol. 10. 2018. n. 2346. 6. Jul.2018. Disponível em: https://doi.org/10.3390/su10072346. Acesso em: 28/04/2021.
CHATTERJU, Aaron K.; FAIRLIE, Robert W. High-Technology Entrepreneurship in Silicon Valley. Journal of Economics & Management Strategy. vol. 22. n. 2. p. 265-389. Disponível em: https://doi.org/10.1111/jems.12015. Acesso em: 29/04/2021.
COCATE, Flávia Medeiros; JÚNIOR, Carlos Pernisa. Crowdfunding: estudo sobre o fenômeno virtual. Líbero, São Paulo, v. 15, n. 29, p. 135-144, jun. de 2012. Disponível em: http://201.33.98.90/index.php/libero/article/view/313/287 . Acesso em: 28 jun. 2021.
COMEÇOU a 4ª Revolução Industrial. HSM Experience. 15 fev. 2017. Disponível em: https://experience.hsm.com.br/spc/posts/comecou-a-4-revolucao-industrial. Acesso em: 13 jul. 2020.
COHEN, Susan; HOCHBERG, Yael. Accelerating Startups: The Seed Accelerator Phenomenon (2014). SSRN Electronic Journal. Disponível em: https://ssrn.com/abstract=2418000 ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2418000. Acesso em: 06/06/21
COUTINHO FILHO, Augusto. Regulação ‘Sandbox’ como instrumento regulatório no mercado de capitais: principais características e prática internacional. Revista Digital de Direito Administrativo, [S. l.], v. 5, n. 2, p. 264-282, 2018. DOI: 10.11606/issn.2319-0558.v5i2p264-282. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rdda/article/view/141450. Acesso em: 5 jul. 2021.
GITAHY, Yuri. Incubadora e aceleradora: qual a diferença entre elas? SEBRAE. 17. Jan. 2014. Disponível em: https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/entenda-a-diferenca-entre-incubadora-e-aceleradora,761913074c0a3410VgnVCM1000003b74010aRCRD. Acesso em: 12/05/2021.
GRANT THORNTON BRASIL. O estímulo como ferramenta para o fomento do investimento em startups: o caso do investimento anjo. ANJOS DO BRASIL, 2017. Disponível em: https://www.anjosdobrasil.net/uploads/7/9/5/6/7956863/estudo_sobre_estimulo_para_investimento_em_startups_-_anjos_do_brasil_e_grant_thornton.pdf. Acesso em: 07/07/2021.
HERBST, Kharen Kelm; AGUSTINHO, Eduardo Oliveira. O investimento anjo como instrumento de desenvolvimento econômico no Brasil. Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 10, n. 2, p. 241-255, jul./dez. 2019. Disponível em: https://periodicos.unipe.edu.br/index.php/direitoedesenvolvimento/article/view/1127/660. Acesso em: 23 de junho de 2021.
JÚDICE, Lucas Pimenta; NYBO, Erik Fontenele, orgs. Direito das Startups. Curitiba: Joruá editora, 2015.
NOGUEIRA, Vanessa Silva; OLIVEIRA, Carlos Alberto Arruda de. Causa da mortalidade das startups brasileiras: como aumentar as chances de sobrevivência no mercado. Nova Lima, DOM: v.9, n. 25, p. 26-33, nov./fev. 2014/2015.
RORATO FILHO, José Cláudio. Uma análise crítica do contrato de participação criado pela Lei Complementar 155/2016 em comparação às outras formas de estruturação do investimento-anjo. Dissertação (Mestrado em direito) - Fundação Getúlio Vargas, Escola de Direito de São Paulo. São Paulo. 2019.
SALAMA, Bruno. Estruturas jurídicas de investimento em startups: Private Equity e Venture Capital. Monografia (LLM em Direito Societário). Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. São Paulo, 2018. Disponível em: http://dspace.insper.edu.br/xmlui/bitstream/handle/11224/1954/BRUNO%20SALAMA_Trabalho.pdf?sequence=1. Acesso em: 12/05/2021.
SANTOS, Fábio Gomes, et al. Desafios jurídicos para o fomento financeiro da inovação pelas empresas. Inovação no Brasil: avanços e desafios jurídicos e institucionais. São Paulo: Blucher. 2017. Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/Fabio-Gomes-Dos-Santos/publication/320479848_Desafios_juridicos_para_o_fomento_financeiro_da_inovacao_pelas_empresas/links/5d8a6a0b458515202b6586b8/Desafios-juridicos-para-o-fomento-financeiro-da-inovacao-pelas-empresas.pdf. Acesso em: 21. jun. 2021.
SCHWAB, Klaus Martin. A Quarta Revolução Industrial. 1ª edição. São Paulo. Edipro. 2017.
SILVA, Francisco Aguiar de Melo e. Fatores que contribuem para o insucesso das startups: o reverso da "medalha". BUM - Dissertações de Mestrado. 20. mai. 2013. Disponível em: http://hdl.handle.net/1822/25153. Acesso em: 14. mar. 2021.
SIQUEIRA, Érica Souza; DINIZ, Eduardo Henrique. Equity Crowdfunding no Brasil: Características Gerais Dessa Modalidade de Investimentos, Novos Aspectos Regulatórios e o Perfil do Investidor. XX SemeAd - Seminários em Administração. Nov. 2017. Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/Erica-Siqueira-2/publication/323014007_EQUITY_CROWDFUNDING_NO_BRASIL_CARACTERISTICAS_DESSA_MODALIDADE_DE_INVESTIMENTOS_NOVOS_ASPECTOS_REGULATORIOS_E_O_PERFIL_DO_INVESTIDOR/links/5a8c7b9ea6fdcc786eafd5c6/EQUITY-CROWDFUNDING-NO-BRASIL-CARACTERISTICAS-DESSA-MODALIDADE-DE-INVESTIMENTOS-NOVOS-ASPECTOS-REGULATORIOS-E-O-PERFIL-DO-INVESTIDOR.pdf. Acesso em: 29. jun. 2021.
SPANIOL MENGUE, T.; SCHMIDT, S.; CRISTINA BOHNENBERGER, M. Contribuições Do Investimento Anjo Para O Desenvolvimento De Startups Na Região Metropolitana De Porto Alegre. Gestao e Desenvolvimento (18075436), [s. l.], v. 16, n. 1, p. 71–98, 2019. DOI 10.25112/rgd.v16i1.1640. Disponível em: http://search.ebscohost.com/login.aspx?direct= true & db= foh & AN= 136902591 & lang=pt-br & site=ehost-live. Acesso em: 14 mar. 2021.
Abstract: The investor angels are figures of extreme importance to the fomentation of startups that, in their turn, have a central and strategic role in the new world economy, by bringing important technological and business model innovations. However, nonetheless the indispensable role of angel investment to promote a significant growth in the startup sector, the brazilian legal system presents several obstacles that discourage that sort of investment. This article, therefore, has the goal of analysing whether the new legal mark of startups promotes in a satisfactory manner the angel investment, as well as the changes it brought to the national legal system.
Key-words: startups, new legal milestone, angel investment, innovation