Tratamento normativo da repatriação de ativos na lavagem de dinheiro

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19/10/2021 às 17:38
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Quais são as formas de branquear os recursos ilícitos?

Resumo: Com a globalização e com o desenvolvimento da tecnologia, que permite à sociedade se comunicar e ter atividades distintas em qualquer lugar do planeta, o crime organizado não ficou alheio a essas mudanças, mas, ao contrário, esse desenvolvimento tecnológico favoreceu a esses grupos criminosos nacionais, internacionais ou transnacionais a ampliar suas garras e suas fronteiras. Esses crimes transnacionais incluem diferentes ilícitos tais como tráfico de drogas, de pessoas, contrabando de armas, comércio de órgãos humanos, falsificações, fraudes e lavagem de dinheiro. O objetivo desta monografia é analisar os caminhos utilizados para a lavagem de dinheiro e as diversas formas de branquear os recursos ilícitos. O suporte das agências internacionais e suas recomendações são deveras relevantes e importantes para auxiliar as autoridades brasileiras a repatriar ativos ilícitos que se encontram fora do Brasil.

Palavras-chave: Lavagem de Dinheiro. Crimes Transnacionais. Organizações Criminosas. Cooperação Internacional. Recuperação de ativos.

Sumário: INTRODUÇÃO. PRODUTO DO CRIME DE LAVAGEM. O crime organizado. A Lavagem de dinheiro. Conceito. Fases da lavagem. REPATRIAÇÃO INTERNACIONAL DE PRODUTO DO CRIME. Repatriação de ativos ilícitos. Aproveitamento de normas internacionais para a repatriação no estrangeiro. TRATAMENTO NORMATIVO DA REPATRIAÇÃO. As Normas e Resoluções do Banco Central. O Código Tributário Nacional (Sonegação Fiscal). CASOS CONCRETOS. Alguns casos citados pelo COAF. Alguns casos publicados pela mídia. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.


1. INTRODUÇÃO

Com a crescente evolução dos crimes de lavagem de dinheiro e a formação cada vez mais especializada das organizações criminosas, tornou-se um desafio acompanhar as transações financeiras nacionais, internacionais e transnacionais, o aumento dos capitais ilícitos e a criação de novos mecanismos para disfarçar o processo e o seu crescimento. Esses grupos criam mecanismos complexos no intuito de ludibriar os organismos de defesa nacionais e internacionais para dificultar o controle feito por seus agentes no sentido de atuar contra essas organizações e as suas formas sofisticadas em camuflar o crime e seus reflexos já que essas organizações se tornam cada vez mais especializadas e com atuação mais abrangente.

As autoridades brasileiras não ficaram inertes a esse problema e buscaram formas de executar medidas adequadas para coibir novas ações e penalizar aqueles que infringem a lei corroborando para que as consequências jurídicas e penais sejam resolvidas com a maior brevidade processual.

De certa forma, um percalço para as organizações criminosas já que elas podem ter suas transações monitoradas, rastreadas, o que as tornam de certa forma, mais vulneráveis. Parafraseando Antonio Carlos Ferreira de Sousa, Diretor de Análise e Fiscalização do COAF, os fluxos financeiros que ocorrem diariamente no mundo se tornaram mais dinâmicos, principalmente com o advento das constantes migrações dos países mais pobres para os mais ricos, pois, na maioria das vezes, as pessoas fogem de seus países em busca de oportunidades de trabalho e de ter uma vida melhor, e, consequentemente essas pessoas trazem suas demandas, suas necessidades. Esse fluxo também contribui para que haja maior intercâmbio comercial entre os povos desses Estados de onde vieram os migrantes, e, consequentemente há maior circulação de ativos das mais diversas procedências que podem ser lícitos ou não.

Essa circulação de pessoas e o maior fluxo monetário gera um risco maior para estimular atividades clandestinas, o fomento do crime organizado e da lavagem de dinheiro que proveem, na maioria das vezes, da corrupção ou de outras transações ilegais. Essas ilicitudes exigem um controle mais apurado do Estado e das instituições financeiras e econômicas que deverão criar mecanismos eficientes para proteger suas instituições, e, portanto, trazer maior segurança aos cidadãos. Além disso, algumas dessas transações financeiras podem estar mascaradas e serem oriundas de transações ilícitas que são de difícil constatação. [1] (COAF, 2016)

Devido à pressão internacional para que o Brasil fosse mais combativo à lavagem de dinheiro e o seu processo em ascensão, criou, em 1998, a Lei de Lavagem de Dinheiro Lei 9.613/1998. Posteriormente ela foi atualizada com alterações que vieram a trazer maior rigor jurídico aos crimes oriundos das organizações criminosas. Esse complemento legal está previsto na Lei 12.683/2012.


2. PRODUTO DO CRIME DA LAVAGEM

2.1. O CRIME ORGANIZADO

Conforme artigo de Cláudio Leite Clementino, publicado em 05/2018, o crime organizado se caracteriza por ser um crime cometido por uma organização criminosa. Essa organização é composta por um grupo de 4 ou mais criminosos que agem contra indivíduos cometendo inúmeras infrações com o intuito de se aproveitar dos bens dos atingidos e o poder usufruí-los imediatamente. [2] (CLEMENTINO, 2018)

Esses criminosos se apresentam como pessoas comuns, tem comportamento normal, não chamam atenção ou provocam qualquer atitude suspeita. São pessoas consideradas normais, do bem.

Esses grupos são muito bem-organizados, possuem uma estrutura aos moldes das atividades empresariais normais. O Chefe é o líder e os outros são os peões, os subalternos. As atividades não podem e não devem gerar desconfiança externa, seus membros devem agir normalmente como se trabalhassem em uma organização que de fato é só que é uma empresa com objetivos escusos. Estabelecem divisão de tarefas e subordinação ao líder. A hierarquia deve ser respeitada. O objetivo dessa hierarquia é evitar que haja conflitos entre os membros. A principal atividade do grupo é a lavagem de dinheiro. O dinheiro sujo é branqueado, disfarçado. A lavagem não deixa vestígios da ilicitude.

A Lei pátria 12.850/13, no art. 1°, § 1°, assim conceitua o que é uma organização criminosa:

§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Conforme Danilo Fontenele Sampaio Cunha, para que uma organização criminosa exista, ele deve se enquadrar em alguns critérios, ter no mínimo 4 pessoas, ter uma estrutura organizada, ter por finalidade cometer as infrações para atingir seus objetivos, motivação de obter vantagens econômicas e ser respeitada por outras organizações criminosas. [3] (SAMPAIO CUNHA, julho 2014)

O crime organizado tem um caráter global. Com o advento da Internet, e de outras tecnologias derivadas, o mundo ficou pequeno. De acordo com Clarissa Furtado, as distâncias se encurtaram e, consequentemente as transações financeiras, lícitas e ilícitas, ficaram cada vez mais facilitadas. [4] (FURTADO, Edição 14 - 1/9/2005)

Mas, não pensemos que a internet provocou o avanço das atividades ilícitas, pois, antes mesmo de termos a facilidade da comunicação através da Web ou WWW, que é o caminho mais rápido para comunicar-se, os crimes também existiam. Eles eram praticados através de transações fraudulentas, operações cambiais e outras formas que disfarçavam o dinheiro sujo.

Explicita Gomes sobre o retrocesso do sistema penal brasileiro, in literis:

Idêntico progresso que a civilização experimentou particularmente nas últimas décadas no âmbito das comunicações, da tecnologia, da informática, etc. não se verificou pari passu, no Direito Penal. Pelo contrário, a impressão que se tem quanto mais a tecnologia e a sociedade avançam (na perspectiva da denominada sociedade de riscos Ulrich Beck -), mais retrocesso se constata na ciência e legislação penais, que hoje se caracterizam pelo abuso e hipertrofia do castigo penal (vivemos a era do Risikostrafrecht).[5] (GOMES, p.13)

O crime organizado não está somente regionalizado em um determinado Estado. A organização criminosa tem tentáculos não só no país de origem como também se expande por outros, criando uma espécie de filiais daquela matriz. O potencial econômico gerado por esses grupos alcança cifras altíssimas. Valores que foram obtidos da atividade criminosa, distribuídos através das conexões internacionais que facilitam a ocultação dos ganhos financeiros ilícitos.

De acordo com Monica Soares Araújo, Coordenadora-geral de Inteligência do COAF, "Dentro do espírito, não só, de prevenção e combate à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, mas também de proteção dos setores econômicos, o COAF criou a Central de Gerenciamento de Risco e Prioridades (CGRP), em consonância com os princípios da Abordagem Baseada em Risco (ABR), que contemplou dentre seus itens de risco, crimes contra o sistema financeiro." [6] (COAF, CAPÍTULO 2)

Conforme Andreucci, partindo de uma perspectiva de política criminal para a fixação dos critérios de determinação do crime organizado, o professor Guillermo esclarece in litteris sobre

"Un estudio comparativo de los sistemas penales permite discernir lo que es considerado de manera más o menos precisa el núcleo de la ilicitud que caracterizaría desde una perspectiva político-criminal al crimen organizado. En ese campo, una primera conclusión es que lo determinante a la hora de ponderar los comportamientos u omisiones como constitutivos de delincuencia organizada es la mayor capacidad de amenaza e la tranquilidad pública que supone una estructura tendiente, básicamente, a delinquir. De esa forma, lo que se presenta como núcleo de interés político es la organización criminal en si misma, entendida como entidad que amenaza las regulaciones del Estado, incluso antes de concretar algún hecho ilícito. Por eso se suele distinguir entre la conducta asociativa misma y los delitos fines que se propone realizar orgánicamente. Esta asociación delictiva, sin embargo, debe representar un mayor grado de agresión o peligro que la simple sumatoria de personas. Por eso se habla de organización o criminalidad organizada. La estructuración de los participantes es un punto relevante en la cuestión en tanto suponen medios y personas orientados a delinquir en ámbitos sensibles de la convivencia. Desde ese punto de vista, importa el nivel de amenaza que representa para el orden público en general, para las instituciones políticas del Estado pero también, y en especial, para el sistema socioeconómico y el respeto por las reglas de juego que regulan los intercambios sociales." [7] (YACOBUCCI, P. 55)

Conforme Dipp, "uma organização criminosa, de modo geral, se revela por dotar-se de aparato operacional, o que significa ser uma instituição orgânica com atuação desviada, podendo ser formal ou informal, mas clandestina e ilícita nos objetivos e identificável como tal pelas marcas correspondentes. A organização criminosa pode também, eventualmente ou ordinariamente, exercer atividades lícitas com finalidade ilícita, apesar de revestir-se de forma e atuação formalmente regulares. Um estabelecimento bancário que realiza operações legais e lícitas em deliberado obsequio de atividades ilícitas de terceiro, é o exemplo que recomenda cuidado e atenção na compreensão de suas características." [8] (DIPP, p. 80)

Com base no Decreto 5.015, de 12-3-2004, que ratificou o tratado da Convenção de Palermo, Andreucci diz que , para a existência de uma organização criminosa, são necessários os seguintes elementos: [9] (CONVENÇÃO DE PALERMO,1999)

  1. atuação conjunta de, no mínimo, três pessoas;
  2. estrutura organizacional;
  3. estabilidade temporal;
  4. atuação concertada;
  5. finalidade de cometer infrações graves;
  6. intenção de obter benefício econômico ou moral.

Ou seja, o crime organizado, gerado pelas organizações criminosas, está intimamente ligado à lavagem de dinheiro. As organizações não sobreviveriam se não fossem financiadas por essa atividade ilícita.

Com o advento da globalização e da internet, as organizações criminosas e o crime organizado tiveram maior possibilidade de desenvolver ações com mais facilidade, criando possibilidades de expansão que era mais dificultada quando não havia disponibilidade de uma comunicação rápida. Como dito anteriormente, as distâncias encurtaram e a comunicação se tornou imediata. Conforme informe do United Nations, Office on Drugs and Crime, em 1998 os Estados membros decidiram criar uma Comissão ad hoc com o propósito de elaborar uma Convenção internacional contra o Crime Organizado Transnacional (TOC), da sigla em inglês. Dessa Comissão resultaram quatro instrumentos legais que foram ratificados pelos Estados membros. Esses instrumentos se referem à Convenção, e aos protocolos sobre tráfico de pessoas, de contrabando de migrantes e fabrico e tráfico de armas de fogo. Essa medida contribuirá para prevenir e combater o crime organizado transnacional.10 (United Nations, 2020)

2.2. A LAVAGEM DE DINHEIRO

A lavagem de dinheiro não é um crime atual. Na década de 1930 já ocorria nos Estados Unidos um comércio ilegal com vendas de bebidas alcóolicas, que eram proibidas. Era um comércio dominado pela máfia italiana. Aparentemente era um negócio legal e toda receita tinha uma destinação aplicar em outras empresas de fachada que não demonstrassem a origem desses recursos.

A expressão lavagem de dinheiro vem do termo inglês money laundering, cuja tradução é literal. Também são usados outros termos por outros países: blanqueo de capitales, blanchiment dargent, geldwashing e riciclaggio di denaro sporco. Traduzindo, todas essas expressões significam a mesma coisa. No Brasil também se conhece como reciclagem de dinheiro.

A lavagem de dinheiro é uma atividade que tem por fim trocar o dinheiro sujo, ilícito, por outro de aparência lícita. Esse novo dinheiro será usado em atividades legais, em investimentos e negócios cuja origem será de difícil identificação e descobrir-se indícios da sua ilicitude. A lavagem de dinheiro se dá de várias formas. Um dos interesses dos lavadores é encontrar maneiras para dissimular ou ocultar o patrimônio auferido por conta das atividades criminosas.

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Uma das formas de encobrir os verdadeiros donos dos bens e do dinheiro ilegal e despistar as autoridades, é feita através de depósitos, normalmente feitos no exterior, através de operações cambiais. Assim, esses ativos ilícitos serão difíceis de rastrear e de se conhecer quem são os depositantes, qual foi o montante depositado, qual é a origem do dinheiro. O local escolhido são os chamados paraísos fiscais também chamados de offshores onde a tributação é muito baixa ou até nenhuma, e o controle e a transparência é praticamente inexistente, pois se permite manter o sigilo dos clientes e das empresas que remetem o dinheiro.

De acordo com o portal do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos da América, no artigo de 2018 do National Money Laundering Risk Assessment (NMLRA) [11]

Os Estados Unidos estimam que o crime financeiro do país, excluindo a evasão de impostos, gera aproximadamente 300 bilhões de dólares de receitas com potencial de serem lavadas, baseando-se nas informações e análises citadas no NMLRA de 2015. As condenações penais e as investigações da lei indicam que a maior parte do dinheiro ganho com o crime nos Estados Unidos permanece no país, mas os Estados Unidos também é um destino atraente para receber fundos ilícitos provenientes do exterior. (tradução livre).

Conforme Ariane Bulla Jaquier [12], "o crime de lavagem de capitais é notadamente marcado pela transnacionalidade das operações que o constituem. Esse caráter internacional, em realidade, é inerente à própria essência do delito: como consectário lógico, quanto maior o distanciamento do capital ilícito de sua origem, através da circulação desses valores pelos canais financeiros e bancários de diversos países, maiores serão os empecilhos para o seu rastreamento. Em verdade, mesmo que o dinheiro transite apenas em território nacional, também serão enfrentadas dificuldades para a sua localização".

A partir dos anos 90 houve maior conscientização sobre um problema existente, de grande abrangência, entre os mais diversos Estados. Antes não se dava muita atenção ao grande volume de recursos que os indivíduos, inexplicavelmente, conseguiam acumular visto que nem sempre essas pessoas tinham uma profissão formal. Foi através de discussões em conferências internacionais que os Estados começaram a se preocupar com a procedência desses recursos e a partir daí é que o crime de lavagem de dinheiro passou a ser um assunto de ampla discussão entre os Estados.

Diante dessas desconfianças, começou-se a discutir como elaborar mecanismos de controle e fiscalização das remessas financeiras que eram transacionadas internacionalmente, e foi possível então, se conhecer que aquelas somas vultosas eram procedentes de atividades criminosas, ou seja, aqueles valores eram ilícitos.

A exemplo de outros países, como os Estados Unidos, que criou o The Money Laundering Control Act of 1986 (Public Law 99-570), que tipifica a lavagem de dinheiro como um crime federal, o Brasil também criou, em 13 de março de 1998, a Lei 9.613 contra a lavagem de dinheiro cujo texto exemplifica o crime:

Dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências (BRASIL, Lei. 9613, 1998).

O que as organizações criminosas objetivam é tentar transformar um ativo ilícito em lícito cuja origem teve como fonte as atividades criminosas do grupo, ou até da atividade criminosa de um só indivíduo. Como bem aponta Carla Veríssimo de Carli [13], (De Carli, p.269)

"a importância da lavagem é capital, porque permite ao delinquente usufruir desses lucros sem pôr em perigo a sua fonte (o delito antecedente), além de protegê-lo contra o bloqueio e o confisco."

A lei que combate à lavagem de dinheiro no Brasil tenta inibir as organizações criminosas de enviar dinheiro ilícito para o exterior, para os chamados "paraísos fiscais", no intuito de "disfarçar" aqueles valores e transformá-los em lícitos. Além do crime de lavagem de dinheiro, esses grupos também cometem outro crime o crime de sonegação fiscal por não pagarem os tributos devidos à Receita Federal, já que, independentemente de sua procedência, qualquer montante, lícito ou não, deve ser declarado ao fisco quando transferido para o exterior. Uma vez que os valores desses indivíduos sejam recuperados, eles serão devolvidos ao erário nacional e poderão ajudar o país a desenvolver projetos pendentes sobre questões emergenciais, demandas sociais e assistências, resolver problemas com o caixa do governo, e, inclusive investir em obras de interesse geral da sociedade.

Corroborando com esse mesmo pensamento, diz Ariane Bulla Jaquier: "...extrai-se a conexão direta entre lavagem de dinheiro, corrupção e organização criminosa. Por óbvio que toda forma de corrupção deve ser enfrentada com o mesmo vigor, ocorre que a corrupção perpetrada por organizações criminosas, por questões lógicas (organização e poder econômico), é a que acarreta os danos mais nefastos à sociedade e arrasa de forma mais evidente a credibilidade das instituições públicas. Veja-se a atual situação política do Brasil."

O artigo 1º da Lei n° 9.613/98 define que a lavagem de dinheiro é ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. Ou seja, a lavagem de dinheiro é um processo de transformação de um dinheiro proveniente de um ato ilícito, um dinheiro sujo, em dinheiro de uso normal, sem vestígios do crime, crime de branqueamento do dinheiro, conforme é conhecido em alguns países.

Esses recursos provenientes do crime crimes aliás com procedências diversas tráfico, terrorismo, corrupção e outros, são enviados para paraísos fiscais e nesse momento se transformam em dinheiro limpo, já que estão depositados em instituições bancárias cuja reputação não é questionada. Há falta de transparência sobre os valores depositados e quem são os depositantes. Como não existe um controle sobre esses bancos fica difícil, inclusive, quebrar o sigilo bancário e fiscal desses depositantes.

O artigo de Juliana Toralles dos Santos Braga [14] nos traz uma análise bem fundamentada sobre a dinâmica das transações financeiras que envolvem a lavagem de dinheiro:

"As transações realizadas anteriormente são multiplicadas, muitas vezes com várias transferências por cabo (wire transfer) através de muitas empresas e contas, de modo a que se perca a trilha do dinheiro (paper trail). Há o saque do dinheiro em espécie e o depósito do mesmo em uma nova instituição ou mesmo destruição dos registros de uma determinada operação em conluio com a instituição financeira. Aliás, Fausto Martin de Sanctis destaca que a realidade de hoje é ainda mais complexa tendo em vista que a criminalidade já está adquirindo bancos internacionais, porque todos os registros dessas instituições são manipulados, viabilizando ainda mais o que já era facilitado pelos paraísos fiscais." (BRAGA, 2010).

Por esse motivo, alguns desses paraísos fiscais estão sendo marginalizados, pois eles se tornam suspeitos já que suas operações não são transparentes. Além disso, como não são fiscalizados nada se sabe a respeito de quem é o depositante, qual a procedência dos valores, e o montante que é depositado. Isso, sem dúvida, dificulta o trabalho das autoridades na perseguição aos seus objetivos de descobrir esses infratores.

No episódio nº 4 da série Na Rota do Dinheiro Sujo, sobre o banco dos cartéis, apresentado pela Netflix, um dos personagens, agente do DEA (Drug Enforcement Administration) agência norte-americana de combate e repressão às drogas, diz You do not follow the drugs, follow the money (Você não segue as drogas, segue o dinheiro - tradução livre). Porém, não podemos generalizar e dizer que todos os paraísos fiscais encobrem ou acobertam o crime. Alguns são considerados paraíso fiscais porque tem uma tributação favorável, mais baixa, até inexistente, o que agrada aos investidores, já que em seus países de origem, como o Brasil, seus recursos seriam tributados com taxas mais altas. A Lei pátria 12.694, de 24 de julho de 2012 , dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição sobre os crimes praticados por organizações criminosas

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.

A Lei posterior de 2013, de número 12.850, disciplina de forma mais abrangente e mais completa e atinge todos os efeitos previstos:

Art. 1º Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado.

§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Os primeiros países a criminalizar a lavagem de dinheiro foram a Itália e os Estados Unidos, cabendo a este último maior protagonismo em implementar ações restritivas a essas atividades ilícitas, a partir do século XX, devido ao crescimento de inúmeros crimes associados a essas atividades.

Mas foi em 1988, através da Convenção de Viena, e, posteriormente com a criação do GAFI em 1989, o interesse internacional motivou os Estados a participarem dessa organização no sentido de coibirem as ações de ilicitude que se avolumavam em esfera global.

Como se pode imaginar, sem a cooperação jurídica internacional, nas relações bilaterais e multilaterais, e, sem que os países colaborassem, seria humanamente impossível rastrear ou recuperar os ativos ilícitos das organizações criminosas.

A Lei brasileira contra a lavagem de dinheiro, nº 9.613, de 3 de março de 1998, dispõe:

Art. 8º O juiz determinará, na hipótese de existência de tratado ou convenção internacional e por solicitação de autoridade estrangeira competente, a apreensão ou o sequestro de bens, direitos ou valores oriundos de crimes descritos no art. 1º, praticados no estrangeiro.

§ 1º Aplica-se o disposto neste artigo, independentemente de tratado ou convenção internacional, quando o governo do país da autoridade solicitante prometer reciprocidade ao Brasil.

§ 2º na falta de tratado ou convenção, os bens, direitos ou valores apreendidos ou sequestrados por solicitação da autoridade estrangeira competente ou os recursos provenientes da sua alienação serão repartidos entre o estado requerente e o Brasil, na proporção de metade, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé.

Essa lei e esses parágrafos preveem e respaldam, inclusive, que a apreensão, sequestro e confisco dos bens provenientes da atividade criminosa possam ser levados a leilão para que o arrecado volte aos cofres públicos.

O principal interesse dos Estados para que a cooperação internacional seja atuante através dessa cooperação é que seja possível recuperar os ativos ilícitos depositados fora do país, acumulados pelas organizações criminosas e, ao mesmo tempo, tentar desestabilizar esses grupos.

No caso da lavagem de dinheiro transnacional, esta cooperação é fundamental para que se possa repatriar os valores ou bens que foram adquiridos como produto do crime organizado.

Conforme matéria publicada no jornal Correio Braziliense de Brasília, em 26 de maio de 202115, nos informa sobre a importância da cooperação internacional. Foi através dessa cooperação e do diálogo com parceiros que atuam nessa esfera que foi possível localizar e deter um mafioso italiano, chefe da máfia e do tráfico na Itália, Rocco Morabito, foragido desde 1990, em um hotel no estado da Paraíba, Brasil, e que é acusado de lavagem de dinheiro, tráfico de drogas, armas e pessoas.

Aliás, conforme o Manual de Cooperação Jurídica Internacional: Matéria Penal e Recuperação de Ativos do Ministério da Justiça, dentre as diversas iniciativas adotadas durante seus mais de 13 anos de existência, o DRCI, por meio de sua Coordenação-Geral de Recuperação de Ativos, após estudos e pesquisas sobre o tema, elaborou um formulário de auxílio jurídico internacional em matéria penal, atualizado e adaptado ano a ano, com o objetivo de disponibilizar um modelo que serve de referência para a elaboração de pedidos de cooperação jurídica internacional em assuntos criminais. [16]

No 2° Congresso dos Profissionais de PLD (Instituto dos Profissionais de Prevenção à Lavagem de Dinheiro), ocorrido em julho, 2020 no Brasil, de forma online, o palestrante Roberto Leonel de Oliveira Lima, ex-Presidente do Coaf e ex-Auditor Fiscal da Receita Federal, definiu com muita propriedade a lavagem de dinheiro:

"o processo para ocultar ou dissimular o produto de crime, movendo os recursos gerados por meio de operações comerciais aparentemente legais, na tentativa de dar aparência lícita à sua origem delituosa. Emprega-se o termo inglês Trade-based Money Laundering (TBML) para designar tal processo."

Ainda, segundo Roberto Leonel de Oliveira Lima, os principais métodos de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores podem ser feitos de forma a não causar suspeitas ou irregularidades já que tem aparência lícita, e podem ser feitos através de:

  • NEGÓCIOS LEGÍTIMOS
  • OPERAÇÕES ENVOLVENDO PARAÍSOS FISCAIS
  • TRANSAÇÕES DE COMPRA E VENDA DE ATIVOS
  • COMÉRCIO DE BENS E/OU SERVIÇOS

Os lavadores se utilizam dos mais diversos meios para atingirem seus objetivos escusos, através de dissimulações, transferências de valores que tem aparência lícita, fraudes, ocultações e outras formas.

O Egmont Group, que é um grupo internacional que agrega 165 Unidades de Inteligência Financeira, tem uma plataforma para trocar experiências e inteligência financeira com segurança no combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. Em sua página publicam a sua definição sobre a lavagem de dinheiro:

"Lavagem de dinheiro é o método pelo qual criminosos disfarçam a origem ilegal de sua riqueza e protegem suas bases financeiras, sem deixar evidências ou rastro do caminho percorrido pelos ilícitos para não serem incriminados pelas agências de controle e aplicação da lei." (tradução livre) [17]

Mark Pieth, em seu artigo Criminalizing the Financing of Terrorism, opina:

"seguir o caminho do dinheiro seria o meio mais eficaz para descobrir a atividade terrorista. Até agora, entretanto, ainda não ocorreu essa oportunidade, e, os prestadores de serviços financeiros argumentam que, no máximo, eles poderão rastrear os nomes dos criminosos através de listas (mas não estão convencidos se vale a pena correr esse risco.)" (tradução livre) (PIETH, 2006, p.1074).18

A expressão "lavagem de dinheiro" exprime claramente o que realmente é: dinheiro sujo, obtido de forma ilícita, que precisa ser reciclado para se tornar utilizável precisa ser "lavado" para se tornar legal, com aparência de limpo, lícito.

É necessário que os novos valores estejam desvinculados de sua origem. Dessa forma, não causarão suspeitas, já que esses recursos não aparentam origem ilegal.

Assim, os lucros oriundos das atividades criminosas são disfarçados e diluídos em transações acima de qualquer suspeita.

A publicação do Ministério da Justiça informa que, "em 2007, por ocasião dos 10 anos de atividade do DRCI foi instalado o primeiro Laboratório de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro (LAB-LD), na estrutura do DRCI/SNJ e, a partir de 2009, o Ministério da Justiça iniciou um processo de replicação do modelo em vários órgãos que atuam no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Composta atualmente por 24 unidades, a Rede Nacional de Laboratórios contra Lavagem de Dinheiro (Rede-LAB), coordenada pelo DRCI/SNJ, alcançará, até o final de 2014, todos os estados do país e totalizará 43 unidades em funcionamento." [19]

Conforme Dipp,20 (DIPP, 80 p) A Lei nº. 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro) foi a que primeiro disciplinou o tema no art. 25 e § 2º (...nos crimes previstos nesta lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços).

A Lei nº. 8.072/90 (crimes hediondos) dispôs no art. 8º e § único ("o participante e o associado que denunciar a autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços"). A Lei nº. 8.137/90 (crimes tributários) estabeleceu no art. 16, § único ("nos crimes previstos nesta lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços"). A Lei nº. 9.034/95 que trata das organizações.

Dipp também enfatiza o Art. 1º, §2º, Incisos I e II da Lei 12.850/13, que prevê:

§ 2o Esta Lei se aplica também:

I - às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

II - às organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer em território nacional.

Ariane Bulla Jaquier nos diz que ... deve-se evitar que o crime seja um negócio lucrativo. Não basta a identificação e a condenação penal dos criminosos, faz-se fundamental a recuperação do dinheiro. Uma vez que a lavagem de capitais presta-se, simultaneamente, a negar o crime antecedente e a tornar possível o gozo dos ganhos obtidos ilicitamente, verificase que a punição só será realmente efetiva se houver o confisco dos proveitos e instrumentos do crime.

2.3. FASES DA LAVAGEM:

As organizações que usam o sistema financeiro, na maioria das vezes se utilizam o sistema para fazer operações de câmbio, remessas para o exterior, utilizando a moeda local ou criptoativos. O dinheiro também é lavado através de transações comerciais, com a compra de bens, móveis ou imóveis, terras, obras de arte, animais de raça, e outros, e até na criação de bancos próprios onde possam disfarçar, sem chamar atenção, suas entradas financeiras provenientes das atividades ilícitas.

Esses indivíduos geralmente um comprador, tem interesse em negociar no mercado imobiliário adquirindo propriedades que terão sempre um valor alto de venda. Preferem comprar à vista, e, quase sempre, negociando o valor em espécie, ou seja, em dinheiro vivo para evitar que possam ser rastreados pelo sistema financeiro.

Empresas de fachada são criadas. Elas são legalmente constituídas e aparentam uma atividade legal. Entretanto, quando se fiscalizam essas empresas percebe-se que foram criadas para contabilizar os ganhos com as atividades ilegais. Muitas vezes os recursos lícitos e ilícitos se mesclam, se confundem, dificultando sua fiscalização.

A doutrina majoritária destaca 3 (três) fases: [21]

  • ocultação da origem do dinheiro
  • dissimulação da conduta para ocultar a ilicitude do dinheiro
  • inserção do dinheiro ilícito no sistema econômico.

Conforme a publicação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, "a colocação, ocultação, conversão ou placement é a primeira etapa da lavagem de dinheiro, concentra - se em inserir recursos em espécie de origem ilícita no sistema econômico e colocálos em movimento."

De acordo com a COAF, a colocação é a primeira etapa da lavagem de dinheiro, inserindo o dinheiro no sistema econômico com o objetivo de ocultar a sua origem. [22]

Na segunda etapa há a dissimulação ou ocultação o mascaramento (Callegari)* ou layering*, que compreende a fase de disfarçar a origem ilícita e dificultar a reconstrução pelas agências estatais de controle e repressão da trilha de papel (paper trail) [23], seguindo o que Antônio Sérgio A. de Moraes Pitombo chama de outro passo no processo de lavagem. [24]

Ou seja, a dissimulação consiste em realizar uma série de operações financeiras para encobrir o início do enriquecimento criminoso.

A terceira e última fase, se caracteriza pelo ato final da lavagem [25] (BADARÓ, Páginas 32-33.). O sistema econômico absorve aqueles recursos e não há como rastreá-los, pois não guarda mais qualquer vestígio ou relação com a atividade criminosa, [26] (BADARÓ, páginas 32-33), e o lavador passa a usufruir dos lucros. De acordo com o COAF, As organizações criminosas buscam investir em empreendimentos que facilitem suas atividades podendo tais sociedades prestar serviços entre si. [27]

2.4. PRODUTO DO CRIME:

Conforme o item anterior, para disfarçar ou encobrir os recebíveis ilícitos, esses indivíduos aplicam seus recursos em ativos legais, normalmente produtos de alto valor e, que, posteriormente poderão ser negociados com preços altos devido às características valorosas desses bens. Um dos produtos de alto valor seria o negócio de compra e venda de pedras e metais preciosos.

Conforme o artigo publicado no IPLD, de autoria de Manuel Bermejo Fletes, esse é um negócio caracterizado pelo alto valor transacional. Um único diamante, por exemplo, pode ter o seu valor calculado em milhões de dólares e a pedra pode ser facilmente transportada através das fronteiras. Essas características tornam as pedras e metais preciosos uma mercadoria vulnerável à exploração por organizações criminosas e grupos terroristas com o objetivo de transferir valores ou legitimar transações ilícitas e lucros. [28]

Ainda, segundo Fletes, esse negócio não tem risco e pode ser usado facilmente com a finalidade da lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. É um produto de fácil armazenamento, de grande liquidez, o seu transporte não requer grandes investimentos ou dificuldades pois são produtos de tamanho pequeno, mas de grande valor, e, portanto, atraem aqueles que desejam uma liquidez imediata. Além do mais, elas não se depreciam como outros produtos que se desvalorizam com o passar do tempo, além de terem outras peculiaridades que fazem das pedras preciosas e metais valiosos moeda de troca de grande liquidez.

Outro ativo também muito usado é a operação dólar-cabo. No artigo de Direito Econômico Operação dólar-cabo é evasão de divisas?, de Angelo Gabriel Gramlich Pereira, publicado em 12 de junho de 2020, no Canal de Ciências Criminais [29], ele informa que "O dólar- cabo normalmente é utilizado por quem possui numerário financeiro de origem ilícita e, para poder utilizá-lo de alguma forma, o envia a outro país por meio da operação financeira em comento por não ter a possibilidade de enviá-lo utilizando-se de instituições autorizadas pelo Banco Central, dada a ilicitude do dinheiro".

Normalmente quem funciona como intermediário desta transação são os chamados doleiros que têm seus correspondentes, também doleiros, em outros países. Eles receberão essas remessas e as utilizarão na abertura de contas bancárias legais em outros países.

Ainda no artigo de Pereira, ele informa que o glossário do Banco Central do Brasil assim define essa operação: "dólar-cabo consiste na prática de negociar dólar no mercado paralelo para depósito em instituição no exterior".

Outro bem de inestimável valor para os criminosos que lavam dinheiro é a compra de imóveis de alto luxo. Essas transações muitas vezes são feitas por intermediários, os corretores de empresas legais, que não causam qualquer suspeita ou desconfiança. Para disfarçar, esses imóveis são declarados e registrados com valores supervalorizados, tornando a operação fraudulenta pois, na declaração desses bens ao fisco encobrem as negociações escusas.

Como também observa Manuel Bermejo Fletes em seu artigo publicado no IPLD "Tipologia: A interseção entre o crime de lavagem de dinheiro e a venda de imóveis", "Outro fator importante é que o imóvel pode proteger o proprietário das flutuações da moeda e da instabilidade do mercado. De acordo com o Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional), cerca de 30% dos ativos recuperados pelo crime organizado internacional são provenientes de propriedades imobiliárias." [30]

Com as inovações promovidas pelo Pacote Anticrime dada pela redação Reforma da Parte Geral do Código Penal de 1984, o art. 91, passou a prever as seguintes condenações aos criminosos:

Art. 91 - São efeitos da condenação: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;

b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso. § 1º Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior. (Incluído pela Lei nº 12.694, de 2012)

Art. 91-A. Na hipótese de condenação por infrações às quais a lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele que seja compatível com o seu rendimento lícito. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

§ 5º Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos crimes. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Outros bens que também são utilizados pelas organizações criminosas são a compra de lanchas, automóveis de luxo, motos, cigarros. Esses bens atraem esses indivíduos pois são produtos que também são facilmente negociáveis.

Conforme o Portal da Revista Veja [31], na matéria de Eduardo Gonçalves, de 26 de agosto de 2020, "A Polícia Federal de Pernambuco ainda está contabilizando todos os bens apreendidos do crime organizado durante a megaoperação Além-Mar. Por enquanto, o que foi levantado até a data da matéria, essa apreensão rendeu mais de 55 milhões de reais provenientes de quatro aeronaves, quatro helicópteros, quatro embarcações, duas motos aquáticas e mais de 130 veículos, entre caminhões e carros."

Outra notícia, do Portal da G1 de 19/09/2013,32 a polícia federal fez prisões e apreensões do Distrito Federal e em outros 9 estados do país. Os alvos eram quadrilhas de lavagem de dinheiro e desvio de recursos.

O G1 informou que, "De acordo com a PF, o objetivo da operação, batizada de Miquéias, é desarticular duas organizações criminosas com atuações distintas: uma envolvida em lavagem de dinheiro e a outra acusada de má gestão de recursos de entidades previdenciárias. Os líderes das duas organizações ficavam no Distrito Federal, segundo a polícia. Os presos devem responder por gestão fraudulenta, operação desautorizada no mercado de valores mobiliários, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e falsidade ideológica.

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Sobre a autora
Angelina Lago Alonso Smid

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília - IESB.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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