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Análise da investigação preliminar de acordo com seus possíveis titulares

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22/02/2007 às 00:00

Resumo:

• A investigação criminal é um procedimento pré-processual com o objetivo de averiguar um delito e sua autoria, fornecendo elementos para a propositura ou arquivamento da ação penal.


• A natureza jurídica da investigação criminal é administrativa, podendo envolver atos judiciais e jurisdicionais, mas sem representar uma relação processual completa.


• A finalidade da investigação é averiguar os fatos criminosos, buscando a verdade dos acontecimentos e não apenas preparando uma futura ação penal.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4- SUGESTÕES PARA UM SISTEMA COMPATÍVEL COM A NOSSA CARTA MAGNA.

           Conforme já abordado, a Carta Magna adotou o sistema acusatório. Aliás, a postura constitucional em face do processo penal não poderia ser outra, eis que o sistema acusatório é a expressão da democracia, que, por sua vez, se revela presente no Estado Democrático de Direito (32).

           Por outro lado, por mais que a noção de sistema inquisitivo ou acusatório esteja atrelada a noção de processo judicial, e não a de outros expedientes jurídicos de natureza diversa, entendemos que o inquérito policial é o sistema investigativo que mais se coaduna com o formato acusatório, tendo em vista a desconcentração de poderes.

           Nesse diapasão, teríamos a atuação de três sujeitos, quais sejam, autoridade policial imparcial, titular do direito potencial de acusar e o investigado (33).

           De igual maneira, não obstante defendermos reformas pontuais em nossa legislação processual, sobretudo na fase preliminar, entendemos que o problema que assola a investigação não é somente de cunho normativo, mas sim no plano da efetividade (34) das normas.

           O atual modelo investigativo pátrio não precisaria passar por uma grande reformulação legislativa, mas tão somente por uma real implementação das legítimas funções de seus atores.

           A condução da investigação pode perfeitamente continuar nas mãos dos delegados de polícia, pois estes, como os juizes e promotores, são bacharéis em Direito e submetem a uma difícil prova para ingresso na carreira. Ressalta-se, porém que maior eficiência (35) teria sua atuação se o mesmo tivesse garantias constitucionais, mormente a inamovibilidade (36).

           No que tange ao promotor, no plano normativo, entendemos que suas funções durante as fases da persecução penal já estão bem delineadas pela Magna Carta, quais sejam, exercer o controle externo da atividade policial e promover ação penal.

           De outra parte, resta claro que sua simples designação como titular da investigação preliminar não iria resolver os problemas desse procedimento, podendo, quiçá, criar outros de natureza vultuosa, como, por exemplo, o comprometimento e desequilíbrio do sistema processual.

           Logo, o que se propõe é uma atuação mais integrada entre a instituição policial e o promotor, devendo este implementar as atividades discriminadas na Lei Complementar 75 (37) concernentes ao acompanhamento efetivo da investigação criminal (38), e não a uma simples revisão ao final deste procedimento.

           Para que ocorra esse desiderato, deverá haver um entrosamento perfeito entre essas instituições, como, por exemplo, disponibilidade dos registros de fatos criminosos por parte da autoridade policial ao promotor, podendo este requisitá-los de acordo com sua conveniência.

           Cabe ressaltar que no processo penal constitucional brasileiro, o parquet afastado da direção da investigação, terá melhores condições de analisar a conveniência e a legalidade da mesma, podendo, para isso, provocar a atuação do judiciário em caso de vícios.

           No que tange ao juiz, preservando sua imparcialidade, estaria vedada sua interferência na fase da investigação, só devendo agir, mediante provocação, quando houver medidas constritivas de direitos fundamentais, tais como, prisão cautelar, arresto ou, ainda, por ocasião do arbitramento de uma fiança.

           Por fim, não poderíamos deixar de lado a defesa, que, por mais que não tenha uma atuação considerável na primeira fase da persecução, não é de toda afastada sua atuação.

           Com efeito, por mais que o inquérito policial não possa gerar um juízo de condenação, e tão-somente embasar uma futura ação penal, vários aspectos negativos podem advir desta fase, como, por exemplo, a já citada estigmatização social e jurídica geradas.

           Logo, se o jus libertatis está protegido inteiramente na fase processual, não pode ser completamente desprezado durante a primeira etapa da persecução penal (39).

           Assim, a partir do momento que alguém figure como indiciado, terá a seu alcance as prerrogativas da ampla defesa, inerentes ao "acusados em geral", conforme alude o art. 5º, inciso LV da Carta Magna (40).


NOTAS

  1. Ao contrário do que muitos pensam, a investigação não visa tão somente obter indícios para a acusação, mas sim apurar a verdade, seja ela a favor da acusação ou da defesa. (CABETTE, Eduardo Luiz Santos. O papel do inquérito policial no sistema acusatório – O modelo brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, 2003, p. 197).
  2. Por ter caráter discricionário, a investigação não segue um procedimento onde seus atos tendem a ter uma seqüência pré-fixada pela lei.
  3. Ao contrário do processo que a regra é a publicidade, no inquérito o que impera é o sigilo de seus atos.
  4. LOPES JR, Aury. Sistema de investigação preliminar no processo penal, 2ª. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 100-101.
  5. Ibid. p. 109
  6. Neste sentido, Tourinho Filho, sobre o inquérito policial, que é uma das espécies de procedimento investigativo, aduz que o mesmo visa à apuração da existência de infração penal e à respectiva autoria, a fim de que o titular da ação penal disponha de elementos que o autorizem a promovê-la. (Processo Penal, v. I, 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000). Na mesma linha, José Frederico Marques, asseverando acerca do inquérito como um procedimento administrativo-persecutório de instrução provisória, destinado a preparar a ação penal (grifou-se) ( Elementos de Processo Penal, V. I, Campinas: Bookseller, 1997, p. 148-149)
  7. ROVEGNO, André. O Inquérito Policial e os Princípios Constitucionais do Contraditório e da Ampla Defesa, Campinas: Bookseller, 2005, p. 139.
  8. Ibid . p. 135.
  9. LOPES JR, Aury ,Op.cit.,p. 50.
  10. Ibid p.51-52
  11. Ibid p. 56
  12. Ibid.,p.72
  13. França e Espanha, dentre outros adotam os Juizados de Instrução.
  14. A autoridade policial, em regra, é carente de diversas garantias, tais como, inamovibilidade e prerrogativa de foro.
  15. GOMES, Luiz Flávio Juizes não devem investigar crimes. Publicado em http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Artigo_Detalhar&did=16115, acessado em 25 de Novembro de 2005.
  16. Item IV da exposição de motivos do nosso Código de Processo Penal "O preconizado juizado de instrução, que importaria limitar a função da Autoridade policial a prender criminosos, averiguar a materialidade dos crimes e indicar testemunhas, só é possível sob a condição de que as distâncias dentro do seu território de jurisdição sejam fácil e rapidamente superáveis. Para atuar proficuamente em comarcas extensas e posto que deva ser excluída a hipótese de criação de juizados de instrução em cada distrito, seria preciso que o Juiz instrutor possuísse o dom da ubiqüidade".
  17. Nesse sentido, podemos verificar essa atuação na Itália, Alemanha e em Portugal (RANGEL, Paulo, Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público - visão crítica, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 147-156).
  18. Esse magistrado atua como um verdadeiro órgão suprapartes, e é também denominado de juiz garante (Lopes Jr, Op. cit. p. 86)
  19. Já manifestamos nosso entendimento que a finalidade da investigação preliminar é a averiguação do fato tido como delituoso e não simplesmente preparar a ação penal.
  20. LOPES JR, Aury, Op.cit., p.89
  21. Sobre os graus de cognição, consultar item 2.3 desta obra.
  22. Nessa esteira, não se pode afirmar que exista uma subordinação funcional em relação aos juizes e promotores (LOPES JR, Aury, Op.cit., p. 63).
  23. Discorrendo sobre a figura desta autoridade, Eduardo dos Santos Cabette assevera que Nesse contexto, destaca-se a figura do Delegado de Polícia como bacharel em Direito, constituindo-se uma vantagem qualitativa da polícia brasileira em relação às alienígenas (Op. cit. p. 198).
  24. LOPES JR, Aury, Op.cit., p. 64-65.
  25. Exposição de motivos do Código de Processo Penal "Para atuar proficuamente em comarcas extensas e posto que deva ser excluída a hipótese de criação de juizado de instrução em cada distrito, seria preciso que o Juiz instrutor possuísse o dom da ubiqüidade".
  26.  
  27. FERREIRA, Orlando Miranda. Inquérito Policial e o ato normativo 314 - PGJ/CPJ, Revista Brasileira de Ciências Criminais, V.45, 2004, p. 259.
  28. Nesse sentido, a Itália rompeu com o juizado de instrução em 1988, assim como Portugal o fez em 1987.
  29. No Brasil, em grande parte dos estados, a disciplina Medicina Legal consta como matéria obrigatória ao concurso ao cargo de delegado de polícia, o que não ocorre nos certames às carreiras de promotor e juiz.
  30. ROVÉGNO, André. Op. cit. p. 117.
  31. LOPES JR, Aury, A Crise do Inquérito Policial: breve análise dos sistemas de investigação preliminar no Processo Penal disponível em http://www.aurylopes.com.br/art0006.html, acesso em 29 de novembro de 2005.
  32. PRADO, Geraldo, Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis processuais penais, 2ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 152.
  33. ROVÉGNO, André, Op. Cit. p. 240
  34. Sobre efetividade das normas, ver Luis Roberto Barroso, O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas, Rio de Janeiro; Renovar, 7ª. ed, 2003.
  35. Nesse sentido, ROVEGNO, André, Op. Cit, p. 146, nota n. 214, A falta de instrumentos de garantias da independência funcional tem conduzido, algumas vezes, à distorção de fazer-se de um órgão vocacionado a servir inflexivelmente à verdade – o que se maximamente salutar para os interesses de um Estado Democrático de Direito – um agente comprometido com a indicação de "culpados" com os riscos que todos nós conhecemos e que a imprensa não tem hesitado em demonstrar, produzindo máculas indesejáveis aos direitos individuais.
  36. Cabe ressaltar que a falta desta garantia não é motivo suficiente para a mudança na direção da investigação, conforme já aduzido.
  37. "Art. 9º- O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de medidas judiciais e extrajudiciais, podendo:
  1. ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais
  2. ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial
  3. representar à autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder.
  4. requisitar à autoridade competente a instrução de inquérito policial sobre a omissão ou o fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial.
  5. promover a ação penal por abuso de poder".
  1. Indo ao encontro desse pensamento, dando mais efetividade ao controle externo da atividade policial, está o artigo 5º, §6º do projeto de reforma do Código de Processo Penal, explicitando uma das medidas que a o delegado deve tomar diante da notícia de um fato criminoso."Tomando conhecimento da ocorrência, a autoridade policial fará, imediatamente, o seu registro, que ficará à disposição do Ministério Público, podendo este requisitá-lo periódica ou especificamente".
  2. ROVEGNO, André. Op. Cit, p. 59
  3. Esse, inclusive, é o que propaga o atual projeto de reforma de nosso Código de Processo Penal em sua exposição de motivos. "A defesa é assegurada a partir do momento em que o investigado passa à condição de indiciado".

Referências bibliográficas:

          CABETTE, Eduardo Luiz Santos. O papel do inquérito policial no sistema acusatório – O modelo brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, 2003.

          FERREIRA, Orlando Miranda. Inquérito Policial e o ato normativo 314 - PGJ/CPJ, Revista Brasileira de Ciências Criminais, V.45, 2004.

          FILHO, Tourinho, Processo Penal, v. I, 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

          GOMES, Luiz Flávio Juizes não devem investigar crimes. Publicado em http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Artigo_Detalhar&did=16115, acessado em 25 de Novembro de 2005.

          LOPES JR, Aury. Sistema de investigação preliminar no processo penal, 2ª. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.

          ________ A Crise do Inquérito Policial: breve análise dos sistemas de investigação preliminar no Processo Penal disponível em http://www.aurylopes.com.br/art0006.html, acesso em 29 de novembro de 2005.

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          MARQUES, José Frederico, Elementos de Processo Penal, V. I, Campinas: Bookseller, 1997.

          PRADO, Geraldo, Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis processuais penais, 2ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.

          RANGEL, Paulo, Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público - visão crítica, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.

          ROVEGNO, André. O Inquérito Policial e os Princípios Constitucionais do Contraditório e da Ampla Defesa, Campinas: Bookseller, 2005.

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Sobre o autor
Claudio Geoffroy Granzotto

advogado da União no Rio de Janeiro (RJ), especialista em Direito Penal e Processo penal pela UERJ

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GRANZOTTO, Claudio Geoffroy. Análise da investigação preliminar de acordo com seus possíveis titulares. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1331, 22 fev. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9522. Acesso em: 22 dez. 2024.

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