A responsabilidade civil por danos ao meio ambiente é tema controvertido no âmbito do Direito Ambiental, sendo relevante destacar a contribuição do Superior Tribunal de Justiça na evolução da proteção ao ambiente, uma vez que a interpretação dada à legislação ambiental pátria pela Corte vem ampliando as possibilidades de reparação dos danos ambientais.
Cumpre destacar que a reparação do dano ambiental encontra fundamento na Constituição Federal, especificamente no seu artigo 225, §3º:
3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados
Pela leitura do dispositivo constitucional, pode-se inferir que inexiste bis in idem na aplicação das sanções penais e administrativas, aplicadas de forma conjunta com a reparação dos danos ambientais. Assim, a independência das instâncias é a regra no ordenamento nacional.
Não custa registrar que, conforme a sistemática do Código Civil, a indenização apenas tem o escopo de recompor o bem jurídico lesado, não tendo geralmente caráter sancionatório e pedagógico. Frederico Amado defende que tal regime jurídico não se revela adequado à proteção ambiental, pois não atende ao Princípio da Prevenção.
No plano infraconstitucional, a Lei nº 6.938/1981, Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, especificamente em seu artigo 14, §1º, prevê que o poluidor é obrigado a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente, independente de culpa:
§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Assim, da conjugação do dispositivo legal supramencionado com as lições da doutrina, a responsabilidade por dano ambiental é objetiva independe de culpa ou dolo - e orientada pela teoria do risco integral, de modo que não se admite excludentes do dever de indenizar (culpa de terceiros, força maior, caso fortuito). Para que fique configurada a responsabilidade de indenizar, basta a combinação de três elementos: dano, ação ou omissão do agente e o nexo causal (fator aglutinante entre os dois primeiros).
Adiante com a análise, o conceito de poluidor indireto dado pelo Superior Tribunal de Justiça, com base no artigo 3º, inciso IV, da PNMA, é bastante extenso, equiparando quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa de fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando os outros fazem.
Nesse escopo está situada a conduta estatal ou sua omissão. Explica-se. O Estado tem o dever de fiscalizar as atividades potencialmente causadoras de dano ambiental. Em caso de omissão no exercício de fiscalização ambiental (concessão de licença ambiental irregular, ausência de fiscalização em determinado empreendimento poluidor etc.), configurado o dano ambiental, surge para o ente estatal a obrigação de indenizar. Ressalte-se que os últimos precedentes do STJ vão no sentido de que a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva, seja decorrente de ações, seja de omissões.
O fundamento constitucional para a responsabilidade do Estado por omissão no dever de fiscalização encontra-se no artigo 225 da Constituição Federal, caput. Conforme o dispositivo, o Poder Público deve defender o ambiente, a fim de preservá-lo para as atuais e futuras gerações, dando efetividade ao Princípio do Desenvolvimento Sustentável.
Feitas tais considerações, e levando-se em conta o recente entendimento do STJ, cristalizado na Súmula 652, pode-se registrar que a responsabilidade do Estado por dano ao meio ambiente decorrente da sua omissão é objetiva, solidária (pois enquadrado no extenso conceito de poluidor indireto), mas de execução subsidiária. Esse último aspecto evidenciado no enunciado sumular em questão nos permite designar o Estado como devedor reserva.
Aqui um aspecto interessante merece realce: o ente estatal integra o título executivo como devedor reserva, ou seja, somente é chamado a pagar se o degradador original (poluidor direto, aquele que praticou a conduta poluidora) não o fizer. Caso o débito público não tivesse o caráter da subsidiariedade, a sociedade seria duplamente onerada, seja com as consequências do dano ambiental, seja com o pagamento relativo ao ressarcimento do dano, efetivado com dinheiro público.
Assim, incumbe ao degradador principal recuperar integralmente o meio ambiente afetado e/ou indenizar pelos prejuízos causados. Na eventualidade de o ente público ser obrigado a indenizar (por insolvência do degradador original), como devedor subsidiário, terá direito de regresso contra o poluidor principal, podendo valer-se, inclusive da desconsideração da personalidade jurídica.
Referências
Súmula 652 do STJ: A responsabilidade civil da Administração Pública por danos ao meio ambiente, decorrente de sua omissão no dever de fiscalização, é de caráter solidário, mas de execução subsidiária. Diário da Justiça eletrônica de 2021.
BRASIL, Constituição da República Federativa do. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 17 fev. 2022.
BRASIL, Lei nº 6.938/1980. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm . Acesso em 17 fev. 2022.
Recurso Especial nº 650.728/SC. Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 23/10/2007.
AMADO, Frederico Augusto di Trindade. Direito ambiental esquematizado. São Paulo: Método. 2013.