A educação domiciliar está em evidência na opinião pública. O Projeto de Lei n° 2.401/19 que regulamenta a prática do homeschooling, formulado pelo governo federal, está aprovado na Camara Federal, após consenso inédito entre os deputados, nesta ultima quinta-feira (19). Ficará restando tramitação no Senado e posterior sanção presidencial. Mas o sinal dado pelos deputados foi claro.
E por aqui começo a questão.
Pergunto, como é possível os deputados aprovarem um projeto de lei que trate de matéria inconstitucional ou ilegal? Não é. A constitucionalidade é questão de ordem primordial, e pode ser sucitada a qualquer momento. E não há indício dela no caso quando se considera questões elementares da nossa ordem atual.
Por ordem de relevância, temos três elementos essenciais: Texto Constitucional, Jurisprudência do STF e movimentação legislativa.
O primeiro possui a maior importância.
Atualmente, a nossa inchada Constituição não se restringe aos seus 250 artigos. E mesmo neles, há afirmação (art. 205) de que o dever de prover educação às crianças é conjunto entre Estado e família.
Contudo, desde a promulgação em 1988, já contamos 106 emendas a esta mesma Constituição. E por causa de alguns princípios de nosso sistema constitucional, os tratados internacionais que o Brasil assine e que tenham como objeto direitos humanos, são integrados ao nosso ordenamento com status supralegal via emendas à Constituição.
Note-se, que o Brasil assinou nas últimas décadas, pelo menos, quatro acordos internacionais relevantes sobre direitos da infância, educação e afins. Destaco apenas um: a Convenção sobre os Direitos das Crianças (1990), pois nele há uma passagem luminar: (...) Caberá aos pais, ou quando for o caso, aos representantes legais, a responsabilidade primordial pela educação e pelo desenvolvimento da criança (BRASIL, 1990).
Em última análise, essa convenção faz parte da nossa Constituição. Ora, a Carta Magna está acima de todas as outras leis no Brasil, logo, conclui-se que o direito dos pais escolherem a melhor forma de educarem seus filhos está amparada na maior das leis no país.
Além disso, temos a recente pronúncia do STF sobre o assunto.
Em 2018, o Supremo julgou um mandado de segurança impetrado por uma família do interior do RS pedindo reconhecimento de liquidez e certeza do seu direito à prática da educação domiciliar.
Na ocasião, o Supremo afirmou que acima corroboramos: a educação domiciliar é constitucional. Entretanto, em diversas passagens da decisão estavam presentes algumas máculas indevidas contra a prática, que são propagadas em todo o país pelos adversários da modalidade. Falou-se em ilegalidade da prática, em prejuízos a formação do estudante, entre outros. Ao final, foi afirmada a necessidade do poder legislativo formular lei regulamentadora da atividade.
Entretranto, a afirmação de constituicionalidade foi feita, e esse foi o maior trunfo.
Por fim, reconsidere-se a recente movimentação legislativa aduzida no início deste artigo. E retomo a questão: como é possível os deputados aprovarem um projeto de lei que trate de matéria inconstitucional ou ilegal? Resposta óbvia, não é possivel.
Todavia, o que o autor destas linhas tem testemunhado como defensor de famílias que são objeto de denúncias feitas por escolas, parentes e colegas contra as familias, é chocante. Fazem-no por causa destas estarem simplesmente exercendo este direito constitucional aos seus filhos, sob o pretexto de configuração do crime de abandono intelectual (art. 246, CP).
O que mais impressiona é o crédito dado por autoridades diversas a essas denúncias. E demonstra um indicativo claro de que há muito o que avançar no que diz respeito a superação dos paradigmas educacionais no Brasil. Mesmo com o surgimento de lei regulamentadora, a mentalidade não dá sinais de evolução.