A Colenda Segunda Câmara do Tribunal de Justiça do RGS, quando de regime de exceção (Apelação 697119840, Rel. José Antônio Cidade Pitrez), anulou julgamento do Tribunal do Júri de Gaurama, com fundamento na "ausência de quesitação do excesso culposo", por considerá-lo obrigatório, apesar de os jurados, no exame da excludente da legítima defesa, haverem negado a "atualidade" ou "iminência" da agressão.
Ao examinar-se a legítima defesa, necessário distinguir-se "situação de legítima defesa" e "ação em legítima defesa".
A primeira, "situação de legítima defesa", está para a segunda, "ação em legítima defesa", em uma relação de "causa jurídica" e "conseqüência jurídica" possível.
Só quando, mas sempre que, se verifique uma verdadeira "situação de legítima defesa", é que há lugar ao exercício do direito de legítima defesa, é que existe a possibilidade de uma "ação em legítima defesa".
Na dicção do art. 25 do Código Penal, a "situação de legítima defesa" compreende a presença de uma agressão injusta, atual ou iminente, a direito próprio ou de terceiro.
A "ação em legítima defesa", por sua vez, e à luz daquele mesmo dispositivo, deve compreender a necessariedade dos meios de defesa empregados e a moderação no uso desses meios. Em se tratando de fato típico doloso, também exigível o elemento subjetivo como um dos ingredientes da "ação em legítima defesa".
Presentes os requisitos caracterizadores da "situação de legítima defesa" e os da "ação de legítima defesa", perfectibilizada estará a excludente. O fato, apesar de típico, não se constituirá em infração penal, porque lícito, permitido, justificado pela ordem jurídica.
Fala-se em excesso na legítima defesa quando a reação ultrapassa, dolosa ou culposamente, os limites legais estabelecidos para a excludente, , ou porque desnecessário o meio defensivo escolhido (poderia o agente valer-se de meio de igual eficácia para cessar o ataque mas menos lesivo do que o escolhido, que se mostra, assim, "desnecessário" frente à gravidade da agressão), ou porque, apesar da adequada escolha, o uso do meio foi além do necessário para cessar a agressão e evitar a lesão ao bem jurídico injustamente agredido (o agente deveria defender-se atuando de forma proporcionada à agressão).
Por derivar da reação, o ir além defensivo pressupõe, evidentemente, uma "situação de legítima defesa". Se não há agressão, não há defesa nem se poderá considerá-la excessiva. Se agressão houver, mas pretérita em relação ao tempo da repulsa, de excesso também não se falará. Se atual ou iminente, mas não injusta, por igual não haverá ação de legítima defesa, e, por conseqüência, inexistirá espaço a considerações a respeito de excesso defensivo.
Verifica-se, assim, o desacerto técnico do julgado acima referido.
Se os jurados não reconheceram a nota temporal da agressão, a "situação de legítima defesa" não se completou, pelo que o efeito jurídico "ação em legítima defesa" não se produziu, não havendo condições a que se pudesse cogitar de uma "excessiva" ação em legítima defesa, de modo a submeter ao júri o quesito do "excesso culposo".
A advertência é doutrinária. Pertence a Taipa de Carvalho: "O exercício da legítima defesa pressupõe, como qualquer outra causa de justificação, uma determinada situação: a "situação de legítima defesa". E tanto a lógica como a metodologia jurídica exigem uma acentuada atenção na caracterização dos pressupostos ou elementos constitutivos de uma "situação de legítima defesa", pois, a existir realmente, permite e justifica a prática da "ação de legítima defesa", o exercício do direito de legítima defesa".