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Direito ambiental e populações tradicionais

Direito ambiental e populações tradicionais

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Resumo: Está emergindo uma nova tendência no Direito Ambiental, que seria adequado chamar de Socioambiental, no qual as populações tradicionais assumem um papel fundamental enquanto aliadas na luta pelo desenvolvimento sustentável. Este artigo evidencia os motivos pelos quais essas populações não podem mais ser ignoradas, tanto da perspectiva jurídica, política, social ou econômica.

Sumário: 1. Introdução. 2. Evolução dos direitos humanos rumo à diversidade. 3. Direito e populações tradicionais. 4. Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. 4. Conclusão. 5. Referências bibliográficas.


INTRODUÇÃO

Uma oportuna correlação entre cultura e natureza foi realizada por Darrell Posey a partir do conceito de Direito dos Recursos Tradicionais. No entender de Posey, os recursos tradicionais dizem respeito tanto ao conhecimento quanto aos recursos naturais, comportando uma síntese cuja percepção é hoje fundamental. Há pertinência dos direitos das minorias dentro da tradição moderna de direitos, a qual pode ser avaliada enfocando-se a evolução por que passaram os direitos rumo à noção de diversidade cultural e ambiental.


EVOLUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS RUMO À DIVERSIDADE

Os direitos têm, sem dúvida, historicidade. Uma das formas de compreendê-la consiste em explicar os direitos conforme o movimento das forças sociais. Desta maneira, é comum classificar direitos como de primeira, segunda e terceira gerações. Mas então alguém poderia perguntar: não havia direitos antes dos direitos de primeira geração? Certamente não existiam direitos universais. Os direitos nas sociedades pré-modernas eram mais privilégios de determinadas categorias de indivíduos do que prerrogativas expansíveis às coletividades.

O projeto universal de direitos surge com a ascensão da burguesia ao poder. A partir de então, cada geração de direitos abre caminhos e condiciona a próxima. Cada onda é movida por um sujeito político particular e a produção jurídica se incorpora ao patrimônio comum. Assim, resumidamente, pode-se dizer que a primeira geração teve como sujeito histórico a burguesia, que liderou a luta das diversas camadas desfavorecidas da sociedade pelas liberdades negativas. Em seguida, e em decorrência do capitalismo, da expropriação dos camponeses e da formação da classe operária, foi a vez da luta e da conquista dos direitos sociais, visando a redução das desigualdades econômicas. Em outras palavras, liberdades substanciais. Seu sujeito histórico foi a classe trabalhadora.

Durante o século XX, em especial após a Segunda Guerra e os anos 1960, as sociedades industrializadas alcançaram uma prosperidade inigualável, fruto de condições econômicas e sociais favoráveis, assentadas no pacto social entre capital e trabalho. O alto índice de produtividade foi capaz de promover um aumento de empregos, de renda, de lucros, em suma, de bem-estar. As mulheres conquistaram espaço no mercado de trabalho e na esfera política. Este foi o suporte político e social do Estado de bem-estar europeu e do seu correspondente na América Latina, o Estado desenvolvimentista. Diversos direitos sociais foram ampliados, favorecendo a integração à sociedade assalariada de parcelas da população antes marginalizadas, a partir de então tendo acesso à educação e saúde públicas e à previdência social.

É importante ressaltar que os direitos nunca deixam de se expandir ou de se retrair, conforme o jogo das forças da sociedade. Assim, hoje, mesmo após o banimento de sua previsão jurídica em todos os países, ainda existe escravidão. Mesmo nos países ricos, como os Estados Unidos, imigrantes ilegais, vítimas de aliciamento e tráfico humano, são obrigados a se submeterem a um regime que, de fato, importa em escravidão. Caso a situação dos países pobres e endividados não mude, o que foi agravado pela globalização, é previsível que a escravidão aumente no mundo. Por outro lado, os direitos de segunda geração são uma forma de alcance por parte da população dos direitos de primeira geração. Com efeito, o acesso à educação e ao trabalho é uma garantia de que indivíduos não precisarão se submeter a trabalho em condições análogas à escravidão.

Se podemos sem maiores problemas ver uma complementaridade entre os direitos de primeira e segunda geração, precisamos de um pouco mais de esforço para correlacioná-los aos de terceira geração. Em primeiro lugar, quais são os direitos de terceira geração e qual o seu sujeito político?

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, seguindo Karel Vasak, denomina-os de direitos de solidariedade ou fraternidade. Seriam eles os direitos à paz, ao desenvolvimento, ao meio ambiente, ao patrimônio comum da humanidade, à autodeterminação dos povos e à comunicação [01].

Os direitos de terceira geração emergiram porque houve rupturas no processo social que implicou na aliança entre a burguesia e a classe trabalhadora. Por um lado, ocorreu uma fratura na expansão do assalariamento, provocada pela Terceira Revolução Industrial. A tecnologia microeletrônica dizimou e continua a reduzir inúmeros postos de trabalho no mundo, sem que os empregos gerados no setor de serviços tenham a capacidade de plenamente substituí-los. A globalização ampliou a mobilidade do capital, mas não a do fator mão-de-obra, transferindo investimentos para países com pouca tradição democrática, desmantelando o pacto do emprego estável e da previdência social nas sociedades desenvolvidas. A partir de então, capitalismo não é mais sinônimo de sociedade de bem-estar. A promessa da modernização, de integração social a uma sociedade assalariada urbana, de crença no pensamento racional entra em colapso. Em paralelo, movimentos identitários, amortecidos pelos acordos pós-guerra, começaram a se reerguer, animados pela falência do pacto de bem-estar e pelo incremento do desemprego. A identidade cultural foi o motor desses movimentos.

Por outro lado, a industrialização produziu uma degradação sem precedentes no planeta, levando a relatórios estarrecedores sobre a situação ambiental, principalmente nos anos 1970 e 1980. A partir de então, a questão ambiental passa a ser item prioritário na agenda global.

Bem-estar social: mal-estar ambiental. Esse o novo dilema e o novo desafio da sociedade moderna. Seria necessária uma firme iniciativa dos governos para deter a destruição da diversidade ambiental. Cultura e meio-ambiente são os temas da nova onda de direitos. O que os une é a luta pela diversidade. Diversidade cultural e diversidade ambiental. Contra a padronização da cultura moderna racional, contra a massificação, a perda de identidades, o consumismo: direito à diversidade cultural. Contra a progressiva substituição do meio-ambiente natural pelo artificial: direito à diversidade biológica, ao patrimônio natural.

O sujeito histórico dos direitos da diversidade são os movimentos sociais. Boaventura de Sousa Santos enumera como novos movimentos sociais os movimentos ecológicos, pacifistas, anti-racistas, de consumidores e de auto-ajuda [02]. Alain Touraine assinala que, enquanto os antigos movimentos sociais, como o sindicalismo operário, se deterioraram, os novos movimentos deixam transparecer uma nova geração de problemas e conflitos sociais e culturais. Enquanto o antigo movimento operário lutava pelo controle dos meios de produção, os novos movimentos reivindicam o controle da finalidade da produção cultural, ou seja, da educação, da saúde e da informação [03].

Para Manuel Castells os novos movimentos sociais encontram-se associados às lutas pela identidade, que se concretiza na forma de religiosidade, nacionalismo, ambientalismo e sexualidade. Identidades constituem fontes de significado para os próprios atores, construídas pelo processo de individualização. Todas as identidades são construídas a partir de matéria-prima fornecida pela história, geografia, biologia, instituições produtivas e reprodutivas, pela memória coletiva e por fantasias pessoais, pelos aparatos de poder e revelações de cunho religioso. Existem três formas e origens de construção de identidades, e cada tipo leva a um resultado distinto na constituição da sociedade: 1) Identidade legitimadora: introduzida pelas instituições dominantes no intuito de expandir e racionalizar a dominação. Ex: nacionalismo. 2) Identidades de resistência: criada pelos atores em condições de marginalização. Ex: orgulho gay. 3) Identidade de projeto: ocorre quando os atores constroem uma nova identidade capaz de definir sua posição na sociedade, em busca da transformação de toda a estrutura social. Ex: feminismo [04].

Na sociedade caracterizada por esta nova etapa da modernidade, os indivíduos tendem a conformar cada vez mais a sua identidade pessoal ao de uma minoria. Assim, a pessoa humana se parte em inúmeros recortes, conforme as peculiaridades de cada um, associando-se ao grupo com o qual tem afinidade. Na América Latina, tem sido cada vez mais forte a recorrência à identidade indígena e campesina na luta pelo poder político, cultural e econômico, como prova a ascensão de lideranças regionais com base no discurso de defesa dessas minorias.

No Brasil, em 1500, as terras dos índios passaram para o domínio de Portugal, e séculos depois para o da União. Desde o início da colonização houve intensa resistência, ocasionando o genocídio de muitos povos indígenas. No século XX, após séculos de luta, está ocorrendo o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas, fundamental para a conservação de sua cultura. A luta pelo reconhecimento e respeito à cultura dos povos autóctones data de séculos. Devemos lembrar que antes de 1507, acreditava-se que os "povos selvagens" não tinham alma, o que só naquele ano foi reconhecido mediante Decreto do Papa. [05]

No final do século XIX prevalecia nos Estados Unidos a doutrina Marshall, então adotada pela Suprema Corte. De acordo com ela, os povos indígenas não poderiam ser sujeitos do direito internacional porque este só reconhecia nações civilizadas, ou seja, cristãos [06]. Por não serem cristãos e não constituírem Estados, as nações dos povos autóctones não teriam soberania. Poderiam, porém, obter o reconhecimento pelos Estados europeus enquanto comunidades autônomas e independentes, deixando de ser estranhas ao direito internacional. Seriam, segundo Marshall, domestic independent communities.

No caso das populações tradicionais, a diversidade ambiental associa-se à diversidade cultural. São os saberes tradicionais que mantêm, ou mesmo geraram, a diversidade biológica, e a manutenção desses saberes é um requisito essencial para aquela. Darrell Posey observou que o Direito dos Recursos Tradicionais (DRT) têm se transformado numa questão central na agenda da política e do direito internacional, incluindo direitos humanos, leis trabalhistas, meio ambiente, comércio, desenvolvimento, liberdade religiosa e propriedade [07].

Segundo a Sociedade Internacional de Etnobiologia,

"o Direito aos Recursos Tradicionais integra um conjunto de direitos fundamentais onde se incluem os direitos humanos e culturais, o direito à autodeterminação, e o direito sobre a terra e sobre o território. O Direito aos Recursos Tradicionais reconhece a autoridade das populações indígenas e comunidades locais sobre o uso de plantas, animais e outros recursos, tais como tecnologias e conhecimentos associados ao seu meio natural envolvente. Este tipo de Direito inclui e toma em consideração valores espirituais, estéticos, culturais e econômicos associados a estes recursos, níveis de conhecimento e tecnologias". [08]

Um importante instrumento jurídico que prevê a proteção da cultura das populações e dos recursos tradicionais é a Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural [09]. Esta Convenção define o que pode ser considerado como patrimônio cultural e patrimônio natural.

A Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural de 2001, ao correlacionar os direitos humanos e a diversidade cultural, estabelece que

"a defesa da diversidade cultural é um imperativo ético, inseparável do respeito à dignidade humana. Ela implica o compromisso de respeitar os direitos humanos e as liberdades fundamentais, em particular os direitos das pessoas que pertencem a minorias e os dos povos autóctones".

Outro instrumento jurídico importante, a Convenção sobre a Diversidade Biológica [10] fez previsão da utilização sustentável dos recursos tradicionais, de seus componentes e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias.


DIREITO E POPULAÇÕES TRADICIONAIS

Não se pode dissociar o direito da biodiversidade do direito das populações tradicionais. As sociedades tradicionais se diferenciam sob o ponto de vista cultural. Reproduzem historicamente seu modo de vida, de forma mais ou menos isolada, com base na cooperação social e relações próprias com a natureza [11]. Neste sentido, desempenham um papel fundamental na sustentabilidade ambiental de áreas protegidas.

A identidade cultural das populações tradicionais precisa ser valorizada, uma vez que dos seus saberes depende a conservação dos recursos naturais e a subsistência das comunidades. Com efeito, essas populações

"apresentam um modelo ocupação do espaço e uso dos recursos naturais voltado principalmente para a subsistência, com fraca articulação com o mercado, baseado em uso intensivo de mão-de-obra familiar, tecnologias de baixo impacto derivadas de conhecimentos patrimoniais e, habitualmente, de base sustentável. Essas populações – caiçaras, ribeirinhos, seringueiros, quilombolas e outras variantes – em geral ocupam a região há muito tempo, não têm registro legal de propriedade privada individual da terra, definindo apenas o local de moradia como parcela individual, sendo o restante do território encarado como área de uso comunitário, com seu uso regulamentado pelo costume e por normas compartilhadas internamente." [12]

As populações tradicionais mantêm uma relação peculiar com a natureza, privilegiando a sustentabilidade, que garante a sua sobrevivência e ao mesmo tempo a reprodução do meio ambiente. Têm o seu modo de viver baseado em relações familiares, comunitárias, com uso em comum dos recursos naturais, e organizam-se de forma cooperativa para poderem sobreviver.

Um exemplo de interação entre essas populações e a natureza pode ser obtido das pesquisas mais recentes realizadas na Amazônia. Nos últimos anos a mudança mais relevante na área da ecologia diz respeito à ênfase crescente na correlação entre a diversidade ambiental na Amazônia e a atividade humana. Estudos têm comprovado que várias zonas de floresta foram objeto de ocupação pré-histórica, como atestam os sítios encontrados, e que representam, na Amazônia brasileira, no mínimo 12% de toda a terra firme [13]. Esses solos são favorecidos pelas populações atuais, caracterizam-se por alta fertilidade e são de extrema importância para a economia indígena. Desta forma, as pesquisas levaram à conclusão de que boa porção da cobertura vegetal da Amazônia é o resultado de milênios de manipulação humana.

Constatar que áreas de maior biodiversidade na floresta amazônica foram frutos da atividade humana leva a questionar modelos que pretendem conservar a floresta intocada, mediante remoção de suas populações locais. Muitas das vezes, a criação de áreas de proteção ambiental impede que as populações nelas se mantenham, ocasionando sua migração para as cidades. De uma maneira geral, as populações locais são pouco ouvidas na formulação de políticas ambientais.

Áreas não-protegidas continuam sendo apropriadas por particulares, principalmente empresas, enquanto são criadas novas reservas. Enquanto o Estado é conivente com a grilagem de terras públicas, grandes empresas pressionam pequenos produtores para venderem suas propriedades. Sua sorte é a periferia dos centros urbanos. Não raramente iniciativas de proteção ambiental encontram oposição nessas populações ou causam-lhes prejuízos. Vejamos dois exemplos.

O primeiro [14] diz respeito ao conflito entre o governo de São Paulo e os índios Guarani envolvendo a ilha do Cardoso, no litoral sul do Estado. Esta ilha encontra-se dentro do território guarani, o que é reconhecido pela FUNAI. Entretanto, como se trata de área de proteção ambiental, funcionários da SEMA exigem a retirada dos índios da ilha, alegando que a mesma é prejudicial ao meio ambiente.

Outro exemplo ocorreu no rio Araguaia, nos municípios de Barra do Garça (MT) e Luís Alves (GO). Em 1977, a SUDEPE proibiu a pesca comercial e o uso de rede de malhar e de tarrafa na região. A conseqüência foi a migração de mais de três mil famílias de ribeirinhos para os centros urbanos [15].

Vários outros exemplos poderiam ser citados, uma vez que se avolumam os casos em que a criação de áreas de preservação gera conflitos entre os órgãos ambientais e povos indígenas ou populações rurais.


POLÍTICA NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS

O Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, conceituou povos e comunidades tradicionais, territórios tradicionais, bem como desenvolvimento sustentável. Segundo o Decreto, entende-se por Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

Os Territórios Tradicionais são os espaços necessários à reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações.

Por seu turno, o Decreto define Desenvolvimento Sustentável como aquele em que existe o uso equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da qualidade de vida da presente geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras. 

Outro Decreto, de 13 de julho de 2006, já estabelecia a competência e composição da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais.

Mesmo sem nomear os povos e comunidades tradicionais, pela composição da referida Comissão pode-se inferir que são reconhecidos como tais os seringueiros, quilombolas, pescadores artesanais, ciganos, índios, quebradeiras de coco babaçu e caiçaras. Além desses, outras comunidades e povos também poderão ser considerados tradicionais, uma vez que, seguindo a lógica da Convenção nº 169 da OIT, promulgada pelo Decreto nº 5.051/2004, o auto-reconhecimento é um fator fundamental. Conforme a Convenção, a consciência da identidade indígena ou tribal deverá ser considerada como critério fundamental para determinar os grupos aos quais a mesma é aplicada. Seguindo este critério, o Decreto nº 6.040/2007 afirma que é objetivo da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável, dentre outros, reconhecer, com celeridade, a auto-definição dos povos e comunidades tradicionais, de modo que possam ter acesso pleno aos seus direitos civis individuais e coletivos.


CONCLUSÃO

O que precisa ser reconhecido é a capacidade que as populações tradicionais têm de viver em áreas protegidas sem produzir degradação. São dotadas de uma outra cultura, que implica em outra forma de se relacionar com a natureza e em outro comportamento econômico.

Lévi-Strauss [16], ao assinalar a importância da colaboração entre culturas, lembra que os sistemas de vida peculiares a cada sociedade correspondem a uma maneira própria que cada uma escolheu para se exprimir e satisfazer o conjunto das aspirações humanas. Assim, não existe cultura superior. O desenvolvimento alcançado pela sociedade moderna não seria possível sem a contribuição decisiva das sociedades antigas. Vivenciamos apenas uma etapa de um longo percurso civilizatório. Por outro lado, em relação às sociedades tradicionais, existem ritmos diferentes de acumulação. Considerar uma sociedade como estagnada por causa de seu ritmo lento de acumulação, importa em exigir que todas as sociedades tenham a mesma velocidade, o que evidencia uma injusta discriminação. O respeito à sua peculiaridade de desenvolvimento reflete-se também na observância da capacidade de renovação dos recursos naturais.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Castells, Manuel. O Poder da Identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

Castro, Fábio de. Níveis de Decisão e o Manejo de Recursos Pesqueiros. In: Ecologia de Pescadores da Mata Atlântica e da Amazônia. Begossi, Alpina (org.). São Paulo: Hucitec: Nepam/Unicamp: Nupaub/USP: Fapesp, 2004.

Diegues, Antônio Carlos (org.). Etnoconservação: Novos Rumos para a Proteção da Natureza nos Trópicos. São Paulo: NUPAUB, Hucitec.

Diegues, Antônio Carlos e Arruda, Rinaldo S. V. (org.). Saberes Tradicionais e Biodiversidade no Brasil. Brasília: Ministério do Meio Ambiente; São Paulo: USP, 2001

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Lévi-Strauss, Claude. Raça e História. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1976.

Posey, Darrell. Conseqüências Ecológicas da Presença do Índio Kayapó na Amazônia: Recursos Antropológicos e Direitos de Recursos Tradicionais. In: Cavalcanti, Clóvis (org). Desenvolvimento e Natureza: Estudo para uma Sociedade Sustentável. São Paulo: Cortez; Recife, PE: Fundação Joaquim Nabuco, 1995.

Rouland, Norbert. Direito da Minorias e dos Povos Autóctones. Brasília: Editora da UNB, 2004.

Santos, Boaventura de Sousa. Pela Mão de Alice: o Social e o Político na Pós-Modernidade. São Paulo: Cortez, 1997.

Touraine, Alain. Crítica da Modernidade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.

Viveiros de Castro, Eduardo. A Insconstância da Alma Selvagem. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.


NOTAS

01 Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 58.

02 Santos, Boaventura de Sousa. Pela Mão de Alice: o Social e o Político na Pós-Modernidade. São Paulo: Cortez, 1997, p. 257.

03 Touraine, Alain. Crítica da Modernidade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994, p. 260.

04 Castells, Manuel. O Poder da Identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 22-28.

05 Rouland, Norbert. Direito da Minorias e dos Povos Autóctones. Brasília: Editora da UNB, 2004, p. 374.

06 Idem, p. 394.

07 Posey, Darrell. Conseqüências Ecológicas da Presença do Índio Kayapó na Amazônia: Recursos Antropológicos e Direitos de Recursos Tradicionais. In: Cavalcanti, Clóvis (org). Desenvolvimento e Natureza: Estudo para uma Sociedade Sustentável. São Paulo: Cortez; Recife, PE: Fundação Joaquim Nabuco, 1995, p. 188.

08 http://ise.arts.ubc.ca.

09 Aprovada pela Conferência Geral da UNESCO em 1972 e promulgada pelo Decreto n° 80.978, de 12.12.77.

10 Promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998.

11 Diegues, Antônio Carlos e Arruda, Rinaldo S. V. (org.). Saberes Tradicionais e Biodiversidade no Brasil. Brasília: Ministério do Meio Ambiente; São Paulo: USP, 2001, p. 27.

12 "Populações Tradicionais" e a Proteção dos Recursos Naturais em Unidades de Conservação. In: Diegues, Antônio Carlos (org.). Etnoconservação: Novos Rumos para a Proteção da Natureza nos Trópicos. São Paulo: NUPAUB, Hucitec, 2000.

13 Viveiros de Castro, Eduardo. A Insconstância da Alma Selvagem. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, p. 325.

14 Autodeterminação: Direito à Diferença. São Paulo: Plêiade, Fapesp, 2001, p. 277.

15 Castro, Fábio de. Níveis de Decisão e o Manejo de Recursos Pesqueiros. In: Ecologia de Pescadores da Mata Atlântica e da Amazônia. Begossi, Alpina (org.). São Paulo: Hucitec: Nepam/Unicamp: Nupaub/USP: Fapesp, 2004, p. 263.

16 Raça e História. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1976, p. 89.bu


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARINHO, Marcos dos Santos. Direito ambiental e populações tradicionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1643, 31 dez. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10814. Acesso em: 19 abr. 2024.