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Alimentos e a transmissibilidade da obrigação aos ascendentes, descendentes e colaterais no Código Civil de 2002

Alimentos e a transmissibilidade da obrigação aos ascendentes, descendentes e colaterais no Código Civil de 2002

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O Código Civil de 2002 em seu art. 1.700 inovou ao disciplinar a obrigação alimentar, pois, transformou a transmissibilidade da obrigação alimentar em regra geral. Seja em razão do parentesco, do casamento ou da união estável, o dever de prestar alimentos será transmitido aos herdeiros do devedor, o que poderá gerar situações inusitadas.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. DOS ALIMENTOS; 3. DOS PARENTES OBRIGADOS A FORNECER ALIMENTOS; 4. DA TRANSMISSIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ENTRE PARENTES; 5. CONCLUSÃO; 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1. INTRODUÇÃO

O homem, ao contrário das demais espécies animais, necessita, desde o seu nascimento, de inúmeros cuidados e atenção de seus semelhantes para garantir a sua sobrevivência. Neste sentido, os alimentos são vitais para garantir a vida, isto é, a subsistência da espécie. Não obstante, entende-se que a obrigação alimentar não pode, em nenhuma hipótese, servir para incentivar o ócio, comodismo ou a vadiagem de quem quer se seja.

Em uma sociedade civilizada, os deveres dos pais para com os filhos menores englobam diversas obrigações, dentre as quais podemos citar o fornecimento de alimentação, vestuário, abrigo, medicamentos e tudo o que for necessário à sobrevivência de sua prole. Outro dever igualmente importante dos pais é o de manter os filhos em sua companhia exercendo vigilância sobre eles, não os deixando ao abandono; proporcionando-lhes educação que abrange o ensino básico ou elementar e outros níveis de conhecimento de acordo com as condições sócio-econômicas desses pais.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 229, dá relevância ao dever que têm os pais de assistir, criar e educar os filhos menores e ao dever que têm os filhos maiores de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Observamos que há uma reciprocidade alimentar como um direito à vida em qualquer idade, quer seja no sentido ascendente, quer seja no sentido descendente na linha reta de parentesco, uma vez que o parentesco em linha reta, não encontra qualquer limitação perante a lei.

Um dos temas mais expressivos do Direito Civil tem sido o que rege os direitos e deveres sobre o tema alimentos. Este tema, pela sua amplitude e importância para toda a sociedade, tem provocado inúmeros debates ao longo do tempo, entretanto, a questão relacionada à transmissibilidade da obrigação alimentar entre parentes tem sido alvo de maior controvérsia.

É comum o pedido de alimentos dos filhos em relação aos pais e também, dos pais em relação aos filhos, esta não tanto comum, neste sentido, nenhuma repercussão mais acentuada se verifica. Todavia, a situação se reverte e provoca sérios atritos quando os alimentos são reclamados entre os demais parentes. Por exemplo, quando da solicitação de alimentos de um irmão para outro, ou de um neto para os avós e vice-versa.

Isto porque nem sempre o parente mais remoto se curva ao entendimento prescrito na lei. Porque se considera que, de acordo com o senso do homo medius, a obrigação alimentar caberia tão somente aos pais em relação aos filhos.

Não obstante, do ponto de vista jurídico, a questão envolvendo a transmissibilidade da obrigação alimentar entre parentes também se encontra em latente debate entre os doutrinadores e operadores do Direito.

Em relação à admissibilidade do pedido de complementação da obrigação alimentar a doutrina é pacífica em admiti-lo, desde que observados os critérios referentes ao binômio necessidade-possibilidade que é da essência da obrigação alimentar.

Cabe ressaltar que a obrigação complementar segue também ao infinito em linha reta, isto é, em relação aos descentes e ascendentes, já os colaterais são limitados até o segundo grau, ou seja, entre irmãos (unilaterais ou bilaterais). No entanto, a complementação entre tios sobrinhos e primos causa celeuma entre os operadores do Direito.

Em relação à complementação da obrigação, podemos exemplificar, um filho que necessite de alimentos (incluindo medicação em função de doença crônica) cujo pai contribui com valores insuficientes, no limite das suas possibilidades, poderia pleitear alimentos ao seu avô para complementar a obrigação.

O Ordenamento Jurídico Brasileiro traz no conceito de transmissibilidade a transferência de coisas, direitos ou obrigações. A transmissibilidade da obrigação alimentar passa ser regra geral, com seu fundamento legal no art. 1.700 do Código Civil de 2002, não se aplicando somente aos cônjuges, como antes era o entendimento, mas também aos parentes e companheiros.

O Código Civil de 2002 em seu art. 1.700 inovou ao disciplinar a obrigação alimentar, pois, transformou a transmissibilidade da obrigação alimentar em regra geral. Seja em razão do parentesco, do casamento ou da união estável, o dever de prestar alimentos será transmitido aos herdeiros do devedor, o que poderá gerar situações inusitadas.

Pensemos na seguinte situação colocando como responsáveis perante a lei, os filhos havidos em um suposto segundo casamento de um alimentante que venha a falecer durante as segundas núpcias. Podemos perceber que de acordo com o art. 1.700 do Código Civil, aqueles estarão obrigados a continuar arcando com os alimentos convencionados pelo pai, agora falecido, aos seus irmãos unilaterais (filhos de um mesmo pai ou de uma mesma mãe), fruto do primeiro casamento do alimentante.

Não obstante, a transmissibilidade irrestrita da obrigação alimentar causa conflitos não apenas pelas situações inusitadas que se verificarão no dia a dia forense, mas também porque o art. 1.700 do Código Civil silencia quanto ao limite da transmissibilidade de tal obrigação.

Destarte, é de fundamental importância, um estudo que se proponha a analisar os limites para o exercício da transmissibilidade da obrigação alimentar. Tal discussão é recente, mas, devido sua relevância no Direito de Família, deve ser realizada visando estabelecer os limites de tal obrigação. Neste sentido, este trabalho considera como problema estabelecido para a pesquisa: Qual a limitação da transmissão da obrigação alimentar entre parentes?

Foi estabelecido como hipótese, amparado no Código Civil de 2002 em seu art. 1.700, que: "a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor na forma do art. 1.694". De conformidade com a "lógica do razoável", a obrigação alimentar será regida pelo princípio da transmissibilidade de alimentos já estabelecidos por decisão judicial ou convenção entre as partes.

O trabalho teve como objetivo demonstrar a transmissibilidade da obrigação alimentar, levando em conta a análise da relação existente entre a Constituição Federal e o Código Civil de 2002, quanto à possibilidade de transmissão da obrigação alimentar; a conceituação e as características básicas dos alimentos; a apresentação dos sujeitos da obrigação alimentar; a explicação dos pressupostos básicos da obrigação alimentar; a abrangência de regra da transmissibilidade dos alimentos já estabelecidos e dos em potencial; os limites da obrigação a ser transmitida; e a abrangência da obrigação alimentar complementar.


2. DOS ALIMENTOS

A família é a célula mater da sociedade e é a partir desta instituição que surge uma das modalidades de prestação dos alimentos, ou seja, a originada no Direito de Família. De outro lado, pretérita a análise da obrigação alimentar, mister faz-se abordar as origens da família.

De logo se percebe a importante influência da família para a constituição de uma sociedade. Assim, destacamos que:

A pessoa humana nasce inserida no seio familiar, a partir de onde modela as suas potencialidade para harmonizar a convivência em sociedade e alcançar a sua realização pessoal. (NERY JUNIOR, 2005 apud FARIAS, 2005, p.32).

Com relação à origem da instituição familiar, existem ainda divergências entre os antropólogos e sociólogos acerca das primeiras formas de famílias existentes. Os pesquisadores ainda não conseguiram chegar a um consenso sobre a gênese da família, o que temos são teorias que buscam ou tentam esclarecer como se relacionavam os membros de uma família ao longo da história da evolução humana, como bem aporta o doutrinador a seguir:

Divergem os antropólogos e sociólogos acerca das primeiras formas de família existentes na humanidade. Isto porque se pode somente supor, imaginar, como seriam as relações familiares anteriores à formação da família existente no Direito Romano, sendo que os estudos sobre a família originária são bem mais de ordem sociológica e antropológica, do que jurídica. (KLEIN, 2001 apud WELTER, 2003, p.18).

Por conseqüência lógica, a conceituação de família também não apresenta uniformidade para sua efetiva compreensão. Trata-se de um paradoxo, pois não existe identidade entre os conceitos formados pela Sociologia, Antropologia e o Direito. Devemos ressaltar que, o Código Civil não traz explícito o conceito de família.

No contexto das transformações sofridas na família, observa Cristiano Chaves de Farias que:

Enfim, a idéia de família precisa ser construída a partir de valores vigentes em cada tempo e espaço, considerando as peculiaridades sociais e culturais, pois concretiza uma forma de viver os fatos básicos da vida. Com esse espírito, não se pode olvidar que a família está sempre se reinventando, se reconstruindo. Transforma-se a cada momento e espaço, naturalmente, renovando-se em face de sua própria estrutura cultural. (NERY JUNIOR, 2005 apud FARIAS, 2005, p.32).

No entanto, o Direito Civil moderno define família como a união de pessoas advindas de uma relação conjugal ou de parentesco. Em um conceito mais amplo, família é o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar, ou seja, unidas pelo vínculo de parentesco, de acordo com o seguinte:

Neste sentido, compreende os ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, incluindo-se os ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por afinidade ou afins. Nessa compreensão, inclui-se o cônjuge que não é considerado parente. Em conceito restrito, família compreende o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder. (VENOSA, 2004, p.16).

Sob o ponto de vista sociológico o conceito de família consiste, na integração de pessoas que vivem sob um mesmo teto, sob a autoridade de um titular (KLEIN, apud WELTER, 2003).

O Direito Romano é o marco para o estudo da família. Ele apresentou uma estrutura familiar, tornando-a uma unidade jurídica, econômica e religiosa fundada na autoridade soberana de um chefe.

Naquela época, a sociedade era fundamentalmente patriarcal, a mulher dedicava-se exclusivamente a realização dos afazeres domésticos, já que o marido era o administrador, ou seja, o chefe da família. Havia um abismo entre o homem e a mulher, pois a lei não conferia os mesmos direitos a ambos. Por forte influência religiosa, a família era a oriunda do vínculo matrimonial.

No Brasil, a partir do século XX, houve grandes mudanças, foram vencidas várias barreiras e o ponto culminante foi a Constituição Federal de 1988 que disciplinou as relações familiares advindas, por exemplo, de união estável, que apesar de existirem no caso concreto, não eram tuteladas pelo direito.

Como o advento da Carta Magna deixa de existir a distinção entre os filhos, a preponderância do varão na sociedade conjugal. Anterior à Constituição, a Lei nº 4121/62, eliminou a incapacidade relativa da mulher casada, inaugurando assim, a igualdade entre os cônjuges. Houve a quebra do patriarcalismo, já que não reside mais no ordenamento jurídico pátrio qualquer desigualdade entre os filhos e os direitos dos cônjuges ou companheiros equipararam-se. A igualdade entre os filhos, assim como nas relações entre casais foi elevada à condição de princípio normativo fundamental no direito de família.

A Constituição Federal consagrou a proteção à família no art. 226, tanto a família oriunda do casamento, quanto à oriunda da união de fato, a família natural e a família adotiva. Neste sentido a doutrina corrobora:

A família é afirmada como base da sociedade e tem especial proteção do Estado, mediante assistência na pessoa de cada um dos que a integram e criação de mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Não é só pelo casamento que se constitui a entidade familiar. Entende-se também como tal à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes e, para efeito de proteção do Estado, também, a união estável entre homem e mulher, cumprindo à lei facilitar sua conversão em casamento (cf. lei 9.278 de 10.5.96). Em qualquer desses casos, os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente entre ambos, já consignado no art. 5º, I (art. 226), (SILVA, 2002, p.822).

Havia um grande clamor da sociedade para que fosse assegurado o reconhecimento da família, mesmo sem a existência de um casamento. Assim, reconhece-se a família constituída pela união estável (art. 226, § 3º, CF) e pela comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, denominadas família nuclear, pós-nuclear, monoparental ou socioafetiva (art. 226, §4º, CF).

A Carta Magna de 1988 no seu art. 227 expressa o dever da família de assegurar à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, ou seja, propiciar uma vida com dignidade. No art. 229 acrescenta que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores e que os filhos deverão amparar seus pais na velhice. No Código Civil de 2002, o art. 1.694 disciplina o pedido de alimentos entre os parentes.

A família é uma comunidade natural composta, em regra, de pais e filhos, aos quais a Constituição, agora, imputa direitos e deveres recíprocos nos termos do art. 229, pelo qual os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, havidos ou não da relação do casamento (art. 227, §6º), ao passo que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. (SILVA, 2002, p.822-823).

Destarte, a obrigação alimentar incube aos genitores, a cada qual e a ambos conjuntamente, o dever de sustentar seus filhos, provendo o que for necessário para a manutenção e sobrevivência dos mesmos. Neste sentido "o pai deve propiciar ao filho não apenas os alimentos para o corpo, mas tudo o que for necessário" (CAHALI, 2002, p.523).

Segundo o magistério de Luiz Felipe Brasil Santos (2005), o Código Civil de 2002, a partir do art. 1.694, disciplina os alimentos devidos entre parentes, cônjuges e companheiros, com isso, encontra-se ab-rogada toda a legislação anterior que contém regras de direito material acerca dos alimentos (exceto a Lei nº 5.478/68, por ser lei processual). Logo, revogados estão, o Código Civil de 1916, a Lei nº 6.515/77 (em relação aos alimentos entre os cônjuges na separação e divórcio) e a Lei nº 278/96 (em relação aos alimentos entre os companheiros, é sabido que, neste particular, a Lei nº 8.971/94 já fora revogada pela Lei nº 9.278/96).

Destarte, todas as regras contidas no Subtítulo III (Dos Alimentos) do Código Civil inequivocamente incidem na obrigação alimentar qualquer que seja a sua origem, isto é, alimentos originados de relação de parentesco, matrimônio ou união estável. Assim, a garantia da prestação alimentar encontra-se expressa e assegurada na Constituição Federal e no Código Civil de 2002.

O instituto da obrigação alimentar é amplamente assegurado, pois se encontra diretamente ligado com a subsistência da espécie. A Constituição Pátria no seu art. 5º assegura a todos o direito à vida. No art. 227 reforça a garantia à vida como dever da família. Assim, o Estado e a família devem assegurar a prestação da obrigação alimentar haja vista sua importância vital para a preservação da vida, sobretudo vida com o mínimo de dignidade.

A relevância da dignidade da pessoa humana já decorre da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, das Nações Unidas, pela qual Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz do mundo (...), bem como da Convenção Americana dos Direitos Humanos (Pacto de San José de Costa Rica). Trata-se a dignidade da pessoa humana de uma referência constitucional unificadora dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, isto é, daqueles direitos que servem de fundamento e fim da atividade pública. Destarte, pode-se afirmar que a dignidade da pessoa humana é o valor supremo da Constituição. Por fim, anota-se que explicitar-se-á em detalhe sobre a dignidade da pessoa humana, bem como sobre os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa no segundo texto referente a este conteúdo. (ALFLEN, 2005, p.4).

Sem alimentos não há vida. O ser humano representa, no reino animal, a espécie mais frágil, totalmente dependente dos cuidados de seus semelhantes no início de sua vida para que consiga, logo após o seu nascimento, sobreviver, e em seguida crescer e desenvolver-se de maneira saudável.

Todos os esforços dos pais devem ser orientados no sentido de fazer do filho por eles gerado um ser em condições de viver por si mesmo, de desenvolver-se e sobreviver sem o auxilio de terceiros, tornando à sua vez capaz de ter filhos, em condições de criá-los: "C’ est la loi de la perpétuation de l’ espèce".(CAHALI, 2002, p.524).

Diante da importância do instituto dos alimentos, Cahali (2002) identifica duas ordens de obrigações alimentares, distintas, dos pais para com os filhos: a) uma resultante do pátrio poder, consolidada na obrigação de sustento da prole durante a menoridade; b) e outra, de caráter geral, fora do pátrio poder e vinculada à relação de parentesco em linha reta.

O termo alimentos, em Direito, é uma referência explicita as prestações periódicas devidas à determinada pessoa, em dinheiro ou espécie, em virtude de ato ilícito, da manifestação de vontade ou em decorrência do Direito de Família, para prover a subsistência. Por exemplo, o atentado contra a vida de alguém, ensejará o pagamento de alimentos decorrente de ato ilícito, pois obriga o ofensor a reparar o dano causado ao ofendido e aos seus dependentes, prestando-lhe os alimentos que necessitam para sobreviver, conforme os art.s 949, II e 950 do Código Civil. Já os alimentos decorrentes da manifestação de vontade se exteriorizam em contratos ou em testamentos, como podemos verificar no legado de alimentos (art. 1.920, CC). Temos ainda, os alimentos decorrentes do Direito de Família, que abrange a obrigação alimentar oriunda do parentesco, do casamento e da união estável.

Cabe ressaltar, que todas as modalidades de alimentos enumeradas têm na lei a sua fonte mediata. Sem previsão legal, não há obrigação a ser imposta.

É relevante apresentar o entendimento de Rodrigues (2004, p.375) que:, "desde o instante em que o legislador deu ação ao alimentário para exigir o socorro, surgiu para o alimentante uma obrigação de caráter estritamente jurídico, e não apenas moral". Entendimento, também corroborado pelo eminente doutrinador Cahali (2002, p. 31):

Na linguagem romântica de Pelissier, como todos os homens são irmãos, cada um deve, segundo a lei natural, vir em auxilio do outro na sua miséria; mas esse dever de solidariedade é muito geral para ser consagrado pelo direito; assim sendo, não será senão em agrupamentos limitados, claramente definidos, que aquele dever de solidariedade dá direito a uma obrigação alimentar; o grupo mais restrito, aquele onde esta solidariedade é mais expressiva, é o agrupamento familiar; os membros de uma família são unidos por vínculos de afeição e de interesses particularmente fortes.

Neste estudo, o nosso interesse é unicamente os alimentos provenientes do Direito de Família, no entanto, mais especificamente, os alimentos entre os ascendentes, descendentes e colaterais decorrentes da Codificação Civil de 2002.

Em síntese, quando tratamos de alimentos, temos de um lado o direito de reclamá-los e por outro a obrigação de prestá-los. O que torna essencial a definição do referido instituto, merecendo igual importância, um breve estudo sobre a classificação doutrinária dos alimentos, como passaremos a abordar no próximo item.

2.2 Conceito e a classificação dos alimentos.

O Código Civil de 2002, no seu capítulo destinado aos alimentos (arts. 1.694 a 1.710), não definiu o referido instituto. No entanto, no art. 1.920 é possível detectar o conceito legal dos alimentos quando a lei refere-se ao legado: "O legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor".

Logo, o conceito de alimentos, dentro da norma cogente, salvo melhor juízo, encontra-se não no Direito de Família, mas sim expresso no capítulo destinado ao Direito Sucessório, Cahali em seu notável estudo sobre alimentos, esclarece:

O ser humano, por natureza, é carente desde sua concepção; como tal, segue o seu fadário até o momento que lhe foi reservado como derradeiro; nessa dilação temporal-mais ou menos prolongada-, a sua dependência dos alimentos é uma constante, posta como condição de vida (CAHALI, 2002, p.15).

Assim, no seu significado simples: "alimentos" é tudo o que for necessário para a conservação da vida do ser humano (grifo nosso). Por outro lado, na linguagem jurídica, os alimentos possuem um significado mais amplo do que o sentido comum, pois compreende além da alimentação, outras necessidades dos seres humanos como a habitação, vestuário, assistência médica e as despesas com educação.

Neste contexto, alimentos são prestações periódicas fornecidas a determinada pessoa para suprir suas necessidades básicas e, como conseqüência, sua subsistência. De acordo com o magistério de Gomes (2002, p. 427):

Alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si. A expressão designa medidas diversas. Ora significa o que é estritamente necessário à vida de uma pessoa, compreendendo, tão-somente, a alimentação, a cura, o vestuário e a habitação, ora abrange outras necessidades, compreendidas as intelectuais e morais, variando conforme a posição social da pessoa necessitada. Na primeira dimensão, os alimentos limitam-se ao necessarium vitae; na segunda, compreendem o necessarium personae. Os primeiros chamam-se alimentos naturais, os outros civis ou côngruos.

Continuando, ainda, sob o prisma da linguagem jurídica, Cahali (2002, p.16), esclarece que:

Ainda no plano jurídico, tanto em lei como na doutrina, tem-se atribuído à palavra "alimentos" uma acepção plúrima, para nela compreender não apenas a obrigação de prestá-los, como também os componentes da obrigação a ser prestada.

Verifica-se a partir da doutrina citada, que atualmente é pacífico que o conceito de alimentos não se refere apenas aos gêneros alimentícios capazes de proporcionar a subsistência orgânica da pessoa. Esse entendimento evidencia e destaca uma conotação muito mais ampla que deve ser dada ao instituto, abrangendo outras carências e necessidades igualmente relevantes como educação, lazer saúde, vestuário, transporte, e outras advindas da vida moderna, dependendo sempre da condição de vida do alimentado, e das possibilidades financeiras do alimentante, como também referenciado por Porto (2003, p. 39):

Hoje já não mais existe qualquer divergência quanto à conotação técnico-jurídica do conceito de alimentos, pois a doutrina de muito firmou o entendimento de que, em tal acepção, devemos considerar não só os alimentos necessários para o sustento, mas, também, os demais meios indispensáveis para as necessidades da vida no contexto social de cada um.

Com o Código Civil de 2002 em seu art. 1.964, §2º, foi introduzido ao lado dos alimentos necessários, o conceito de alimentos indispensáveis. Foi uma inovação, pois o Código de 1916 não apresentava esta distinção, segundo Silva (2003, p.1503):

Este artigo introduz em nosso direito, no §2º, ao lado dos alimentos necessários, o conceito de alimentos indispensáveis, devidos mesmo diante de culpa do credor, que permanece com o direito de ser alimentado. De grande valia é essa regra, porque, ao mesmo tempo em que atende ao princípio da solidariedade nas relações de parentesco, casamento e união estável, não deixa de reconhecer que em caso de culpa devem ser atendidas somente as necessidades básicas do alimentário, com a prestação do que é indispensável à sua subsistência.

Daí o entendimento de que, somente, serão devidos os alimentos naturais ao cônjuge ou convivente culpado; aos inocentes e aos demais parentes, serão devidos os alimentos naturais e civis. Essa mudança legislativa transfere aos parentes o encargo alimentar em qualquer situação como relata Diniz (2005, p. 536):

Há uma tendência moderna de impor ao Estado o dever de socorrer os necessitados, através de sua política assistencial e previdenciária, mas, com o objetivo de aliviar-se desse encargo, o Estado o transfere, mediante lei, aos parentes daqueles que precisam de meios para sobreviver, pois os laços que unem membros de uma mesma família impõem esse dever moral e jurídico.

Logo, segundo a doutrina majoritária, os alimentos também são classificados em: a) alimentos naturais ou necessários, isto é, os necessarium vitae; e b) alimentos civis ou côngruos, isto é, os necessarium personae, sendo entendido por Dias (2005, p. 449), como "o alargamento do conceito de alimentos levou a doutrina a distinguir alimentos civis e naturais".

Os alimentos naturais ou necessários são apenas os estritamente necessários para a subsistência. Há um entendimento doutrinário uníssono sobre o que exatamente compreende os alimentos naturais, também relatado por Assis (2001, p.99-100) como:

Os alimentos naturais compreendem as notas mínimas da obrigação: alimentação, cura, vestuário e habitação; equivalem a necessidades básicas do ser humano. Eles se situam, portanto, nos limites do necessarium vitae.

Já os alimentos civis ou côngruos contemplam o rol das demais necessidades, como amplamente demonstrado pela doutrina:

Os alimentos civis, também chamados côngruos, englobam, além desse conteúdo estrito, o atendimento a necessidades morais e intelectuais do ser humano, objetivamente considerando, e por isso se dizem necessarium personae. Em outras palavras, os alimentos civis se taxam segundo os haveres do alimentante e a qualidade de situação do alimentado. (ASSIS, 2001, p. 99-100).

Assim, de acordo com os ensinamentos de Yussef Said Cahali, os alimentos, quanto à natureza, dividem-se em naturais e civis. O eminente doutrinador enfatiza que:

Quando se pretende identificar como alimentos aquilo que é estritamente necessário para a mantença da vida de uma pessoa, compreendendo tão-somente a alimentação, a cura, o vestuário, a habitação, nos limites assim do necessarium vitae, diz-se que são alimentos naturais; todavia, se abrangentes de outras necessidades, intelectuais e morais, inclusive recreação do beneficiário, compreendendo assim o necessarium personae e fixados segundo a qualidade do alimentando e os deveres da pessoa obrigada, diz-se que são alimentos civis. (CAHALI, 2002, p.18).

Na prática, esclarecemos que a divisão dos alimentos em civis e naturais é amplamente utilizada pela jurisprudência:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALIMENTOS PLEITEADOS POR FILHO MAIOR. Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia. Ao que consta dos autos, não foi o apelante culpado pela causa da sua diminuição da visão, devendo os alimentos fixados abranger não só os alimentos naturais (subsistência), mas também os alimentos civis (lazer, cultura, estudos, etc.). Apelo parcialmente provido. (Apelação Cível Nº 70008851842, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Carlos Stangler Pereira, Julgado em 01/07/2004).

EMENTA: ALIMENTOS. FILHA MAIOR, CAPAZ, COM FORMAÇÃO SUPERIOR E APTA AO TRABALHO. O pai não tem obrigação de prestar alimentos para a filha maior, capaz, com formação superior e apta ao trabalho pois os alimentos podem ser convenientes para ela mas não necessários ao sou sustento. Os alimentos para os filhos maiores são devidos apenas na situação excepcional de necessidade, que não se confunde com conveniência, acomodação ou vontade de não trabalhar. Recurso provido. (Embargos Infringentes Nº 70007690514, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 12/03/2004).

EMENTA: PRISÃO CIVIL - Alimentante - Pena de prisão pelo não pagamento dos alimentos - Casal que não possui filhos - Hipótese em que os alimentos que são objeto da ação são civis, não estando em questão maior a sobrevivência da credora rica que exerce trabalho de destacado status - Ademais, somente os alimentos naturais permitem a prisão por dívida, eis que ameaçam a permanência íntegra do alimentando - Ordem concedida. (Relator: Fonseca Tavares - Habeas Corpus 147.842-1 - São Paulo - 10.04.91)

EMENTA: ALIMENTOS - Fixação - Valor destinado a exercer as funções dos chamados alimentos "naturais" e "civis" - Direito da filha a participar do padrão socioeconômico do pai - Verba bem estimada segundo os recursos e o nível de vida paternos. Os alimentos não compreendem apenas o mínimo indispensável à subsistência da vida fisiológica, senão que, quando o permitam os recursos do obrigado, devem, ultrapassando a taxa mínima, concorrer para a manutenção ou elevação do padrão de vida sociológica, segundo a clássica distinção entre alimentos naturais e civis. (Apelação Cível n. 228.389-4/1 - Campinas - 2ª Câmara de Direito Privado - Relator: Cezar Peluso - 14.05.02 - V.U.).

No caso de culpa do alimentando, esclarece Dias (2005, p. 450) que:

A diferenciação entre alimentos civis e naturais foi adotada pelo Código Civil com nítido caráter punitivo. Parentes, cônjuges e companheiros podem pedir alimentos uns aos outros para viver de modo compatível com a condição social, inclusive para atender às necessidades de educação (1.694). Todos os beneficiários - filhos, pais, parentes, cônjuges e companheiros - têm assegurada a mantença do padrão de vida que sempre desfrutaram. Merecem alimentos civis, independente da origem da obrigação. No entanto, limita a lei o valor dos alimentos sempre que é detectada culpa do alimentando (1.694 §2º e 1.704). Quem, culposamente, dá origem à obrigação, faz jus a alimentos naturais, isto é, percebe somente o que basta para manter a própria subsistência. Entretanto, mesmo quando são limitados os alimentos ao indispensável à sobrevivência, as necessidades educacionais não podem ser excluídas, assim como um mínimo razoável ao lazer e ao atendimento das necessidades intelectuais.

Quanto à modalidade da prestação, segundo Cahali (2002), os alimentos classificam-se em: a) próprios, quando o cumprimento da obrigação tem como conteúdo o fornecimento do que é diretamente necessário à manutenção do alimentando, por exemplo, o fornecimento de gêneros alimentícios, isto é, oferecer arroz, feijão, leite, e medicamentos, etc.; e b) impróprios quando tem como conteúdo a prestação financeira e os meios idôneos à aquisição de bens correspondentes ao atendimento de todas as necessidades do alimentando, em outras palavras, o fornecimento em dinheiro para a devida aquisição de gêneros alimentícios e para o pagamentos das demais despesas.

De acordo com a finalidade, Diniz (2005) apresenta o entendimento de que os alimentos são classificados em: a) definitivos, que são os de caráter permanente, fixados por sentença homologatória de acordo ou condenatória com o trânsito em julgado sob o aspecto formal, devendo ser observado o que preceitua o art. 1.699 do Código Civil; b) provisórios, são os concedidos a título precário, mediante prova de parentesco ou da obrigação alimentar do devedor. São concedidos em caráter imediato, para atender a uma necessidade premente do alimentando; e c) provisionais, são os previstos no art. 1.706, CC, são os que a parte pede liminarmente em cautelares para o seu sustento e para os gastos processuais, enquanto durar a demanda. Cabem nas ações de investigação de paternidade julgadas procedentes e enquanto não transitarem em julgado, quando se tornarão definitivos.

Segundo ensina Yussef Said Cahali, os alimentos quanto à finalidade, classificam-se em provisionais e regulares:

Dizem-se provisionais, provisórios ou in litem os alimentos que, precedendo ou concomitantemente à ação de separação judicial, de divórcio, de nulidade ou anulação de casamento, ou ainda à própria ação de alimentos, são concedidos para a manutenção do suplicante, ou deste e de sua prole, na pendência do processo, compreendendo também o necessário para cobrir as despesas da lide.

Dizem-se regulares, ou definitivos, aqueles estabelecidos pelo juiz ou mediante acordo das próprias partes, com prestações periódicas, de caráter permanente, ainda que sujeitos a eventual revisão. (CAHALI, 2002, p.27).

E finalmente, consoante o entendimento majoritário da doutrina, os alimentos classificam-se quanto ao momento da prestação em atuais ou futuros: a) atuais, são os postulados a partir do ajuizamento da ação. E o pedido já está instruído com prova pré-constituída do pressuposto de direito (certidão de nascimento) e b) futuros, os que decorrerão da respectiva sentença. De acordo com a Súmula 277 do STJ, publicada no DJU de 16/06/2003, "Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação". Sobre os alimentos atuais e futuros, Monteiro (2004, p. 374) esclarece que:

Os alimentos objetivam a satisfação de necessidades atuais ou futuras e não as passadas. Têm eles finalidade prática, a subsistência da pessoa alimentada. Se esta, bem ou mal, logrou sobreviver sem recorrer ao auxílio do alimentante, não pode pretender, desde que resolveu a impetrá-lo, se lhe concedam alimentos relativos ao passado, já definitivamente transposto. A pensão alimentícia, em hipótese alguma, poderá ser subministrada para período anterior à propositura da ação, não se atendendo, portanto, às necessidades passadas. Alimentos são devidos ad futurum, não ad praeteritum. Alimentos atrasados só são devidos se fundados em convenção, testamento ou ato ilícito, quer dizer, por título estranho ao direito de família. É o que estabelece o art. 13, §2º, da Lei nº 5.478/68: os alimentos retroagem à data da citação.

Podemos concluir, que de acordo com o conceito de alimentos, devemos considerar não só os alimentos necessários para o sustento, mas, também, os demais meios indispensáveis para as necessidades da vida no contexto social de cada um.

É importante, também, levar em conta que, no âmbito das relações no Direito de Família, os alimentos são devidos em virtude de parentesco e pelo dever de solidariedade. O referido instituto apresenta classificações segundo diversos critérios.

A característica fundamental dos alimentos é a de ser um direito personalíssimo, ou seja, sua titularidade é própria, com isso, não passa a outrem. Por conseguinte, é justamente em razão dessa característica, que se originam as demais características, as quais analisaremos com maiores detalhes no item a seguir.

2.3 Características da obrigação alimentar.

O parentesco consiste no vínculo existente entre uma pessoa e o tronco ancestral em comum. Observando-se a relação de ascendência e descendência entre os parentes, teremos o que chamamos de parentesco em linha reta. Sem essa relação, mas levando em conta a ancestralidade comum, teremos o parentesco de linha colateral como demonstrado na Figura 1.

[01].

A obrigação alimentar, possui características próprias, quer seja proveniente do casamento, união estável ou originada pelo vínculo de parentesco. As características da obrigação de alimentos, oriundas do parentesco, segundo a doutrina majoritária, são as seguintes: direito personalíssimo, irrenunciabillidade, alternatividade, reciprocidade, impenhorabilidade, irrepetibilidade, imprescritibilidade e transmissibilidade (grifo nosso). Não obstante, outras características serem apresentadas pela doutrina, neste estudo nos reportaremos apenas às já referenciadas, pois a doutrina majoritária [02] apresenta a seguinte classificação:

a) Direito Personalíssimo

É a característica basilar do direito a alimentos, é a partir dela que decorrem todas as demais características. Como ensina Cahali (2002, p. 49) "a característica fundamental do direito de alimentos é representada pelo fato de tratar-se de direito personalíssimo".

É direito personalíssimo, pois visa assegurar a subsistência do ser humano. De acordo com Gomes (2002, p. 431) :

É direito pessoal no sentido de que a sua titularidade não passa a outrem por negócio ou por outro fato jurídico. Consideram-no direito personalíssimo, como uma das manifestações do direito à vida, vale dizer, um direito que se destina a tutelar a própria integridade física do indivíduo.

Nesse sentido, merece destaque os ensinamentos de Maria Berenice Dias, quando esclarece a respeito do direito personalíssimo na obrigação alimentar:

O direito a alimentos não pode ser transferido a outrem, na medida em que visa a preservar a vida e assegurar a existência do indivíduo que necessita de auxílio para sobreviver. Como decorrência direta de seu caráter personalíssimo, trata-se de direito que não pode (1.707): a) ser cedido. O credito alimentar não se sujeita a b) compensação, qualquer que seja a natureza da dívida que venha a lhe ser oposta. A pensão alimentar é c) impenhorável, uma vez que garante a subsistência do alimentado. Tratando-se de direito que se destina a prover o sustento de pessoa que não dispõe, por seus próprios meios, de recursos para sobreviver, inadmissível que credores privem o alimentado dos recursos de que necessita. (DIAS, 2005, p.450-451).

O entendimento doutrinário é pacífico de que a obrigação alimentar caracteriza-se como um direito personalíssimo.

b) Irrenunciabillidade

É irrenunciável o direito aos alimentos decorrentes de parentesco (jus sanguinis). De acordo como o Código Civil no seu art. 1.707 "Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora".

Cabe ressaltar, que o direito aos alimentos sempre foi irrenunciável entre os parentes, com fulcro no art. 404 do Código Civil de 1916. Desse modo, segundo o entendimento de Gomes (2002, p.432):

O que ninguém pode fazer é renunciar a alimentos futuros, a que faça jus, obrigando-se a não reclamá-los, mas aos alimentos devidos e não prestados, o alimentando pode fazê-lo, pois lhe é permitido expressamente deixar de exercer o direito. A renuncia posterior é, portanto, válida.

O cerne da questão é que o encargo alimentar é de ordem pública, ou seja, o interesse público predomina sobre o particular com o escopo de preservar a vida. Assim, é pertinente observarmos o entendimento de Monteiro (2004, p.372) sobre este tema:

Consoante lição de Laurent, o encargo alimentar é de ordem pública, imposto pelo legislador por motivo de humanidade e piedade. Por isso mesmo, não pode ser renunciado. Pode-se deixar de exercer, mas não se pode renunciar o direito a alimentos. O que se pode renunciar é a faculdade de exercício, não a de gozo. Não é válida, portanto, declaração segundo a qual um filho vem a desistir de pleitear alimentos contra o pai. Embora necessitado, pode ele deixar de pedir alimentos, mas não se admite que renuncie a tal direito.

Logo, não há a possibilidade de renunciar o direito a alimentos. E mesmo que sejam renunciados, os credores poderão pleiteá-los em outro momento, se houver necessidades deles para a sua subsistência.

c) Alternatividade

Como regra geral, os alimentos são fornecidos em dinheiro. Não obstante, serem prestados in natura, com a concessão de hospedagem e sustento de acordo com o art. 1.701 do Código Civil. Portanto, trata-se de uma faculdade a maneira de cumprir a prestação de obrigação alimentar.

No entanto, não é considerado um direito absoluto do devedor a escolha para o cumprimento da obrigação, diante do parágrafo único do artigo supra, onde é expresso que o juiz pode determinar outra forma do cumprimento da prestação, como referenciado por Monteiro (2004, p.375):

Se existe, por exemplo, situação de incompatibilidade entre alimentante e alimentado, não pode o juiz constranger o segundo a coabitar com o primeiro sob o mesmo teto. Tal convivência contribuiria certamente para recrudescimento da incompatibilidade, convertendo-se em fonte de novos atritos.

Destarte, a forma de pagamento da prestação alimentícia poderá ser convencionada pelas partes ou por decisão judicial, observando-se sempre a razoabilidade da forma de cumprimento da obrigação.

d) Reciprocidade

De acordo com os arts. 1.694 e 1.696 do Código Civil o direito à prestação de alimentos é recíproco entre os parentes, sendo considerados pertinentes os ensinamentos do eminente doutrinador Luiz Felipe Brasil Santos (2004, p.220):

A obrigação alimentar, pela ordem, fica limitada, em primeiro lugar, aos ascendentes, depois aos descendentes e, por fim, aos irmãos, assim germanos como unilaterais (art. 1.697). Observe-se que na linha reta, seja ascendente ou descendente, não há limitação de grau, ao passo que na colateral resta limitada ao grau mais próximo (irmão). Em cada linha, sempre os mais próximos em grau devem ser chamados em primeiro lugar, sendo a obrigação alimentar dos parentes mais remotos subsidiária e complementar. Isto é, vem depois da dos mais próximos e limita-se a complementar o valor que por estes possa ser prestado.

No entanto, a reciprocidade não significa que o direito que tem uma das partes seja como conseqüência lógica, causa do direito da outra parte. Como esclarece Cahali (2002, p.130), "à evidência, reciprocidade não significa que duas pessoas devam entre si alimentos ao mesmo tempo, mas apenas que o devedor alimentar de hoje pode tornar-se credor alimentar no futuro".

No mesmo sentido dispõe a Desembargadora Maria Berenice Dias (2005, p.451) que:

O credor alimentar de hoje pode vir, em momento futuro, a tornar-se devedor, e vice-versa. A reciprocidade tem fundamento no dever de solidariedade. Com relação aos alimentos decorrentes do poder familiar, não há que se falar em reciprocidade (CF 229). No momento em que os filhos atingem a maioridade, cessa o poder familiar e surge, entre pais e filhos, a obrigação alimentar recíproca em decorrência do vínculo de parentesco.

Por conseguinte, podemos afirmar a existência de reciprocidade da obrigação de prestar alimentos porque o credor poderá tornar-se devedor, ou seja, a situação poderá ser invertida se houver necessidade de um ou de outro de acordo com o caso concreto, é assim, pois no Direito de Família há a possibilidade da reciprocidade do pedido entre os parentes.

e) Impenhorabilidade

A impenhorabilidade é um dos reflexos do direito personalíssimo. A prestação alimentícia visa manter a subsistência do alimentando que não pode prover suas necessidades. Assim, seria inadmissível serem penhoradas às referidas prestações, como considera Gomes (2002, p. 432-433):

A impenhorabilidade do crédito alimentar decorre do fundamento e da finalidade do instituto. Seria absurdo admitir que os credores pudessem privar o alimentando do que é estritamente necessário à sua mantença. Pretende-se que a proteção legal não se estenda à totalidade do crédito, no pressuposto de que, prestados alimentos civis, há sempre uma parte que não corresponde ao necessarium vitae, mas a dissolução é inadmissível. Os alimentos são impenhoráveis no estado de crédito, a impenhorabilidade não acompanhando os bens que forem convertidos. A penhora pode recair na soma de alimentos provenientes do recebimento de prestações atrasadas. Não há regras que disciplinem especificamente tais situações, mas o juiz deve orientar-se pelo princípio de que a impenhorabilidade é garantia instituída em função da finalidade do instituto.

Logo, como o fundamento basilar do instituto visa garantir a subsistência, não há que ser falar em penhora das prestações alimentícias, com o devido fundamento legal no art. 1.707 do Código Civil de 2002.

Em outras palavras, o que se deseja proteger é a vida de uma pessoa, sua alimentação, saúde, educação, habitação, enfim todas as sua necessidades básicas para viver com dignidade. Destacamos que, o crédito alimentar é impenhorável, no entanto, a impenhorabilidade não atinge os frutos.

f) Irrepetibilidade

A obrigação alimentar é irrepetível, isto é, uma vez prestados, os alimentos são irrepetíveis, quer sejam alimentos provisionais ou os definitivos. A natureza do instituto justifica a inteira impossibilidade de restituição.

Por conseguinte, observemos o entendimento de Dias, onde destaca o seguinte:

A própria natureza dos alimentos justifica, por si só, a impossibilidade de serem restituídos. Por isso, a alteração, para menor, do valor da pensão não dispõe de efeito retroativo. Passa a vigorar tão-somente com referência aos valores vincendos. Admite-se a devolução quando houver má-fé ou postura maliciosa do credor. Em nome da irrepetibilidade, não se pode dar ensejo ao enriquecimento injustificado. É o que se vem chamando de relatividade da não-restituição. Soa sobremaneira injusto não restituir alimentos claramente indevidos, em notória infração ao princípio do não-enriquecimento sem causa. (MADALENO, 1999 apud DIAS, 2005, p.452).

No mesmo sentido temos o magistério de Bittencourt que faz as seguintes advertências:

Moura Bittencourt adverte que a regra da irrestituibilidade deve ser entendida em termos, "pois o que não se admite é a restituição de prestações fundadas no fato de vir o alimentando a obter recursos com que possa devolver o que recebeu. Também não cabe restituição do que foi pago a título provisório, durante a demanda a final julgada improcedente, mas admite-se que os alimentos provisionais possam ser computados na partilha em ação de desquite, se a mulher for vencida, o que é uma forma de restituição (RT 309/281)". (BITTENCOURT, 1979 apud CAHALI, 2002, p.128).

Todavia, Arnoldo Wald entende ser cabível a restituição dos alimentos no seguinte caso:

Admite-se a restituição dos alimentos quando quem os prestou não os devia, mas somente quando se fizer a prova de que cabia a terceiro a obrigação alimentar, pois o alimentando, utilizando-se dos alimentos, não teve nenhum enriquecimento ilícito. A norma adotada pelo nosso direito é destarte a seguinte: quem forneceu os alimentos, pensando erradamente que os devia, pode exigir a restituição do valor dos mesmos do terceiro que realmente deveria fornecê-los. (WALD, 2002, p.47).

Compartilha do mesmo entendimento Venosa (2004, p.393), o qual pondera que: "nos caso patológicos, com pagamentos feitos com evidente erro quanto à pessoa, por exemplo, é evidente que o solvens terá direito à restituição".

Porém, Yussef Cahali entende ser irrepetível também nos caso referidos:

Mesmo recebidos por erro na forma assim pretendida, não caberia a restituição pelo alimentário, eis que faltou o pressuposto do enriquecimento sem causa; e quanto à pretendida sub-rogação do terceiro prestante em erro, no direito do alimentário contra o obrigado, a tese apresenta-se discutível. (CAHALI, 2002, p.128).

Também neste sentido a jurisprudência de nossos tribunais:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM ALIMENTOS. FIXAÇÃO DE PENSIONAMENTO PROVISÓRIO. DESCABIMENTO. É descabida, no momento, a fixação de alimentos provisórios em favor do investigante. Não há verossimilhança na alegada paternidade, porquanto tudo que se sabe até agora é que o agravante manteve relações sexuais com a genitora do investigante, mas em período não esclarecido. Ademais, considerando a irrepetibilidade dos alimentos, a inexistência de qualquer elemento concreto acerca das possibilidades financeiras do investigado e o risco de prejuízo irreparável à sua família e filhos, o mais adequado é revogar os alimentos provisórios. DERAM PROVIMENTO. (Agravo de Instrumento nº 70006647747, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 11/09/2003).

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ALIMENTOS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. DEPÓSITO JUDICIAL DOS ALIMENTOS VENCIDOS. SAQUE DA INTEGRALIDADE DOS VALORES. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE CONTRACAUTELA. 1. Em se tratando de execução provisória, não se defere o saque da integralidade dos valores depositados judicialmente para garantir a execução, pois os alimentos mensais estão sendo devidamente pagos e não houve prestação de caução. Ademais, concedendo-se o pedido, eventual decisão da Corte Superior, afastando o dever alimentar, seria inócua em razão da irrepetibilidade dos alimentos, o que configuraria a transformação em definitiva de execução que não o é. 2. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento nº 70004691911, Segunda Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 11/03/2003).

Embora alguns doutrinadores defendam, em determinados casos, a restituição dos alimentos, a doutrina e jurisprudência majoritárias defendem a irrepetibilidade dos alimentos.

g) Imprescritibilidade

O direito aos alimentos é imprescritível, isto é, estando configuradas as condições, o credor terá legitimidade para pleitear os alimentos a qualquer tempo. No entanto, se já houver obrigação estabelecida anteriormente e com prestações vencidas, estas serão suscetíveis de prescrição.

É pacífico que os alimentos são imprescritíveis, porém se faz necessário determinar o alcance da imprescritibilidade, conforme ensina Gomes (2002, p. 432):

Há que distinguir três situações: 1ª) aquela em que ainda não se conjuminaram os pressupostos objetivos, como, por exemplo, se a pessoa obrigada a prestar os alimentos não está em condições de ministrá-los; 2ª) aquela em que tais pressupostos existem, mas o direito não é exercido pela pessoa que faz jus aos alimentos; 3ª) aquela em que o alimentando interrompe o recebimento das prestações, deixando de exigir do obrigado à dívida a cujo pagamento está este adstrito. Na primeira situação, não há cogitar de prescrição, porque o direito ainda não existe. Na segunda, sim. Consubstanciado pela existência de todos os seus pressupostos, seu exercício não se tranca pelo decurso do tempo. Diz-se, por isso, que é imprescritível. Na terceira, admite-se a prescrição, mas não do direito em si, e sim das prestações vencidas. É compreensível e desejável que o prazo prescricional seja curto pela presunção de que se o alimentando deixa de receber por algum tempo as prestações alimentares é porque não estava realmente necessitado.

Em suma, o direito a alimentos é imprescritível, pois o alimentando poderá necessitar do seu recebimento em qualquer momento de sua vida. Mas, uma vez fixados judicialmente, terá inicio o lapso prescricional. O Código Civil de 2002, no art. 206, § 2º estabelece que a prescrição é bienal.

h) Transmissibilidade

A transmissibilidade da obrigação alimentar apresenta-se como uma das inovações do Código Civil de 2002, terminado com uma grande controvérsia sobre a transmissibilidade da obrigação (ALDROVANDI, 2004).

Destarte, a transmissibilidade da obrigação alimentar passa a ser a regra geral. De acordo com o art.1.700 que prevê "a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art.1.694".

De acordo com Luiz Felipe Brasil Santos, não restam dúvidas sobre ser transmissível à obrigação alimentar:

A partir dessa nova disposição do art. 1.700, dúvida não há no sentido de que a transmissibilidade passou a ser característica tanto da obrigação oriunda do parentesco como daquela proveniente do casamento ou da união estável. Isso porque a regra insere-se agora no Subtítulo III, que cuida dos alimentos entre parentes, cônjuges ou companheiros. (SANTOS, 2004 p.221).

Assim, tal regra deverá ser aplicada aos cônjuges, parentes e companheiros. Em capítulo próprio será analisada a transmissibilidade da obrigação alimentar entre parentes, haja vista ser um aspecto fundamental deste trabalho. No capítulo seguinte apresentamos o papel dos parentes nessa discussão e suas responsabilidades ou obrigações no fornecimento de alimentos.


3. DOS PARENTES OBRIGADOS A FORNECER ALIMENTOS

O Código Civil de 2002, nos art.s 1.696, 1.697 e 1.698 elenca os sujeitos da obrigação alimentar, ou seja, os parentes que se encontram obrigados a prestar os alimentos. A relação legal é taxativa, assim, somente os sujeitos enumerados na lei têm legitimidade para prestar ou requerer a obrigação alimentar. De acordo com Gomes (2002, p.429-430) devemos observar que:

Não são todas as pessoas ligadas por laços familiares que estão sujeitas, porém, às disposições legais atinentes aos alimentos, mas somente os ascendentes, os descendentes, os irmãos, assim germanos como unilaterais, e os cônjuges. Limita-se aos colaterais de segundo grau de obrigação proveniente de parentesco. Quanto aos cônjuges, a obrigação pressupõe a dissolução da sociedade conjugal pela separação judicial, visto que, na constância do matrimônio, o dever do marido de sustentar a mulher e o desta de concorrer para as despesas do casal são efeitos jurídicos imediatamente decorrentes do casamento. Do mesmo modo, a obrigação dos pais diz respeito aos filhos adultos, pois, enquanto menores, devem-lhes sustento.

Segundo Welter, os sujeitos obrigados a prestar alimentos, em virtude do parentesco, são os seguintes: os ascendentes, descendentes e os colaterais.

Os alimentos são devidos somente nos seguintes casos: a) pelos ascendentes (pais, avós, bisavós, etc.); b) pelos descendentes (filho, neto, bisneto, etc.); c) pelos irmãos; d) pelo cônjuge ou convivente. Assim, em face da lei, verifica-se que há quatro classes de pessoas obrigadas à prestação alimentícia, formando uma hierarquia no parentesco: "1ª) pais e filhos, reciprocamente (art. 229 da CF); 2ª) na falta destes, os ascendentes, na ordem de sua proximidade com o alimentado; 3ª) os descendentes, na mesma ordem, excluído o direito de representação; 4ª finalmente, os irmãos unilaterais ou bilaterais". Isto é, têm direito aos alimentos somente as pessoas que procedem do mesmo tronco ancestral, excluindo-se parentes por afinidade, por mais próximo que seja o grau. O cônjuge ou companheiro "não se encontra nessa ordem sucessiva, porque deve alimentos em circunstâncias especiais" (WELTER, 2003, p.34-35).

De acordo com o preceituado no art. 1.696 do CC, na obrigação alimentar decorrente do parentesco, deverão prestar os alimentos, em primeiro lugar, os parentes em linha reta, sendo tal obrigação recíproca entre os mesmos, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta dos outros. Em outras palavras, a existência de parentes mais próximos opera a exclusão dos mais remotos da obrigação alimentícia.

Assim, deve-se pedir alimentos ao pai ou a mãe; na falta destes, aos avós maternos e paternos; na ausência destes, aos bisavós maternos e paternos e assim por diante. À falta de parentes em grau mais próximo é equiparada à ausência de possibilidades. Assim, somente após a demonstração da inexistência ou da impossibilidade de um dos parentes de determinada classe em prestar alimentos é que se pode exigir pensão alimentícia de parentes pertencentes às classes mais remotas. O alimentando não pode, sob pena de subverter toda a sistemática do direito–dever dos alimentos, eleger, discricionariamente, os ascendentes que devem socorrê-lo. A prova da impossibilidade, neste caso, deve ser robusta, clara, pois enquanto "o obrigado mais próximo tiver condições de prestar alimentos, ele é o devedor e não se convoca o mais afastado". (SILVA, 2003, p.1.505).

O art. 1.697 do CC expressa que, não havendo parentes em linha reta, serão chamados os colaterais para prestar os alimentos. Cabe destacar, que em relação à linha reta de parentesco não há qualquer limitação de grau, contudo, em relação à linha colateral há limitação ao segundo grau de parentesco.

Inexistindo ascendentes hábeis à prestação de alimentos, a obrigação recai nos descendentes, observada a ordem sucessiva e independentemente da origem da filiação. Na falta de descendentes à obrigação transfere-se aos irmãos, tanto germanos (filhos do mesmo pai e da mesma mãe) como unilaterais (filhos de um mesmo pai ou de uma mesma mãe), (SILVA, 2003, p. 1.506).

No sistema jurídico brasileiro, os parentes por afinidade não têm direito a prestar nem receber alimentos. Como esclarece Rodrigues (2004, p.380), "no direito brasileiro, ao contrário do que ocorre no francês e naqueles sistemas que seguiram o Código Napoleônico, os parentes afins não são obrigados a prestar, nem tem o direito a receber, alimentos uns dos outros". Como conseqüência, os parentes por afinidade não figuram no rol dos sujeitos da obrigação alimentar.

No art. 1.698 do Código Civil de 2002 podemos observar uma repetição dos graus de parentesco na obrigação alimentar. Também fazendo referência a obrigação alimentar complementar, destacamos que o referido instituto será analisado em capítulo próprio.

Como anteriormente mencionado, nos art.s 1.696, 1.697 e 1.698 do Código Civil, temos o rol dos sujeitos obrigados a prestar e receber a obrigação alimentar. No entanto, apesar de grande divergência doutrinária, tem legitimidade também o nascituro. A propósito, confira-se o magistério de Pereira (2003, p. 47):

É importante anotar, ainda, que dentre os legitimados a demandar alimentos se encontra, como já assentou certa corrente doutrinária, a que aderimos, o nascituro.

É que a despeito do fato da personalidade civil do homem só existir, em havendo o nascimento com vida, não se pode olvidar que a lei põe, desde logo a salvo os direitos do nascituro (art. 2º do Código Civil).

Nesse sentido, confira-se a palavra sempre abalizada de Pontes de Miranda:

"A obrigação de alimentar também pode começar antes do nascimento e depois da concepção (Código Civil, arts. 397 e 4º), pois, antes de nascer, existem despesas que tecnicamente se destinam à proteção do concebido e o direito seria inferior à vida, se acaso recusasse atendimento a tais relações inter-humanas, solidariamente fundadas em exigências de pediatria".

Claro é, contudo, que a subsistência no futuro do direito á percepção dos alimentos está condicionada ao nascimento do ser concebido com vida.

No mesmo sentindo, merecem destaque as observações de Porto (2003, p.21):

Importante destacar que também ao nascituro é assegurado direito a alimentos, haja vista que o art. 2º do CC assegura desde a concepção seus direitos e, dentre estes, evidentemente, está o direito à vida, do qual decorre naturalmente o direito a alimentos, no seu conceito amplo de necessidades à subsistência. Eventual demanda em favor de nascituro deverá ser proposta por seu representante legal que tanto poderá ser a mãe ou o pai ou ainda o curador (art. 1.779 do CC).

Como observa Cahali (2002), a questão não é pacífica entre os doutrinadores, de um lado temos Moreira Alves, Clóvis Bevilacqua e Arnold Wald que não reconhecem o nascituro como legítimo titular para pleitear os alimentos, com o argumento de que o nascituro não tem personalidade jurídica. De outro lado, encontramos João Claudino de Oliveira e Cruz, Moura Bittencourt e Pontes de Miranda, que efetivamente, reconhecem o direito do nascituro.

Observemos os entendimentos jurisprudenciais, no que diz respeito aos alimentos pleiteados para o nascituro:

EMENTA: INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. ALIMENTOS PROVISÓRIOS EM FAVOR DO NASCITURO. POSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO DO QUANTUM. 1. Não pairando dúvida acerca do envolvimento sexual entretido pela gestante com o investigado, nem sobre exclusividade desse relacionamento, e havendo necessidade da gestante, justifica-se a concessão de alimentos em favor do nascituro. 2. Sendo o investigado casado e estando também sua esposa grávida, a pensão alimentícia deve ser fixada tendo em vista as necessidades do alimentando, mas dentro da capacidade econômica do alimentante, isto é, focalizando tanto os seus ganhos como também os encargos que possui. Recurso provido em parte. (Agravo de Instrumento nº 70006429096, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 13/08/2003).

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. NASCITURO. Estando o feito no seu início, sem que contenha dados seguros acerca tanto da paternidade imputada ao agravado como a comprovação da alegada união estável entretida entre as partes, inviável a fixação de alimentos provisórios ao nascituro; mormente porque sequer angularizada a relação processual. Agravo de instrumento desprovido. (Agravo de Instrumento nº 70009811027, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 09/11/2004).

Não obstante, a divergência doutrinária, o entendimento jurisprudencial é pacífico em relação à concessão dos alimentos ao nascituro, desde que, seja extreme de dúvidas o vínculo de parentesco entre alimentando e alimentante.

Logo, devemos considerar as observações de Maria Helena Diniz em seus comentários ao art. 2º do Código Civil de 2002:

Ante as novas técnicas de fertilização in vitro e do congelamento de embriões humanos, houve quem levantasse o problema relativo ao momento em que se deve considerar juridicamente o nascituro, entendendo-se que a vida tem início, naturalmente, com a concepção no ventre materno. Assim sendo, na fecundação de proveta, embora seja a fecundação do óvulo, pelo espermatozóide, que inicia a vida, é a nidação do zigoto ou ovo que a garantirá; logo, para alguns autores, o nascituro só será "pessoa" quando o ovo fecundado for implantado no útero materno, sob a condição do nascimento com vida. O embrião humano congelado não poderia ser tido como nascituro, apesar de dever ter proteção jurídica como pessoa virtual, com uma carga genética própria. Embora a vida se inicie com a fecundação, e a vida viável com a gravidez, que se dá com a nidação, entendemos que na verdade o início legal da consideração jurídica da personalidade é o momento da penetração do espermatozóide no óvulo, mesmo fora do corpo da mulher.(DINIZ, 2005, p.6).

Em suma, as pessoas obrigadas a prestar alimentos são: pai e mãe (demais ascendentes), os descendentes e os colaterais de 2º grau (sejam irmãos germanos ou unilaterais). E também, o nascituro que pode ser considerado sujeito podendo pleitear os alimentos, tendo assim, reconhecido o seu direito, salvo melhor juízo.

Superada a questão pertinente a qualificação dos sujeitos obrigados a prestar alimentos, mister se faz uma análise referente aos pressupostos básicos da obrigação alimentar.

O art. 1.694 § 1º do Código Civil de 2002 faz referência aos pressupostos essenciais da obrigação de alimentos, concomitantemente com o que preceitua o art. 1.695 da referida lei. Assim, teremos, de acordo com Diniz (2005), os seguintes pressupostos: vínculo de parentesco, a necessidade do alimentando, a possibilidade econômica do alimentante e a proporcionalidade, na sua fixação, entre as necessidades do alimentário e os recursos econômico-financeiros do alimentante, ou seja, o consagrado binômio necessidade-possibilidade.

Em relação ao vínculo de parentesco, somente sua existência, automaticamente, não torna exigível a obrigação alimentar. Podemos dizer que, para tornar exigível a obrigação de alimentos, é imperioso a presença concomitante de todos os seus pressupostos básicos. Nesse sentido corrobora Gomes (2002, p. 430-431):

Não basta, todavia, a existência do vínculo de família para que a obrigação se torne exigível; é preciso que o eventual titular do direito à prestação de alimentos os necessite de verdade. Necessário, numa palavra, que esteja em estado de miserabilidade. Por tal deve-se entender a falta de recursos, sejam bens ou outros meios materiais de subsistência, mas, também, a impossibilidade de prover, pelo seu trabalho, à própria mantença.

Ainda, porém, que faça jus ao recebimento da prestação de alimentos, por estar em condições de reclamá-lo, o alimentando não pode exercer o seu direito se aquele de quem os exige não tiver condições de satisfazê-la.

Destacamos, ainda, que os pressupostos da obrigação alimentar são disciplinados pelos princípios da proporcionalidade e da condicionalidade, como ensina Pereira (2003, p. 31-33):

Inicialmente, tem-se que, para a avaliação das necessidades do alimentando à percepção da pensão, há que se considerar não só o que o credor de alimentos, em princípio, precisa para sua própria subsistência, como também, o de que necessita para atender a despesas complementares, a saber, gastos com tratamento de saúde e educação, quando for o caso.

Por outro lado, nos limites do razoável, é possível em certos casos, serem os alimentos fixados ad decorrem, pois não se pode negar ao alimentando-sempre, naturalmente, que o alimentante esteja em condições de proporcionar-o direito de conservar o nível de vida que anteriormente tinha.

Tal proporção visa a, de um lado, assegurar ao credor necessitado, o suficiente para suprir suas reais necessidades e de outro, não comprometer o alimentante com o pagamento de uma pensão superior às forças de sua fortuna, exigindo-lhe um sacrifício superior àquele que o devedor poderia suportar, sem o comprometimento do efetivamente necessário à sua própria mantença.

Os princípios mencionados devem servir como norteadores para a avaliação, de acordo com o caso concreto, da fixação dos alimentos, isto é, de seus valores, observando-se sempre o binômio necessidade-possibilidade. No mesmo sentindo, temos os ensinamentos de Dias (2005, p.469):

Para definir valores, há que se atentar ao princípio da proporcionalidade. Este é o vetor para a fixação dos alimentos. Tradicionalmente, invoca-se o binômio necessidade-possibilidade, ou seja, perquirem-se as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante para estabelecer o valor da pensão. No entanto, esta mensuração é feita para que se respeite o critério maior, da proporcionalidade. Por isso, se começa a falar, com mais propriedade, em trinômio: proporcionalidade-possibilidade-necessidade.

Portanto, não podemos falar em fixação de alimentos sem que esteja presente o binômio necessidade-possibilidade, ou como acrescenta Maria Berenice Dias, o trinômio proporcionalidade-possibilidade-necessidade. A propósito, temos o entendimento de Porto (2003, p.23):

Não há como fugir deste binômio necessidade-possibilidade, pois toda verba alimentar fixada ou pretendida fora da realidade dos envolvidos na relação jurídica alimentar representará, sem dúvida, um verdadeiro convite ao não cumprimento da obrigação; convite este, de regra, decorrente da impossibilidade fática do obrigado.

A jurisprudência vem sinalizando, em certas hipóteses, que um critério razoável para a fixação de alimentos seria aquele que atribui um terço dos rendimentos líquidos do devedor ao credor. Todavia, importante que se registre, nada obsta que os valores a serem pagos fiquem aquém ou ultrapassem o percentual referido, pois a lei não quer o perecimento do alimentado, mas também não deseja o sacrifício do alimentante. Deve, pois, haver uma adequação ao binômio necessidade-possibilidade.

Em síntese, diante dos sujeitos obrigados a prestar e a requerer os alimentos, pois de acordo com a lei o direito á prestação de alimentos é recíproco. Não podemos deixar de examinar a presença de todos os pressuposto, para a devida fixação dos alimentos.

No entanto, devemos diferenciar a obrigação alimentar entre ascendentes e descendentes do dever de sustento, o que faremos a seguir.

2.2. Do dever de sustento e a obrigação alimentar entre os ascendentes e descendentes.

Conforme expressa o art. 229 da Constituição Federal, o dever de assistência existe entre os pais e os filhos menores; e entre os filhos maiores e os seus respectivos pais. Assim, encontra-se legitimada a assistência recíproca entre pais e filhos.

Acontece que existem duas modalidades legais distintas a que estão sujeitos os pais em relação aos filhos: uma consiste no dever de sustento e outra na obrigação alimentar.

Destarte, temos duas ordens de obrigação alimentar como ensina Cahali (2002, p. 525):

A doutrina de maneira uniforme, inclusive com respaldo na lei, identifica duas ordens de obrigações alimentares, distintas, dos pais para com os filhos: uma resultante do pátrio poder, consubstanciada na obrigação de sustento da prole durante a menoridade; e outra, mais ampla, de caráter geral, fora do pátrio poder e vinculada à relação de parentesco em linha reta.

É importante ressaltar que as duas modalidades têm fatores distintivos. A obrigação de sustento origina-se do pátrio poder. O mencionado instituto destina-se à proteção dos filhos. Assim, continuemos a observar os ensinamentos de Cahali (2002, p. 525):

A obrigação de sustento tem a sua causa no pátrio poder. Para permitir aos pais o desempenho eficaz de suas funções, a lei prove os genitores do pátrio poder, com atribuições que não se justificam senão por sua finalidade; são direitos a eles atribuídos, para lhes permitir o cumprimento de suas obrigações em relação à prole; não há pátrio poder senão porque deles se exigem obrigações que assim se expressam: sustento, guarda e educação dos filhos.

No Código Civil de 2002 temos a substituição da nomenclatura pátrio poder por poder familiar, haja vista a garantia constitucional de igualdade entre o homem e a mulher; e ter o instituto o escopo de proteger o menor, devendo ser exercido concomitantemente pelo pai e pela mãe, de acordo com os art.s 5º, I e 226, § 5º da Constituição Federal. Somente haverá exclusividade a um dos pais, na falta ou impedimento do outro. Não obstante fazermos referência à opinião de Rodrigues (2004, p.355):

O novo Código optou por designar esse instituto como poder familiar, pecando gravemente ao mais se preocupar em retirar da expressão a palavra "pátrio", por relacioná-la impropriamente ao pai (quando recentemente já lhe fora atribuído aos pais e não exclusivamente ao genitor), do que cuidar para incluir na identificação o seu real conteúdo, que antes de poder, como visto, representa uma obrigação dos pais, e não da família, como sugere o nome proposto.

Continuando sob o prisma de Rodrigues (2004, p. 356) convém à apresentação do conceito de poder familiar:

O poder familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes.

O fato de a lei impor aos pais, com o fim de proteger os filhos, realça o caráter de munus público do poder familiar. E torna irrenunciável.

Desta forma, Regina Silva em seus comentários sobre o art. 1.631 do Código Civil acrescenta o seguinte:

O poder familiar deve ser exercido por ambos os pais, conforme ditames constitucional da absoluta igualdade entre homens e mulheres. Tanto o pai como a mãe devem atuar na educação e formação dos filhos, não havendo distinção entre um e outro no exercício desse poder.

Caso haja desacordo entre os progenitores no exercício desse poder, é assegurado a quaisquer deles recorre ao Judiciário para a solução da divergência, excetuando-se somente questões de cunho personalíssimo, sobre as quais descabe áquele pronunciar-se. (SILVA, 2003, p. 1.443).

Há uma presunção da necessidade para os filhos menores, obrigando aos pais a prestação do sustento, pois como preceitua o art. 1.630 do Código Civil, os filhos enquanto menores, estão submetidos ao poder familiar. De outro lado, a obrigação decorrente do poder familiar, extingue-se com a maioridade dos mesmos, com ensina Cahali (2002, p.527), "assim, o dever de sustento vinculado ao pátrio poder só cessa com a maioridade, ainda que, pela sua idade, o filho já estivesse apto para o trabalho em face de legislação específica".

Sob o mesmo ponto Cahali (2002, p.528) enfatiza que:

O dever de sustento, assim não é recíproco a benefício dos genitores e cessa com a maioridade do filho.

Efetivamente, com a maioridade, pode surgir obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos, porém de natureza diversa, fundada no art. 1.694 do Código Civil; essa obrigação diz respeito aos filhos maiores que, por incapacidade ou enfermidade, não estiverem em condições de prover à sua própria subsistência.

Todavia, devemos destacar que a jurisprudência vem prorrogando esse prazo, como destaca Dias (2005, p. 455-456):

Atenta às dificuldades atuais da sociedade, em que há necessidade cada vez maior de qualificação para a inserção no mercado de trabalho, a jurisprudência vem dilatando o período de vigência dos alimentos, contanto que o filho se encontre estudando.

No mesmo sentido, Welter (2003), em síntese, elenca as três possibilidades de prorrogação do prazo para a prestação de alimentos oriundos do poder familiar aos filhos maiores: a) alimentos ao filho maior e incapaz; b) alimentos dos pais ao filho maior e capaz que cursa escola profissionalizante ou faculdade; e c) alimentos dos pais ao filho maior, capaz e indigente. Welter (2003, p.122), acrescenta que:

Consta no art. 16 da Lei nº 6.515/77 que "as disposições relativas à guarda e à prestação de alimentos aos filhos menores estendem-se aos filhos maiores inválidos". Os mesmos termos estão contidos no art. 1.590 do Código Civil de 2002; "as disposições relativas à guarda e prestação de alimentos aos filhos menores estendem-se aos filhos maiores incapazes", ou seja, "a maioridade faz cessar o poder familiar (pátrio poder), mas não extingue a obrigação alimentar se o alimentando é pessoa doente, incapaz de prover sua subsistência e gerir os atos da vida civil".

O pode familiar, de acordo com a lei, poderá ser suspenso, destituído ou extinto, de acordo com a doutrina de Diniz (2005):

a) suspensão do poder familiar: as causas de suspensão estão arroladas, genericamente, no art. 1.637 do Código Civil. Consiste na sanção que visa a preservar os interesse do filho, privando o genitor, temporariamente, do exercício do poder familiar, por prejudicar um dos filhos ou alguns deles; retorna ao exercício desse poder, uma vez desaparecida a causa que originou tal suspensão;

b) destituição do poder familiar: os casos estão elencados no art. 1.638 do Código Civil. É uma sanção mais grave que a suspensão, imposta, por sentença judicial, ao pai ou mãe que pratica qualquer um dos atos que a justifiquem, sendo, em regra, permanente, embora o seu exercício possa restabelecer-se, se provada a regeneração do genitor ou se desaparecida a causa que determinou, por ser medida imperativa abrange toda a prole e não somente um ou alguns filhos. Assim, será destituído do poder familiar pai ou mãe que: castigar imoderadamente o filho, deixar o filho em abandono, praticar atos contrários à moral e aos bons costumes, incidir reiteradamente nas faltas do art. 1.637;

c) extinção do poder familiar: os casos estão elencados no art. 1.635 do Código Civil. O poder familiar é extinto pela morte dos pais ou do filho, pois a morte de um deles não extingue o poder familiar, visto que o outro o exercerá sozinho; pela emancipação do filho, ou seja, aquisição da capacidade civil antes da idade legal nos casos do Código Civil, art. 5º parágrafo único, equiparando-se a pessoa maior, deixa, então, de submeter-se ao poder familiar; pela maioridade do filho; pela adoção, que extingue o poder familiar do pai ou mãe carnal, transferindo-o ao adotante; se falecer o pai adotivo, não se restaura o poder familiar do pai ou mãe natural, nomeando-se tutor ao menor.

É essencial que se compreenda as diferenças básicas entre o dever de sustento e a obrigação alimentar. O que referenciamos de acordo com a doutrina de Cahali (2002):

a) a obrigação alimentar é recíproca entre pais e filhos; já o dever de sustento não é recíproco a benefício dos genitores e cessa com a maioridade do filho;

b) a obrigação alimentar do art. 1.696 do Código Civil é proporcional, segundo o art. 1.694, §1º da referida lei, à capacidade econômica de quem os deve e as necessidades de quem os reclamam; trata-se, pois, de uma obrigação de conteúdo variável e contingente, enquanto o dever de sustento dos filhos menores, imposto aos genitores, caracteriza-se como sendo absoluto, sem qualquer consideração às respectivas fortunas.

c) o dever de sustento se extingue com a maioridade, ou mesmo com a emancipação do filho: ao romper-se o vínculo do pátrio poder, cessam os efeitos do mesmo, entre os quais o dever de sustento do filho, e surge como única e autônoma a prestação legal de alimentos, condicionada, agora, esta, ao estado de necessidade do filho e à possibilidade do genitor;

d) o dever de sustento que pesa sobre os pais (art. 1.566, IV), não se estende aos outros ascendentes, e não é recíproco; a obrigação alimentar (art. 1.696), ao contrário, é recíproca entre todos os ascendentes e descendentes, qualquer que seja o grau de parentesco e qualquer que seja a idade do alimentando, mas não se exime da prova dos pressupostos do art. 1.694, § 1º do Código Civil,

e) tecnicamente, a obrigação de sustento define-se como uma obrigação de fazer; enquanto a obrigação alimentar consubstancia uma obrigação de dar.

No entanto, a maioridade não retira do filho o direito de reivindicar alimentos aos seus ascendentes. Efetivamente com a maioridade poderá surgir à obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos maiores, só que de natureza fundada no art. 1.694 do Código Civil. Por incapacidade ou enfermidade, caso os filhos maiores não tenham condições de prover sua própria subsistência.

De acordo Cahali a diferença existente entre dever de sustento e obrigação alimentar consiste basicamente no seguinte:

O dever de sustento se extingue com a maioridade, ou mesmo com a emancipação do filho: ao romper-se o vínculo do pátrio poder, cessam os efeitos pessoais do mesmo, entre os quais o dever de sustento do filho, e surge como única e autônoma a prestação legal de alimentos, condicionada, agora, esta, ao estado de necessidade do filho e à possibilidade do genitor.

A obrigação alimentícia que surge com a cessação do dever de sustento que resultou da maioridade é uma obrigação que pode durar por toda a vida do alimentário: "Esse direito do filho ao qual corresponde à obrigação dos pais perdura até a morte".

O dever de sustento que pesa sobre os pais (art. 1.566, IV, do Código Civil), não se estende aos outros ascendentes e descendentes, não é recíproco; a obrigação alimentar do art. 1.696 do Código Civil, ao contrário, é recíproca entre todos os ascendentes e descendentes, qualquer que seja o grau de parentesco e qualquer que seja a idade do alimentando, mas não se exime da prova dos pressupostos do art. 1.694, § 1º, do Código Civil. (2002, p.528-529).

Enfim, podemos referir que com a cessação do dever de sustento poderá, dependendo do caso concreto, emergir a obrigação alimentar. Destacamos, ainda, que há a obediência ao princípio da reciprocidade no âmbito da obrigação alimentar, no entanto, em relação ao dever de sustento não há que se invocar tal princípio, pelos motivos já apresentados.

Podemos destacar, ainda, que a maioridade do filho não implica automaticamente na interrupção do pagamento dos alimentos, a qual apenas deixa de ter como causa o poder familiar e passar a ser legitimada com fundamento no princípio da solidariedade entre os parentes.

Diante dos esclarecimentos supra, mister se faz uma breve análise sobre a obrigação alimentar existente entre os colaterais, ou seja, a obrigação dos irmãos. Pois, efetivamente, o nosso Código Civil reconhece tal obrigação em seu art. 1.694, cabendo ressaltar que, em linha colateral ou transversal, o parentesco estende-se até o quarto grau com fulcro no art. 1.592; no entanto, na linha colateral há limitação ao segundo grau de parentesco na obrigação alimentar como expressa o art. 1.697; e que como já referimos, o parentesco em linha reta tem vínculo infinito (Figura 1).

2.3. Da obrigação alimentar entre os colaterais

De acordo com o estatuto civil pátrio, os irmãos, tanto os germanos como os unilaterais, foram incluídos no rol de parentes com obrigação legal à prestação de alimentos limitados ao segundo grau de parentesco, com base legal no art. 1.697 do referido estatuto.

Em seus comentários ao art. 1.697 do Código Civil, Silva (2003, p.1506) esclarece que:

Inexistindo ascendentes hábeis à prestação de alimentos, a obrigação recai nos descendentes, observada a ordem sucessiva e independentemente da origem da filiação. Na falta de descendentes à obrigação transfere-se aos irmãos, tanto germanos como unilaterais. Assim, enquanto na linha reta de parentesco não há limitação de grau, na linha colateral há limitação ao segundo grau de parentesco na obrigação de alimentos.

Em conseqüência a limitação existente na linha colateral, observa Monteiro que há colisão com o direito sucessório. Haja vista, que o mesmo compreende até o quarto grau de acordo com o art. 1.839 do Código Civil. Nesse sentido o referido doutrinador refere o seguinte:

Note-se que, diante da impossibilidade parcial de um parente mais próximo prestar alimentos, a responsabilidade a que estão sujeitos os parentes mais distantes é complementar.

A obrigação alimentar é de natureza legal, a cargo das pessoas expressamente designadas, de tal forma que se deve ter sua indicação por taxativa e não enunciativa.

Conseguinte, os demais parentes não se acham sujeitos ao encargo alimentar. Este, na linha colateral, não vai além do segundo grau, o que como observa Bonfante, colide com o direito sucessório, que, em nossa legislação, vai até o quarto grau (at. 1.839). Por conseguinte, no direito pátrio, o onus alimentorum não coincide com o emolumentum successionis. (MONTEIRO, 2004, P. 367).

Como já referimos, a obrigação legal à prestação de alimentos, na linha colateral é limitada ao segundo grau de parentesco de acordo com art. 1.697 do Código Civil, e nesse sentido é pacífica a doutrina e a jurisprudência.

Não obstante, vale ressaltar o surgimento de teses que admitem legitimidade até o quarto grau, para que sejam pleiteados os alimentos, como demonstra Dias (2005, p. 460):

Ainda que, reconhecendo ser mais ampla a ordem de vocação hereditária, de forma maciça, a doutrina não admite que a responsabilidade alimentar ultrapasse o parentesco de segundo grau. No entanto, não se pode emprestar tal sentido ao fato de não ter o legislador reconhecido à necessidade de detalhamento sobre a obrigação dos parentes de terceiro e quarto graus. Trazer a lei algumas explicitações quanto à obrigação entre ascendentes e descendentes, bem como detalhar o dever dos irmãos, não exclui os demais parentes do encargo alimentar. O silêncio não significa que tenham sido excluídos do dever de pensionar. Os encargos alimentares seguem os preceitos gerais: na falta dos parentes mais próximos são chamados os mais remotos, começando pelos ascendentes, seguidos dos descendentes. Portanto, na falta de pais, avós e irmãos, a obrigação passa aos tios, tios-avós, depois aos sobrinhos, sobrinhos-neto e, finalmente, aos primos.

O entendimento sobre a possibilidade da obrigação de alimentos por tios é bastante divergente no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul de acordo com a notícia abaixo transcrita:

A 7ª Câmara Cível do TJRS apreciou anteontem apelação em ação de alimentos, movida contra avô e quatro tias. A autora da ação, universitária, sustentou necessitar de pensão alimentícia para poder continuar seus estudos, pois a mãe é aposentada por invalidez, recebendo em torno de R$ 700,00 por mês do INSS, e o pai encontra-se doente e desempregado desde 1995.

O pedido foi rejeitado por unanimidade, pelo fato de a ação não ter sido movida contra o genitor e, "sem estar comprovada sua impossibilidade financeira, não poderiam ser demandados os parentes". No entanto a relatora, desembargadora Maria Berenice Dias, expressou a convicção de ser possível, em tese, a obrigação de alimentos pelos tios.

Ela explicitou que "a regra diz que parentes devem prestar alimentos uns aos outros e, se não há ascendentes nem descendentes, buscam-se alimentos de outros parentes". Aduziu que o art. 1.694 do Código Civil é absolutamente claro ao reconhecer a obrigação alimentar dos parentes.

Referiu também que "como os parentes até o quarto grau têm vantagens legais, podendo herdar bens, claro que também têm o dever de prestar alimentos". E avançou: "Se têm bônus, também devem arcar com alguns ônus". Questionou a situação de alguém que, necessitando de alimentos não tem pais, avós ou irmãos: "Então morre de fome? E, se morrer de fome quem vai herdar são exatamente os tios ou os primos...".

O desembargador José Carlos Teixeira Giorgis elogiou "o pioneirismo do entendimento", mas observou que embora o Código Civil, em seu artigo 1.694, refira parentes de forma genérica, no art. 1.696 define quem entende por parentes. "O Código poderia ter estabelecido a obrigação aos demais mas não o fez, o que considero eloqüente".

A impossibilidade de prestação de alimentos pelos tios também foi manifestada pelo desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, para quem, "apesar de a tese ser absolutamente inédita, tanto doutrinária quanto jurisprudencialmente", o Código é claro ao limitar, nos arts. 1696 e 1697, as obrigações alimentares (ESPAÇO VITAL, 2004, p.1).

Destarte, a possibilidade de existência de obrigação alimentar entre tios, sobrinhos e primos, ou seja, a existência de obrigação alimentar em linha colateral além do segundo grau de parentesco, é algo inédito, como bem observou o Desembargador Luiz Felipe Brasil, até porque não há base legal, nem tampouco doutrinária que atenda tal pretensão. Nesse sentido, é atual a observação de Chaves (2004, p.1-2):

Primeiramente, observo que se trata de entendimento inédito, como bem destacou o eminente desembargador Luiz Felipe Brasil Santos no voto que lançou em processo onde tal tema estava sendo questionado, e, ouso afirmar, mais do que inédito é inusitado e isolado.

Em segundo lugar, observo que o paralelo traçado pela eminente articulista, entre a obrigação alimentar e a capacidade sucessória é impertinente, na medida em que são institutos diversos e de naturezas distintas, ambos tendo em comum apenas e tão somente o fato de contemplarem parentes numa relação de reciprocidade.

Lembro, ainda, que não há falar em ônus e bônus, na medida em que a capacidade sucessória dos parentes colaterais é limitada e eventual, ou seja, eles somente herdam se ninguém os preceder na ordem de vocação hereditária e, mesmo assim, se o autor da herança quiser, isto é, se não nomear outra pessoa, já que tios, sobrinhos e primos são herdeiros facultativos...

Ora, dentro da relação de parentesco, observo que constitui dever legal próprio dos pais prestar o sustento e também assegurar a plena educação aos filhos menores, sendo que a obrigação alimentar, como decorrência do dever de solidariedade familiar, tem substrato legal na regra do art. 1.694 do Código Civil, o qual estabelece que podem os parentes pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social. Ou seja, os alimentos têm em mira sempre a situação de necessidade pessoal do alimentando (art. 1.695 do Código Civil).

E o Código Civil vigente dispõe, taxativamente, que "o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns na falta dos outros" (art. 1.696), sendo que "na falta dos ascendentes, cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim os germanos como unilaterais" (art. 1.697).

Lembro, por oportuno, que não há qualquer eiva de inconstitucionalidade nessa disposição, na medida em que apenas refere o âmbito do parentesco colateral. Se os irmãos são filhos do mesmo pai e da mesma mãe, são bilaterais; se forem filhos do mesmo pai ou da mesma mãe, são irmãos unilaterais. Isso nada tem de discriminatório e nada tem a ver com igualdade jurídica entre os filhos. Cuida-se apenas da relação entre irmãos e da forma como o parentesco entre eles se estabelece.

Esse é, pois, o universo de pessoas que mantém reciprocamente relação obrigacional alimentar. E nele não estão contemplados, como se vê, nem os tios, nem os sobrinhos, nem os primos...Ou seja, não existe encargo alimentar entre tios e sobrinhos, nem entre primos. A obrigação vai ao infinito na linha reta (pai-filho, avô-neto, bisavô-bisneto e assim por diante), mas, na linha colateral, não supera o segundo grau, isto é, não vai além dos irmãos, sejam eles unilaterais ou bilaterais.

Como colorário, na falta de ascendentes e descendentes, a obrigação alimentar deverá ser imputada aos colaterais de segundo grau (Figura 1). Assim, os tios não estarão obrigados a prestarem alimentos aos sobrinhos, nem mesmos os primos se devem alimentos entre si; e como conseqüência lógica, excluídos também estão os parentes afins, pois a lei não prescreve os alimentos entre pessoas ligadas pela afinidade. Nesse sentido corrobora Cahali (2002, p. 698-699):

A jurisprudência de nossos tribunais é pacífica no sentido de excluir o direito de alimentos entre sogro e nora: a afinidade não origina parentesco, mas apenas aliança, que não é poderosa para criar direito a alimentos; a nora, não sendo vinculada ao sogro pelo ius sanguini, não é parente para ver-se como parte alimentária.

Em relação à afinidade cabe ressaltar que segundo Cahali (2002, p. 700-701) o que segue:

Considerando que, no caso, existe mera relação de afinidade, parece certo que "o padrasto ou a madrasta não tem de manter os enteados; mas, se qualquer deles estiver investido do pátrio poder, a situação se transfigura", é o que ocorre se o enteado vier a ser adotado pelo padrasto, possibilidade legal que aqui não comporta ser discutida.

Não obstante, a realização de breve estudo no plano doutrinário sobre os alimentos entre colaterais, na prática são raros os casos de litígios entre irmãos.

Seguindo, pois, no contexto das transformações advindas do Código Civil pátrio, no capítulo três passaremos aos comentários relacionados com a transmissibilidade da obrigação alimentar.


4. DA TRANSMISSIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ENTRE PARENTES

Com fundamento legal no art. 402 do Código Civil de 1916, verbatim: "a obrigação de prestar alimentos não se transmite aos herdeiros do devedor". Com isso, a questão da intransmissibilidade da obrigação alimentar não gerava nenhum tipo de dificuldade, pois a norma vedava a transmissão da obrigação e diante do entendimento majoritário da doutrina em afirmar a regra contida no artigo supra referido.

Contudo, a Lei 6.515/77 passou a questionar a regra da não transmissibilidade dos alimentos:

Todavia, com o advento da Lei 6.515/77, esta característica sofreu verdadeiro abalo em suas bases e passou a representar tormentoso problema para os estudiosos da temática, já que a referida lei, em seu art. 23, assim disciplinou a matéria: "a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1.796 do CC / 1916". Conforme se vê, a redação do dispositivo é diretamente oposta à constante no art. 402 do CC / 1916. Diante desta situação, observou com talento costumeiro Sérgio Gischkow Pereira: "O direito brasileiro (...) repousava, tranqüilo e imperturbável, sobre o axioma da intransmissibilidade. O art. 402 do CC, impávido, esmagava qualquer tentativa de reação, por mais tímido que fosse seu esboço".

Note-se que o eminente doutrinador gaúcho diz que o direito repousava; significa que ao tempo de sua exposição, em razão do conteúdo do art. 23 da nominada lei, já não passou a repousar com a mesma tranqüilidade.

Como efeito, após a vigência da chamada Lei do Divórcio, passou a se ter divergência de opiniões em torno da matéria, como se verá. (PEREIRA, Apud PORTO, 2003, p.38-39).

Assim, instaurada estava a controvérsia sobre a transmissibilidade da obrigação alimentar, pois se tornou fonte de conflito tanto doutrinário quanto jurisprudencial a interpretação dos artigos já mencionados, haja vista a transmissibilidade ser totalmente incabível com fulcro no art. 402 do CC/ 1916 e se passível de transmissão segundo o art. 23 da Lei do Divórcio. No entanto esclarece Santos (2004, p.221):

Doutrina e jurisprudência majoritárias firmam-se no sentido de que intransmissível é a obrigação alimentar entre parentes (com fulcro no art. 402), enquanto transmissível é a obrigação entre os cônjuges(art. 23 da Lei 6.515/77). Isso porque o parente beneficiário dos alimentos seria também herdeiro do autor da herança, e, de outro lado, de regra, poderia também postular alimentos diretamente aos próprios herdeiros, por possuir parentesco com estes (salvo no caso do irmão alimentado, que possuindo o de cujus filhos, não seria herdeiro e nem poderia pedir alimentos aos sobrinhos.

No mesmo sentido temos o posicionamento de Sérgio Gischkow Pereira onde faz a seguinte referência:

O art. 402 do Código Civil de 1916 previa a intransmissibilidade da obrigação alimentar. Sempre defendi que foi totalmente revogado pelo art. 23 da Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977. Agora temos o art. 1.700 do Código Civil de 2002, que insiste no conteúdo do art. 23. (PEREIRA, 2004, p.143).

A desembargadora Maria Berenice esclarece não haver controvérsia entre os art.s 402 do CC / 1.916 e o 23 da Lei do Divórcio:

A aparente contradição legislativa era solvida pela jurisprudência, atentando ao fato de se tratar de encargos diferenciados: a lei civil regulava os alimentos entre parentes, e a Lei do Divórcio tratava da obrigação entre cônjuges. Predominava o entendimento de que, diante da existência de dever autônomo entre os parentes consangüíneos, a transmissão do encargo geraria desequilíbrio na divisão da herança. Por exemplo, falecido o alimentante, ao transmitir-se aos filhos maiores a obrigação alimentar em relação ao irmão menor, este perceberia herança em valor superior aos demais, em flagrante quebra ao princípio da divisão igualitária dos quinhões. Porém, admite-se a imposição do encargo até ultimada a partilha dos bens, mediante a devida compensação, para que o alimentando-herdeiro não receba duplamente. (DIAS, 2005,p.452-453).

Não obstante, o Código Civil de 2002 inovou ao afirmar expressamente em seu art. 1.700 que a obrigação alimentar transmite-se aos herdeiros do devedor. Desta forma, tanto a obrigação oriunda do parentesco como a oriunda do casamento ou mesmo da união estável são transmissíveis à luz do art. 1.700, isto é, todos os alimentos do direito de família estão regulados conjuntamente. Continuemos com os ensinamentos de Santos (2004, p.221):

No entanto, a partir dessa nova disposição do art. 1.700, dúvida não há no sentido de que a transmissibilidade passou a ser característica tanto da obrigação oriunda do parentesco como daquela proveniente do casamento ou da união estável. Isso porque a regra insere-se agora no Subtítulo III, que cuida dos alimentos entre parentes, cônjuges ou companheiros.

Com isso, temos como superada a controvérsia existente em torno de ser ou não transmissível à obrigação alimentar, ou seja, é pacífica a regra da transmissibilidade da referida obrigação.

Por outro lado, surge o questionamento a cerca da limitação da transmissibilidade, a norma legal expressa a regra de que a obrigação é transmissível, no entanto, silencia no tocante aos seus limites, o que poderá trazer ao hermeneuta equívocos quanto à aplicação do artigo, ora em estudo. No entanto, Pereira (2004, p.145) observa que:

Tudo está em perceber que a transmissão opera exclusivamente no respeitante ao patrimônio deixado pelo de cujus, isto é, não vai além deste, não supera as forças da herança. A obrigação não se transmite, pura e simples, aos herdeiros, mas somente se transfere incidindo sobre o patrimônio do falecido, na proporção deste. Inexistindo bens, desaparecerá a obrigação. Se insuficientes os bens para gerarem o valor integral da pensão, ver-se-á esta reduzida proporcionalmente. Por isto o art. 23 da lei do Divórcio aludia ao art. 1.796 do Código Civil anterior.

Alguns se preocupam porque o art, 1.700 do Código Civil de 2002 se reporta ao art. 1.694 e não menciona dispositivo legal pertinente à herança. Ora, isto em nada altera o fato de que a transmissão só ocorre dentro das forças da herança. Importa é que o artigo 1.700 é claro ao falar em transmissão aos herdeiros: isto significa que cabe aplicar as normas de direito hereditário e nestas é absolutamente pacífico que os débitos do falecido estão limitados pelas forcas da herança.

Diante de tal inovação do diploma legal, mister se faz socorremo-nos da melhor doutrina e jurisprudência. Vejamos os seguintes posicionamentos doutrinários:

É certo que o art. 1.700 não faz qualquer referência a que a transmissibilidade deva ocorrer nos limites das forcas da herança, o que, em princípio, pode conduzir à interpretação de que os herdeiros passam a ser pessoalmente responsáveis pela continuidade do pagamento, independentemente de terem ou não herdado qualquer patrimônio. Tal interpretação, entretanto, não pode prosperar, pois ofenderia uma das características fundamentais da obrigação alimentar que é o fato de ser personalíssima, somente se justificando sua transmissão aos herdeiros na medida em que vinculada às forças da herança. (SANTOS, 2004, p.221).

Na nossa visão, porém, a norma do art. 1.700, do novo estatuto civil, a despeito dos termos aparentemente peremptórios de sua redação, há de ser interpretada cum grano salis, que será possível transmitir aos herdeiros do alimentante, é o débito que tenha sido por ele deixado sem quitação, antes de seu falecimento, não propriamente o encargo alimentar que como obrigação personalíssima deve ser visto, portanto, como intransmissível. (PEREIRA, 2003, p.13).

A obrigação de prestar alimentos que se transmite aos herdeiros do devedor sempre deve ficar limitada aos frutos da herança, não fazendo sentido que os herdeiros do falecido passem a ter obrigação de prestar alimentos ao credor do falecido segundo suas próprias possibilidades. (SILVA, 2003, p.1.509).

Em outros termos, os alimentos transmitem-se aos herdeiros e à sucessão nos limites da herança. Porém, considerando que o filho deixado pelo devedor é irmão dos herdeiros, poderá ele ajuizar ação de alimentos contra seus irmãos (filhos do devedor), não porque é filho do devedor, e sim porque é irmãos dos herdeiros, aplicando-se, com isso, os arts.1.695 e 1.694, cabeço, ambos do novel Código Civil. Nesse último caso, os herdeiros, irmãos do alimentado, respondem não só nos limites da herança, mas também com os seus bens particulares.(WELTER, 2003, p.42).

Em suma, há o entendimento majoritário da doutrina no sentido de que a obrigação alimentar é plenamente transmissível, e que a mesma encontra seus limites no âmbito das forças da herança.

Todavia, eminente doutrinador Sérgio Gischkow Pereira apresenta grande preocupação em relação à interpretação restritiva do art.1.700, pois enfatiza que a transmissão da obrigação alimentar continua mesmo que já tenha sido realizada a partilha:

Lamento, porém, que tenha surgido outra fórmula restritiva ao magnífico sentido do art. 23, hoje 1.700: a transmissão operaria somente até a partilha dos bens do de cujus. Mais perigosa esta interpretação porque seus argumentos valem para o art. 1.700 do Código Civil de 2002. Neste teor foi deliberação do 4º Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Mais preocupante é que o Superior Tribunal de Justiça resolveu por igual forma. Mais uma vez se revela a, com toda a vênia, injustificada resistência aos arts. 23-1.700. Não tenho dúvida de que a transmissão continua mesmo feita a partilha. Esta exegeses restritiva não pode ser acatada porque destrói a razão de ser da transmissibilidade e os elevados objetivos sociais e humanos que ditaram sua aceitação pelo direito brasileiro. Outra vez se põe a herança acima dos alimentos, e os arts. 23-1.700 ficam praticamente letra morta. Não importa, inclusive, que o alimentando reúna a condição de herdeiro; ainda que seja óbvio que se deva fazer uma compensação, para que o alimentado não receba duas vezes, seria injusto que desaparecessem os alimentos com a partilha, pois pode simplesmente acontecer que o quinhão hereditário seja totalmente insuficiente para a manutenção do alimentando! Neste caso penso devem os quinhões dos demais herdeiros serem atingidos pelos alimentos. (PEREIRA, 2004, p. 150).

O Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, participando do julgamento de Apelação Cível destaca que a transmissão da obrigação atinge além das parcelas vencidas, abrangerá também as vincendas, acrescenta que os alimentos subsistirão apenas enquanto não se consumar a partilha (grifo nosso). Como podemos verificar no seguinte julgado:

EMENTA: ALIMENTOS. RESPONSABILIDADE DO ESPÓLIO. TRANSMISSIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO. Configurados os pressupostos necessidade-possibilidade, cabível a estipulação dos alimentos. Isso nos remete ao tema da transmissibilidade da obrigação alimentar, agora tornada inquestionável pelo artigo 1.700 do Código Civil. E não se diga que a transmissão se restringe apenas às parcelas eventualmente vencidas, deixando de abranger as vincendas. É que, em primeiro lugar, esse dispositivo legal refere-se a obrigação e não a dívidas, o que, por si só, deve bastar. Há mais, porém. É que interpretá-lo como abrangendo apenas eventuais parcelas inadimplidas até o ensejo da morte do devedor de alimentos é tornar a regra inteiramente vazia, pelo simples fato de que o artigo 1.997 do CC já torna o Espólio responsável pelo pagamento das dívidas do falecido, não havendo, portanto, necessidade de que a mesma disposição constasse em local diverso. Por isso, e não podendo entender-se que a lei contém palavras inúteis, é evidente que o art. 1.700 determina a transmissão da obrigação, abrangendo parcelas que se vençam inclusive após o óbito do devedor, como no caso. LIMITE DA OBRIGAÇÃO. É certo que o apelante, como filho que é do autor da herança, é também seu herdeiro, em igualdade de condições com os demais descendentes. Logo, mais cedo ou mais tarde lhe serão atribuídos bens na partilha que se realizará no inventário recém iniciado. Nesse contexto, os alimentos subsistirão apenas enquanto não se consumar a partilha, pois, a partir desse momento desaparecerá, sem dúvida, a necessidade do alimentado. PROVERAM. UNÂNIME. (Apelação Cível nº 70007905524, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 22/12/2004).

Outra observação pertinente e de que em uma obrigação temos duas partes: credor e devedor. Os alimentos no direito de família têm como regra a transmissibilidade da obrigação alimentícia em relação ao devedor dos alimentos, pois, em relação ao credor a obrigação é intransmissível, devido os alimentos ter caráter pessoalíssimo, assim, ensina Pereira (2003, p. 6-7):

O direito aos alimentos é intransmissível pelo credor a terceiros ou seus sucessores, após a morte do alimentando.

É evidente, contudo, que o que desaparece com a morte do alimentando é o próprio direito à continuidade à prestação dos alimentos, subsistindo, todavia, para seus herdeiros o indiscutível direito de reclamar, do alimentante, o que deixou de pagar, em vida, ao credor da pensão, o que se entende perfeitamente porque, com observa, com absoluta correção, pontes de Miranda, tais alimentos constituem "direito definitivamente adquirido pelo alimentário: já fazia parte de seu patrimônio; e como tal é perfeitamente transmissível".

Destarte, tem-se que, embora, não possam os herdeiros do alimentando, como sucessores deste, exigir do alimentante a continuidade do cumprimento da obrigação alimentar, o que se explica pelo fato de se estar diante de um direito personalíssimo, como tal intransmissível, é certo que podem aqueles demandar o alimentante para o pagamento das prestações atrasadas, à época própria não satisfeitas, das quais era, em veda, credor o alimentando.

Nesse caso, e è Carvalho Santos quem observa, citando o pensamento de Clóvis Bevilacqua: "estes atrasados não constituem mais pensão alimentar, assumem o caráter de uma dívida comum que deixou de ser paga".

Por outro lado, em relação à transmissibilidade passiva, ou seja, em relação ao devedor de alimentos, Pereira (2003, p.13) enfatiza que:

Na nossa visão, porém, a norma do art. 1.700, do novo estatuto civil, a despeito dos termos aparentemente peremptórios de sua redação, há de ser interpretada cum grano salis, de modo a permitir que se entenda que, na verdade, o encargo que será possível transmitir aos herdeiros do alimentante, é o débito que tenha sido por ele deixado sem quitação, antes de seu falecimento, não propriamente o encargo alimentar que como obrigação personalíssima deve ser visto, portanto, como intransmissível.

Em suma, destacamos que em relação ao credor temos a intransmissibilidade dos alimentos, e, em relação ao devedor temos a transmissibilidade. Contudo os ensinamentos de Pereira (2003) são no sentido de que, a obrigação é intransferível por ser direito personalíssimo, o que se transmite não é a obrigação de prestar alimentos, e sim os débitos existentes.

Outro ponto que merece destaque é que, a transmissão da obrigação alimentar somente se concebe quando a mesma já estiver sido estabelecida, como ensina Dias (2005, p.453-454):

Admite a lei a transmissão da "obrigação" alimentar, isto é, quando o encargo já havia sido imposto judicialmente por ocasião da morte do alimentante. Não cabe confundir obrigação com dever alimentar, quando o direito ainda não foi exigido. A lição de Pontes de Miranda é sempre presente, ao se estabelecer a distinção entre direito-dever; pretensão-obrigação; ação-execução.

Apesar de a lei falar em transmissão aos herdeiros, a obrigação ocorre relativamente ao espólio. O encargo não deve ultrapassar as forças da herança e permanece até a ultimação da partilha. A partir da divisão dos bens, não cabe falar em sucessores, os quais não respondem com seu patrimônio particular pelo pagamento de obrigação alimentar do devedor falecido. Como, via de regra, o credor dos alimentos é herdeiro, ao receber seu quinhão hereditário passa a prover a própria subsistência. Se isso não alcança a força de sua herança, surge o direito de alimentos, mas diretamente frente aos parentes. Mas é obrigação de outra origem, tendo por fundamento a solidariedade familiar.

Diante da mesma questão, Pereira (2004, p.152) esclarece com seu magistério o seguinte:

(...) O que se transmite é a obrigação, e não o dever jurídico. Assim, deve existir obrigação devidamente preconstituída, mediante sentença, condenatória ou homologatória de acordo, ou, pelo menos, mediante acordo extrajudicial, admitindo até que este acordo não seja escrito, mas resulte de costumeiro e regular pagamento de alimentos. Não concordo é que a ação de alimentos seja proposta contra a sucessão ou contra os herdeiros, se os alimentos não vinham sendo pagos antes da morte do alimentante; aí me parece uma demasia, um excesso não confortado pelo sistema legal.

Diante do entendimento doutrinário temos como ponto, que a transmissibilidade da obrigação de alimentos dever ser concebida, desde que a partir da morte do devedor, o mesmo já esteja obrigado a prestá-la. Assim, é pertinente a análise da jurisprudência sobre a questão apresentada:

EMENTA: ALIMENTOS. TRANSMISSÃO. HERDEIROS. ART. 1.700 DO NOVO CÓDIGO CIVIL.

1 - O espólio tem a obrigação de prestar alimentos àquele a quem o de cujus devia, mesmo vencidos após a sua morte. Enquanto não encerrado o inventário e pagas as quotas devidas aos sucessores, o autor da ação de alimentos e presumível herdeiro não pode ficar sem condições de subsistência no decorrer do processo. Exegese do art. 1.700 do novo Código Civil. 2 - Recurso Especial conhecido, mas improvido. (STJ - Resp 219.199 / PB - Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar -j. 10/12/2003).

EMENTA: TRANSMISSIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. ALIMENTOS DEVIDOS PELO ESPÓLIO A HERDEIRO. CONFUSÃO. INOCORRÊNCIA. VIGÊNCIA DO ARTS. 1700 E 1707 DO CÓDIGO CIVIL. Em matéria de alimentos devidos pelo espólio a herdeiro não ocorre confusão. Não obstante o princípio da saisine "segundo o qual ´´aberta a sucessão a herança transmite-se desde logo aos herdeiros ´´ a efetiva fruição do quinhão hereditário somente será possível após ultimada a partilha. Até então, subsiste a necessidade do agravado e a obrigação do espólio, em vigor a disposição do art. 1.700 do CC. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Agravo de Instrumento Nº 70010643922, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 23/03/2005)

Enfim, em relação à limitação da transmissibilidade da obrigação alimentar podemos referenciar, com os fundamentos doutrinários aqui já expostos, as seguintes premissas basilares: a transmissão opera exclusivamente até os limites das forças da herança; os alimentos subsistirão apenas enquanto não se consumar a partilha e a transmissibilidade se opera se a partir da morte do devedor a obrigação já estava constituída, mediante sentença.

Além disso, é pertinente a realização de um breve estudo a respeito da obrigação complementar, pois como sabemos o Código Civil estabeleceu a prestação de alimentos aos ascendentes. Sendo assim, estudaremos a seguir o pedido de alimentos contra os avós, onde desde logo, destacamos ser fundamental a prova da impossibilidade dos pais, para somente assim, serem os avós demandados como devedores dos alimentos.

3.2. Da obrigação alimentar complementar dos avós

Com o propósito de estudarmos a obrigação alimentar complementar, mister se faz uma breve análise sobre a natureza da obrigação alimentar.

Assim, atentemos para os ensinamentos de Pereira, onde há o entendimento de que a obrigação alimentar não é de natureza solidária:

Como observa Pontes de Miranda em seu Tratado de Direito de Família. "A obrigação de alimentar não é solidária, porque a solidariedade não se presume: resulta da lei ou da vontade das partes.

Por não ser solidária tal obrigação, segue-se que, cada uma das pessoas chamadas a prestar alimentos somente responde pela quota que lhe couber."

Quanto à cota de contribuição dos co-obrigados, naqueles casos em que mais de um parente é chamado a prestar alimentos, é certo que não há de ser, sempre, igual, mas antes proporcional aos recursos de cada um, prevalecendo a regra geral do artigo 1.694, § 1º do Código Civil, que estabelece o comprometimento do devedor de alimentos com o cumprimento da obrigação alimentar, guardada a devida proporção com os limites de seus reais recursos. (PEREIRA, 2003, p.27-28).

É importante anotar, contudo, que obrigação prestada em conjunto não é solidária, presente que a solidariedade, como anteriormente já se assinalou, só pode resultar da lei ou do contrato.

Assim sendo, cada co-obrigado só é responsável pela cota de pensão que lhe foi atribuída, não podendo, ausente a solidariedade, ser demandado para o pagamento das cotas dos demais co-obrigados, porventura inadimplentes.

Com o mesmo posicionamento, Cahali (2002, p.141) reforça o entendimento de que a obrigação alimentar não é solidária:

A obrigação alimentar não é solidária.

Pode acontecer que haja diversos devedores postos no mesmo plano, como, por exemplo, vários filhos obrigados à prestação alimentícia em benefício do genitor comum; ou do neto necessitado perante dois avós em condições de fornecer-lhe alimentos; ou pode acontecer que os vários obrigados pertençam a categorias ou graus diferentes, como no caso as esposa diante de seu cônjuge, seu filho ou seu genitor.

Continuando sob o mesmo prisma Monteiro (2004, p.374-375) destaca o caráter da não solidariedade na prestação da obrigação alimentar:

Outro aspecto interessante da obrigação alimentar: na hipótese de coexistirem vários parentes do mesmo grau, obrigados à prestação, não existe solidariedade. Exemplificativamente: um indivíduo de idade avançada, pai de vários filhos, carece de alimentos. Não se tratando de obrigação solidária, em que qualquer dos co-devedores responde pela dívida toda (Cód. Civil de 2002, art. 275), cumpre-lhe chamar a juízo, simultaneamente, num só feito, todos os filhos. Não lhe é lícito dirigir a ação contra um deles somente, ainda que o mais abastado. Na sentença o juiz rateará entre os litisconsortes a soma arbitrada, de acordo com as possibilidades econômicas de cada um. Se um deles se achar incapacitado financeiramente, será por certo exonerado do encargo.

Anote-se ainda que divisível é a obrigação. Em tais condições, numa ação de alimentos, podem os outros parentes obrigados ser chamados a integrar a lide, para o devido rateio da soma fixada em favor do credor de alimentos (Cód. Civil de 2002, art. 1.698).

Todavia, o Código Civil de 2002, em seu art. 1.698 apresenta a obrigação complementar dos parentes, ou seja, se o parente mais próximo não estiver em condições de satisfazer a obrigação os de grau imediato deverão fazê-lo, tendo a obrigação nesses termos caráter estritamente complementar, e não solidário pelos fundamentos já anteriormente apresentados.

Em relação ao artigo supra mencionado, apresentamos os comentários de Aldrovandi e França (2004, p. 55):

Na situação de serem vários os parentes do mesmo grau obrigados a prestar os alimentos, a obrigação será conjunta e divisível, respondendo cada um na proporção dos seus recursos, conforme entendimento que já vinha sendo adotado. Todavia o Novo Código Civil trouxe uma substancial inovação ao prever a possibilidade de ajuizada a ação contra um dos co-obrigados, este poder chamar a integrar a lide todas as outras pessoas obrigadas.

No mesmo sentido, Monteiro (2004, p. 367) corrobora: "Note-se que, diante da impossibilidade parcial de um parente mais próximo prestar alimentos, a responsabilidade a que estão sujeitos os parentes mais distantes é complementar".

Com isso, cabe destacar o posicionamento de Silvio Rodrigues apresentado os seus comentários a respeito da obrigação alimentar complementar:

O novo Código, por previsão expressa contida no art. 1.698, autoriza a pensão complementar dos parentes de grau imediato mais próximo, se o convocado em primeiro lugar não tiver condições de suportar totalmente o encargo. Entretanto, contrariando a orientação que se firmava, previu-se a possibilidade de proposta a ação contra um, serem chamadas a integrar a lide todas as pessoas obrigadas, pertencentes ao mesmo grau.

Segundo, pode causar extremada turbulência no processo, a prolongá-lo demasiadamente em prejuízo do necessitado. Ora, com ou sem o ingresso dos demais obrigados, a responsabilidade do acionado é sempre quantificada diante de seus recursos, e, tratando-se de pensão complementar, cabe ao próprio alimentante demonstrar a limitação de recursos do primeiro obrigado e a pertinência de sua opção, diante da restrição econômica ou participação direta de outros, sob pena de não preencher o requisito "necessidade" (pois teria meios diversos para garantir sua subsistência).

Assim, adequado o art. 1.698, que autoriza pensão complementar, acolhendo neste particular a orientação já consolidada na doutrina e jurisprudência, mas desastroso ao prever a interferência de todos os obrigados no mesmo processo. (RODRIGUES, 2004, p.381).

Logo, a obrigação de prestar alimentos dos avós tem caráter de obrigação complementar, pois serão convocados para suportar a obrigação alimentar pelo vínculo de parentesco com o respectivo credor.

A lei prevê a obrigação complementar dos avós, no entanto, primeiramente é necessário buscar a satisfação da obrigação em relação ao parente mais próximo, como bem adverte Dias (2005, p.458):

É necessário, primeiro, buscar a obrigação alimentar do parente mais próximo. Nada impede, no entanto, intentar ação concomitante contra pai e o avô. Constitui-se um litisconsórcio passivo facultativo sucessivo. Ainda que não disponha o autor de prova da impossibilidade do pai, o uso da mesma demanda atende ao princípio da economia processual. Na instrução é que cabe a prova da ausência de condições do genitor, pois só será reconhecida a responsabilidade dos avós se evidenciar a impossibilidade de o genitor adimplir a obrigação.

Assim, vejamos o entendimento firmado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça:

EMENTA: CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. AVÓS. RESPONSABILIDADE.

A responsabilidade de os avós pagarem pensão alimentícia aos netos decorre da incapacidade de o pai cumprir com sua obrigação. Assim, é inviável a ação de alimentos ajuizada diretamente contra os avós paternos, sem comprovação de que o devedor originário esteja impossibilitado de cumprir com o seu dever. Por isso, a constrição imposta aos pacientes, no caso, se mostra ilegal.

II - Ordem de ´´habeas corpus´´ concedida. (HABEAS CORPUS nº 38.314 - MS (2004/0131543-9) RELATOR : MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO).

Diante do exposto, merece atenção o voto do Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, proferido quando do julgamento de Habeas Corpus supra mencionado, pois enfatiza a necessidade da prova de que os genitores não podem cumprir a obrigação, para que os avós sejam chamados a prestar os alimentos, ou seja, o pedido para os avós somente seria viável se comprovada a impossibilidade do genitor de cumprir com suas responsabilidades:

EXMO. SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (Relator): Conforme se verifica, o alimentando ajuizou ação de alimentos contra os avós paternos, pelo que a MM. juíza de direito determinou fosse emendada a inicial para incluir no pólo passivo da ação o pai do menor, por entender que "... o avô só está obrigado a prestar alimentos ao neto se o pai deste não estiver em condições de concedê-lo, estiver incapacitado ou for falecido; assim, a ação de alimento não poderá contra o ascendente de um grau sem prova de que o mais próximo não pode satisfazê-la. (Yussef Said Cahali, Dos Alimentos, 4. ed. RT, 2003, p. 677)" (fls. 25).

Na contestação alegaram os réus, ora pacientes, impossibilidade jurídica de formulação simultânea de pedido de alimentos contra o genitor e progenitores, salientando a ilegitimidade passiva ´´ad causam´´ dos últimos e afirmando ter o pai do alimentando rendimentos próprios.

Pediram fosse afastada a obrigação de pagar alimentos provisórios sem a prova de que o devedor primário não possa fazê-lo, o que foi indeferido (fls.45).

Esta Corte tem decidido que a responsabilidade alimentar dos avós tem como pressuposto a "falta" dos pais, a ela equiparada a incapacidade de o pai cumprir com sua obrigação (RESP 169.746-MG, Rel. Ministro Ruy rosado de Aguiar, DJ de 22/8/99) e que "não é só porque o pai deixa de admitir a obrigação alimentar devida aos seus filhos que sobre os avós (pais do alimentante originário) deve recair a responsabilidade pelo cumprimento integral" (RESP 366.837-RJ, Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 22/9/2003).

No caso dos autos, não há qualquer decisão judicial no sentido de que o devedor originário esteja incapacitado para cumprir com a sua obrigação. Aliás, sequer consta do acórdão proferido pelo Tribunal ´´a quo´´ tenha o alimentando ajuizado ação de alimentos contra o seu genitor. A ação foi proposta apenas contra os avós paternos, daí a razão de ter a MM. juíza de direito determinado a emenda da inicial para incluir no pólo passivo o devedor primário da obrigação alimentar, no caso, o pai do menor.

A constrição, ´´in casu´´, imposta aos pacientes, se mostra ilegal, como salientado pelo Ministério Público Federal, ´´verbis´´:

"In casu, porém, a representante legal do menor ajuizou a ação de alimentos diretamente contra os avós paternos, sem ao menos pré-questionar a possibilidade de seu genitor em fazê-lo. Assim sendo, a constrição suportada pelos pacientes revela-se manifestamente ilegal".(fls.125)

Ante o exposto, acolho o parecer do ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Henrique Fagundes, concedo a ordem.

Continuemos a examinar o entendimento do STJ, a respeito da obrigação complementar dos avós, referente ao julgamento de Recurso Especial nº 366.837-RJ:

CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. RESPONSABILIDADE COMPLEMENTAR DOS AVÓS.

Não é só e só porque o pai deixa de adimplir a obrigação alimentar devida aos seus filhos que sobre os avós (pais do alimentante originário) deve recair a responsabilidade pelo seu cumprimento integral, na mesma quantificação da pensão devida pelo pai.

Os avós podem ser instados a pagar alimentos aos netos por obrigação própria, complementar e/ou sucessiva, mas não solidária.

Na hipótese de alimentos complementares, tal como no caso, a obrigação de prestá-los se dilui entre todos os avós, paternos e maternos, associada à responsabilidade primária dos pais de alimentarem os seus filhos.

Recurso especial parcialmente conhecido e parcialmente provido, para reduzir a pensão em 50% do que foi arbitrado pela Corte de origem.

Por conseguinte, teremos com pressuposto, em relação à obrigação complementar dos avós que a ação deverá ser proposta inicialmente contra os pais, e, havendo a prova da impossibilidade dos mesmos, só assim surgirá à responsabilidade que deverá ser imposta a cargo dos avós, de acordo com Cahali (2002, p.678-677):

Assim, duas circunstâncias abrem oportunidade para a convocação do ascendente mais remoto à prestação alimentícia: a falta de ascendente em grau mais próximo ou a falta de condições econômica deste para fazê-lo; o grau mais próximo exclui aquele mais remoto, sendo o primeiro lugar na escala dos obrigados ocupado pelos genitores; apenas se faltam os genitores, ou se estes se encontram impossibilitados financeiramente de fazê-lo, estende-se a obrigação de alimentos aos ulteriores ascendentes, respeitada a ordem de proximidade.

Nessa linha, proclama a jurisprudência que o art. 397 do CC não se limita a designar os parentes que são obrigados, mas, ao estender a obrigação alimentar a todos os ascendentes, faz recair a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros; não se afirma, porém, singelamente, que os mais próximos excluem os mais remotos (tal como acontece na vocação hereditária); mas se estabelece apenas que os mais remotos só serão obrigados quando inutilmente se recorrer aos que precederam; desse modo, se admissível a ação de alimentos contra o avô, ocorre a carência dessa ação se qualquer dos genitores do menor tem patrimônio hábil para sustentá-lo, pois o avô só está obrigado a prestar alimentos ao neto se o pai deste não tiver em condições de concedê-lo, estiver incapacitado ou for falecido; assim, a ação de alimentos não procederá contra o ascendente de um grau sem prova de que o mais próximo não pode satisfazê-la.

A título de ilustração, observemos entendimento sobre da obrigação complementar dos avós apresentado pelo Tribunal de Justiça de Goiás de acordo com as notícias abaixo transcritas:

O Tribunal de Justiça de Goiás, por unanimidade da 1ª Câmara Cível, reformou sentença da Justiça de Goiânia que determinara a um avô paterno o pagamento de quatro salários mínimos e meio, a título de pensão alimentícia, a uma neta menor. A decisão foi tomada em apelação cível interposta pelo avô. O relator, juiz convocado Jeová Sardinha de Morais, votou pela extinção do feito, por entender que o apelante era parte ilegítima para integrar o pólo passivo da ação.

O relator ponderou que o art. 397, do atual Código Civil dispõe que o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, um em falta de outro e que esta ordem deve somente ser seguida quando na ausência absoluta dos pais, ou na falta de condição financeira para tal.

Conforme observou, a ação foi primeiramente contra o pai da menor, que está fornecendo pensão à filha, "de forma que o seu inconformismo quanto à quantia ínfima não lhe autoriza a ajuizar nova ação contra o avô no sentido de pleitear um aumento, sem que ainda não foram esgotados os procedimentos necessários ao acionamento de quem é o primeiro colocado na ordem do cumprimento da obrigação alimentar".

O relator ressaltou, ainda, que "incumbir alguém, como o avô, ao cumprimento de uma obrigação, como por exemplo, de pagar pensão alimentícia, mesmo que seja próximo, quando o pai possui condições financeiras razoáveis para sustentar a filha e está em local certo e sabido de onde pode ser encontrado, é injusto e estar-se-ia invertendo a ordem das obrigações previstas na própria lei. Os avós são responsáveis na ajuda da criação dos netos desde que ausentes os pais ou, se presentes, estes provem que são insuficientes financeiramente. Apenas nestes casos, é que se obriga os avós a pagar pensão a netos". (Proc. nº 75234-0/188 - com informações do TJ-GO).(ESPAÇO VITAL, 2004, p. 1).

"A responsabilidade dos avós de prestar alimentos aos netos não é apenas sucessiva, mas também complementar, quando demonstrada a insuficiência de recursos do genitor". Com este entendimento do desembargador Felipe Batista Cordeiro, a 3ª Câmara Cível do TJ de Goiás, por unanimidade, manteve sentença da Justiça de Goiânia que determinara ao pai e à avó de um menor, o pagamento de três salários a título de pensão alimentícia, ficando o primeiro responsável por uma salário mínimo e a avó pelo restante.

Os apelantes alegaram ser exorbitante a quantia fixada, sustentando que não foi levada em conta a situação financeira do pai, bem como não restaram comprovadas as necessidades do menor apelado. Pediram para que os alimentos fossem reduzidos para um salário mínimo mensal, a ser pago unicamente pelo pai do recorrente.

O relator refutou as preliminares de inépcia por ausência de demonstração da renda do primeiro apelante e de ilegitimidade passiva da segunda, ponderando que "a responsabilidade alimentar dos avós não é apenas sucessiva, mas também complementar, posto que serve tanto para suprir as necessidades do alimentado, como para complementar o que o genitor não consegue arcar sozinho".

Para o relator, ficou comprovado que o pai do menor não é capaz de suportar sozinho o ônus da pensão, mesmo porque ele não contesta isso, mas ao contrário diz que a situação financeira não permite o pagamento superior a um salário mínimo.

Quanto ao complemento a ser feito pela avó, observou o relator que se trata de juíza aposentada que, "de acordo com o que ela mesmo afirma, e contra-cheque que junta, recebia, em 2001, um salário líquido de R$ 4.965,54".

A ementa recebeu a seguinte redação:"A responsabilidade dos avós de prestar alimentos aos netos não é apenas sucessiva, mas também complementar, quando demonstrada a insuficiência de recursos do genitor. Não há que se falar em redução do quantum alimentar fixado se não demonstrada impossibilidade de seu pagamento. Apelo improvido". (Proc. nº 79173-4/88 - com informações do TJ-GO). (ESPAÇO VITAL, 2005, p. 1).

Contudo, Cahali adverte que o encargo que os avós assumem, como devedores de alimentos, tem caráter excepcional e transitório:

Ajuizada a ação contra o bisavô, deve ser demonstrado o exaurimento da capacidade econômica dos precedentes em grau, para o surgimento da obrigação alimentícia daquele, e assim sucessivamente.

Adverte-se que, quando ocorre de virem os avós a complementar o necessário à subsistência dos netos, o encargo que assume é de ser entendido como excepcional e transitório, a título de mera suplementação, de sorte a que não fique estimulada a inércia ou acomodação dos pais, primeiros responsáveis. (CAHALI, 2002, p. 682-683).

Finalmente, temos como inquestionável que os avós são partes legítimas em ação de alimentos, no entanto, há de ser extreme de dúvidas que os genitores do credor não possuam condições econômicas de cumprir com a obrigação, pois a obrigação em relação aos avós tem caráter complementar, isto é, a obrigação nesta hipótese é divisível, fazendo com que cada parte arque com o pagamento consoante sua possibilidade.

Cabe ressaltar, que há o entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência a cerca da admissibilidade do pedido de complementação dos alimentos pelos avós, daí por que se dizer que é obrigação divisível, segundo o princípio que rege o direito de família, a solidariedade. Em outros termos, a todos os parentes obrigados a prestar os alimentos, pois podem pleitear o cumprimento segundo a regra de busca aos mais remotos, além da possibilidade de requerer de vários parentes, se não houver possibilidade suficiente dos primeiros obrigados. Finalizando serão apresentadas as conclusões relativas ao estudo realizado.


CONCLUSÃO

Os temas direitos e deveres na obrigação alimentar representa, atualmente, um dos pontos mais expressivos do Direito Civil. É um assunto que, pela sua amplitude e impacto que causa na sociedade, provoca inúmeros debates sempre que é colocado na pauta de discussões no ordenamento jurídico brasileiro. Neste sentido, como demonstramos neste estudo, a questão relacionada à transmissibilidade da obrigação alimentar entre parentes tem sido alvo de maior controvérsia.

O estudo demonstrou que a transmissibilidade da obrigação alimentar está sujeita a um contexto complexo de leis e direitos que leva em conta relações existentes entre a Constituição Federal e o Código Civil de 2002, quanto à possibilidade de transmissão da obrigação alimentar; assim como outros fatores como: a conceituação e as características básicas dos alimentos; a apresentação dos sujeitos da obrigação alimentar; a explicação dos pressupostos básicos da obrigação alimentar; a abrangência de regra da transmissibilidade dos alimentos já estabelecidos; os limites da obrigação a ser transmitida; e a abrangência da obrigação alimentar complementar.

Em resposta a nossa questão de pesquisa, demonstramos que existe um entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência no sentido de que a obrigação alimentar é plenamente transmissível, e que a mesma encontra seus limites no âmbito das forças da herança, o que possibilita ao judiciário a tomada de decisões acertáveis em questões que preservem os direitos, não somente dos alimentandos, mas também, dos potenciais responsáveis perante a lei, pelo pagamento dos alimentos.

Os conceitos apresentados sobre a obrigação alimentar, as relações de parentesco e suas relações com o direito de família, são da maior importância uma vez que possibilita o entendimento das inter-relações e dos limites das responsabilidades existentes entre os parentes na linhagem direta e indireta da obrigação alimentar. É importante ter esses conceitos em mente para uma análise criteriosa e justa de julgamentos de ações envolvendo diferentes tipos de parentesco na obrigação alimentar.

Como destacado na Figura 1, as relações entre os parentes nas linhas ascendentes, descendentes e linha colateral ou transversal, ajuda no entendimento do grau de complexidade na composição das linhas de responsabilidade com a obrigação alimentar e a transmissibilidade dessa obrigação. Ainda, como demonstramos neste estudo, obrigação complementar segue também ao infinito em linha reta, ou seja, em relação aos descentes e ascendentes, já os colaterais são limitados até o segundo grau, ou seja, entre irmãos (unilaterais ou bilaterais). Já a complementação entre tios sobrinhos e primos causa celeuma entre os operadores do Direito. A compreensão dessas linhas de parentesco pode auxiliar de forma bastante significativa, na elaboração de ações de alimentos mais precisas em relação a causas que demandem a obrigação alimentar.

Outro ponto importante demonstrado pelo estudo é que o ordenamento jurídico atual, preconizado pelo Código Civil de 2002, demonstra com clareza as questões inerentes à obrigação alimentar. E que a transmissibilidade da obrigação alimentar passa ser regra geral, com seu fundamento legal no art. 1.700 do referido diploma legal, não se aplicando somente aos parentes, como antes era o entendimento, mas também ao cônjuge e aos companheiros.

O Código Civil de 2002 em seu art. 1.700 inovou ao disciplinar a obrigação alimentar, pois, transformou a transmissibilidade da obrigação alimentar em regra geral. Seja em razão do parentesco, do casamento ou da união estável, o dever de prestar alimentos será transmitido aos herdeiros do devedor, o que poderá gerar situações inusitadas.

É importante ressaltar que a obrigação alimentar não é mais uma imposição da sociedade exclusivamente ao homem, como antigo supridor da família, característica que predominou durante muito tempo na sociedade patriarcal. Atualmente, essa obrigação é compartilhada em igualdade de condições, não somente com as mulheres que também passaram a arcar com a responsabilidade alimentar na dissolução da união dos casais, mas também por outras pessoas ligadas por diferentes graus de parentesco com os potenciais necessitados de alimentos.

O ordenamento jurídico atual é claro no entendimento de que a obrigação alimentar deve ser percebida como um instrumento que possibilite a manutenção da vida em condições dignas de um ser humano, entretanto, um fator crucial na sua aplicação está em como proteger os direitos da pessoa necessitada e manter os direitos, no limite da sua responsabilidade, do responsável pela obrigação alimentar, onde dever vigorar o binômio necessidade-possibilidade. Julgar as diferentes questões envolvendo as mais diversas situações que se apresentar no ambiente jurídico é o grande desafio, neste momento de grandes transformações por que passa a sociedade globalizada.


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Notas

01 Esta figura foi extraída de Juliana Gontijo e Fernando Gontijo. Parentesco e vínculos de afinidade no Novo Código Civil. Porto Alegre, RS. Mar. 2005. Disponível em: . Acesso em 24 mar. 2005.

02 Nesse sentido podemos citar Yussef Cahali, Orlando Gomes, Maria Berenice Dias, dentre outros.


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CASTRO, Ana Paula Soares da Silva de. Alimentos e a transmissibilidade da obrigação aos ascendentes, descendentes e colaterais no Código Civil de 2002. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1664, 21 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10856. Acesso em: 23 abr. 2024.