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As liminares suspensivas das decisões com base no art. 41-A da Lei Eleitoral e o instituto da reclamação constitucional para o STF

As liminares suspensivas das decisões com base no art. 41-A da Lei Eleitoral e o instituto da reclamação constitucional para o STF

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Não cabe mais a nenhuma instância judicial suspender a decisão que aplica o art. 41-A da Lei n.° 9.504/97, realizando o ideal de justiça aguardado pelo povo brasileiro.

Sumário:1. Introdução. 2. O Art. 41-A da Lei n.º 9.504/97. 3. Os Recursos Eleitorais e seus efeitos. 4. A ADI n.º 3592/DF. 5. Os efeitos da declaração de (in)constitucionalidade em controle concentrado pelo STF e a transcendência dos motivos determinantes. 6. Aspectos do instituto da Reclamação Constitucional e a decisão que condena com base no art. 41-A da Lei Eleitoral. 7. Conclusão. 8. Referências Bibliográficas.


1. Introdução

Longe de ser ponto pacífico no direito eleitoral, os efeitos dos recursos eleitorais sempre provocaram acirrados debates entre advogados, promotores, juízes e estudiosos do direito. Não poderia ser diferente, em se tratando da captação ilícita de sufrágios, definida pelo art. 41-A da Lei Eleitoral, uma vez que esse instituto surgiu com a proposta de promover uma revolução copernicana no direito das eleições, seja sob o ponto de vista material, seja sob o ângulo processual.

Desde os primeiros momentos da vigência da Lei Federal n.º 9.840/99, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 9.504/97, muito se questionou qual seria a sorte das decisões condenatórias baseadas no citado dispositivo. Indagavam os céticos se seria necessário continuar a esperar o trânsito em julgado da decisão para finalmente experimentar sua execução; ou então, ao contrário disso, a eficácia da decisão seria imediata, satisfazendo, portanto, a esperança da sociedade em obter um resultado prático mais célere.

Com efeito, vieram os primeiros julgados do TSE sobre o assunto, os quais, para surpresa dos descrentes, acabaram por chancelar as expectativas dos otimistas, firmando reiterada jurisprudência no sentido de consolidar a eficácia imediata das decisões condenatórias baseadas no art. 41-A da Lei Eleitoral. Nesse sentido, citem-se:

"Cassação de registro (L. 9.504/97, art. 41-A): eficácia imediata.

1 – A decisão que, com base no art. 41-A, cassa o registro de candidato tem eficácia imediata, despidos os recursos cabíveis de efeito suspensivo..."

(Questão de Ordem no Resp. n.º 19.538, Ac. n.º 19.528. Rel. Min. Ellen Gracie)

"A decisão fundada no art. 41-A da Lei n.º 9.504/97 terá efeito imediato"

(MC n.º 994, Rel. Min. Fernando Neves, de 31.5.01; Resp. n.º 19.023, DJ. 14.5.01, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo; MC n.º 995, DJ. 8.6.01, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo; Resp. n.º 19.552, 13.12.01, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo; Resp. n.º 19.176, 16.1.01, Rel. Min. Sepúlveda Pertence)

Entretanto, foi o próprio Tribunal Superior Eleitoral, no famoso "Caso Capiberibe" [01], que deixou ruir o edifício no qual ergueu a tese da eficácia imediata, ao conceder liminar em Medida Cautelar, e a seguir confirmá-la, suspendendo os efeitos de sua decisão, consoante os seguintes termos:

"AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO QUE DEFERIU LIMINAR PARA SUSPENDER OS EFEITOS DE DECISÃO DO TSE QUE APLICOU A PENA DO ART. 41-A DA LEI N.º 9.504/97 ATÉ A PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO. NECESSIDADE DE EVITAR SUCESSIVAS ALTERAÇÕES NOS CARGOS DO LEGISLATIVO FEDERAL. Agravo regimental a que se nega provimento." (Ementa do Acórdão n.º 1.341/AP, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 13.5.04)

Isto foi o bastante para fazer pulular nos Tribunais Regionais, sobretudo em relação às eleições de 2004, bem como no próprio TSE, decisões no sentido de homenagear o argumento segundo o qual, tanto quanto possível, se devem evitar as sucessivas alterações nos cargos eletivos [02]. Ou seja, acabou-se por comprometer o sucesso inicial da jurisprudência do TSE, que lançava luzes sob a eficácia imediata das decisões anticorrupção eleitoral, de maneira que, atualmente, no excelso tribunal eleitoralista encontra-se firmada a tese diametralmente oposta.

Todavia, o TSE parece ainda não ter fechado questão quanto à possibilidade de eficácia imediata das decisões consagradoras do dispositivo anticorrupção eleitoral, quando, apreciando as demandas caso a caso, resolve não suspender a decisão da instância inferior, que, estribada no art. 41-A da LE, cassa o mandato ou o diploma dos infratores [03]. Assim sendo, há de se perguntar o intérprete mais curioso: que destino se reservará à questão da suspensividade das decisões com base no art. 41-A da Lei Eleitoral?


2. O Art. 41-A da Lei n.º 9.504/97

Saudado pela crítica especializada como um diploma legal dos mais completos do nosso ordenamento, a exemplo do Código de Defesa do Consumidor e da Lei de Execuções Penais, a Lei Eleitoral foi recebida com aplausos, gerando expectativas positivas nos operadores do direito, no sentido de que ela encerraria todos os problemas do processo eleitoral brasileiro, inclusive porque, dessa norma, esperava-se um contrapeso ao polêmico instituto da reeleição, recém-introduzido à época pela EC n.º 16/96, bem como uma lei processual eleitoral perene, a reger todas as eleições adiante.

Portanto, o legislador eleitoral de 1997 tinha em mente reduzir, senão extinguir, a legislação eleitoral casuística que norteava o processo eleitoral brasileiro, pois, como o art. 16 da CF/88 impõe o princípio da anterioridade anual da lei que rege o processo eleitoral, nossa cultura baseava-se no costume de aprovar uma lei específica para regular cada processo eleitoral. Assim, dentre os objetivos da lei, havia o de criar uma lei geral das eleições, que pudesse reger todos os processos eleitorais vindouros.

Da mesma forma, outra demanda a que se propunha o legislador de 1997 era disciplinar o uso da máquina administrativa para os titulares do executivo que desejem postular a reeleição. Com o fim da irrelegibilidade dos chefes do executivo, a criação de mecanismos de contensão ao poder político em ano eleitoral era medida reclamada por todos aqueles que criticaram ou mesmo que apoiaram a importação do instituto da reeleição, dos quadrantes estadunidenses, para a nossa ordem constitucional. Por conta disso, é que o legislador infraconstitucional resolveu, muito competentemente, cria o art. 73 da Lei Eleitoral, cuja sistemática define as condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais.

Pois bem, a despeito de toda a evolução legislativa materializada pela Lei n.º 9.504/97, sua redação originária descuidou de um problema crucial das nossas eleições, qual seja a corrupção eleitoral. Ou seja, bastou a realização das eleições de 1998 para a sociedade apontar a falta de uma norma que tratasse, com rigor e eficácia, o fenômeno da compra-de-votos, uma vez que, de pouco adiantaria fechar as portas da casa, e deixar uma janela aberta para a delinqüência política que solapa o edifício da vontade popular.

Com efeito, segmentos sociais organizados, assistidos por juristas compromissados com um ideal de justiça, lançaram uma campanha ostensiva nos meios de comunicação de massa, propondo um projeto de lei de iniciativa popular, com a finalidade de aperfeiçoar a Lei Eleitoral coibindo eficazmente a danosa prática da corrupção eleitoral.

Até aquela altura, o problema da compra-de-votos era tratado ora pelo direito penal – que tipifica como criminosa a conduta descrita no art. 299 do Código Eleitoral, mas cuja eficácia era nitidamente nula, uma vez que não se tem notícia na jurisprudência pátria, de alguém que, tenha cumprido pena por ter comprado votos – ora pelo contencioso cível-eleitoral, nos termos do abuso do poder econômico, cuja aferição sempre beneficiava o infrator, por exigir-se a demonstração de que o ilícito comprometeu o resultado final da eleição, assim como dependia do trânsito em julgado da sentença condenatória, para surtir os efeitos da cassação do mandato.

Ou seja, se persistisse aquela conjuntura jurídica, mesmo o infrator que fosse um corruptor eleitoral confesso, uma vez eleito, tinha a quase certeza de que cumpriria todo o mandato e não sofreria nenhuma sanção eleitoral prática. Era a famosa "Teoria do Fato Consumado", reconhecida até por magistrados eleitorais, baseada no pragmatismo segundo o qual: embora certo de que realmente houve o ardil, uma vez realizadas as eleições, o resultado das urnas era intangível.

A concepção, portanto, do projeto lei de iniciativa popular com potencial de moralizar os certames, tocante à prática de compra-de-voto, foi em boa hora assimilado pelo povo brasileiro, porquanto mais de um milhão de eleitores o subscreveram, tendo sido tal projeto aprovado pelo Parlamento, e sancionado pelo Executivo, em tempo recorde, resultando na Lei n.º 9.840/99, que, alterando a Lei n.º 9.504/97, remunerou-a, introduzindo, dentre outras regras, o art. 41-A.

A rigor, o Art. 41-A da Lei Eleitoral nada mais fez do que, em linhas gerais, trazer para a esfera cível-eleitoral o tipo penal do disposto no art. 299 do Código Eleitoral, penalizando o infrator com a cassação do registro ou diploma, e não mais com a quimera de prometer cadeia para quem corromper a vontade popular, à base do poder do dinheiro ou do poder político. Veja-se:

Lei Eleitoral

Código Eleitoral

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999)

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta nãoseja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

Outra grande percepção do legislador "semi-popular" foi escolha da legislação ordinária, e não da legislação complementar, para abrigar o dispositivo, pois, com isso, abriu-se a possibilidade de exigir o cumprimento imediato da sentença ou acórdão, escapando da discussão sobre o tratamento idêntico ao das normas que dispunham sobre inelegibilidade, as quais exigem o trânsito em julgado para surtir efeitos. Aliás, a lógica legislativa da Lei de Inelegibilidades vem sendo objeto de críticas desde seu advento, a ponto de o ex-Presidente do TSE, Min. Paulo Brossard, ter apelidado a norma de "Lei das Inelegibilidades Fictícias".

Assim, como o bem jurídico protegido pelo art. 41-A da Lei das Eleições é a vontade do eleitor, e não a lisura do pleito ou o resultado da eleição, não há que se cogitar, diferentemente do que ocorre com a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, de potencial lesivo para configurar a infração ao disposto na norma. Apenas a prática de corrupção de um único voto, portanto, acarreta na subtração do registro ou do diploma.

Quem corrompe a liberdade de um único eleitor, não pode jamais gerir a coisa pública, nem representar a coletividade, é no mínimo um delinqüente político, não tem perfil para defender o patrimônio público e muito provavelmente vai transformar o mandato eletivo num instrumento para obtenção de interesses pessoais. É um despreparado e não conhece a grandeza do que significa representar o povo.

Acerca da configuração do que venha a ser captação ilícita de sufrágio, a jurisprudência do TSE já assentou que ela acontece quando o candidato participa, ou simplesmente anui com o oferecimento de alguma dádiva, ou simples promessa de vantagem como o fim de obter o voto do eleitor.

E quanto ao rito processual escolhido pelo legislador para apurar a captação ilícita de sufrágio, houve-se bem o elaborador da norma, na medida em que tomou de empréstimo o rito sumário do art. 22 da LC n.º 64/90 – o mesmo que encadeia a AIJE. Todavia, a despeito de possuírem o mesmo rito, a representação com base no art. 41-A não se confunde com a AIJE, pois, embora possam ter a mesma base fática, suas procedências levam a conseqüências não necessariamente idênticas. Uma diferença marcante entre ambas consiste no fato, segundo o qual: a procedência da representação baseada no art. 41-A não atrai a pecha de inelegibilidade, nem incide o art. 15 da LC n.º 64/90 (TSE, AgMC n.º 970), diferentemente do que ocorre com a AIJE.


3. Os Recursos Eleitorais e seus efeitos

Toda a processualística eleitoral está concebida para tutelar um bem da vida muito caro à coletividade: a representação popular, que, concebida em nosso ordenamento através de mandatos periódicos, requer do legislador processual atenção aos valores de celeridade, com a preservação das garantias constitucionais de ampla defesa e do contraditório.

Logo, os ritos processuais eleitorais comuns são sumários, como são, por exemplo, os ritos da AIJE e da representação do art. 41-A da Lei Eleitoral, os quais se utilizam do art. 22 da LC n.º 64/90, bem como os ritos da Ação de Impugnação do Registro de Candidatura (AIRC) e da Ação de Impugnação ao Mandato Eletivo (AIME), que se baseiam no art. 3.º a 14 da LC n.º 64/90; e muitas vezes até sumaríssimos, verbi gratia, as representações por propaganda eleitoral irregular, cujo rito se encontra no art. 96 da LE, e os pedidos de direito de resposta, previstos no art. 58 da LE.

Por serem ritos muito mais rápidos do que os ordinários do processo civil comum, os ritos do processo eleitoral indicam que a aferição da prova não deve ser exaustiva, pois na processualística das eleições deve o magistrado se contentar com um juízo positivo de probabilidade dos fatos narrados na inicial, afinal se fosse para se buscar a verdade real [04] no processo eleitoral o legislador conceberia um rito ordinário a exemplo do que ocorre no processo penal ou civil.

Nesse diapasão, há inclusive autorização, dada ao magistrado eleitoral pelo legislador, para julgar a demanda baseada nos indícios e presunções, e ainda, atentando para os fatos públicos e notórios, bem assim aqueles fatos e circunstâncias que as partes sequer hajam suscitado no processo, consoante preconiza a norma do art. 23 da Lei de Inelegibilidades:

Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral. (LC n.º 64/90)

Essa lógica processual adotada pela legislação reflete-se no sistema recursal eleitoral, de modo a exigir a máxima efetividade das decisões dessa justiça especializada; tanto assim que o art. 257 do Código Eleitoral expressamente proíbe a suspensividade como efeito do recebimento do recurso eleitoral:

Art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo.

Parágrafo Único. A execução de qualquer acórdão será feita imediatamente, através de comunicação por oficio, telegrama, ou, em casos especiais, a critério do Presidente do Tribunal, através de cópia do acórdão.

É dizer, em regra os recursos eleitorais não possuem efeito suspensivo, exceto, claro, quando a própria norma assim o prevê, como sói acontecer no caso dos recursos que combatem decisões que condenam à inelegibilidade, nos termos do art. 15 da LC n.º 64/90, in verbis:

Art. 15. Transitada em julgado a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido.

Na espécie do art. 41-A da Lei Eleitoral, portanto, não há previsão de suspensividade, pois não se cuida de decisão que condene à inelegibilidade. Aliás, é certo, porém, que pode haver casos de condenação com base no art. 41-A da Lei Eleitoral acompanhada de sanção de inelegibilidade, quando, por exemplo, a AIJE constata compra-de-votos em quantidade que revele um potencial de comprometer o próprio resultado da eleição, desequilibrando a igualdade da disputa, hipótese na qual se diz que o recurso eleitoral, nesse caso, deve ser recebido apenas no efeito devolutivo quanto à cassação do registro ou diploma, mas nos efeitos devolutivo e suspensivo em relação à inelegibilidade.

Entretanto, como se noticia na introdução deste trabalho, a jurisprudência do TSE tem admitido emprestar efeito suspensivo a recurso eleitoral agitado contra decisão que condena com base no art. 41-A da LE, fazendo-se o uso, para tanto, da Medida Cautelar Inominada para retardar a execução do julgado.

Com a devida licença das cortes eleitorais que têm adotado essa interpretação, dentre elas o próprio TSE, somos em que, não se pode, em hipótese alguma, conceder medida cautelar para emprestar efeito suspensivo a recurso eleitoral contra tal decisão, pois, além de a concessão de tais medidas serem vedadas expressamente pelo Código Eleitoral, as liminares suspensivas ofendem aos motivos determinantes de decisão proferida pelo STF, na ADIn n.º 3592-4/DF, de observância "erga omnes".


4. A ADIn n.º 3592/DF

Nesta Ação Declaratória de Inconstitucionalidade, movida pelo Partido Socialista Brasileiro – coincidentemente o mesmo partido do proponente da Medida Cautelar n.º 1.341/AP, que suspendeu a eficácia imediata do acórdão do TSE que cassou o então Senador do Amapá, por captação ilícita de sufrágio – propôs a inconstitucionalidade da expressão "e cassação do registro ou do diploma", contido no art. 41-A da Lei das Eleições.

Na inicial da ação constitucional, alegou-se que o referido dispositivo teria criado nova hipótese de inelegibilidade, sem observar a reserva constitucional de lei complementar para regular o assunto, prevista no art. 14, §9° da Constituição [05]. Alegou-se também que o dispositivo estabeleceu hipótese de perda de mandato eletivo em decorrência de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude, sem observar, no entanto, o procedimento previsto para a ação de impugnação de mandato eletivo.

Aplicado o rito de julgamento do art. 12 da Lei n.° 9.868/99 [06], Presidente da República, Congresso Nacional, Advocacia-Geral da União e Procurador-Geral da República, todos pugnaram pela constitucionalidade da norma, diferenciando que a sanção de cassação do registro ou diploma não constitui causa de inelegibilidade, se bem que a parte procedimental do dispositivo se utiliza do rito da AIJE.

No voto do relator, Min. Gilmar Mendes, cujos termos integraram a parte dispositiva do acórdão que julgou improcedente a ADIn, percebe-se que o STF firmou o entendimento segundo o qual a decisão que condena com base no art. 41-A, da Lei das Eleições, deve ser imediatamente executada, se não vejamos:

"É certo que a captação de sufrágio, definida pelo art. 41-A, da Lei n.° 9.504/97, deverá ser apurada de acordo com o procedimento da ação de investigação judicial eleitoral, previsto no art. 22 da LC n.º 64/90, o qual dispõe, em seus incisos XIV e XIV, o seguinte:

XIV - julgada procedente a representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3 (três) anos subseqüentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico e pelo desvio ou abuso do poder de autoridade, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e processo-crime, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;

XV - se a representação for julgada procedente após a eleição do candidato serão remetidas cópias de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11 da Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral.

Tais incisos, no entanto, não se aplicam ao procedimento da representação para apuração da conduta descrita no art. 41-A da Lei n.° 9.504/97, como já decidiu o Tribunal Superior Eleitoral (Ac. n.° 19.587, de 21.3.2002, Rel. Min. Fernando Neves; Ag n.° 3.042, 19.3.2002, Rel. Min. Sepúlveda Pertence).

O procedimento do art. 22, a ser observado na aplicação do art. 41-A, é aquele previsto nos incisos I a XIII. Isso porque, diferentemente da ação de investigação judicial eleitoral, a representação para a apuração da captação de sufrágio não implica a declaração de inelegibilidade, mas apenas a cassação do registro ou diploma.

Por isso, a decisão fundada no art. 41-A da Lei n.° 9.504/97, que cassa o registro ou diploma do candidato, tem eficácia imediata, não incidindo, na hipótese, o que previsto no art. 15 da LC n.° 64/90, que exige o transito em julgado da decisão para a declaração de inelegibilidade do candidato. Os recursos interpostos contra tais decisões são regidos pela regra geral do art. 257 do Código Eleitoral, segundo a qual os recursos eleitorais não têm efeito suspensivo. Assim, não há necessidade de que seja interposto recurso contra a diplomação ou ação de impugnação de mandato eletivo para o fim de cassar o diploma. [07]"


5. Os efeitos da declaração de constitucionalidade em controle concentrado pelo STF e a transcendência dos motivos determinantes

Longe de querer aqui traçar um esboço completo sobre o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade das leis e atos normativos, deve-se pontuar que o controle concentrado neste país é exercido exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal, sendo esta corte o intérprete derradeiro da Constituição Federal e, por conseguinte, é a última palavra em constitucionalidade das normas legais.

Com efeito, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) ou Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), cujas previsões se encontram na Constituição e seus trâmites encontram-se na Lei Federal n.° 9.868/99, o STF tem o poder de expungir do ordenamento a norma questionada ou, então, de consagrar-lhe a validade e a eficácia.

Como se sabe a Emenda Constitucional n.° 03/93 criou o caráter vinculante das decisões do STF em sede de ADC, aspecto que a própria jurisprudência da excelsa corte tratou de emprestar também às decisões em sede de ADIn, tendo a Lei n.° 9.868/99 previsto expressamente o caráter obrigatório destas decisões [08].

Assim sendo, não somente todos os órgãos do Poder Judiciário, mais de igual modo a administração pública direta ou indireta no âmbito federal, estadual ou municipal, deverão pautar suas interpretações de acordo com o que decido pelo STF em sede controle concentrado de constitucionalidade, já que tais decisões possuem eficácia contra todos e efeito vinculante.

Em verdade, quando se trata de decisão do Supremo Tribunal em sede de controle concentrado, não apenas a parte dispositiva do acórdão, mas os próprios os motivos determinantes da decisão possuem efeitos vinculantes, consoante reconhece a doutrina de Alexandre de Moraes, segundo a qual: "os efeitos vinculantes se referem, inclusive, à ratio decidendi, para evitar qualquer tentativa de desrespeito da decisão em sede de jurisdição constitucional [09]".

Para esse grande constitucionalista, seja nos casos de procedência da ação, improcedência da ação, interpretação conforme a constituição, a vinculação obrigatória decorre da própria racionalidade do sistema concentrado de constitucionalidade, onde compete ao Supremo Tribunal Federal, a guarda da Constituição Federal [10].

É dizer, quando o STF decide sobre a constitucionalidade de qualquer lei ou ato normativo, em sede de controle concentrado, as razões de decidir empregadas para a solução do problema também transitam em julgado, com efeitos vinculantes e eficácia contra todos, de modo que há uma verdadeira transcendência dos motivos determinantes da decisão do pretório excelso.

Essa transcendência dos motivos determinantes tem sido reconhecida pela jurisprudência, através do uso do instituto processual da Reclamação (Rcl), veículo processual constitucional que tem se prestado a preservar a autoridade das decisões do STF adotadas no âmbito do controle concentrado.

Um exemplo desse fenômeno se deu, verbi gratia, no acolhimento da Rcl n.° 2.986/SE, movida pelo Estado de Sergipe, onde se cassou decisão do Juízo da 5ª Vara do Trabalho de Aracaju/SE (Processo nº 01.05-1212/00) que, contrariando a inteligência de decisão anterior do STF adotada na ADIn n.° 2.868/PI, não reconheceu a possibilidade de valor referencial inferior ao art. 87 do ADCT [11], com a redação dada pela Emenda Constitucional n.° 37/02.

Isto é, anteriormente ao caso concreto que deu azo à Rcl n.° 2.986/SE, havia o STF julgado a constitucionalidade de lei piauiense que havia estabelecido valores referenciais para as obrigações de pequeno valor – os chamados RPV – abaixo do disposto no art. 87 do ADCT, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.° 37/02, na forma da ementa da ADIn n.° 2.868/PI:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 5.250/2002 DO ESTADO DO PIAUÍ. PRECATÓRIOS. OBRIGAÇÕES DE PEQUENO VALOR. CF, ART. 100, § 3º, ADCT, ART. 87.

Possibilidade de fixação, pelos estados-membros, de valor referencial inferior ao do art. 87 do ADCT, com a redação dada pela Emenda Constitucional 37/2002.

Ação direta julgada improcedente.

(ADIn 2.868/PI, Rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa)

Ignorando as razões de decidir adotadas pelo STF acima mencionada, o Juízo Trabalhista de Sergipe não reconheceu a possibilidade de a lei sergipana estabelecer marco legal para os requisitórios de pequenos valores (RPV’s) inferior ao estabelecido no art. 87 do ADCT, fato que motivou a proposição da Reclamação Constitucional n.° 2.986 em que o Estado de Sergipe obteve o reconhecimento da transcendência da ratio decidendi da ADIn n.° 2.868/PI.

No acórdão da Rcl n.° 2.986/SE, adotada pelo STF, que reconheceu a transcendência dos motivos determinantes de suas decisões, colhe-se a imprescindível lição do Min. Celso de Mello, adiante transcrita:

"O litígio jurídico-constitucional suscitado em sede de controle abstrato (ADI 2.868/PI), examinado na perspectiva do pleito ora formulado pelo Estado de Sergipe, parece introduzir a possibilidade de discussão, no âmbito deste processo reclamatório, do denominado efeito transcendente dos motivos determinantes da decisão declaratória de constitucionalidade proferida no julgamento plenário da já referida ADI 2.868/PI, Rel. p/ o acórdão Min. JOAQUIM BARBOSA.

Cabe registrar, neste ponto, por relevante, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no exame final da Rcl 1.987/DF, Rel. Min. MAURÍCIO CORREA, expressamente admitiu a possibilidade de reconhecer-se, em nosso sistema jurídico, a existência do fenômeno da "transcendência dos motivos que embasaram a decisão" proferida por esta Corte, em processo de fiscalização normativa abstrata, em ordem a proclamar que o efeito vinculante refere-se, também, à própria "ratio decidendi", projetando-se, em conseqüência, para além da parte dispositiva do julgamento, "in abstracto", de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade.

Essa visão do fenômeno da transcendência parece refletir a preocupação que a doutrina vem externando a propósito dessa específica questão, consistente no reconhecimento de que a eficácia vinculante não só concerne à parte dispositiva, mas refere-se, também, aos próprios fundamentos determinantes do julgado que o Supremo Tribunal Federal venha a proferir em sede de controle abstrato, especialmente quando consubstanciar declaração de inconstitucionalidade, como resulta claro do magistério de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS/GILMAR FERREIRA MENDES ("O Controle Concentrado de Constitucionalidade", p. 338/345, itens ns. 7.3.6.1 a 7.3.6.3, 2001, Saraiva) e de ALEXANDRE DE MORAES ("Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional", p. 2.405/2.406, item n. 27.5, 2ª ed., 2003, Atlas).

Na realidade, essa preocupação, realçada pelo magistério doutrinário, tem em perspectiva um dado de insuperável relevo político-jurídico, consistente na necessidade de preservar-se, em sua integralidade, a força normativa da Constituição, que resulta da indiscutível supremacia, formal e material, de que se revestem as normas constitucionais, cuja integridade, eficácia e aplicabilidade, por isso mesmo, hão de ser valorizadas, em face de sua precedência, autoridade e grau hierárquico, como enfatiza o magistério doutrinário (....).

Cabe destacar, neste ponto, tendo presente o contexto em questão, que assume papel de fundamental importância a interpretação constitucional derivada das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função institucional, de "guarda da Constituição" (CF, art. 102, "caput"), confere-lhe o monopólio da última palavra em tema de exegese das normas positivadas no texto da Lei Fundamental, como tem sido assinalado, com particular ênfase, pela jurisprudência desta Corte Suprema:

"(...) A interpretação do texto constitucional pelo STF deve ser acompanhada pelos demais Tribunais. (...) A não-observância da decisão desta Corte debilita a força normativa da Constituição. (...)."

(RE 203.498-AgR/DF, Rel. Min. GILMAR MENDES – grifei)"

Outro caso de reconhecimento da transcendência dos motivos determinantes das decisões do STF adotada em sede controle concentrado de constitucionalidade encontra-se no Rcl n.° 2.363/PA, Rel. Min. GILMAR MENDES, quando sua excelência fez consignar, em expressiva passagem do seu douto voto, o que se segue:

"(...) Assinale-se que a aplicação dos fundamentos determinantes de um ‘leading case’ em hipóteses semelhantes tem-se verificado, entre nós, até mesmo no controle de constitucionalidade das leis municipais.

Em um levantamento precário, pude constatar que muitos juízes desta Corte têm, constantemente, aplicado em caso de declaração de inconstitucionalidade o precedente fixado a situações idênticas reproduzidas em leis de outros municípios.

Tendo em vista o disposto no ‘caput’ e § 1º-A do artigo 557 do Código de Processo Civil, que reza sobre a possibilidade de o relator julgar monocraticamente recurso interposto contra decisão que esteja em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, os membros desta Corte vêm aplicando tese fixada em precedentes onde se discutiu a inconstitucionalidade de lei, em sede de controle difuso, emanada por ente federativo diverso daquele prolator da lei objeto do recurso extraordinário sob exame.

.......................................................

Não há razão, pois, para deixar de reconhecer o efeito vinculante da decisão proferida na ADIn.

Nesses termos, meu voto é no sentido da procedência da presente reclamação."

Assim sendo, o Supremo Tribunal Federal tem enfatizado que a reclamação reveste-se de idoneidade jurídico-processual, se utilizada com o objetivo de fazer prevalecer a autoridade decisória dos julgamentos emanados daquela corte, notadamente quando impregnados de eficácia vinculante, o que também deve ocorrer em relação à ADIn n.° 3.592/DF, na qual o STF fixou o entendimento de que a decisão condenatória adotada com base no art. 41-A da Lei das Eleições tem eficácia imediata.

Ou seja, qualquer decisão da Justiça Eleitoral – inclusive do TSE – que suspender a eficácia da decisão, de qualquer grau, que cassa o registro ou diploma do candidato, nos termos do dispositivo anticorrupção eleitoral, desafia a autoridade da decisão adotada pelo STF, na ADIn n.° 3.592/DF, sendo, portanto, passível de reprimenda pela excelsa corte, através do instituto da Reclamação Constitucional.


6. Aspectos do instituto da Reclamação Constitucional fundada no julgamento da ADIn n.° 3.592/DF e a decisão que condena com base no art. 41-A da Lei Eleitoral

A criação do instituto da Reclamação remonta à doutrina dos poderes implícitos (implied powers) consagrada pela suprema corte americana, adotada historicamente pelo STF, segundo a qual não faz sentido estabelecer uma corte constitucional e não dotá-la de poderes para tornar eficazes suas decisões, de modo que, mesmo antes de qualquer previsão legal, dela já se valiam alguns. Na verdade esse instituto foi expressamente previsto no regimento interno da corte excelsa em 1957. A partir da Carta de 1967, foi criada lei a prevendo; para somente, com o advento da Carta Política de 1988, ser positivada em nosso texto constitucional (art. 102, I, l).

A princípio, somente quando intentada por quem foi parte na respectiva ação direta de inconstitucionalidade, e em ação que tivesse o mesmo objeto, é que o STF a admitia, de modo que terceiro pretensamente interessado não era considerado legitimado processualmente, como acontece atualmente. Porém, com a edição da Lei n.° 9.868/99 o quadro começou a mudar, tendo a Suprema Corte firmado o entendimento de que: "todos os que forem atingidos por decisões contrárias ao entendimento firmado pelo STF no julgamento de mérito proferido em ação direta de inconstitucionalidade sejam considerados parte legitima para a propositura de reclamação [12]".

Portanto, "assiste plena legitimidade ativa, em sede de reclamação, àquele – particular ou não – que venha a ser afetado, em sua esfera jurídica, por decisões de outros magistrados ou Tribunais que se revelem contrárias ao entendimento fixado, em caráter vinculante, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos processos objetivos de controle normativo abstrato instaurados mediante ajuizamento, quer de ação direta de inconstitucionalidade, quer de ação declaratória de constitucionalidade [13]".

Ou seja, qualquer legitimado eleitor na circunscrição, partido político, coligação, candidato, ministério público poderá, no caso de suspensão da sentença ou acórdão que subtrair o registro ou diploma do corruptor eleitoral, pugnar ao STF pela cassação da suspensão, a fim de dar eficácia imediata à decisão judicial eleitoral baseada no art. 41-A da Lei das Eleições.

Quanto ao sujeito passivo da Reclamação Constitucional, este é a autoridade judiciária ou administrativa que afronta a decisão do STF em sede de controle concentrado de constitucionalidade, ou de sua súmula vinculante [14]. Logo, no caso de tribunal ou juízo eleitoral que desconsidere a eficácia imediata da decisão que condena o corruptor eleitoral à perda do registro ou do diploma, ou mesmo do Presidente do Poder Legislativo que se recuse a reconhecer a eficácia imediata da decisão judicial condenatória, com base no art. 41-A da Lei Eleitoral, pode ser figurar como reclamado.

Todavia, é patente que não caberá Reclamação fundada no julgamento da ADIn n.° 3.592/DF como sucedâneo de ação rescisória eleitoral, uma vez que o cabimento desta, no processo eleitoral, é restrito às hipóteses dadas pelo art. 22, I, alínea j [15] do Código Eleitoral; tampouco se poderá manejá-la contra decisões anteriores à publicação do mencionado acórdão do STF, pois o efeito vinculante não é do disposto no art. 41-A, mas da decisão que apreciou a ADIn n.° 3.592/DF.

Quanto ao procedimento de tal Reclamação, devem-se observar os arts. 13, parágrafo único, e 14, I e II, da Lei n.° 8.036/90, bem como os arts. 156 a 162 do Regimento Interno do STF, de modo que seu processamento assemelha-se ao do Mandado de Segurança [16]. Nela a prova é documental, totalmente pré-constituída e deve demonstrar a suspensão da decisão que condena com base no art. 41-A. Essa documentação deve ser juntada à petição endereçada ao Presidente do STF.

Após ser distribuída a Reclamação ao relator, este requisitará informações da autoridade reclamada, estabelecendo-se o prazo de 10 dias para resposta; ordenará a suspensão liminar [17] do ato (art. 14 da Lei n.° 8.036/90), pois a manutenção de condenado por corrupção eleitoral em cargo eletivo gera dano irreparável à sociedade [18]. Após, encaminha-se à Procuradoria-Geral da República para parecer. Empós, seguir-se-á para julgamento definitivo pelo pleno do STF.

Os recursos a serem interpostos são os embargos de declaração, quando se tratar de decisão do pleno, e agravo regimental, contra decisão monocrática do ministro relator. Não cabem embargos divergentes em sede de Reclamação (Súmula 368).


7. Conclusão

Esboçadas as premissas em que se pretendeu solucionar o problema proposto, qual seja, o de analisar uma saída jurídica para estancar as medidas judiciais que obstam a eficácia imediata da decisão condenatória com base no art. 41-A da Lei Eleitoral, tem-se de reconhecer que, a Reclamação Constitucional voltada a defender a autoridade do julgamento do STF, na ADIn n.° 3.592/DF, apresenta-se como alternativa jurídica a ser adotada.

Isto porque a indiscutível constitucionalidade da Lei n.° 9.840/99 (advinda da iniciativa popular das leis, concebida pelo constituinte de 1988 como um dos mecanismos de democracia participativa), reconhecida em sede de controle concentrado de constitucionalidade, revela a premência da eficácia imediata das decisões judiciais que cassam o registro ou o diploma do corruptor eleitoral, uma vez que esta premissa se apresentou como um dos motivos determinantes do julgado do STF, a possuir, portanto, efeitos transcendentes à ADIn n.° 3.592/DF.

Nesse passo, não cabe mais a nenhuma instância judicial suspender a decisão que aplica o art. 41-A da Lei n.° 9.504/97, realizando, outrossim, o ideal de justiça aguardado pelo povo brasileiro.


Notas

  1. No Resp. n.º 21.264/AP, julgado 27.4.2004, o TSE cassou o diploma do Ex-Governador do Amapá, então Senador eleito nas eleições de 2002, pelo mesmo Estado, João Alberto Rodrigues Capiberibe, e de sua mulher Janete Maria Góes Capiberibe. Na ementa do decisum, lê-se: "Prática de conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n.º 9.504/97, acrescentado pelo art. 1.º da Lei n.º 9.840/99: compra de votos. Há, nos autos, depoimentos de eleitoras, prestados em juízo, que atestam a compra de votos." (Parte da Ementa do Acórdão n.º 21.264/AP). Todavia, por meio de liminar concedida pela Min.ª Ellen Gracie, na MC n.º 1.341/AP, confirmada que foi pelo pleno, em 13.5.2004, o TSE suspendeu a execução do julgado no Resp. n.º 21.264/AP, até a publicação do acórdão, considerando a argumentação da defesa do Ex-Senador que informara a intenção de interpor Recurso Extraordinário no STF, alegando a possibilidade de dano de difícil reparação, caso os suplentes viessem a tomar posse.
  2. Nesse sentido, por exemplo, convém invocar a liminar veiculada no site do TSE, em 24 de dezembro de 2007, por seu insigne Presidente, Min. Marco Aurélio, na MC n.º 2278/MA, que concedeu ao Governador Jackson Lago o direito de aguardar no cargo a decisão do Recurso Extraordinário no RCD n.º 671/MA.
  3. Nesse sentido, verbi gratia, pode-se citar a liminar negada pelo Min. César Asfor, em 10.04.2007, ao deputado estadual eleito por Roraima, Antonio Idalino de Melo: "A concessão de efeito suspensivo a recurso, que por lei não goza desse privilégio, é possível segundo a jurisprudência deste Tribunal. Entretanto, essa medida deve ser concedida em situações especiais, quando presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora. Não é essa, porém, a situação dos autos, porque não demonstrada a fumaça do bom direito, consistente na plausibilidade de recurso que sequer foi interposto para esta Corte Superior. (...) À falta desse pressuposto, indefiro a liminar e a própria cautelar."
  4. Sobre o raciocínio judiciário na avaliação da prova, Chaim Perelman preconiza que: "Os depoimentos, os indícios e as presunções quase nunca conduzem a certeza absoluta, mas esta não é exigida: basta que a convicção dos juízes seja suficiente para afastar dúvida razoável." (In Lógica Jurídica, Martins Fortes, São Paulo, 2004, p.225)
  5. § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994)
  6. Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.
  7. Cf. Ementário do STF n.° 2262-2, julgado de 26/10/2006, publicado no DJ de 02/02/2007.
  8. Atualmente, a EC n.° 45/04 trouxe essa mesma disposição para as decisões adotadas em sede de controle difuso, através da edição das chamadas súmulas vinculantes.
  9. In Direito Constitucional, 20ª edição, Atlas, p. 713.
  10. Ob. cit, p. 715.
  11. Art. 87. Para efeito do que dispõem o § 3º do art. 100 da Constituição Federal e o art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias serão considerados de pequeno valor, até que se dê a publicação oficial das respectivas leis definidoras pelos entes da Federação, observado o disposto no § 4º do art. 100 da Constituição Federal, os débitos ou obrigações consignados em precatório judiciário, que tenham valor igual ou inferior a:

    I - quarenta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal;

    II - trinta salários-mínimos, perantea Fazenda dos Municípios.

  12. Reclamação (AgR – questão de ordem) n° 1.880/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, decisão de 06/11/02, informativo STF n° 289. Quanto à possibilidade de manejar a Reclamação para defender medida liminar adotada em sede controle concentrado de constitucionalidade, tem-se a Rcl n° 1.652, Rel. Min. Gilmar Mendes, decisão de 28/04/2002, informativo STF n° 306.
  13. Precedente: Rcl n° 1.722/RJ, Rel. Min. Celso de Mello.
  14. Com a introdução do art. 103-A, §3° na CF/88, pela EC n° 45/04, cuja regulamentação se deu pela Lei n.° 11.417/08, a súmula vinculante passou a ser prevista, dando efeitos vinculativos às questões decididas pelo STF em sede de controle difuso de constitucionalidade. Fredie Didier Jr, in "Transformações do Recurso Extraordinário", artigo assinado em 08/09/2005 e extraído do site www.lfg.com.br sugere o cabimento de Reclamação contra qualquer decisão que antagonize com julgado do STF, oriundo de seu plenário.
  15. Art. 22. Compete ao Tribunal Superior: I - Processar e julgar originariamente: (...) j) a ação rescisória, nos casos de inelegibilidade, desde que intentada dentro de cento e vinte dias de decisão irrecorrível, possibilitando-se o exercício do mandato eletivo até o seu trânsito em julgado. (Competência acrescentada pela LC n° 86/96, sendo que o STF suspendeu a eficácia da expressão "possibilitando-se o exercício do mandato eletivo até o seu trânsito em julgado", no julgamento da ADIn n° 1.459-5, decidida em 17.03.99)
  16. Segmentos da doutrina definem a natureza jurídica da Reclamação Constitucional, ora como ação (nesse sentido: Pontes de Miranda e Leonardo José Carneiro da Cunha), ora como recurso (nesse sentido:Moacir Amaral Santos), todavia o STF, no julgamento da ADIn n° 2.212-1/CE, Rel. Min. Ellen Gracie, pontificou que: "a natureza jurídica da reclamação não é a de um recurso, de uma ação e nem de um incidente processual. Situa-se ela no âmbito do direito constitucional de petição previsto no art. 5º, inciso XXXIV da Constituição".
  17. Leonardo José Carneiro da Cunha, discorrendo sobre a Reclamação Constitucional, particularmente em relação à suspensão do ato impugnado, preconiza que: "A decisão que autoriza a suspensão do processo ou do ato impugnado tem natureza de antecipação de tutela, mas pode ser concedida ex officio pelo relator" (In A Fazenda Pública em Juízo, 5ª edição, Dialética, 2007, p.505).
  18. Aliás, o móvel da Reclamação fundada no julgado da ADIn n.° 3.592/DF é justamente obter um provimento rápido do STF para proporcionar a eficácia imediata da decisão que se baseia no art. 41-A da Lei Eleitoral.

Autor

  • Edmilson Barbosa

    Edmilson Barbosa

    Advogado. Mestre em Direito Constitucional pela UFC. Professor de Direito Eleitoral pela UFC(2004-2006). Professor Convidado da Pós-Graduação em Processo Civil do Curso Juspodivm de Salvador-BA e da Pós-Graduação em Direito Eleitoral do TRE-AL.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARBOSA, Edmilson. As liminares suspensivas das decisões com base no art. 41-A da Lei Eleitoral e o instituto da reclamação constitucional para o STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1884, 28 ago. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11650. Acesso em: 26 abr. 2024.