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Da repetição de indébito tributário referente a tributo lançado por homologação.

Uma síntese da crítica doutrinária e consolidação jurisprudencial após a edição da Lei Complementar n° 118/2005

Da repetição de indébito tributário referente a tributo lançado por homologação. Uma síntese da crítica doutrinária e consolidação jurisprudencial após a edição da Lei Complementar n° 118/2005

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O texto analisa os efeitos da nova lei sobre a prescrição tributária, verdadeiro objetivo do legislador em sua edição e, em especial, a evolução da jurisprudência acerca da disciplina da prescrição da ação de repetição de indébito referente aos tributos lançados por homologação.

RESUMO

Analisa as peculiaridades da lei complementar nº 118, de 9 de fevereiro de 2005, abordando as questões referentes à sua constitucionalidade, efeitos sobre a disciplina da prescrição no Direito Tributário, verdadeiro objetivo do legislador em sua edição e, em especial, a evolução da jurisprudência acerca da disciplina da prescrição da ação de repetição de indébito referente aos tributos lançados por homologação. Para a elaboração do estudo, utiliza-se pesquisa doutrinária e, principalmente, jurisprudencial. Expõe-se o quadro prescricional no Código Tributário Nacional antes e depois da publicação da lei complementar em questão. Aborda a alteração, por meio de aparente interpretação, do prazo prescricional para a ação de repetição de indébito de tributo lançado por homologação, promovida por esta lei. Aclara as conseqüências para o universo jurídico-tributário, dando ênfase ao contribuinte lesado pelo pagamento de indébito tributário e às manifestações jurisprudenciais a respeito. Conclui pela inconstitucionalidade da lei complementar nº 118, demonstrando o real objetivo do legislador, a inocorrência de interpretação autêntica no caso, a ofensa a inúmeros princípios gerais do Direito e, mormente, à evolução e consolidação da jurisprudência a respeito.

Palavras-chave: Real objetivo do legislador complementar. Caráter interpretativo. Irretroatividade. Jurisprudência.

ABSTRACT

Analyses the peculiarities of the supplementary law nº 118 of February 9th, 2005, addressing issues relating to its constitutionality, effects on prescription discipline in Tax Code, the true goal of the legislature in its edition and, in particular, the jurisprudential evolution relative to the prescription term discipline for the claim for refund of tax levy by homologation overpayment. For the development of the study shall be used doctrinaire and, in particular, jurisprudential research. Spells out the prescription framework in the National Tax Code before and after the publication of the supplementary law in question. Addresses the amendment, through apparent interpretation, of the prescription term for the claim for refund of tax levy by homologation overpayment, promoted by the law. Demonstrates the consequences for the legal universe-tax, emphasizing the taxpayer aggrieved by the payment of undue tribute and jurisprudential pronouncements. Concludes by the unconstitutionality of the law nº 118, demonstrating the legislature´s real goal, the not authenticity of the interpretation of the case, the violation of many general principles and, mainly, the evolution and consolidation of jurisprudence on the theme.

Key-Words: legislature´s real goal. Interpretative character. Non-retroactivity. Jurisprudence.


1 introdução

A polêmica em torno do instituto da prescrição encontra-se longe de ser um fenômeno hodierno; ao contrário, fomenta acaloradas discussões não apenas no círculo jurídico científico, mas também dentre os cidadãos comuns, haja vista que estes vêem suas esferas jurídicas constantemente influenciadas pelos efeitos desencadeados pelo decurso do tempo.

No que tange ao Direito Tributário, não poderia ser diferente, uma vez que a prescrição perfaz-se num ponto nodal das relações jurídico-tributárias, tendo sido objeto, no decorrer das últimas décadas, de inúmeros estudos e pronunciamentos judiciais. Nestes últimos, o que se viu foi a constante luta de nossos Pretórios em busca do ponto pacífico acerca da matéria, a interpretação que melhor se coadunaria com os ideais de justiça e bem comum que norteiam o ordenamento jurídico pátrio (Art. 5º [01], LICC).

Deveras, as controvérsias jurídicas decorrentes de relações jurídico-tributárias postas à apreciação do Poder Judiciário sempre se caracterizaram pela discrepância das teses atinentes à prescrição do crédito tributário (execução fiscal) e do crédito titularizado pelo contribuinte (repetição de indébito); sendo que a suscitada discrepância tem como gênese a interpretação atribuída ao instituto sub examine pela Fazenda Pública, ora posicionando-se esta pelo prazo decenal e vintenal, tratando-se de execução fiscal, ora se debatendo pela prescrição qüinqüenal, em versando a lide sobre direito à repetição de indébito tributário.

Concretizada a cizânia interpretativa em questão, o Judiciário, no exercício de seu nobre mister, laborou arduamente para alcançar a equânime solução da controvérsia em tela, tendo, nos últimos anos, quase que pacificado o seu entendimento - ao menos em relação aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação - sobre a questão (a ser mais bem analisado).

Pois bem, ante ao quadro jurídico supramencionado, o Poder Legislativo, como é de notório conhecimento, editou a Lei Complementar nº 118, de 9 de fevereiro de 2005, tendo esta atribuído suposta interpretação autêntica aos dispositivos do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966) que dispõem sobre a prescrição do direito do contribuinte pleitear a repetição de eventual indébito tributário referente a tributo lançado por homologação (artigos 150, § 1º, e 168, I, transcritos em itens subsequentes), quedando-se drasticamente alterada - em favor do Fisco, destaque-se - a interpretação judicial anteriormente consolidada.

De fato, o texto legal em comento - expõe o seu artigo 3º (transcrição em item subsequente) - lançou mão de aparente interpretação para restringir eventual pleito ressarcitório a ser manifestado pelo contribuinte, haja vista que, delimitado em cinco anos o prazo prescricional, contados do pagamento antecipado (Arts. 150, §§ 1º e 4º, do CTN, transcritos em tópico oportuno), o reconhecimento da prejudicial de mérito em questão fulminaria uma enormidade de pretensões postas, ou em vias de sê-lo, à apreciação do Poder Judiciário, sob pena de clara afronta a texto de lei (L.C. nº 118/05). A invasão da esfera de atuação daquele Poder estatal foi manifesta.

Realmente, ao valer-se de tal artifício – a fixação em lei do termo a quo do prazo prescricional para a repetição de indébito (Art. 3º, L.C. 118/05), através de canhestra interpretação autêntica – o Poder Legislativo avançou sobre os limites constitucionalmente relegados à função jurisdicional, dessa forma violando o princípio da independência dos Poderes da União (Art. 2º [02], CF/88).

Outrossim, ao pretender conferir efeito retroativo (Art. 4º. Transcrição em seguida) à interpretação veiculada em seu artigo 3º, a lei complementar nº 118 não observou o princípio da irretroatividade das leis modificativas (Art. 5º [03], XXXVI, CF/88).

Concretizada esta breve digressão, resta claro - é voz corrente entre os doutrinadores - que os vícios supra-expostos determinaram o descompasso da lei complementar ora em comento em relação à Carta Magna, bem como, consolidado o quadro jurídico posterior à edição daquela, consubstanciado nas inevitáveis manifestações jurisprudenciais supervenientes, a violação do direito do contribuinte à uma tributação condizente com as garantias fundamentais constantes do bojo da Constituição Federal de 1988.


2 da prescrição no direito tributário

Antes de adentrar nos pormenores que caracterizam e individualizam a prescrição aplicada ao Direito Tributário, apartando-a, em virtude de suas especificidades, dos demais ramos do Direito, importante discorrer, mesmo que brevemente, acerca do histórico legislativo responsável pelo traçado das linhas mestras do instituto jurídico ora em análise no universo tributário nacional.

Pois bem, fixando preliminarmente e superficialmente – haja vista que será mais bem aclarado em seguida - a noção de que a prescrição, no Direito Tributário, é vista sob duas perspectivas diferentes, quais sejam, a prescrição da ação de repetição de indébito tributário eventualmente adimplido pelo contribuinte e a da ação executiva concernente à cobrança, pelo Fisco, de débito atribuído aquele, passemos ao tratamento dos principais diplomas legais atinentes à matéria; ressaltando que tal mister tomará como base a lição do professor Eurico Marcos Diniz de Santi, veiculada em sua tese de doutoramento [04], elaborada sob a batuta do professor Paulo de Barros de Carvalho.

2.1.1 Decreto nº 20.910, de 6 de agosto de 1932

Importante mencionar a edição do Decreto em questão, haja vista que, tendo sido recepcionado por todas as Cartas Políticas promulgadas posteriormente a sua publicação, ainda é responsável pelo regramento geral da prescrição das dívidas atribuídas à Fazenda Pública.

No entanto, "não é mais aplicável à matéria tributária em razão da decadência e da prescrição haverem recebido tratamento específico com a edição da Lei 5.172/66" [05].

2.1.2 Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980 (Lei de Execução Fiscal)

A relevância desse texto legal à esfera jurídico-tributária é manifesta, haja vista que balizador do procedimento a ser seguido, pelas Fazendas Públicas, quando da cobrança de seus créditos tributários e não tributários, bem como dos direitos e garantias conferidos ao contribuinte, quando nessa posição jurídica de desvantagem em relação ao Fisco.

Entretanto, mercê de tal importância, a lei ordinária em tela não guarda maior relação de pertinência ao presente estudo, uma vez que, no que tange à prescrição em específico, introduziu alterações pontuais, observáveis, não obstante a sua discutível constitucionalidade, mais sob o enfoque processual do que material, não cabendo, em virtude disso, circunlóquio a respeito.

2.1.3 Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991 (Lei de Custeio)

A lei ordinária epigrafada veio a lume no escopo de, objetivamente, organizar a Seguridade Social, instituindo o seu Plano de Custeio.

Pois bem, a polêmica decorrente de sua edição encontrou fomento nas alterações respeitantes à prescrição dos débitos relativos às contribuições sociais, "distendendo, em relação ao Código Tributário Nacional, o prazo de decadência de cinco para dez anos (Art. 45 caput) e trinta anos (Art. 45 § 1º), e o prazo de prescrição, também, de cinco para dez anos (Art. 46)..." [06].

Em verdade, o diploma legislativo ora em comento perfazia-se num dos sustentáculos da problemática concernente à melhor interpretação a ser conferida ao instituto da prescrição aplicada ao Direito Tributário, mormente no que diz respeito à prescrição de execução fiscal dirigida à cobrança de débito relativo à Seguridade Social (CSLL, COFINS, PIS etc.), haja vista que era um dos supedâneos, juntamente com o Código Tributário Nacional, da interpretação fazendária atribuída à matéria.

De fato, neste específico ponto, a constitucionalidade do texto legal em tela sempre fora alvo de ataques por parte da doutrina e dos Tribunais, uma vez que, tendo sido editado já sob os auspícios da nova ordem constitucional de 1988, a afronta ao artigo 146 [07], III, b, da nova Carta Política era manifesto (tese sustentada por, entre outros inúmeros mestres de renome, SACHA CALMON NAVARRO COELHO), sendo que, em consequência, o colendo Supremo Tribunal Federal proclamou, em sessão plenária do dia 12 de junho de 2008, a inconstitucionalidade dos referidos artigos 45 e 46 (Súmula Vinculante n° 8 [08]), encontrando-se estes atualmente expressamente revogados, por obra da lei complementar n° 128 de 2008 [09].

Expostos tais desdobramentos, não será objeto de maiores considerações, haja vista que a presente análise circunscreve-se à interpretação conferida (LC nº 118/2005) a dispositivos do CTN.

2.1.4 Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional)

A lei ordinária agora enfocada, é cediço, é a principal responsável pelo regramento material dos institutos da decadência e prescrição tributárias. No escopo de aclarar e corroborar tal afirmação, lança-se mão, uma vez mais, das palavras do professor DE SANTI: "Recepcionada primeiro pela Constituição Federal de 1967, depois pela de 1988, a Lei nº 5.172 de 25 de outubro de 1966, ou Código Tributário Nacional, é atualmente o principal veículo introdutor dos enunciados prescritivos que versam sobre a matéria da decadência e prescrição (...)" [10].

Deveras, tendo traçado as linhas gerais do ordenamento jurídico-tributário brasileiro, o Código Tributário Nacional, devidamente recepcionado, como já afirmado, pela ordem constitucional de 1988 (Arts. 24 [11], I, e 146, III, b), foi e continua a ser o sustentáculo dos embates jurídico-interpretativos relativos à matéria ora em discussão (a prescrição tributária); não sendo outro o motivo que o conduziu ao centro (Arts. 150, § 1º, e 168, reproduzidos em tópico pertinente, em seguida) do novel regramento instituído pela lei complementar nº 118/2005.

2.1.5 Lei Complementar nº 118, de 9 de Fevereiro de 2005

À lei complementar nº 118/05 atribui-se um considerável estímulo às controvérsias que já há muito circundam o tema da prescrição aplicada ao Direito Tributário. Tal fomento encontra a sua razão de ser na suposta interpretação autêntica atribuída aos dispositivos do Código Tributário Nacional (Arts. 150, § 1º, e 168, I, do CTN, transcritos abaixo) que versam sobre a prescrição da ação de repetição de indébito tributário atinente a lançamento por homologação, pago pelo contribuinte.

As críticas ao diploma legal em testilha, não poderia ser diferente, foram e continuam ferrenhas, mormente diante da consolidação de um panorama jurídico-normativo amplamente infenso às garantias fundamentais que delimitam o poder tributário do Estado frente à esfera jurídica do contribuinte.

No presente estudo, como já dito em sede introdutória, pretender-se-á reavivar, dentro dos limites que o caracterizam, as nódoas do texto da lei complementar em questão, dando ênfase à reação doutrinária e consolidação do panorama jurisprudencial a respeito dos prazos fatais que circundam a ação de repetição de indébito tributário.

2.2 Da Decadência do Crédito Tributário

Preliminarmente à análise geral da prescrição no Direito Tributário, mister discorrer acerca da decadência do crédito tributário, haja vista que prescindir de tal tópico seria relegar à insignificância instituto jurídico absolutamente indissociável do contexto "tempo" enquanto determinante da extinção de eventual relação jurídico-tributária.

A matéria sub examine (decadência tributária), já era de se esperar, é também por demais tormentosa. Contudo, tentar-se-á aqui estabelecer suas premissas gerais, relacionando-a com o tema da prescrição, com destaque para as manifestações jurisprudenciais decorrentes de tal interdependência.

Principiemos pela transcrição dos dispositivos legais regentes da matéria, todos constantes do bojo do Diploma Tributário Nacional, uma vez que deveras importante à melhor compreensão do tema (art. 156, V; art. 150 e parágrafos; e 173, I, II e parágrafo único):

Art. 156. Extinguem o crédito tributário: (...) V – a prescrição e a decadência.

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento. (...)

§ 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. (grifo nosso)

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. (grifo nosso)

Em verdade, compilando-se a doutrina atinente à decadência tributária, percebe-se a consolidação do posicionamento segundo o qual o Código Tributário Nacional teria estabelecido não apenas um prazo decadencial apto a fulminar a potencialidade, atribuível ao Fisco, de constituição de eventual crédito tributário, mas sim inúmeros. A discordância doutrinária situa-se, hodiernamente, na quantidade de prazos fixados pelo suscitado diploma legal.

O professor Paulo de Barros Carvalho - prescindindo aqui da menção aos pormenores relacionados à questão (possibilidade de interrupção e suspensão do prazo, existência de um verdadeiro direito de lançar etc.), devidamente abordados pelo autor - posiciona-se, ao que tudo indica, pela existência de três prazos decadenciais distintos no Código Tributário Nacional:

A Fazenda dispõe de cinco anos para efetuar o ato jurídico administrativo de lançamento. Não o praticando, nesse período, decai o direito de celebrá-lo. Na redação do art. 173 estão consignados dois marcos iniciais para a contagem do prazo: o do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetivado (item I); e da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado (item II). E o parágrafo único do mesmo artigo acrescenta o terceiro: da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. Eis a disciplina da decadência do direito de lançar. [12]

No que tange aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, o autor limita-se a uma breve menção a respeito, tecendo breve comentário acerca dos prazos decorrentes da disciplina constante do artigo 150 do CTN, já transcrito.

Outrossim, o Desembargador Federal Hugo de Brito Machado, ao versar sobre a controvérsia em voga, parece se posicionar pela existência de, a princípio, apenas dois prazos decadenciais tributários, ambos fulcrados no artigo 173 do CTN. Ao tratar dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, sustenta o mesmo prazo qüinqüenal, sendo que a única diferença porventura existente seria o termo a quo, qual seja, o fato gerador. Pertinente trazer à baila o seu ensinamento:

Tem-se, portanto, que nos termos do Código Tributário Nacional temos três prazos extintivos de direitos da Fazenda Pública, distintos, embora todos sejam igualmente de cinco anos. O primeiro começa no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ser efetuado (art. 173, I), ou então na data em que se torne definitiva a decisão que tenha anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado (art. 173, II). O segundo prazo, que também é de decadência, porque extingue o próprio direito de lançar, começa na data em que tenha sido iniciada a ação fiscal, destinada a constituir o crédito tributário. E o terceiro, que é de prescrição, (...), começa na data em que se tornar definitiva a constituição do crédito (art. 174).

E prossegue o autor:

O prazo de que dispõe a Fazenda Pública para fazer o lançamento tributário, sob pena de decadência, é de cinco anos, independentemente da modalidade de lançamento a que o tributo esteja submetido. Em se tratando de tributos sujeitos ao lançamento por homologação algumas divergências tem sido suscitadas, mas a única peculiaridade relativa a esses tributos diz respeito ao momento em que se inicia aquele prazo. [13]

Luciano Amaro, por sua vez, ao empreender uma profunda análise sobre o tema, parece estremar cinco regras de decadência presentes no Código Tributário Nacional, a saber: (i) prazo qüinqüenal geral constante do inciso I do artigo 173; (ii) prazo qüinqüenal contado da data em que se tornar definitiva a decisão (administrativa ou judicial) que anular, por vício formal, lançamento anteriormente realizado (art. 173, II. Muito criticado pelo autor); (iii) o estipulado no parágrafo único do retromencionado artigo, que só operará seus efeitos, segundo o autor, se a notificação houver sido feita antes do início do prazo geral do inciso I (também alvo de críticas ferrenhas); (iv) o prazo qüinqüenal atinente aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, que na verdade, segundo o que defende, prescinde de um maior rigor técnico, haja vista que não se poderia falar em decadência nessa modalidade de lançamento; (v) por fim, a aplicação do prazo geral do artigo 173, I, quando da constatação da ocorrência de dolo, fraude ou simulação (art. 150, § 4º). [14]

Ademais, forçosa ao menos uma menção ao já citado trabalho de Eurico Marcos Diniz de Santi, uma vez que aquele é considerado a mais profunda tese acerca da prescrição e decadência no Direito Tributário até os dias de hoje elaborada. No entanto, mercê de tamanha relevância, não se adentrará aqui nos detalhes de seu ensinamento, justamente em virtude da suscitada profundidade que o caracteriza, que foge ao foco da sucinta abordagem, e, também, em virtude de não se encontrar consolidada enquanto predominante no universo jurídico-tributário.

Por fim, o professor Ercias Rodrigues de Sousa, Procurador da República com vasta experiência no universo tributário, em artigo recentemente publicado, citando a supramencionada obra de Eurico de Santi, corrobora a até aqui sustentada multiplicidade de regras decadenciais no CTN:

A perplexidade aventada no início desse trabalho e a conclusão a que se chegou no tópico anterior foram bem apanhadas por Eurico de Santi, no que se tem como a melhor bibliografia nacional sobre prescrição e decadência. Com efeito e reiterando: não existe uma regra de decadência apenas. Existem várias, conquanto se tenha, é verdade, um eixo comum a ligar as hipóteses contempladas no Código Tributário Nacional. [15]

Em conclusão, a divergência exposta acima se presta, é inegável, a demonstrar a existência de mais de uma regra decadencial no Código Tributário pátrio. Todavia, não obstante a complexidade demonstrada, ater-se-á, haja vista o fim ora colimado, à regra geral constante do artigo 173, I (qüinqüênio contado a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado), e, principalmente, à disciplina posta aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, presente no artigo 150, § 4º, do CTN.

Destarte, temos que, no que tange aos lançamentos de ofício e por declaração, as Fazendas Públicas têm cinco anos para constituir o crédito tributário, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado (art. 173, I). No que diz respeito aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, não tendo a lei fixado prazo distinto, o Fisco teria cinco anos, contados do fato gerador, para homologar o pagamento antecipadamente realizado; em não se pronunciando nesse lapso temporal, considera-se homologado aquele, bem como definitivamente extinto o crédito tributário. A princípio (Item "2.3.1"), são estes os estritos termos dos dispositivos legais pertinentes à análise que ora se desenvolve.

Da decadência do crédito tributário e a jurisprudência. A tese "dos Dez anos"

Agora enfocando especificamente o lançamento por homologação, haja vista que sobre este versou a lei complementar nº 118/05, absolutamente necessário abordar as manifestações jurisprudenciais a respeito, isto no escopo de sobrelevar a injusta lesão acarretada aos interesses do cidadão-contribuinte.

Em verdade, a tese que dantes reinava nas decisões proferidas pelo colendo Superior Tribunal de Justiça era a denominada "dos Dez anos" [16]. Segundo esta, em se tratando de tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo decadencial a ser observado somente se iniciaria decorrido o lapso temporal estabelecido no § 4º do artigo 150 do CTN, ou seja, o Fisco disporia, para expressamente homologar ou efetuar eventual correção, de dez anos para constituir o seu crédito ("cinco mais cinco", referente à conjugação dos prazos dos artigos 150, § 4º, e 173, I, ambos do CTN).

A ilogicidade e afronta aos princípios igualitários que norteiam a aplicação do Direito foram sempre destacados pela doutrina [17].

Em prosseguimento, houve uma mudança de rumo no entendimento outrora esposado, uma vez que:

O próprio Superior Tribunal de Justiça parece ter revisto o equivocado posicionamento ao proclamar que, se não houver pagamento (sujeito ao lançamento por homologação), é aplicável o prazo do artigo 173 do Código Tributário Nacional, tendo lugar, caso haja pagamento, o prazo de cinco anos, contados do fato gerador, na forma do art. 150, § 4º, do mesmo diploma. Não obstante, o Tribunal já voltou a afirmar o antigo equívoco, alternando-o com decisões em que aplica o entendimento que é, a nosso ver, correto. [18]

Como bem aclarado pelo supracitado autor, atualmente ainda existe uma alternância, na egrégia Corte Superior de Justiça, entre as duas posições [19]. Entretanto, como bem se demonstrará (Item "2.3.1"), na prática, o denominado autolançamento (GIA, DCTF etc.) acarreta diferentes conseqüências ao quadro decadencial do crédito tributário.

Dando continuidade, predomina na doutrina a defesa do último dos entendimentos mencionados, ou seja, em versando o caso concreto sobre tributo sujeito a lançamento por homologação, havendo pagamento antecipado, conta-se o prazo decadencial qüinqüenal do fato gerador (art. 150, § 4º, do CTN); por outro lado, em sendo declarado o tributo e não se concretizando o respectivo pagamento, lança-se mão, de forma imediata, do regramento contido no artigo 173, I, do CTN, dessa forma limitando-se o lapso decadencial, em qualquer das possibilidades aventadas, ao interregno de cinco anos, ou, no caso de aplicação do art. 173 e seu inciso I, poucos meses a mais. No escopo de destacar a pertinência do posicionamento doutrinário em questão, interessante transcrever julgado recentemente proferido no STJ, que devidamente expõe que a tese em questão é a que parece estar em vias de consolidação na Corte (Item "2.3.1"). Senão vejamos:

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. DECADÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PAGAMENTO NÃO ANTECIPADO PELO CONTRIBUINTE. INCIDÊNCIA DO ART. 173, I, DO CTN. PRESCRIÇÃO. ART. 174 DO CTN. CITAÇÃO VÁLIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1. O prazo decadencial para constituição do crédito tributário pode ser estabelecido da seguinte maneira: (a) em regra, segue-se o disposto no art. 173, I, do CTN, ou seja, o prazo é de cinco anos contados "do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado"; (b) nos tributos sujeitos a lançamento por homologação cujo pagamento ocorreu antecipadamente, o prazo é de cinco anos contados do fato gerador, nos termos do art. 150, § 4º, do CTN.

2. Em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação cujo pagamento não foi antecipado pelo contribuinte, deve ser aplicado o disposto no art. 173, I, do CTN.

3. Definitivamente constituído o crédito tributário, inicia-se o prazo prescricional para sua cobrança, de modo que o Fisco possui o lapso temporal de cinco anos para o ajuizamento da execução fiscal e, após, para a citação válida do executado, consoante previsto no art. 174 do CTN.

(...)

5. Recurso especial desprovido.

(STJ, Resp 739694, PROC. 200500553040/MG, PRIMEIRA TURMA, REL. MIN. DENISE ARRUDA, DJU 12/11/2007, grifo nosso)

No voto condutor do julgado em tela, a ilustre relatora preleciona

"(...) que o entendimento jurisprudencial consagrado no Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de tributos sujeitos a lançamento por homologação cujo pagamento ocorreu antecipadamente, o prazo decadencial de que dispõe o Fisco para constituir o crédito tributário é de cinco anos, contados a partir do fato gerador. Todavia, se o contribuinte declarar o tributo, mas não antecipar seu pagamento, incide a regra do art. 173, I, do CTN."

Por fim, solidificando as bases estruturais de seu raciocínio, a Ministra relatora menciona julgado, cuja relatoria ficou aos cuidados do ilustre Ministro Luiz Fux, fulcrado no mesmo entendimento, in fine:

"TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. TERMO INICIAL

1. O crédito tributário constitui-se, definitivamente, em cinco anos, porquanto mesmo que o contribuinte exerça o pagamento antecipado ou a declaração de débito, a Fazenda dispõe de um qüinqüênio para o lançamento, que pode se iniciar, sponte sua, na forma do art. 173, I, mas que de toda sorte deve estar ultimado no qüinqüênio do art. 150, § 4º.

2. A partir do referido momento, inicia-se o prazo prescricional de cinco anos para a exigibilidade em juízo da exação, implicando na tese uniforme dos cinco anos, acrescidos de mais cinco anos, a regular a decadência na constituição do crédito tributário e a prescrição quanto à sua exigibilidade judicial.

3. Inexiste, assim, antinomia entre as normas do art. 173 e 150, § 4º do Código Tributário Nacional.

4. Deveras, é assente na doutrina: ''a aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173, o que conduz a adicionar o prazo do artigo 173 - cinco anos a contar do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido praticado - com o prazo do artigo 150, § 4º - que define o prazo em que o lançamento poderia ter sido praticado como de cinco anos contados da data da ocorrência do fato gerador. Desta adição resulta que o dies a quo do prazo do artigo 173 é, nesta interpretação, o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do artigo 150, § 4º. A solução é deplorável do ponto de vista dos direitos do cidadão porque mais que duplica o prazo decadencial de cinco anos, arraigado na tradição jurídica brasileira como o limite tolerável da insegurança jurídica.

Ela é também juridicamente insustentável, pois as normas dos artigos 150, § 4º e 173 não são de aplicação cumulativa ou concorrente, antes são reciprocamente excludentes, tendo em vista a diversidade dos pressupostos da respectiva aplicação:o art. 150, § 4º aplica-se exclusivamente aos tributos ''cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa''; o art. 173, ao revés, aplica-se aos tributos em que o lançamento, em princípio, antecede o pagamento.

(...)

A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173 resulta ainda evidente da circunstância de o § 4º do art. 150 determinar que considera-se ''definitivamente extinto o crédito'' no término do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o lançamento já não poderá ser efetuado em razão de já se encontrar ''definitivamente extinto o crédito''? Verificada a morte do crédito no final do primeiro quinquênio, só por milagre poderia ocorrer sua ressurreição no segundo." (Alberto Xavier, Do Lançamento. Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tributário, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1998, 2ª Edição, p. 92 a 94).

(...)

(EREsp 276.142/SP, 1ª Seção, Rel.Min. Luiz Fux, DJ de 28.2.2005. Grifo nosso)

Pois bem, esta é a interpretação que, segundo a melhor doutrina, seria a mais consentânea com os cânones principiológicos e hermenêuticos que regem o Direito.

Todavia, e este é o objetivo principal da exposição ora em desenvolvimento, resta assentar, tendo em vista o tema ora versado (LC nº 118/05 e o atual panorama prescricional na repetição de indébito tributário), que mesmo com base no segundo dos entendimentos retromencionados, o prazo extintivo a ser observado pelas Fazendas Públicas, no que tange aos tributos lançados por homologação, será de, no mínimo, dez anos – decadência (cinco anos), mais prescrição (cinco anos, art, 174 do CTN). Em se aplicando a primeira das teses supra-expostas, o prazo será, ao que tudo indica, de no mínimo 15 (quinze) anos – dez anos para decadência (tese "dos Dez anos"), mais prescrição (cinco) anos.

Entretanto, importante reiterar que, no que tange ao autolançamento (GIA, DCTF etc.), o entendimento da colenda Corte tem seguido outro norte, sendo que a abordagem à posição em questão será despendida no tópico pertinente (Item "2.3.1"), logo em seguida.

Concluindo, importante fixar estes teóricos prazos extintivos a ser observados pelo Fisco, uma vez que serão confrontados com o que é posto ante ao contribuinte em eventual repetição de indébito tributário, antes e depois do advento da lei complementar nº 118/05.

2.3 Da Prescrição no Direito Tributário e Suas Especificidades

Expostas as premissas gerais acerca da decadência e sua importância para o tema da prescrição, passemos à análise desta última, destacando as peculiaridades que a caracterizam quando inserta no universo jurídico-tributário.

Preliminarmente, importante reafirmar que o instituto em questão é passível de fulminar a relação jurídico-tributária formalizada entre o contribuinte e o Estado sob dois prismas distintos, quais sejam: a prescrição do direito estatal de cobrar (execução fiscal) eventual crédito tributário oponível ao contribuinte e, por outro lado, da ação de repetição de indébito tributário porventura pago pelo cidadão.

Em verdade, a distinção supramencionada diz respeito tão-somente a um mesmo fenômeno (a prescrição) desencadeando seus efeitos sobre a esfera jurídica de diferentes sujeitos de direito (contribuinte e Fazendas Públicas), titulares de pretensões (repetição de indébito tributário e execução fiscal, respectivamente) plenamente exercitáveis por meio do direito de ação. Não obstante tal aparente simplicidade conceitual, este esclarecimento apresenta-se como absolutamente necessário, haja vista o tratamento legal conferido à matéria pelo Código Tributário Nacional, estremando e regulando as duas vertentes de forma plenamente contrastável, bem como a controvérsia interpretativa atinente aos prazos e suas peculiaridades (termos a quo etc.). Tal problemática guarda incontestável relação com o objeto da presente análise.

Outrossim, sobreleve-se que questões específicas - à guisa de exemplificação: fatos jurídicos interruptivos da prescrição tributária, possibilidade de suspensão ou interrupção de prazo decadencial tributário, análise das diversas modalidades de lançamento e etc. - não serão aqui tratadas, uma vez que escapam ao objetivo ora colimado.

Posto isto, cumpre pontuar que a prescrição, quando relativa à relação jurídico-tributária, é cediço, concerne a direito material, uma vez que o "CTN, (...), diz expressamente que a prescrição extingue o crédito tributário (art. 156, V). Assim, nos termos do Código, a prescrição não atinge apenas a ação para cobrança do crédito tributário, mas o próprio crédito, vale dizer, a relação material tributária" [20].

Em arremate a presente introdução conceitual, importante aclarar que se discorrerá sobre o tema (prescrição tributária) balizando-o dentro dos liames atinentes ao lançamento por homologação, haja vista que deste trata a lei complementar nº 118/2005.

2.3.1 Da prescrição da ação de cobrança de crédito tributário (execução fiscal)

O legislador pátrio, ao regrar a cobrança judicial do crédito tributário pelas Fazendas Públicas federal, estaduais e municipais, deferiu tratamento privilegiado à estas pessoas políticas. A doutrina nacional não se cansa de manifestar a sua discordância para com a opção político-legislativa em questão, direcionando severas críticas à Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. Pertinente a transcrição do posicionamento de Araken de Assis, segundo o qual:

Anima o Estado brasileiro, às vezes, um profundo espírito caviloso, que avulta no tratamento diferenciado conferido, de um lado, ao crédito da Fazenda Pública, e, de outro, ao crédito contra a Fazenda. Investiu-se o Estado, na primeira hipótese, de procedimento especial dotado de inúmeras e radicais simplificações, algumas duvidosas no merecimento e beliscando a constitucionalidade, e no qual os expedientes hábeis à rápida realização do crédito, princípio comum a toda execução, se mesclam a privilégios descabidos. [21]

De fato, inúmeras controvérsias circundam a realização do crédito fazendário por meio da execução fiscal (Lei 6.830/80). Entretanto, atendo-se ao tema em exposição, cumpre ressaltar que o regramento básico da prescrição do crédito titularizado pelo Fisco encontra-se no Código Tributário Nacional, no seu artigo 174 [22], combinado com o artigo 150, § 4º (lançamento por homologação).

Pois bem, "feito o lançamento (para cuja consecução deve ser observado o prazo decadencial), passa-se a cogitar de outro prazo, que é o de prescrição da ação para cobrança do tributo lançado" [23]. Da assertiva ora transcrita sobreleva-se, como já exposto (item "2.2.1"), que ao interregno relativo ao prazo prescricional soma-se o prazo decadencial já transcorrido. Resta saber em que momento se daria o efetivo início do prazo fatal em comento (prescricional) para a Fazenda Pública cobrar o seu eventual crédito.

Em verdade, entremostra-se acertada a tese ora sustentada no colendo Superior Tribunal de Justiça, com suporte na jurisprudência de nossa Corte Suprema, segundo a qual, o auto de infração determina a consumação do lançamento; notificado o contribuinte, a fluência do prazo para recurso administrativo, ou o julgamento definitivo deste, constitui definitivamente o crédito tributário. Só a partir deste momento (termo a quo) é que se pode cogitar de prazo prescricional em curso [24]. Esse é o regime jurídico a ser observado no que diz respeito ao lançamento de ofício, não obstante as abalizadas opiniões em contrário [25].

Outrossim, em se tratando de tributo lançado por homologação (Art. 150, § 4º, CTN), há peculiaridades merecedoras de destaque, sendo que, para adentrar-se na discussão, cabível a menção, uma vez mais, à lição de Luciano Amaro:

..., também não cabe falar em prescrição no caso de tributos lançados por homologação. Se essa forma de lançamento, quer na modalidade expressa, quer na tácita, supõe o prévio pagamento, é intuitivo que, uma vez realizado o lançamento (por homologação ou tácita), não há o que cobrar, e, portanto, não se pode falar em prescrição da ação de cobrança. Diversamente, se o tributo (lançável por homologação) for lançado de ofício (porque o sujeito passivo não "antecipou" o pagamento ou o fez a menor), poderá ocorrer a prescrição, mas aí já não se trata de prescrição da ação de cobrança de tributo lançado por homologação, e sim de tributo lançado de ofício. [26]

A princípio, o posicionamento supra parece ser o mais acertado, uma vez que, ocorrendo a homologação expressa ou tácita (esta última, a que sempre ocorre na prática) do pagamento antecipado pelo contribuinte, estará extinto o crédito tributário, nada mais havendo para cobrar.

Contudo, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça [27] está se consolidando no sentido de que, em se tendo em mira tributo a ser lançado por homologação, a declaração (DCTF, GIA etc.) apresentada pelo contribuinte caracteriza uma confissão de dívida, definitivamente constituindo o crédito tributário em favor do Fisco. A principal conseqüência desse regime jurídico é que, em tendo apresentado uma das declarações supramencionadas, o montante total nela consubstanciado será passível de constituição imediata do crédito, ou seja, declarado o tributo, se o contribuinte pagar a menos, o saldo devedor estará definitivamente constituído; se não adimplir fração alguma do declarado, o valor total também restará definitivamente constituído em favor da Fazenda Pública. Sendo assim, fácil perceber que não haverá a necessidade de lavratura de auto de infração fiscal contra o contribuinte em questão, sendo lícito ao Fisco inscrever diretamente o débito declarado, e não pago, nos cadastros da dívida ativa pública, franqueando-lhe o acesso à via executiva judicial, não se cogitando, no caso em questão, de contraditório na esfera administrativa.

Frente à situação supra-exposta, ao contrário do que afirma Luciano Amaro, não há que se falar em lançamento de ofício de tributo declarado e não pago, ou pago a menor, uma vez que com a formalização da suscitada declaração o crédito tributário estará definitivamente constituído. Destarte, em relação ao crédito em comento, o prazo a ser considerado já será de prescrição da ação de execução fiscal, e não de decadência, uma vez que já inscrito em dívida ativa e passível de ser cobrado judicialmente.

Por outro lado, imaginemos a seguinte situação: determinado contribuinte declara dever ao Fisco a quantia de R$ 10,00 (dez reais). No entanto, o montante em verdade devido é de R$ 11,00 (onze reais). Qual será o quadro temporal configurado ante a autoridade fazendária?

Pois bem, em relação ao valor declarado (R$ 10,00), qualquer irregularidade (ausência de pagamento ou pagamento a menor) acarretará a constituição imediata do crédito tributário em favor do Fisco, possibilitando a imediata e direta inscrição em dívida ativa e ajuizamento da respectiva execução fiscal. Já no que tange à quantia não declarada (R$ 1,00), em relação à esta, sim, é que se pode cogitar de prazo decadencial para constituição do respectivo crédito tributário, uma vez que haverá a necessidade de lavratura de auto de infração fiscal, com a conseqüente abertura do contraditório administrativo, sendo que a definitiva constituição do crédito em tela somente se dará com o trânsito em julgado administrativo, segundo a jurisprudência do colendo STJ, corroborada por Hugo de Brito Machado.

Destarte, somente no que diz respeito ao saldo devedor (R$ 1,00) mencionado no parágrafo supra é que se cogita acerca do prazo decadencial a ser aplicado, sendo que a aplicação excludente dos prazos estabelecidos nos artigos 150, § 4º, e 173, I, ambos do CTN (Item "3.2.1"), tese hodiernamente em vias de consolidação no STJ, parece ser a solução mais escorreita.

Ademais, interessante a menção à lição do professor Ercias Rodrigues de Sousa [28], já citado na análise em epígrafe, segundo a qual, em relação ao saldo devedor supramencionado (não declarado), o prazo decadencial a ser observado será o do artigo 150, § 4º, ou seja, sempre de cinco anos. A aplicação do artigo 173, I, somente haveria de ser considerada no caso de dolo, fraude ou simulação (art. 150, § 4º, CTN). Tal hipótese de contagem de prazo também se apresenta como correta e absolutamente admissível, haja vista que também excludente da famigerada tese "dos dez anos".

Diante disso, no que tange aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, o termo a quo do prazo prescricional qüinqüenal (Art. 174, do CTN) para o ajuizamento da competente execução fiscal será, no caso de pagamento a menor ou completa omissão em relação a este, a data final do prazo para o adimplemento do crédito constituído em decorrência da declaração apresentada [29]. No caso de saldo devedor atinente a valor não declarado pelo contribuinte, o termo a quo do referido prazo prescricional será o termo ad quem do respectivo prazo decadencial, já mencionado, para a constituição do crédito tributário.

Concluindo, o que se pretende expor com a sucinta análise despendida acima é que, tanto nas situações retromencionadas, como nas descritas no item "2.2.1" (STJ e suas outras teses decadenciais), não há prejuízo ao Fisco, muito pelo contrário. Em cometendo o contribuinte uma infração (não pagamento ou pagamento a menor) referente a tributo declarado, as Fazendas Públicas poderão desencadear todos os atos jurídicos exigidos para a cobrança do débito sem a necessidade de ouvir, em contraditório, o devedor. Tal benesse compensa, em muito, a aparente exigüidade do prazo fatal (prescricional. Art. 174 do CTN) posto ante a pretensão fazendária.

Além disso, em se omitindo o contribuinte em relação a valor que deveria ter sido declarado, seja lá qual for a tese a ser sustentada pelos Tribunais pátrios, o prazo prescricional será de até 10 (dez) anos, ou mais, se defendida a malfada tese decadencial "dos Dez anos". É essencial deixar assente estas noções, haja vista que o cotejo do tema com o prazo prescricional da ação de repetição de indébito é o próximo passo a ser seguido, uma vez que esta modalidade de exercício do direito de ação foi o objeto principal da lei complementar nº 118/2005.

2.3.2 Da prescrição na ação de repetição de indébito tributário

Passemos agora a abordar as teses que circunscrevem a prescrição tributária atinente à ação de repetição de indébito de tributo lançado por homologação, a ser manejada pelo contribuinte, haja vista que esta modalidade de manifestação do direito de ação foi o efetivo objeto da aparente interpretação autêntica veiculada pela lei complementar nº 118/2005.

Principie-se esclarecendo que, não obstante a utilização do termo "prescrição" no título do presente tópico, não há consenso na doutrina sobre a natureza do prazo extintivo em questão, se decadencial ou prescricional. Apesar disso, tal embate doutrinário não interessa ao objetivo em foco, sendo que, em razão disso, usar-se-á o termo genérico "prazo extintivo" para qualificá-lo.

Pois bem, a disciplina do direito à repetição de eventual indébito tributário encontra-se disposta nos artigos 165 [30] e 168, este último, no que tange aos tributos lançados por homologação, c/c o artigo 150, § 4º, todos do Diploma Tributário Nacional. Pertinente a transcrição do mencionado artigo 168, uma vez que disciplinador do prazo extintivo ora em análise:

Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I – nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; II – na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória. (grifo nosso)

Em verdade, a leitura do artigo de lei transcrito acima traz, aos menos afetos aos pormenores do Direito Tributário, a impressão de que o prazo extintivo em tela não comportaria qualquer tipo de questionamento, qualquer suscitação de controvérsia jurídica. Ledo engano, uma vez que, ao se ter em mira os tributos sujeito à disciplina do lançamento por homologação, a data da efetiva extinção do crédito tributário sempre foi ponto de discórdia a fomentar acalorados debates entre os doutrinadores e magistrados brasileiros.

O professor Sacha Calmon Navarro Coêlho, ao expor a tese antes pacífica na 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, ensina que:

(...) Nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, a extinção do crédito tributário ocorre pela homologação, expressa ou tácita, do pagamento. E o prazo para homologar, já vimos, é de cinco anos, a contar do fato gerador, a teor do art. 150, § 4º. (...) Como a Fazenda Pública nunca homologa expressamente, considera-se extinto o crédito tributário cinco anos após ocorrido o seu fato gerador (homologação tácita). Assim sendo, o prazo de cinco anos para exercer o direito de pedir a restituição tem como dies a quo justamente o dies ad quem da Fazenda Pública para homologar o crédito restituendo. [31]

Não obstante as opiniões de peso em contrário (LUCIANO AMARO), esta era a tese dominante, restando, como já afirmado, pacificada no colendo Superior Tribunal de Justiça [32].

Destarte, tem-se que, como o Fisco, na prática, nunca procede ao lançamento expresso por homologação, o prazo extintivo em tela sempre acabava por se concretizar em 10 (dez) anos (Art. 168, c/c o art. 150, § 4º, ambos do CTN). Cotejando este lapso temporal com àquele atinente à prescrição da ação executiva fiscal (Item "2.3.1"), verificava-se a congruência entre ambos, não obstante a interpretação jurisprudencial ter-se pautado exclusivamente nos dispositivos legais reguladores da repetição de indébito tributário, e não em eventual homenagem ao princípio da isonomia processual entre os litigantes (contribuintes e Fazenda Pública).

Ocorre que, frente à sedimentação da tese jurídica retromencionada (Dez anos para a repetição de indébito tributário), o Poder Legislativo, a pretexto de solucionar a controvérsia, editou a Lei Complementar nº 118, de 9 de fevereiro de 2005, tendo por meio desta veiculado suposta interpretação autêntica dos artigos 168, I, e 150, § 1º, do Código Tributário Nacional, in fine:

Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei. (grifo nosso)

Como de notório conhecimento, já transcorridos os pouco mais de quatro anos de sua edição, a lei complementar em questão estabeleceu interpretação claramente confrontante com àquela sedimentada no Superior Tribunal de Justiça, em conseqüência de anos de legítimo labor jurisdicional. Aquele Sodalício não demorou a expor a contrariedade da lei em questão para com o complexo axiológico e principiológico que informam o ordenamento jurídico nacional.


3 da lei complementar nº 118, de 9 de fevereiro de 2005

Traçadas as linhas gerais acerca da decadência e prescrição no Direito Tributário, passa-se agora à abordagem do quadro temporal que, após a edição da lei complementar n° 118, circunscreve a ação de repetição de indébito tributário. Para tanto, repisar-se-á aqui as manifestações doutrinárias e, primordialmente, jurisprudenciais manifestadas após a sua vigência.

Pois bem, de autoria do deputado federal Antonio Carlos Magalhães Neto, a Lei complementar nº 118, Diário Oficial da União de 9 de fevereiro de 2005, veio à lume no proscênio jurídico para adaptar o Código Tributário Nacional à nova Lei de Falências, tendo introduzido alterações nos seus artigos 133, 174, 185, 186, 187, 188 e 191, bem como acrescentado os artigos 155-A, 185-A e 191-A.

No entanto, o legislador federal aproveitou-se do texto legal em questão para veicular norma aparentemente interpretativa em seu bojo, no seu art. 3º, ao qual foi conferido efeito retroativo pelo art. 4º da mesma lei, modificando regramento atinente à prescrição da ação de repetição de indébito tributário a ser manejada pelo contribuinte (Arts. 150, § 1º, e 168, I, do CTN).

Prescindindo da análise respeitante às adaptações relativas ao novo regime falimentar ora vigente, os supramencionados artigos 3º e 4º da LC 118/05 consubstanciam-se, segundo uníssonas manifestações doutrinárias, em instrumentos de interferência do Poder Legislativo no exercício da função jurisdicional, constitucionalmente atribuída, enquanto típica, ao Poder Judiciário (Art. 2º, da CF/88).

Isto porque, ao estabelecer que a extinção do crédito tributário, no que tange aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, ocorre no momento da efetivação do pagamento antecipado de que trata o § 1º, do artigo 150, do CTN, o legislador manifestamente prejudicou a interpretação anteriormente consolidada no colendo Superior Tribunal de Justiça [33], segundo a qual, como já mencionado, a extinção do crédito tributário somente se daria após o transcurso do lapso temporal atinente à homologação tácita prevista no § 4º do mesmo artigo (Tese dos "cinco mais cinco").

De fato, publicada a lei em comento, vociferaram os doutrinadores contra esta, ressaltando o seu real objetivo: privilegiar o Poder Executivo (Fazenda Pública), reduzindo o prazo prescricional posto ante a pretensão do contribuinte lesado pelo adimplemento de indébito tributário, resguardando, de forma reflexa, a arrecadação tributária e, conseqüentemente, a busca incessante por superávits primários.

Kiyoshi Harada insurgiu-se nos seguintes termos:

Entretanto, o fisco acionou o astuto legislador que, por meio da chamada interpretação autêntica, tentou reduzir o prazo prescricional da ação de restituição do indébito, invariavelmente, para cinco anos, fixando o seu termo inicial para a data do pagamento antecipado, independentemente de sua homologação que resultaria na constituição do crédito tributário. [34]

O trecho transcrito expõe a contrariedade da majoritária doutrina [35] ao objetivo colimado pelo legislador quando da edição do diploma legislativo em tela, repita-se: resguardar os cofres públicos contra o legítimo exercício do direito de ação pelo contribuinte que fora prejudicado pelo pagamento de tributo em desacordo com os critérios constantes da regra matriz de incidência, dispostos na respectiva norma legal.

3.2 Do Quadro Prescricional Anterior à Edição da LC nº 118/05

No escopo de mais bem aclarar as conseqüências do texto de lei objeto desta análise, cabe tecer maiores considerações a respeito do fenômeno da prescrição da ação de repetição de indébito tributário antes e, em tópico subseqüente, depois da publicação da lei complementar nº 118/05.

Como já afirmado (item "2.3.2"), a tese que reinava absoluta no colendo Superior Tribunal de Justiça era a chamada dos "cinco mais cinco"; isto porque, mediante simples interpretação literal (a ser mais bem explicada em seguida) dos artigos 156, VII, 168, I, e 150 §§ 1º e 4º, todos do CTN, concluíram os doutos Ministros especializados na seara do Direito Público que a extinção do crédito tributário só ocorreria quando da formalização da homologação expressa (art. 150, § 1º) ou tácita (art. 150, § 4º) do pagamento antecipado, iniciando–se a partir deste momento (Art. 168, I, c/c art. 156, VII) o prazo prescricional. Tal posicionamento jurisprudencial foi consequência de um árduo processo dialético doutrinário, forma legítima de solução das controvérsias jurídicas, que não deve ser malferida pela via transversa da interpretação autêntica.

Deveras, anteriormente coexistiam duas teses acerca do prazo prescricional a ser observado no que tange à manifestação, perante o Judiciário, da pretensão à repetição de indébito tributário pago pelo contribuinte:

A primeira corrente, sustentada pelo professor luso-brasileiro Alberto Xavier e pelo professor paulista Marco Aurélio Greco, afirma que o prazo para se pleitear a repetição de indébito seria de 05 anos contados da extinção do crédito tributário (art. 168 do CTN), no entanto, para esta corrente, a extinção do crédito tributário se daria com o efetivo pagamento. A segunda corrente, sustentada pelo professor Sacha Calmon Navarro Coelho e pelo mestre Paulo de Barros Carvalho, sustenta que realmente o termo inicial para contagem do prazo decadencial seria da extinção do crédito tributário. Todavia, nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, a extinção do crédito tributário sempre se dá com a homologação tácita, ou seja, após o decurso de 05 anos da ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CTN). [36]

A primeira das teses era a que outrora predominava no Supremo Tribunal Federal, quando ainda investido na função de guardião do ordenamento infraconstitucional, sendo também posteriormente sustentada pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça [37].

Entretanto, a Segunda Turma da referida Corte, em leading case apreciado no ano de 1994, passou a aplicar o prazo de 10 (dez) anos [38].

Em solução à controvérsia instaurada no seio da Corte, a sua Primeira Seção de Direito Público, em julgamento de Embargos de Divergência, consolidou a tese mais condizente com a literalidade dos dispositivos do Código Tributário Nacional que versam sobre a matéria, restando pacificada a "tese dos Dez anos" para a propositura de ação de repetição de indébito tributário relativo a tributo lançado por homologação [39].

Destarte, tendo em vista que a controvérsia em questão dizia respeito à legislação infraconstitucional, encontrou-se definitivamente solucionada pela Corte constitucionalmente competente para a interpretação daquela, o STJ, quedando-se afastada a primeira das teses supracitadas (prescrição em cinco anos), obviamente a defendida pela Fazenda Pública.

3.3 Da Situação Configurada Após a Edição da LC nº 118/05

Solidificado o posicionamento do colendo Superior Tribunal nos termos expostos no tópico anterior, as representações judiciais das Fazendas Públicas federal, estaduais e municipais viram-se de mãos atadas, haja vista que a alegação da prejudicial de mérito sob análise (prescrição), em ação de repetição de indébito de tributo sujeito a lançamento por homologação, passou a ser de toda infrutífera, uma vez que certamente sempre afastada em última instância.

Ante a tal situação, de acordo com o exposto pela doutrina, o Poder Legislativo, solidário para com o Poder Executivo e seu objetivo de manutenção da arrecadação tributária, editou a lei complementar ora em discussão. Pertinente a transcrição, uma vez mais, do que dispõe o seu artigo 3º, in fine:

Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei.

Como claramente se vê, a pretexto de solucionar controvérsia jurídica já devidamente resolvida pelo Poder estatal competente (o Judiciário), supostamente interpretando os dispositivos do Código Tributário Nacional que menciona, a lei complementar nº 118 inovou no universo jurídico, restabelecendo o vetusto entendimento do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, que sufragava o prazo prescricional de cinco anos para a repetição de indébito tributário.

Ana Carolina Dias Lima Fernandes, promotora de justiça no Estado de Sergipe, ao expor seu entendimento a respeito, afirma:

Percebe-se, portanto, nitidamente, que o comando normativo em tela inova no plano normativo, na medida em que retira da disposição interpretada o sentido até então extraído pelo STJ. Resta claro o propósito de alterar, pela via legislativa direta, o entendimento até então dominante na Corte guardiã da legislação federal pátria. Retoma-se, assim, através dessa lei, o anterior entendimento do STF (quando ainda detinha a função de tutor da legislação federal), inicialmente acatado pelo STJ, de que a contagem do prazo prescricional para a ação de restituição de indébito, no caso do autolançamento, se iniciaria a partir da data do pagamento. [40]

Pois bem, com a edição da lei em comento, via de conseqüência, restou inserto no ordenamento jurídico-tributário nacional o prazo prescricional de cinco anos para a formalização de pleito restituitório referente a tributo sujeito ao lançamento por homologação, uma vez que expressamente disposto que a extinção do crédito tributário dar-se-á no momento da antecipação do pagamento devido (art. 150, § 1º, do CTN). Em assim sendo, "... os contribuintes deverão estar atentos à nova legislação, para que não percam seus créditos junto às Fazendas Públicas da federação." [41]

Foi esta a situação jurídica efetivamente objetivada pelo legislador complementar. No entanto, como será mais bem aclarado em seguida, o Superior Tribunal de Justiça já logrou modificar a situação ora exposta, mediante a delimitação do alcance do artigo 3º do texto legal em tela.

3.4 Do Suposto Caráter Interpretativo

Agora adentrando no ponto fomentador da discórdia circundante à lei complementar nº 118/05, cuja análise não se poderia aqui prescindir, seu artigo 3º (terceiro), já transcrito, foi editado supostamente no intuito de conferir mera interpretação aos artigos 150 e 168 do Código Tributário Nacional. Com base nessa arrevesada delimitação de alcance e sentido, o artigo 4º (quarto) da mesma lei pretendeu conferir efeito retroativo à modificação legislativa veiculada, fulminando os prazos prescricionais cujo transcurso havia iniciado antes da publicação do texto complementar em comento.

Principiemos dizendo que a esmagadora maioria dos juristas pátrios discorda da legitimidade da interpretação legislativa ou autêntica, qualidade supostamente caracterizadora da lei complementar nº 118. Aliás, muitos deles negam até mesmo a existência de tal modalidade de interpretação.

Carlos Maximiliano, já na primeira metade do século XX, manifestou a sua discordância em relação ao labor interpretativo em comento:

Não há propriamente interpretação autêntica; se o Poder Legislativo declara o sentido e alcance do texto, o seu ato, embora reprodutivo e explicativo de outro anterior, é uma verdadeira norma jurídica, e só por isso tem força obrigatória, ainda que ofereça exegese incorreta, em desacordo com os preceitos basilares da Hermenêutica.

É feita a lei, seja qual for a sua espécie, a fim de concretizar o Direito. Torná-lo claro, expressivo, visível, positivo; se o não consegue por defeito de redação, falta-lhe o seu primeiro requisito, e a que lhe explica o conteúdo é a que realiza o objetivo colimado; portanto, constitui uma lei nova, mais do que a precedente, que resultara quase inútil, falha na prática.

Por outro lado, é quase impossível fazer uma norma exclusivamente interpretativa, simples declaração do sentido e alcance de outra; em verdade, o que se apresenta com esse caráter, é uma nova regra, semelhante à primeira e desta modificadora de modo quase imperceptível. [42]

Roque Antonio Carraza, em comentário ao artigo 106 do Código Tributário Nacional, também se posiciona pela impropriedade e inexistência das leis interpretativas:

Há quem queira – seguindo na traça do art. 106, I, do CTN – que a lei tributária interpretativa retroage até a data da entrada em vigor da lei tributária interpretada. Discordamos, até porque, no rigor dos princípios, não há leis interpretativas. A uma lei não é dado interpretar uma outra lei. A lei é o direito objetivo e inova inauguralmente a ordem jurídica. A função de interpretar leis é cometida a seus aplicadores, basicamente ao Poder Judiciário, que aplica a lei aos casos concretos submetidos à sua apreciação, definitivamente e com força institucional. [43]

Pode-se também trazer à colação, apesar de vencido, o voto proferido pelo ilustre Ministro Sepúlveda Pertence na Ação Direta de Inconstitucionalidade na qual restou assentada a posição do Supremo Tribunal Federal acerca da constitucionalidade do artigo 106, I, do CTN, bem como, via de conseqüência, a posição da Corte em relação à higidez das leis interpretativas, senão vejamos:

Para mim, no sistema brasileiro, lei interpretativa ou é inócua ou é lei nova. Se é mera interpretação de lei preexistente e veicula – se isso é possível – a única interpretação admissível dessa lei preexistente, a lei interpretativa vale exatamente o que valer a interpretação que traduz, isto é, nada vale, porque, evidentemente, se é a única interpretação, ou não, a afirmação, no caso concreto, continuará entregue ao Poder Judiciário. Se, no entanto, a título de lei interpretativa, a segunda lei extrapola da interpretação, é lei nova, que altera a lei antiga, modificando-a ou adicionando-lhe normas inexistentes. E assim há de ser examinada. [44]

Pois bem, com fulcro no posicionamento doutrinário supra-exposto, parece ser correto o entendimento segundo o qual, em verdade, não há leis substancialmente interpretativas, haja vista que, ou simplesmente declarará o que já está contido na lei interpretada, sendo de todo vazia, ou alterar-lhe-á o conteúdo normativo, inovando no ordenamento jurídico; não podendo, neste último caso, retroagir para atingir casos pretéritos (art. 5º, XXXVI, CF/88). Concluindo, mais uma vez valendo-se do ensinamento de Carlos Maxiliano:

(...) se a lei tem defeitos de forma, é obscura, imprecisa, faça-se outra com o caráter franco de disposição nova. Evite-se o expediente perigoso e retrógrado, a exegese por via de autoridade, irretorquível, obrigatória para os próprios juízes; não tem mais razão de ser, coube-lhe um papel preponderante outrora, evanescente hoje. [45]

Entretanto, não obstante a manifesta predominância do posicionamento retromencionado, o Supremo Tribunal Federal, como já mencionado, declarou a constitucionalidade das leis interpretativas (art. 106, do CTN), restando assente a subsistência da interpretação autêntica no cenário jurídico brasileiro. É com base nessa decisão que, mercê de amplamente criticada pela doutrina, o Poder Legislativo ainda lança mão desse expediente.

Aclarada a possibilidade jurídica de edição de leis interpretativas na ordem jurídica nacional (STF), cumpre discorrer sobre o suposto caráter interpretativo do artigo 3º da lei complementar nº 118/2005.

Em verdade, mercê do pretendido pelo legislador, o artigo em comento nada tem de interpretativo. Muito pelo contrário. Foi responsável por uma considerável alteração no plano jurídico-tributário, haja vista que determinante de um novo prazo prescricional (cinco anos) para as ações de repetição de indébito tributário, manifestamente prejudicando a interpretação anteriormente consolidada no Superior Tribunal de Justiça.

Em artigo recentemente publicado, Maria Beatriz Conde Pellegrino e Alisson Thomaz Bretas Leôncio expuseram o entendimento ora predominante na doutrina, posteriormente proclamado pelo STJ, corroborando a tese aqui em exposição, senão vejamos:

Nos termos do entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça, o § 1º, do art. 150 do Código Tributário Nacional estabelece uma condição para a extinção do crédito tributário, qual seja a ulterior homologação do pagamento antecipado por parte do fisco. Daí que enquanto pendente tal condição resolutiva, definitivo não é o pagamento e, portanto, inviável a repetição. Já a norma do inc. I, do art. 168, é clara no sentido de que a extinção do crédito tributário é o ato que possibilita a ação de repetição de indébito, pelo quê se a norma pretensamente interpretativa acaba por "revogar" parte do § 1º, do art. 150, tem-se certo que de norma interpretativa não se trata. (...) [46]

De fato, "temos que o artigo 3º editado não pode ser norma de caráter interpretativo, uma vez que modificou substancialmente o dispositivo que pretendia interpretar (no caso, o inc. I do art. 168, do CTN)" [47], podendo falar-se, nos temos do artigo 2º [48], § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil, em revogação do § 1º, do artigo 150, do Diploma Tributário Nacional.

Destarte, resta clara a insubsistência do caráter interpretativo do artigo 3º da lei complementar nº 118/2005, intentado pelo legislador, uma vez que as alterações na disciplina da prescrição em pleito restituitório são manifestas, não havendo como sustentar mera interpretação dos artigos 168 e 150 do Código Tributário Nacional. Importante deixar assente tal noção, uma vez que nesta se fundamentou a declaração de inconstitucionalidade, em controle difuso pelo STJ, do artigo 4º da lei complementar sub examine.

3.5 Do cotejo da Lei Complementar nº 118/05 com a Constituição Federal

3.5.1 Da constitucionalidade formal da lei complementar nº 118/05

Principiando por uma abordagem geral acerca da adequação da lei complementar nº 118 ao texto constitucional, deve-se assentar que, do ponto de vista formal, a lei em tela encontra-se em conformidade com os ditames da Constituição Federal.

Deveras, a doutrina é quase que uníssona no que tange à recepção do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966), pela nova ordem constitucional de 1988, com o status de lei complementar, haja vista que a disciplina das normas gerais em matéria tributária, especialmente no que tange à decadência e prescrição, compete à esta modalidade de lei (artigo 146, III, "b", CF/88).

Mercê da discordância do professor Roque Antonio Carraza em relação à tese em questão, divergência esta fulcrada no ensinamento construído pela "corrente dicotômica, liderada por Geraldo Ataliba" [49], aquele mesmo doutrinador aclara que o seu posicionamento não é sustentando pela doutrina tradicional [50], entendendo esta que

(...) se o Código Tributário Nacional (lei ordinária) regulava, por exemplo, a matéria de normas gerais de direito tributário, e se a Constituição de 1967 (como continua fazendo a atual) passou a exigir lei complementar para regular essa matéria, resulta que o Código Tributário Nacional só pode ser alterado por lei complementar. Não porque ele seja uma lei complementar, mas porque a Constituição, agora (desde 15-1-1967) exige lei complementar para cuidar do assunto. [51]

Outrossim, com relação à competência para legislar, não se pode deixar de reconhecer a observância ao artigo 24, inciso I, da Constituição Federal, que estabelece competir à União legislar em matéria tributária, estando tal competência adstrita ao regramento geral (§ 1º do mesmo artigo).

Feitas estas considerações, inafastável que, sob o enfoque exclusivamente formalístico, a lei complementar nº 118/2005 é constitucional, uma vez que, tendo alterado, via suposta interpretação, dispositivos do Código Tributário Nacional, adequou-se aos supramencionados dispositivos constitucionais (Arts. 24, I, e 146, III, "b") [52].

3.5.2 Da inconstitucionalidade do seu artigo 4º

Exposta a real intenção do Legislador, bem como a primordial conseqüência da edição da lei complementar nº 118/05 - alteração, via suposta interpretação, de dispositivos do CTN, prejudicando jurisprudência outrora consolidada -, necessário abordar o seu artigo que fomentou as mais ásperas críticas por parte da doutrina.

O artigo 4º da lei complementar em testilha expressamente dispõe:

Art. 4º. Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional. (grifo nosso)

Pertinente a transcrição do citado artigo 106, I, do Código Tributário Nacional, in fine:

Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. (grifo nosso)

Pois bem, da análise dos artigos acima colacionados se percebe que o legislador intentou atribuir efeito retroativo ao artigo 3º da lei complementar nº 118, isto com base no suposto caráter meramente interpretativo - já devidamente afastado (Item "3.4") - deste dispositivo. Mercê da subsistência do artigo 106 do Código Tributário Nacional no ordenamento jurídico pátrio, e, em conseqüência, também das leis interpretativas (STF. Item "3.4"), a doutrina e a jurisprudência não demoraram a apontar a inconstitucionalidade da pretensão retroativa estampada no suscitado artigo 4º da lei complementar em análise.

3.5.2.1 Das manifestações da doutrina

Não obstante o pretendido caráter interpretativo já ter sido objeto de análise (Item "3.4"), importante destacar a contrariedade da doutrina pátria em relação ao escopo retroativo da lei complementar em tela, trazendo à colação, em tal mister, o ensinamento de R. Limongi França, jurista responsável pela elaboração de obra de peso sobre a irretroatividade das leis e o direito adquirido.

De fato, o suscitado autor, após assentar a natureza constitucional, na ordem jurídica brasileira, do princípio da irretroatividade das leis [53], aborda a controvérsia atinente às leis interpretativas sob o enfoque decorrente de cinco indagações:

a saber: a) é possível ao nosso Poder Público fazer leis interpretativas? b) a lei interpretativa, para assim ser considerada, deve ter conteúdo igual ao da lei interpretada? c) existe a possibilidade de conflito entre ambas? d) que sucede com as leis aparentemente interpretativas? e e) existe Direito Adquirido, de acordo com uma interpretação infirmada pela lei interpretativa? [54]

A primeira das questões já foi devidamente respondida (Item "3.4"), sendo certo que o autor também se posiciona pela subsistência da interpretação autêntica no cenário jurídico nacional.

Com relação ao segundo questionamento, afirmando, em síntese, a necessidade de afastamento da obscuridade da lei interpretada, preleciona que "... o texto interpretador, por sua própria natureza, será sempre diverso do que aquele que visa elucidar" [55], sob pena, é o que parece, de ser absolutamente inócuo. Não obstante a maestria do ensinamento, este parece desaguar na tese da inexistência da lei efetivamente interpretativa, sustentada por Carlos Maximiliano [56] e Roque Antonio Carazza [57].

No que tange à terceira problemática, o jurista, após assentar a noção de impossibilidade de confronto da lei interpretada para com a lei interpretativa [58], sustenta, ao que tudo indica, a desnecessidade de se considerar a possibilidade de regramento dos fatos pretéritos pela nova interpretação, uma vez que "... se nada faz de novo, não há como falar em retroação, pois o que existe é a própria ação ex nunc da lei interpretada, e não a força ex tunc da lei interpretativa" [59].

Deveras, se realmente meramente interpretativa, não há porque pensar em retroação da lei veiculadora da interpretação, massim em eficácia da lei interpretada, com base no alcance e sentido tidos como corretos pelo legislador quando do exercício do labor interpretativo via construção legislativa.

Outrossim, ao tratar das leis aparentemente interpretativas, "a resposta é evidente. Não se trata de lei interpretativa, senão de lei nova. O conflito se instaura e se resolve pelos princípios especializados referentes à matéria" [60].

Por fim, pede-se vênia para transcrever a análise do autor acerca da existência de direito adquirido à "interpretação" que prevalecia anteriormente à edição de eventual lei interpretativa:

Com efeito, uma lei está em vigor até que outra a modifique ou revogue (Lei de Introdução, art. 2º). Ora, o pressuposto é de que a lei é clara e de que, portanto, é válida a interpretação que se lhe dá. Por outro lado, é comum ser uma lei passível de mais de uma interpretação e, uma vez que esta se processe dentro das regras de hermenêutica que as informam, não há como desconhecer o Direito Adquirido segundo essa perspectiva. (...)

Mas distinguimos.

É preciso que, efetivamente, a interpretação se tenha processado dentro das boas regras de hermenêutica, regras essas da própria lei, da Doutrina e da Jurisprudência. Com efeito, não pode haver Direito Adquirido, segundo uma possível compreensão estapafúrdia e arbitrária, ainda que de norma acentuadamente obscura. [61]

Com fulcro nas lições supra-expostas, resta reafirmar que de forma alguma o artigo 3º da lei complementar nº 118/05 é passível de ser considerado meramente interpretativo, haja vista que, em síntese, conflita com os artigos do Código Tributário Nacional que pretensamente interpretou, tendo tacitamente os revogado (Art. 2º, § 1º, da LICC), sendo, de forma inconteste, apenas aparentemente interpretativa. Ademais, como bem exposto na lição de Limongi França, é absolutamente lícito se falar em violação a direito adquirido (Art. 5º, XXXVI, CF/88) do contribuinte à interpretação anteriormente vigente, haja vista que esta era a tida como a mais correta pela Corte Judicial competente (STJ), uma vez que decorrente da literalidade dos dispositivos ora supostamente interpretados (Arts. 150 e 168 do CTN).

Em conclusão, é nessa fundamentação que a moderna doutrina buscou supedâneo à sua insurgência contra a pretensão retroativa do artigo 3º da lei em comento, encartada no seu artigo 4º, vergastando, de forma ferrenha, a constitucionalidade destes dispositivos [62] [63].

Ademais, como já exaustivamente ressaltado, afora a questão do fictício caráter interpretativo da norma, esta padece de vícios atinentes à observância à independência dos Poderes da República (Art. 2º, CF/88), uma vez que é manifesta a intenção do legislador em prejudicar a atuação do Poder Judiciário na matéria (prazo prescricional para repetição de indébito), à segurança jurídica dos contribuintes e à efetividade da administração [64].

Estes os argumentos sobre os quais se assenta o inconformismo do meio jurídico-científico em relação à lei complementar ora em análise; fundamentos estes que, com todo o respeito às opiniões em contrário, entremostram-se de todo corretos.

3.5.2.2 Das manifestações jurisprudenciais relativas à lei complementar nº 118/2005

Publicada a lei complementar nº 118/2005, as representações judiciais das Fazendas Públicas passaram, de imediato e legitimamente, a lançar mão de suas disposições (Arts. 3º e 4º), sustentando a prejudicial de mérito em questão (prescrição) nas ações de repetição de indébito tributário relativas a tributos sujeitos ao lançamento por homologação.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça, guardião máximo da legislação infraconstitucional brasileira, não demorou a escoimar, na medida do juridicamente possível, os vícios até aqui incessantemente destacados.

De fato, ante a pretensão de fazer retroagir os efeitos do seu artigo 3º aos casos ainda pendentes de julgamento, a colenda Corte se posicionou, em um primeiro momento, pela aplicação do novo regramento (Art. 3º) tão–somente às ações ajuizadas após a entrada em vigor da lei complementar nº 118. O acórdão ora transcrito ilustra este primeiro entendimento sufragado:

PROCESSUAL CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO DEMONSTRADO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. ORIENTAÇÃO FIRMADA PELA 1ª SEÇÃO DO STJ, NA APRECIAÇÃO DO ERESP 435.835/SC. LC 118/2005: NATUREZA MODIFICATIVA (E NÃO SIMPLESMENTE INTERPRETATIVA) DO SEU ARTIGO 3º. INCONSTITUCIONALIDADE DO SEU ART. 4º, NA PARTE QUE DETERMINA A APLICAÇÃO RETROATIVA. ENTENDIMENTO CONSIGNADO NO VOTO DO ERESP 327.043/DF. COMPENSAÇÃO. TRIBUTOS DE DIFERENTES ESPÉCIES. SUCESSIVOS REGIMES DE COMPENSAÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA OU EXAME DA CAUSA À LUZ DO DIREITO SUPERVENIENTE. INVIABILIDADE. JUROS. SELIC. LEGALIDADE. PRECEDENTES

(...)

3. A 1ª Seção do STJ, no julgamento do ERESP 435.835/SC, Rel. p/ o acórdão Min. José Delgado, sessão de 24.03.2004, consagrou o entendimento segundo o qual o prazo prescricional para pleitear a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de cinco anos, contados da data da homologação do lançamento, que, se for tácita, ocorre após cinco anos da realização do fato gerador — sendo irrelevante, para fins de cômputo do prazo prescricional, a causa do indébito. Adota-se o entendimento firmado pela Seção, com ressalva do ponto de vista pessoal, no sentido da subordinação do termo a quo do prazo ao universal princípio da actio nata (voto-vista proferido nos autos do ERESP 423.994/SC, 1ª Seção, Min. Peçanha Martins, sessão de 08.10.2003).

(...)

5. O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar os arts. 150, § 1º, 160, I, do CTN, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a "interpretação" dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal. Portanto, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.

6. O artigo 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (CF, art. 2º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI). Todavia, no julgamento do ERESP 327.043/DF, a 1ª Seção entendeu que o dispositivo é aplicável às ações propostas a partir da data da sua vigência, com o que ficava dispensada a declaração de sua inconstitucionalidade. Ressalva, no particular, do ponto de vista pessoal do relator, no sentido de que cumpre ao órgão fracionário do STJ suscitar o incidente de inconstitucionalidade perante a Corte Especial, nos termos do art. 97 da CF.

(STJ - REsp 818336 / SP – PRIMEIRA TURMA – MIN. TEORI ALBINO ZAVASCKI – DJU 17/04/2006. Grifo nosso)

Como bem se observa, o STJ principiou determinando a aplicação da lei complementar nº 118 às ações posteriores à sua vigência, no que dispensou a análise de sua constitucionalidade [65]. Contudo, a ressalva feita pelo ilustre relator, Min. Teori Albino Zavascki, foi determinante para a afetação da controvérsia à apreciação da Corte Especial do guardião da legislação infraconstitucional pátria.

Deveras, em meados do ano-calendário de 2007, frente a toda insegurança proporcionada pela publicação da lei complementar aqui vergastada, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de argüição de inconstitucionalidade formulada em embargos de divergência interpostos em recurso especial, sustentando ser apenas aparentemente interpretativo o artigo 3º da lei em comento, posicionou-se definitivamente pela inconstitucionalidade do seu artigo 4º, restando consolidada a impossibilidade de retroação do novo prazo prescricional (Art. 3º) aos casos anteriores à vigência do texto complementar em testilha. Importante a colação de trecho da ementa do julgamento em questão:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. LEI INTERPRETATIVA. PRAZO DE PRESCRIÇÃO PARA A REPETIÇÃO DE INDÉBITO, NOS TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. LC 118/2005: NATUREZA MODIFICATIVA (E NÃO SIMPLESMENTE INTERPRETATIVA) DO SEU ARTIGO 3º. INCONSTITUCIONALIDADE DO SEU ART. 4º, NA PARTE QUE DETERMINA A APLICAÇÃO RETROATIVA.

(...)

4. Assim, tratando-se de preceito normativo modificativo, e não simplesmente interpretativo, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.

5. O artigo 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (CF, art. 2º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI).

6. Argüição de inconstitucionalidade acolhida.

(STJ - AI nos EREsp 644736 / PE – CORTE ESPECIAL – REL. MIN. TEORI ALBINO ZAVASCKI – DJU 27/08/2007. Grifo nosso)

Com o pronunciamento acima colacionado, a Corte delimitou a abrangência do novo prazo prescricional, para as ações de restituição de indébito relativas a tributos lançados por homologação, às situações concretizadas - leia-se: fatos geradores - após a sua vigência [66] (Art. 105, CTN). Ressalte-se que a declaração de inconstitucionalidade em tela se circunscreveu, infelizmente, tão-somente ao efeito retroativo pretendido pelo artigo 4º da lei, restando hígido o novo prazo prescricional constante do artigo 3º.

Pois bem, as decisões posteriores à declaração de inconstitucionalidade supramencionada têm se pautado no entendimento em questão. No entanto, ante a subsistência do artigo 3º da lei, surgiu a dúvida atinente à contagem do prazo prescricional quando se tratar de pagamento indevido (fato gerador do dever de restituir) concretizado anteriormente à publicação da lei complementar em tela (art. 105, do Código Tributário Nacional). A solução já fora proclamada pelo Superior Tribunal de Justiça.

De fato, declarada a inconstitucionalidade nos termos do acórdão supra-exposto, os Ministros que compõem as Turmas especializadas em Direito Público vêm delimitando o prazo prescricional das ações de repetição de indébito tributário, em se tratando de tributo lançado por homologação, nos seguintes termos:

(...)

Assim, na hipótese em exame, com o advento da LC 118/05, a prescrição, do ponto de vista prático, deve ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a ação de repetição do indébito é de cinco anos a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei nova.

(...)

(Voto proferido pelo Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, no julgamento do REsp 1038117 / PE – PRIMEIRA TURMA – DJU 24/04/2008. Grifo nosso)

Em conclusão, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça assentou a aplicação tão-somente prospectiva do novo prazo prescricional estabelecido no artigo 3º da lei complementar nº 118/2005, devendo ser atingidos pelos seus termos apenas os fatos geradores do dever de restituir (pagamentos indevidos) consolidados (Art. 105, do CTN) a partir de 9 de junho de 2005.

Em verdade, no que tange à aplicação do novel prazo, a solução preconizada pelo Ministro, supracitada, é a mais consentânea para com os ideais de justiça que informam a ordem jurídica nacional, sendo, deveras, a técnica interpretativa diuturnamente aplicada aos conflitos decorrentes do surgimento de prazo fatal mais estreito do que o outrora em vigor.

3.6 Das Conseqüências Para o Contribuinte e Para o Fisco

A título de complemento pragmático, com relação às conseqüências advindas da publicação da lei complementar nº 118, no que tange ao contribuinte, identificá-las não é labor dos mais tormentosos.

Deveras, em um primeiro momento, visualiza-se a principal delas, aquela que se manifesta em concreto perante o cidadão: a redução, via lei supostamente interpretativa, de um prazo fatal (prescrição da pretensão repetitiva de indébito) estabelecido em lei a seu desfavor. Com base nisto, cabe ao contribuinte, como já mencionado, permanecer alerta, zeloso para com a eventual necessidade de manifestação da suscitada pretensão em juízo, uma vez que até o presente momento o artigo 3º do texto legal em testilha permanece vigente, ainda tido como amoldado ao texto constitucional.

Afora a conseqüência concreta supramencionada, vislumbra-se uma mediata, qual seja: a instabilidade decorrente do exercício da atividade legislativa divorciado dos cânones principiológicos atinentes à segurança jurídica e à moralidade no desempenho das funções estatais; o primeiro deles, um verdadeiro princípio geral de Direito, o segundo, uma norma-princípio inferida do artigo 37 [67], caput, da Carta Magna.

Lançando mão, uma vez mais, do ensinamento de Kiyoshi Harada, este, ao expor a sua indignação em relação ao escopo do legislador quando da edição da lei em comento, textualmente afirmou:

O princípio da segurança jurídica pressupõe normas jurídicas estáveis, regulares e previsíveis, porque conformadas com os direitos e garantias fundamentais consagrados pela Carta Política em nível de cláusula pétrea. A previsibilidade de normas jurídicas futuras é inerente ao sistema de segurança jurídica. Normas casuísticas e imprevisíveis, ditadas por legisladores idiossincráticos, que surgem do nada, na calada da noite, com toda a certeza, não se harmonizam com o sistema jurídico fundamentado na Constituição Federal, pelo contrário, são normas bastardas que devem ser repelidas e expurgadas do mundo jurídico. [68]

Realmente, a falta de lealdade do legislador para com o cidadão, que também não deixou de ser captada pelo jurista supracitado, acarreta um clima de insegurança no meio jurídico, haja vista que a noção de que nada se encontra consolidado, de que todo e qualquer instituto jurídico é passível de ser alterado pelo legislador, quando e como melhor lhe aprouver, coloca o jurisdicionado numa situação de absoluta incerteza quanto à higidez de seus direitos.

Outrossim, o desprestígio à moralidade administrativa é manifesto [69], haja vista que o ato legislativo em comento fora levado a cabo em prol da cupidez daqueles que administram os cofres públicos, em prejuízo, como já afirmado, da segurança jurídica do contribuinte.

Em verdade, vários outros exemplos podem ser trazidos à colação para ilustrar a reiteração do comportamento no mínimo censurável do legislador brasileiro: (i) a Emenda Passos Porto (EC nº 23/83), que "sepultou três teses de natureza constitucional proclamadas pela Corte Suprema" [70]; (ii) a Lei nº 11.051/04, que, por meio de seu artigo 6º, "a pretexto de explicitar o alcance da norma do caput do art. 40 da Lei 6.830/80, veio introduzir sorrateiramente o § 4º, dilatando o prazo de prescrição intercorrente, procurando driblar a jurisprudência dos tribunais" [71]; (iii) não obstante se tratar de ato do Poder Executivo, a Medida Provisória nº 2.183. de 2001, que intentou prejudicar três súmulas das Cortes Superiores (n° 164 e n° 618, ambas do STF e n° 69, do STJ) acerca dos juros compensatórios devidos no processo de desapropriação, em caso de imissão na posse [72]; estes dentre vários outros passíveis de menção.

Destarte, clara a perniciosidade da lei complementar nº 118 não apenas ao cidadão/contribuinte, mas também a ordem jurídica nacional como um todo, haja vista que, como bem sentido pela doutrina especializada, absolutamente em descompasso com a Constituição Federal e os princípios gerais de Direito, positivados estes ou não.

Por outro lado, pondo em foco a esfera de interesses da Fazenda Pública, inconteste o benefício decorrente do texto legal em exame, haja vista que, uma vez diminuído o prazo prescricional a ser observado pelo contribuinte quando da potencialidade do exercício do seu direito de ação (repetição de indébito), certamente o número de ações prejudicadas, e em vias de sê-lo, em virtude da alegação de prescrição com base nas disposições da lei complementar em tela será enorme. O intuito de resguardo à arrecadação fiscal e, via de conseqüência, aos superávits primários é indisfarçável.

Entretanto, despendendo uma análise mais acurada, é possível extrair decorrências não tão benéficas ao Fisco, ainda que sub color de meras especulações doutrinárias.

A título de ilustração, haja vista que descompromissado com um maior rigor conceitual (exposição do item "2.3.1"), interessante a conseqüência referente ao obstáculo anteposto à atividade fiscalizadora do Poder Público, uma vez que, ao estabelecer que a extinção do crédito tributário dá-se no instante da antecipação do pagamento, efetivado pelo contribuinte, o legislador acabou por extinguir a figura da homologação e, em conseqüência, do lançamento de ofício de eventual saldo devedor, haja vista que, obviamente, estando o crédito tributário extinto, nada há o que fiscalizar.

André Malta Martins, ao externar as suas conclusões a respeito da lei complementar em discussão, em artigo já trazido à colação, corrobora a tese supra-exposta:

Ao estabelecer que a extinção do crédito – antes provisória e agora definitiva – ocorre com o pagamento, assinalando o "dies a quo" do prazo prescricional da repetição de indébito, o legislador acabou com a figura da homologação do crédito e, portanto, impôs óbice à atividade fiscalizatória tendente a apurar tributo não pago. [73]

Em verdade, o raciocínio merece críticas, uma vez que a figura da homologação não se quedou extinta. De fato, o pagamento antecipado feito pelo contribuinte possui o condão de constituir, de forma imediata, eventual crédito declarado e não pago, ou pago a menor. Em tendo havido omissão quanto a valor que deveria ter sido declarado e não o foi, a respectiva Fazenda Pública ainda terá a seu favor o prazo decadencial para a constituição do crédito tributário a ser futuramente cobrado do contribuinte infrator (Item "2.3.1"). No entanto, como mencionado, a título de exemplificação, interessante trazer à exposição a tese do autor.

Além disso, há quem sustente que a mesma construção jurídica que culminou na redução do prazo prescricional para a ação de repetição de indébito tributário pode ser usada em relação à cobrança de crédito tributário, isso em homenagem ao princípio da isonomia:

se o pagamento feito fixa o início do prazo para a repetição daquilo indevidamente recolhido, o não pagamento há de demarcar o início do lapso para que a Fazenda Pública proceda à formalização da obrigação tributária (constituição do crédito tributário), já que se trata de condutas simetricamente antagônicas em relação ao mesmo fato, verso e anverso de um mesmo proceder. Restaria, pois, em situação de idêntica paridade a Fazenda Pública e o contribuinte, impondo-se, a partir do advento da Lei Complementar 118 de 2005, a eliminação da regra dos "cinco mais cinco" para ambos. Interpretação diversa escamotearia a preponderância dos interesses arrecadatórios do Estado, sobre o direito individual do contribuinte. [74]

Posta a tese em questão em cotejo com as teorias que circundam a decadência do direito atribuído ao Fisco de constituir eventual crédito tributário contra o contribuinte devedor, não se apresenta como imune a contestações. Contudo, louvável a intenção da autora de fazer valer o princípio da isonomia substancial entre as partes (Estado e contribuinte) da relação jurídico-tributária.

No entanto, reafirme-se que, tendo em vista a ausência de uma maior fundamentação teórica, as teses supramencionadas ainda encontram guarida tão-somente na incipiente doutrina a respeito da lei complementar objeto do presente estudo. Aguarda-se por alvissareira mudança de rumo, uma vez que o desânimo do contribuinte ante as investidas do Poder Público já há muito reclama uma reviravolta de nossos doutrinadores e, via de consequência, de nossos Pretórios.


4 conclusão

Aclarada toda a injustiça concretizada por meio da lei complementar nº 118/05, bem como o quadro doutrinário e jurisprudencial posteriormente consolidado, cumpre relembrar o ensinamento de Norberto Bobbio, para quem é perfeitamente possível uma norma jurídica ser válida sem ser justa:

Aqui não é preciso ir muito longe para buscar exemplos. Nenhum ordenamento jurídico é perfeito: entre o ideal de justiça e a realidade do direito há sempre um vazio, mais ou menos grande, dependendo dos regimes. Certamente o direito, que em todos os regimes de um certo período histórico e em alguns contemporâneos que consideramos civilmente ultrapassados, admite a escravidão, não é justo, mas nem por isso é menos válido. Não faz muitos anos vigoravam leis raciais que nenhuma pessoa racional estaria disposta a considerar justa e, não obstante, eram válidas. Um socialista dificilmente conceberá como justo um ordenamento que reconhece e protege a propriedade individual; assim como um reacionário dificilmente admitirá como justa uma norma que considere a greve lícita. E ainda, nem o socialista nem o reacionário terão dúvidas sobre o fato de que, em um ordenamento positivo como o italiano, tanto as normas que regulam a propriedade individual quanto as que reconhecem o direito de greve são válidas. [75]

Com base no ensinamento do jurista peninsular, é inconteste a possibilidade de vigência de uma norma veiculadora de disposições absolutamente em descompasso com os ideais de justiça que devem, ou ao menos deveriam, guiar o mister legislativo.

Pois bem, no que tange à lei complementar em discussão, já é mais do que pacífico na doutrina especializada que a deslealdade do legislador em relação ao cidadão/contribuinte fora manifesta, e, ao que tudo indica, tal vício não decorreu dos "erros, impropriedades, atecnias, deficiências e ambigüidades (...)" [76] do legislador, mas sim do claro objetivo de garantir a sanha arrecadadora do Estado, manifestada, sem dúvida, através de lobby do Poder Executivo junto ao Congresso Nacional.

De fato, a completa ausência, por parte do legislador complementar, de racionalidade e observância a um mínimo de técnica quando da edição da lei complementar nº 118/05 decorreu do claro intuito de prejudicar a jurisprudência até então consolidada acerca da prescrição da ação de repetição de indébito tributário (tese dos "cinco mais cinco"), diminuindo o prazo prescricional em questão via canhestra interpretação. A sobreposição do interesse do Fisco, prescindindo às estampas de um mínimo de moralidade administrativa, sobre o legítimo direito individual do contribuinte foi gritante.

Ademais, o menosprezo a princípios do jaez da independência dos Poderes da República (Art. 2º, CF/88) e, principalmente, da segurança jurídica é ultrajante, e, em se repetindo a edição de leis dessa natureza, o cidadão ver-se-á cada vez mais inserto num ambiente jurídico pautado pela instabilidade, haja vista que posto na mira de um legislador absolutamente descompromissado com os princípios basilares que informam a ordem jurídica nacional, plenamente disposto a atender aos interesses escusos de um Poder Executivo preocupado apenas em garantir e aumentar a arrecadação tributária e, via de conseqüência, seus superávits primários.

Deveras, a incorreção, para se dizer o menos, do labor legislativo aqui guerreado resta ainda mais exposta quando cotejado com o ensinamento de Ricardo Aziz Cretton, para quem:

As idéias de razão, racional, racionalidade e razoável, razoabilidade, em suas variadas acepções, imbricam-se e se entrecuzam, desde os primórdios do pensamento jusfilosófico, com as de justo, justiça e equânime, eqüidade.(...) [77]

Pondo-se em foco a jurisprudência por enquanto firmada a respeito, como se intentou demonstrar, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça assentou o seu posicionamento pela inconstitucionalidade do pretendido efeito retroativo (artigo 4°) a ser conferido ao artigo 3° da lei complementar n° 118/2005, sendo que, em vista disso, a tese que hodiernamente paira tranquila no âmbito fiscal é a de que o novo regramento só se aplica aos fatos geradores ocorridos após a vigência da lei complementar que o instituiu (LC 118/2005). No que respeita aos fatos geradores concretizados anteriormente à suscitada vigência, os prazos a ser observados obedecerão à vetusta "tese dos dez anos", entretanto, limitado ao novel limite de cinco anos imposto pela lei complementar n° 118.

Por outro lado, aguarda-se a possível manifestação do egrégio Supremo Tribunal Federal a respeito, rogando-lhe, aos ilustres Ministros, obstinação, firmeza e clareza de princípios, qualidades que sem dúvida ostentam, para que impinjam a pecha de inconstitucional não apenas ao artigo 4° da lei complementar epigrafada, já declarada no controle difuso, mas também ao seu artigo 3°, por violador dos princípios da independência dos Poderes da República, da segurança jurídica e, por sem dúvida, da moralidade administrativa.

Concluindo, até que se concretize a reação judicial aventada, só resta lamentar os objetivos imorais que deram azo à edição da lei complementar nº 118/2005, torcendo para que no futuro o Poder Legislativo, antes de se curvar aos anseios da "Máquina Administrativa", não prescinda do controle prévio de constitucionalidade e moralidade de eventual projeto de lei posto à sua apreciação, sob pena de se eternizar o discurso, infelizmente ainda marcado pela sua atualidade, de Celso Antonio Bandeira de Mello, para quem:

O Estado Brasileiro é um bandido. O Estado Brasileiro não tem o menor respeito pela outra parte, pelo cidadão. O Estado Brasileiro atua com deslealdade e com má-fé, violando um dos primeiros e mais elementar princípios do Direito, que é o princípio da lealdade e da boa-fé. O Direito abomina a má-fé. [78]

Só resta aguardar, desejando a obsolescência das palavras do supracitado autor, isto sem nunca reservar-se ao silencio parcimonioso, permanecendo sempre em prontidão, ávidos por lançar tintas fortes sobre eventuais expedientes normativos desmoralizantes do ordenamento jurídico pátrio, infelizmente tão utilizados pelos Poderes Legislativo e Executivo das Pessoas Políticas integrantes da República Federativa do Brasil.


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Notas

  1. Art. 5° Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
  2. Art. 2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
  3. Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos: (...) XXXVI – A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. (grifo nosso)
  4. DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário, 3ª ed., São Paulo: Max Limonad, 2004, p. 93-95 passim.
  5. Ibid., p. 96.
  6. DE SANTI, loc. cit.
  7. Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; (...)
  8. São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do decreto-lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário.
  9. Art. 13. Ficam revogados: I – a partir da data de publicação desta Lei Complementar:
  10. a)os arts. 45 e 46 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991; 

  11. DE SANTI, loc. cit. (grifo nosso)
  12. Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; (...)
  13. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 18ª ed., Saraiva: São Paulo, 2007, p. 481/482. (grifo nosso)
  14. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 28ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 241 seq. (grifo nosso)
  15. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 406-407 passim. (grifo nosso)
  16. DE SOUSA, Ercias Rodrigues. Prescrição e Decadência em Matéria Tributária, Revista Jurídica da Univale, ano I, n. I, março de 2007, p. 103. (grifo nosso)
  17. REsp nº 808.390, julgado em 21/02/2006, Min. José Delgado.
  18. AMARO, 2006, p. 412; DE SANTI, 2004, p. 183/184; DE SOUSA. Revista Jurídica da Univale, ano I, n. I, março de 2007, p. 109/110.
  19. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 413.
  20. Embargos de divergência no Resp 101.407/SP, DJU 08/05/00; e REsp 276.142/SP, DJU 30/06/03.
  21. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 28ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 245.
  22. DE ASSIS, Araken. Manual da Execução, 11ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 985.
  23. Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva. (grifo nosso)
  24. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 414. (grifo nosso)
  25. STJ - AI-AgR No REsp 96616/RJ - Min. Francisco Rezek - DJ 27.04.1984.
  26. HARADA, Kyioshi. Direito Financeiro e Tributário, 16ª ed., São Paulo: Atlas, 2007, p 526.
  27. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 417. (grifo nosso)
  28. STJ - EREsp 576661 / RS – Primeira Seção – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – DJ 16/10/2006.
  29. DE SOUSA, Ercias Rodrigues. Prescrição e Decadência em Matéria Tributária, Revista Jurídica da Univale, ano I, n. I, março de 2007, p. 99 seq.
  30. STJ - EREsp 576661 / RS – Primeira Seção – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – DJ 16/10/2006.
  31. Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º, do art. 162, nos seguintes casos: I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
  32. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 9ª ed., Forense: Rio de Janeiro, 2007, p. 818. (grifo nosso)
  33. STJ - REsp nº 121.607.383/SC - Min. José Delgado - DJ 13.12.2004.
  34. "O artigo 3º, da Lei Complementar nº 118/05, intenta, na realidade, reformar o entendimento já pacificado no egrégio Superior Tribunal de Justiça...". MARTINS, André Malta. Duas Abordagens acerca da Lei Complementar nº 118/05. Contagem da prescrição em repetição de indébito e indisponibilidade de bens em execução fiscal. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/7713>. Acesso em 23/07/2007.
  35. HARADA, Kiyoshi. Repetição de indébito. Confusão em torno do prazo prescricional trazida pela LC nº 118/05. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6396>. Acesso em: 23/07/2007. (grifo nosso)
  36. "Pois bem, tendo em vista que os 10 anos são ‘pesados’ aos cofres da administração pública, o Governo Federal, valendo-se da autoridade que lhe é inerente, editou a Lei Complementar nº 118 com um objetivo bastante tenaz: o de acabar com essa interpretação do Poder Judiciário. (...)" CASTILHOS, Everton Hertzog. Comentários sobre os arts. 3º e 4º da Lei Complementar nº 118/2005. Prescrição da ação para restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6791>. Acesso em: 23/07/2007.
  37. ELIAS, Eduardo Arrieiro. A Lei Complementar nº 118 e o prazo para repetição de indébito tributário: problemas à vista. Disponível em : <http://jus.com.br/revista/texto/6318>. Acesso em: 25/07/2007
  38. REsp 44.165/RS – Rel. Min. Demócrito Reinaldo – 1ª Turma – DJ 27.06.1994.
  39. REsp 44.221/PR – Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro – 2ª Turma – DJ 23.05.1994. Ementa retificada por embargos de declaração julgados em 31.08.1994 – DJ 19.09.1994, apud, VIEIRA, Alexandre Ferreira Infante. Art. 3º da Lei Complementar nº 118/2005: o fim da tese dos "cinco mais cinco" para a repetição de tributo sujeito a lançamento por homologação. Disponível em: <http://jus2. uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6321>. Acesso em: 25/07/2007.
  40. EREsp 42.720/RS – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – 1ª Seção – DJ 17.04.1995.
  41. FERNANDES, Ana Carolina Dias Lima. A Lei Complementar nº 118/2005 e os novos paradigmas para repetição de indébito e constituição de créditos tributários. Disponível em: <http://jus2. uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7407>. Acesso em: 25/07/2007. (grifo nosso)
  42. ELIAS, Eduardo Arrieiro. A Lei Complementar nº 118 e o prazo para repetição de indébito tributário: problemas à vista. Disponível em : <http://jus.com.br/revista/texto/6318>. Acesso em: 25/07/2007.
  43. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 19ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.75 (grifo nosso).
  44. CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 23ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 346-348 passim. (grifo nosso)
  45. ADIn nº 605 MC, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, DJ 05.03.1993.
  46. MAXIMILIANO, op. cit.
  47. PELLEGRINO, Maria Beatriz Conde e LEÔNCIO, Alisson Thomaz Bretas. A Lei Complementar nº 118 e o prazo para a repetição de indébito. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6925>. Acesso em 25/07/2007. (grifo nosso)
  48. CASTILHOS, Everton Hertzog. Comentários sobre os arts. 3º e 4º da Lei Complementar nº 118/2005. Prescrição da ação para restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6791>. Acesso em: 23/07/2007. (grifo nosso)
  49. Art. 2º. Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. (...)
  50. CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 23ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 884.
  51. Ibid., p. 921.
  52. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 171. (grifo nosso).
  53. "Em princípio, nenhuma ilegalidade macula a Lei Complementar editada. Vejamos os principais aspectos: pretendia-se modificar o CTN (Lei Complementar por força da Constituição Federal); para isso, editou-se norma através de uma outra Lei Complementar; conclusão é que a hierarquia legislativa foi respeitada, não havendo nenhuma ilegalidade neste sentido.
  54. Quanto à competência para legislar em matéria tributária, prevê o artigo 24 da Carta da República, em seu inciso I, que a União é competente para legislar em matéria tributária. Contudo, essa competência se limita à edição de normas gerais, por se tratar de competência concorrente (§ 1º do mesmo dispositivo). Sob este prisma, não podemos deixar de reconhecer que a Lei Complementar nº 118/05 é uma norma geral em matéria tributária, respeitando inclusive o postulado artigo 146, III, b, da Constituição Federal." CASTILHOS, Everton Hertzog. Comentários sobre os arts. 3º e 4º da Lei Complementar nº 118/2005. Prescrição da ação para restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6791>. Acesso em: 23/07/2007. (grifo nosso)

  55. "Por fim, seja ressaltado que, entre nós, tão arraigada é a noção de que o princípio da irretroatividade das leis tem natureza constitucional,..." FRANÇA, R. Limongi. A Irretroatividade das Leis e o Direito Adquirido, 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 189. (grifo nosso)
  56. Ibid., p. 198. (grifo nosso)
  57. Ibid., p. 199.
  58. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 19ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.75.
  59. CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 23ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 346-348 passim.
  60. FRANÇA, loc. cit.
  61. loc. cit.
  62. loc. cit. (grifo nosso)
  63. FRANÇA, op. cit. (grifo nosso)
  64. CARDOZO, Paulo Sigaud; RANGEL, Maria Luiza Reenó. A Lei Complementar nº 118/2005 e a Prescrição do Direto à Repetição do Indébito. Disponível em: <http://www.apet.org.br/artigos/ver.asp?art_id=104>.Acesso em: 07/05/2008.
  65. GOMES, Eduardo Wanderley. A aplicação dos arts. 3º e 4º da Lei Complementar nº 118/2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6970>. Acesso em: 07/05/2008.
  66. "Logo, além de não ser possível a sua aplicação retroativa (não se trata de lei meramente exegética, nos termos do art. 106, inciso I, do CTN), a norma expressa pelo art. 3º padece de flagrante inconstitucionalidade, por afronta ao princípio da segurança jurídica e da efetividade da administração (respectivamente, art. 5º, "caput" e art. 37, "caput", da Constituição Federal, o que torna prejudicada a sua aplicação, também, no presente e no futuro." MARTINS, André Malta. Duas abordagens acerca da Lei Complementar nº 118/05; Contagem da prescrição em repetição de indébito e indisponibilidade de bens em execução fiscal. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/7713>. Acesso em 23/07/2007. (grifo nosso)
  67. EREsp nº 327.043/DF.
  68. "Mas necessário se faz que se vá além, condicionando-se não somente a eficácia da norma à observância da vacatio legis, mas, de igual modo, a aplicabilidade do dispositivo apenas a fatos geradores ocorridos após o advento da lei...". FERNANDES, Ana Carolina Dias Lima. A Lei Complementar nº 118/2005 e os novos paradigmas para repetição de indébito e constituição de créditos tributários. Disponível em: <http://jus2. uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7407>. Acesso em: 25/07/2007. (grifo nosso)
  69. Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
  70. HARADA, Kiyoshi. Repetição de Indébito. Confusão em torno do prazo prescricional trazida pela LC nº 118/05. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6396>. Acesso em: 23/07/2007. (grifo nosso)
  71. "O expediente aético e maroto, utilizado pelo ardiloso legislador na redação do art. 3º sob exame, um verdadeiro ato de improbidade legislativa, certamente, há de ser repelido pelo STJ, que já sinalizou no sentido da invalidade dessa norma afrontosa sob todos os aspectos ao sistema jurídico, alicerçado nos direitos e garantias fundamentais." HARADA, Kiyoshi. Repetição de Indébito. Confusão em torno do prazo prescricional trazida pela LC nº 118/05. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6396>. Acesso em: 23/07/2007. (grifo nosso). (grifo nosso)
  72. HARADA, Kiyoshi, Repetição de Indébito. Confusão em torno do prazo prescricional trazida pela LC nº 118/05. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6396>. Acesso em: 23/07/2007.
  73. HARADA, Kiyoshi, Repetição de Indébito. Confusão em torno do prazo prescricional trazida pela LC nº 118/05. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6396>. Acesso em: 23/07/2007
  74. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 19ª ed., São Paulo: Atlas, 2006.
  75. MARTINS, André Malta. Duas Abordagens acerca da Lei Complementar nº 118/05. Contagem da prescrição em repetição de indébito e indisponibilidade de bens em execução fiscal. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7713>. Acesso em 23/07/2007. (grifo nosso)
  76. FERNANDES, Ana Carolina Dias Lima. A Lei Complementar nº 118/2005 e os novos paradigmas para repetição de indébito e constituição de créditos tributários. Disponível em: <http://jus2. uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7407>. Acesso em: 25/07/2007. (grifo nosso)
  77. BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurídica, 2ª ed. revista, São Paulo: Edripo, 2003. (grifo nosso)
  78. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 18ª ed., Saraiva: São Paulo, 2007, p. 5.
  79. CRETTON, Ricardo Aziz. Os Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade e sua Aplicação no Direito Tributário, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.
  80. Palestra proferida no IX Congresso Brasileiro de Direito Tributário, in Revista de Direito Tributário nº 67, Malheiros Editores, p. 54, apud, DE LIMA, Luiz Fernando Pelegrina. Prazo Para se Pleitear a Devolução de Valores Recolhidos Indevidamente a Título de Tributos Lançados por Homologação e a Lei Complementar nº 118/2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6693> Acesso em: 23/07/2007.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CÂNDIDO, Elton Luiz Bueno. Da repetição de indébito tributário referente a tributo lançado por homologação. Uma síntese da crítica doutrinária e consolidação jurisprudencial após a edição da Lei Complementar n° 118/2005. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2210, 20 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13176. Acesso em: 18 abr. 2024.