Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/13225
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Aspectos teóricos e práticos no cálculo de horas extras dos comissionistas

Aspectos teóricos e práticos no cálculo de horas extras dos comissionistas

Publicado em . Elaborado em .

As comissões constituem o pagamento da produção alcançada pelo empregado, de modo que, quanto mais ele trabalha, produzindo ou vendendo, maior será a sua contraprestação.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7º, quando trata da melhoria da condição social do trabalhador, no inciso XIII, dispõe "duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho".

Assim, todos empregados, inclusive os contratados a base de comissões, salvo exceção prevista no art. 62, I, da CLT, que trata dos que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, estão sujeitos às limitações da jornada de trabalho imposta pela Lei Maior.

Ainda, em seu art. 7º, XVI, dispõe que a remuneração do serviço extraordinário deve ser superior, no mínimo, em 50% (cinqüenta por cento) à do normal. Regulamentando este dispositivo constitucional, o art. 59, da CLT, estabelece que a duração normal do trabalho diário poderá ser acrescida de horas suplementares em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho.

Assim, uma vez que o comissionista está submetido ás limitações da jornada de trabalho, na hipótese de prorrogação de sua jornada normal de trabalho, terá o direito ao pagamento destas horas acrescidas de, no mínimo, 50% da hora normal.

O trabalhador remunerado por produção, da qual se enquadra o comissionista, recebe o equivalente ao serviço executado em determinado tempo. Na hipótese de trabalhar em horário extraordinário, assim considerado o que excede de 8 (oito) horas diárias, já terá remunerada cada hora trabalhada em horário suplementar, tendo direito apenas ao adicional por trabalho extraordinário (no mínimo 50%). Em outras palavras, as comissões são auferidas dentro de toda a jornada de trabalho, seja em tempo normal e tempo extraordinário.

Neste sentido, segue o entendimento jurisprudencial pacificado no Tribunal Superior do Trabalho (TST), consubstanciado nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 235 da SBDI-1:

HORAS EXTRAS. SALÁRIO POR PRODUÇÃO. Inserida em 20.06.01 (título alterado e inserido dispositivo, DJ 20.04.2005). O empregado que recebe salário por produção e trabalha em sobrejornada faz jus à percepção apenas do adicional de horas extras.

Ainda, uma vez que nossa legislação trabalhista não contém dispositivo expresso em estabelecer regras para o cálculo de horas extraordinárias para o comissionista, o TST, através da Súmula nº 340, assim firmou entendimento:

COMISSIONISTA. HORAS EXTRAS (nova redação) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O empregado, sujeito a controle de horário, remunerado à base de comissões, tem direito ao adicional de, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento) pelo trabalho em horas extras, calculado sobre o valor-hora das comissões recebidas no mês, considerando-se como divisor o número de horas efetivamente trabalhadas.

Em relação a integração das horas extras do comissionista na remuneração do repouso semanal, por falta de previsão legal expressa, a jurisprudência têm-se manifestado a respeito, porém, de modo divergente, vejamos:

Da não integração:

EMENTA: "..." COMISSIONISTA PURO. BASE DE CÁLCULO DAS HORAS EXTRAS. INTEGRAÇÃO DO REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. A base de cálculo do empregado comissionista puro é composta, unicamente, pelo valor-hora das comissões recebidas no mês, e, portanto, não inclui a incorporação de outras parcelas de natureza salarial, nos termos da Súmula 340 do TST. Agravo não provido. "...".NÚMERO ÚNICO PROC: A-AIRR - 775/2003-024-01-40. PUBLICAÇÃO: DJ - 29/05/2009. 2ª Turma - TST

Da integração:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. COMISSIONISTA. HORAS EXTRAS. DIVISOR. SALÁRIO-HORA. O empregado comissionista puro não sofre discriminação no tocante a outras verbas salariais (repouso semanal remunerado e horas extras, por exemplo): apenas possui fórmula de cálculo destas verbas compatível com a especificidade da dinâmica da figura da comissão. Assim, no caso de repouso semanal, o cálculo faz-se nos moldes previstos na Lei 605, de 1949: o montante do reflexo corresponderá ao quociente da divisão por seis da importância total das comissões percebidas na semana (art. 7º, c e d, da Lei 605). No caso das horas extras, o cálculo faz-se pela aplicação do respectivo adicional de sobrejornada sobre o valor das comissões referentes a essas horas (Súmula 340/TST). Agravo de instrumento de s provido. NÚMERO ÚNICO PROC: AIRR - 1315/2000-061-02-40. PUBLICAÇÃO: DJ - 29/08/2008. 6ª Turma - TST

O princípio in dubio pro operario se traduz em critério de interpretação da norma trabalhista, quando comportar mais de uma interpretação viável. Assim, na dúvida, há de prevalecer a interpretação mais favorável ao empregado (in dubio pro misero), no caso em discussão, da integração do valor das horas extras dos comissionistas na remuneração do repouso semanal (Lei 605/49).

Diante dos entendimentos supra mencionados, faremos análise de seus pressupostos ou fatores para execução do cálculo de horas extras aos comissionistas:

a)Empregado sujeito a controle de horário: Só se aplica aos comissionistas cuja jornada de trabalho é controlada pelo empregador;

b)Remunerado a base de comissões: Só se aplica ao empregado que recebe por comissões, inclusive para os comissionistas mistos, porém atingindo tão somente as comissões;

c)Adicional de 50% pelo trabalho em horas extras: Deve-se computar a quantidade de horas extras executadas no mês e computar o acréscimo de 50%;

d)Calculado sobre o valor-hora das comissões recebidas no mês: Deve-se converter o valor das comissões do mês em valor comissões-hora para servir de base de cálculo do adicional de 50%;

e)Considerando-se como divisor o número de horas efetivamente trabalhadas: Deve-se apurar no mês a quantidade de horas efetivamente prestadas em horário normal e as extraordinárias de trabalho, ou seja, aquela que de fato foi trabalhada no mês;

f)Integração do Repouso Semanal Remunerado: Integração das horas extras sobre comissões na remuneração do repouso semanal.

Sendo assim, segue um exemplo prático, considerando as seguintes circunstâncias:

1.Considerando o mês de agosto/2009, com 26 (vinte seis) dias úteis e 5 (cinco) dias destinados a repouso semanal (domingos);

2.Considerando que o empregado, em horário normal e extraordinário, auferiu comissões no mês na quantia de R$ 1.280,00;

3.Considerando que a jornada normal de trabalho de 7hs 20min (7,333333 horas em centesimais) por dia de segunda-feira a sábado. No mês, considerando 26 dias úteis (de segunda-feira a sábado), laborou 190hs 40min (190,67 em horas centesimais);

4.Cumpriu 2 (duas) horas extraordinárias todos os dias no mês, sendo 26 dias, logo totalizou 52 horas extras;

5.A jornada normal de trabalho (190hs 40min) e a jornada extraordinária (52hs) totalizaram em 242hs e 40min (242,67 em horas centesimais).

Regras do Cálculo

-R$ 1.280,00 (comissões do mês) ÷ 242,67 (horas trabalhadas normais e extraordinárias no mês) = R$ 5,27 (Salário-Comissões/Hora);

-R$ 5,27 (Salário-Comissões/Hora) x 50% (adicional horas extras) = R$ 2,64 (valor unitário do adicional de horas extras);

-R$ 2,64 (valor unitário do adicional de horas extras) x 52 (qtde. horas extras no mês) = R$ 137,28 (valor a pagar);

-Cálculo do DSR: R$ 137,28 (valor das horas-extras comissões do mês) ÷ 26 (dias úteis do mês) = R$ 5,28 (valor unitário por repouso semanal);

-R$ 5,28 x 5 (domingos do mês) = R$ 26,40 (valor a pagar)

Demonstrativo de Pagamento de Salário         

Recibo de Pagamento de Salário Agosto/2009

Descrição

Qtde.

Vr. Unit./Base

Crédito

Débito

Salário comissões Mês

5%

25.600,00

1.280,00

 

DSR s/ comissões Mês

5/26

1.280,00

246,15

 
Horas extras 50%  (Comissões)

52

2,64

137,28

 
DSR s/ H.E. 50% (Comissões)

5/26

137,28

26,40

 
Contribuição Previdenciária

11%

1,689,83

 

185,88

 

Total de vencimento

1.689,83

Total de Desconto

185,88

 

Total Liquido

1.503,95

Salário base

1.526.15

Sal. Contr. INSS

1.689,83

Base de cálc. FGTS

1.689,83

FGTS do Mês

135,19

Base Cálc IRRF

1.503,88

Faixa IRRF

7,5

* Desconto da Contribuição Previdenciária vigente em agosto de 2009 aplicada conforme Portaria Interministerial nº 48, de 12 de fevereiro de 2009.

Na hipótese de comissionista misto, ou seja, aquele que percebe parte fixa e comissões, normalmente esta parte fixa é fixado um salário mensal, o cálculo das horas extras para parte fixa se faz nos mesmos moldes de um mensalista, sendo calculadas somando-se o valor da hora normal ao adicional respectivo (50%, no mínimo) inclusive o acréscimo do repouso semanal remunerado e as horas extras incidentes sobre as comissões, se faz da forma como foi exposto. Neste sentido, segue o entendimento pacificado no Tribunal Superior do Trabalho:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. HORA EXTRA. COMISSIONISTA MISTO. APLICABILIDADE PARCIAL DA SÚMULA 340/TST. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, ante a constatação de contrariedade, em tese, à Súmula 340/TST. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. HORA EXTRA. COMISSIONISTA MISTO. APLICABILIDADE PARCIAL DA SÚMULA 340/TST. As horas extras de empregados denominados -comissionistas mistos-, que recebam à base de comissões e verbas fixas, devem ser calculadas da seguinte forma: sobre a parte fixa do salário as respectivas horas extras e mais o adicional legal, e quanto à parte variável somente o adicional de 50%. Aplicabilidade parcial da Súmula 340/TST. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido. Processo: RR - 1629/2005-033-01-40.0 Data de Julgamento: 17/06/2009, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 6ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 26/06/2009.

EMENTA: HORAS EXTRAORDINÁRIAS. EMPREGADO COMISSIONISTA MISTO. Este C. Tribunal Superior já firmou entendimento no sentido de que, quanto à parte fixa da remuneração do empregado comissionista misto, são devidas as horas simples acrescidas do adicional de horas extraordinárias. Em relação à parte variável, é devido somente o adicional de horas extraordinárias, tendo em vista que a hora simples já é remunerada pelas comissões. Precedentes da C. SDI. Recurso de revista não conhecido. Processo: RR - 1509/2004-004-03-00.0 Data de Julgamento: 03/06/2009, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 12/06/2009.

Por fim, diante da sistemática extraída da legislação e consolidada em nos tribunais até aqui expostos, cabe observar eventual disposição mais vantajosa em documento coletivo de trabalho do sindicato representativo da categoria profissional do empregado, pois nesta hipótese, prevalece a norma convencional, onde cada uma adota sua sistemática de cálculo.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Cristiano. Aspectos teóricos e práticos no cálculo de horas extras dos comissionistas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2220, 30 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13225. Acesso em: 26 abr. 2024.