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A necessidade de se repensar a reforma do ensino jurídico no Brasil

A necessidade de se repensar a reforma do ensino jurídico no Brasil

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Este estudo busca contribuir para a reflexão sobre o estado caótico da educação jurídica, evidenciando as autorizações de novos cursos e aprofundando propostas da OAB e do MEC.

RESUMO

O ensino superior no Brasil apresentava-se como um ótimo negócio em meados de 1990, sendo o curso de Direito, em razão da boa procura e da facilidade de implantação, perfeitamente adequado para a expansão. Adveio, pois, a proliferação indiscriminada, não havendo comprometimento da maioria dos empresários e do Estado com a qualidade. Por ser de opiniões diversas, criou-se, então, impasse entre o MEC e a OAB, pois enquanto aquele apoiava o expansionismo, este era convicto da necessidade de se conter o crescimento de cursos e vagas. No sentido de dirimir a contenda, em 2004 foi designado Grupo de Trabalho com representantes das instituições citadas, além do Conselho Nacional de Educação e do Ministério da Justiça, o que culminou com sugestões de critérios e procedimentos para autorização de novos cursos, reacendendo, inclusive, a discussão sobre o critério da "necessidade social". Em observância ao contexto geral do ensino jurídico, focando a proliferação dos cursos e a qualidade da educação oferecida e, ainda, com base nas recomendações do GT MEC-OAB, esta monografia propõe-se a contribuir para a reflexão sobre o estado caótico da educação jurídica, evidenciando as autorizações de novos cursos e aprofundando propostas da OAB e do MEC, com vistas a indicar perspectivas em que a previsível perpetuação da "crise" no ensino seja evitada.


INTRODUÇÃO

Por ser responsável técnico da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e participante do Grupo de Trabalho designado pelo Ministro da Educação – instituído por meio da Portaria n. 3.381, de 2004 [01] –, com a "finalidade de realizar estudos para consolidar os parâmetros já estabelecidos, de análise dos pedidos de autorização de novos cursos jurídicos" –, instigado pelos que me tutelam, senti-me na contingência de expor o meu vivenciamento no Grupo de Trabalho (GT MEC-OAB) cumulado com a experiência que pude adquirir do trabalho inerente à Comissão de Ensino Jurídico, produzindo a presente monografia, intitulada "A necessidade de se repensar a reforma do ensino jurídico no Brasil: o relato de uma experiência".

Esta monografia tem o cuidado de: tornar claro o que viria a ser a "crise do ensino jurídico", repetidamente estampada na imprensa e combatida pela OAB; trazer à tona a situação geral das instituições de ensino, abrangendo, ainda, a situação das universidades, que são imbuídas de maior responsabilidade sobre os caminhos da educação; reunir a legislação acerca do ensino do Direito e aprofundar a parte burocrática da criação de cursos; apresentar o Grupo de Trabalho MEC-OAB, adentrando-se às suas propostas; e, ao final, apresentar, harmonizando todos os capítulos, as perspectivas quanto a área, num futuro próximo. É essencial deixar claro que todos os pontos acima enfocam o contexto dos cursos de Direito no decorrer dos últimos dez anos, quando estes se proliferaram indiscriminadamente, em decorrência de uma corrida do ouro, onde empresários investiam na criação de instituições de ensino superior em busca de retorno certo, farto e fácil, enquanto o poder público barganhava, autorizando a grande maioria dos cursos pleiteados, em nome da política expansionista da educação e em atenção aos favores políticos.

É importante observar que nessa corrida não havia qualquer comprometimento dos meros empresários e, muito menos, dos políticos empresários, com a qualidade do ensino, pois aqueles estavam preocupados apenas com o retorno financeiro decorrente das mensalidades e, quanto aos políticos, também com as perspectivas eleitoreiras de seu novo "curral eleitoral". É sabido, inclusive, que os mantenedores, muitas vezes, até optavam pela má qualidade, em razão de se conseguir viabilizar custos mais baixos de investimento e manutenção. Num outro viés, há que se frisar que instituições comprometidas com a qualidade investiam pesado no desenvolvimento de corpo docente, coordenação, métodos de ensino e estrutura física, o que colaborava para certa perpetuação do abismo entre a má e a boa educação jurídica.

Em contrapartida à primeira situação, que sempre foi majoritária com larga margem de vantagem, a Ordem dos Advogados do Brasil, temerosa com o eminente colapso do ensino jurídico, cada vez mais fielmente refletido nos resultados dos exames de ordem e, supostamente, imbuída de uma ótica corporativista, tentava, por meio da atribuição conferida pelo inciso XV do artigo 54 da Lei n. 8.906, de 1994 [02], sofrear a expansão, manifestando-se contrariamente à autorização de cursos que entendia não serem aptos a proporcionar um ensino que venha a inserir, em meio à sociedade, profissionais capazes de atender aos seus próprios anseios. Diante do contexto, criou-se uma situação desconfortável entre o MEC e a OAB, pois, ignorando os pareceres da Ordem que negavam a abertura de cursos, o Ministério autorizava o funcionamento de quase a totalidade dos solicitados. Como o foco de dessemelhança entre as posições das duas instituições era, tecnicamente, a divergência quanto aos critérios adotados, o Ministro da Educação Tarso Genro teve a iniciativa de criar um Grupo de Trabalho de mútuo interesse do MEC e da OAB, contando, ainda, com a participação do Conselho Nacional de Educação e do Ministério da Justiça, no sentido de viabilizar que os entendimentos daquele Ministério e da Ordem pudessem ser sintetizados em um documento, afinando critérios e normas, no sentido de harmonizar o posicionamento das instituições.

O Grupo se reuniu durante cinco meses, apresentando, ao final, um relatório onde se encontram sugestões de critérios e procedimentos para a autorização de novos cursos de Direito. Mas esses apontamentos nunca foram colocados em prática com a desejada efetividade, não se aproveitando o resultado dos estudos para ampliar o debate com o mundo acadêmico, de forma a não se contribuir com a melhoria do ensino jurídico e, sequer, minorar a disparidade entre o número de pareceres desfavoráveis da OAB e as homologações do MEC. Não obstante, o material produzido é de grande valia e deve ser explorado, razão pela qual este trabalho suscitará elementos importantes do Relatório Final do GT MEC-OAB, discutindo o ensino jurídico de forma que os rastros históricos da educação contribuam para a compreensão da contemporaneidade, com vistas, por fim, a ajudar a traçar perspectivas para o futuro do ensino jurídico e, talvez, numa visão mais ambiciosa, a colaborar com a indicação de um caminho a ser pautado para a tentativa de recuperação da credibilidade do universo da educação jurídica.


1.A PARAMETRIZAÇÃO DA "CRISE"

Ao tratar da "crise do ensino jurídico", deve-se contextualizar devidamente o termo, o que justificou a inclusão deste capítulo. Não se pode afirmar friamente que há uma crise no ensino jurídico sob pena de poder estar permitindo interpretações diversas do que se pretende. Entende-se por crise uma fase difícil na evolução das coisas, dos fatos ou das idéias. Pois bem, mas a que especificamente quer referir-se a afirmação "crise do ensino jurídico"? A resposta é muito importante para delimitar do que se fala, porém, ao mesmo tempo, é bastante simples: Trata-se do contexto geral. Refere-se ao ensino como um todo, ou seja, a queda na média da qualidade, analisando-se todas as instituições que oferecem cursos de Direito no país. Já quando se fala em qualidade de ensino, temos que instituições, tidas como exemplares (normalmente tradicionais), têm obtido bons resultados com seus alunos, que estão tendo a oportunidade de participar de um ensino superior de elevada qualidade, com recursos muito melhores do que estas mesmas faculdades poderiam oferecer há dez ou vinte anos atrás, o que nos mostra que houve uma melhora substancial no ensino jurídico [03]. A qualificação do corpo docente, as técnicas de docência, entre as quais a interdisciplinaridade e a multidisciplinaridade, a estrutura curricular (com a instalação de núcleos de monografia, pesquisa, extensão, atividades complementares e prática jurídica) e a própria estrutura física das instituições permitem o oferecimento de um ensino diferenciado, possibilitando que o corpo discente absorva mais conhecimento e possa, no ambiente acadêmico, preparar-se mais adequadamente para o mercado de trabalho. Pode-se aferir, ainda, que até mesmo o corpo discente encontra-se mais preparado, sobretudo em razão da velocidade e disponibilidade da informação, notadamente com a democratização da internet. Segundo Edgar Morin [04], "a educação deve contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver) e ensinar como se torna um cidadão". Nessa linha, pode-se afirmar que ensinar o Direito não se restringe a simplesmente repassar a informação jurídica, pelo contrário, há a necessidade de reavivar Montaigne com a sentença: "mais vale uma cabeça bem-feita do que uma cabeça cheia".

Rudolf von Jhering [05] escreveu, ainda no Século XIX:

Missão do direito. – É um problema insolúvel dir-se-á, o de indagar o que é que constitue o conteúdo do direito, porque ele é eternamente variável: é deste modo aqui, e além será de outro. É um caos em perpétua fusão, agitando-se sem freio nem regra. O que aqui é proibido, permitir-se-á mais além: o que aqui se prescreve, proíbe-se acolá. Fé e superstição, selvageria e civilização, vingança e amor, crueldade e humanidade, que mais sei eu? Tudo o direito tem acolhido sem consolidar coisa alguma. Por certo que, se a missão do direito fosse realisar a verdade em si mesma, o resultado seria desolador. Se lhe atribuíssemos uma tal missão teríamos de confessar que êle está votado ao perpétuo erro. Cada século transformando o direito pronunciaria a condenação do século precedente, que julgava que o seu direito consagrava a verdade, e seria a seu turno condenado pelo século seguinte. A verdade levaria sempre alguns passos de dianteira ao direito, e este nunca poderia atingi-la, tal como se fora uma criança correndo em perseguição de uma borboleta que levanta vôo à sua aproximação.

Como visto, o Direito não é uma matéria estática, quanto mais exata. Por isso, a educação jurídica não pode limitar-se ao repasse de informações, isto porque temos que construir e pensar a realidade a partir de princípios, adequando, então, a norma, que, inclusive, caminha conforme os anseios da sociedade. Forma-se, assim, um círculo vicioso, onde a sociedade alimenta a norma que regula a sociedade. Não se pode crer que a simples exposição da norma a um ser humano, no caso, o aluno, será suficiente para que ele entenda toda a dimensão a que corresponde o ensinamento jurídico. Mais uma vez, a título de ilustração, pode-se recorrer a textos históricos que comprovam a dinamicidade do Direito, agora, por Edmond Picard [06]:

É portanto uma idéia falsa a fixidez absoluta do Direito, quer para certas épocas, quer num futuro ideal como o imaginam os que crêem no Direito natural supremo que descrevi no parágrafo 83. As Leis têm esta estabilidade, mas, como vimos no parágrafo 95, são apenas uma expressão humana colocada acima da verdadeira vida jurídica popular, inspirando-se nesta, mas não confundindo-se com ela. A fixidez das Legislações está constantemente sujeita à reação dos costumes que trabalham sem descanso e acabam sempre por ter razão na sua obra lenta de decomposição ressurreicional. Nenhum Direito se manteve jamais intato e invariável, salvo se já é um Direito morto, como o romano que já não se pratica, do mesmo modo que o latim e o grego antigo são línguas mortas porque ninguém já as fala.

É comprovada a complexidade da matéria quando se fala em Direito. Cabe destacar, deste trecho, que a "fixidez das Legislações está constantemente sujeita à reação dos costumes", ou seja, o Direito é tão dinâmico quanto a sociedade, de forma que o ensino jurídico exige mais do que o simples repasse de informações, exige que se eduque o pensamento e a reflexão. O educador António Manuel Hespanha [07] confirma esse entendimento ao indicar que "as normas jurídicas apenas podem ser entendidas se integradas nos complexos normativos que organizam a vida social. Nesse sentido, o direito tem um sentido meramente relacional (ou contextual)". E complementa [08]: "Da antropologia jurídica, chegou a idéia de ‘pluralismo’, da coexistência de diferentes ordens jurídicas, legais ou costumeiras, no mesmo espaço social". De acordo com o autor, o Direito é oriundo da cultura social com vistas a regular ou balizar a relação entre os membros de uma sociedade ou, até mesmo, a relação entre sociedades. Assim, entende-se que o Direito brota de um conglomerado de costumes, ou seja, a sociedade não precisa se adaptar ao Direito, mas interage com este naturalmente [09].

Edgar Morin [10] aprofunda:

O importante não é apenas a idéia de inter- e de trans- disciplinaridade. Devemos "ecologizar" as disciplinas, isto é, levar em conta tudo que lhes é contextual, inclusive as condições culturais e sociais, ou seja, ver em que meio elas nascem, levantam problemas, ficam esclerosadas e transformam-se. É necessário também o "meta-disciplinar"; o termo "meta" significando ultrapassar e conservar. Não se pode demolir o que as disciplinas criaram; não se pode romper todo o fechamento: há o problema da disciplina, o problema da ciência, bem como o problema da vida; é preciso que uma disciplina seja, ao mesmo tempo, aberta e fechada.

Pelos elementos apresentados, verifica-se que o Direito não pode ser resumido a uma construção simplificada, sem vínculos com a sua própria história e com a história das sociedades. As normas são peças importantes do Direito, mas não podem ser consideradas a sua estrutura básica, porque cabe ao Direito, inclusive, compor normas, o que demanda mais que o conhecimento da legislação vigente, exige um amplo conhecimento contemporâneo e histórico da sociedade, além de estudos filosóficos. Ocorre, porém, que embora algumas instituições tenham investido pesado na qualidade, viabilizando um ensino incapaz de ser lecionado no contexto da década de oitenta, a grande maioria das faculdades de Direito pregam a educação em massa, ou seja, não se preocupam com a qualidade do que se repassa ao aluno, mas simplesmente com a quantidade de alunos que se tem, o que, em tese, acarreta o crescimento financeiro do mantenedor. Exemplo disso é o aumento indiscriminado de vagas [11] em universidades particulares (que possuem competência legal para tanto) sem investimentos proporcionais em corpo docente, projeto pedagógico e infra-estrutura.

Em síntese, pode-se afirmar que, progressivamente, temos instituições mais capacitadas a cada dia, e que estas estão melhorando constantemente. Em contrapartida, temos também o constante aumento de instituições que não se preocupam com a qualidade do ensino, que, aliás, vêm piorando na medida que os interesses econômicos sobressaem os didáticos. Tem-se, então, um distanciamento cada vez maior entre o melhor e o pior ensino, sendo que o primeiro cresce vagarosamente, enquanto o segundo cresce vertiginosamente, ocasionando uma constante queda na média geral de qualidade do ensino [12]. E é nesse sentido que se trata da "crise" no ensino do Direito.


2.ENTENDENDO A EVOLUÇÃO DO ENSINO DO DIREITO

A crise dos cursos de Direito decorre de uma deterioração ampla da educação, conseqüência da vulgarização da informação, impregnada nas novas perspectivas da sociedade. Como se sabe, matérias político-sociais evoluem (ou involuem) conforme o contexto em que se encontram. Atualmente, o Estado e a sociedade pugnam por educação, seja ela como for, entendendo que títulos valem por si só, desprezando-se a qualidade e conteúdo do conhecimento adquirido. Cabe, neste ponto, fazer uma remissão às considerações do capítulo anterior, enfatizando a coexistência de regra e exceção, sendo que a exceção, neste caso, é um ensino de qualidade superior e que tem se aperfeiçoado sobremaneira nos últimos anos, enquanto a regra é um ensino de massa, genérico, que tem se multiplicado geometricamente nesse mesmo espaço de tempo.

O molde de educação "genérico", ou seja, o curso padrão, sem excelência, contribuiu para molestar uma das mais fortes instituições mundiais: a Universidade [13]. Esta, como instituição, foi criada na Europa, na Idade Média, mais especificamente no século XII, período em que floreava o Renascimento. Nesse tempo, o enfoque sobrevinha os estudos de Direito, Teologia e Medicina, despertando-se, especialmente, na Itália e na França. É preciso ressaltar que há quem afirme que já em trezentos e oitenta e sete antes de Cristo Platão teria criado a primeira universidade da história, chamada de "Academia", por situar-se em Academus, cidade próxima a Atenas, na Grécia. Contudo, como "Universidade" abrange mais do que a "universalidade de idéias situada num campo propício para o desenvolvimento intelectual", majora o entendimento que a instituição somente tomou corpo efetivo com o Renascimento. A propósito, entre os anos de um mil e duzentos e um mil e quatrocentos, foram fundadas, na Europa, cinqüenta e duas universidades, sendo vinte e nove delas erguidas por papas, chefes da então instituição mais forte e consistente do mundo.

Enfatizando a importância e solidez das universidades, cabe reproduzir Boaventura de Sousa Santos [14]:

A notável continuidade institucional da universidade sobretudo no mundo ocidental sugere que os seus objectivos sejam permanentes. Em tom joco-sério Clark Kerr afirma que das oitenta e cinco instituições actuais que já existiam em 1520, com funções similares às que desempenham hoje, setenta são universidades.

A título de ilustração, deve-se ressaltar que, no Brasil, temos 177 universidades [15], praticamente uma para cada milhão de habitantes. Aceitável seria, não fossem alguns outros elementos [16] de contextualização: apenas 30% da população tem acesso ao ensino superior; e, além das universidades, há 118 centros universitários, 1523 faculdades isoladas, 349 institutos superiores e 33 centros tecnológicos.

Atualmente, ressalvadas poucas exceções, o estudante busca a informação pelo título correspondente e não pelo desenvolvimento intelectual pessoal e social, de forma que as universidades, aos olhos do povo, acabam por se tornar grandes faculdades reunidas para o oferecimento de informações, com vistas a viabilizar ao estudante o acesso ao mercado de trabalho. Nesse diapasão encontra-se a crise institucional da Universidade e, com muita propriedade, Boaventura de Sousa Santos aponta o cerne da questão [17]:

A centralidade da universidade enquanto lugar privilegiado da produção de alta cultura e conhecimento científico avançado é um fenómeno do século XIX, do período do capitalismo liberal, e o modelo de universidade que melhor o traduz é o modelo alemão, a universidade de Humboldt. A exigência posta no trabalho universitário, a excelência dos seus produtos culturais e científicos, a criatividade da actividade intelectual, a liberdade de discussão, o espírito crítico, a autonomia e o universalismo dos objectivos fizeram da universidade uma instituição única, relativamente isolada das restantes instituições sociais, dotada de grande prestígio social e considerada imprescindível para a formação das elites. Esta concepção da universidade, que já no período do capitalismo liberal estava em relativa dessintonia com as "exigências sociais" emergentes, entrou em crise no pós-guerra e sobretudo a partir dos anos sessenta. Esta concepção repousa numa série de pressupostos cuja vigência se tem vindo a mostrar cada vez mais problemática à medida que nos aproximamos dos nossos dias. Estes pressupostos podem formular-se nas seguintes dicotomias: alta cultura – cultura popular; educação – trabalho; teoria – prática.

Como visto, a universidade tem tido problemas quanto a alguns fatores oriundos do desenvolvimento social, que vem forçando um contexto cada vez mais desfavorável. Nesse sentido, a sociedade, que, em tese, seria a menos interessada em desvalorizar e deteriorar a qualidade e importância de grandes institutos que trabalham para o seu desenvolvimento, vem os prejudicando, o que certamente refluirá contra os próprios interesses sociais.

2.2.Situação contemporânea dos cursos de Direito

2.2.1.Elementos objetivos [18]

Conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP –, o Brasil contava, em 1995, com 235 cursos de Direito, sendo 160 de iniciativa particular e 75 de iniciativa pública. Daí infere-se ter 68% de cursos particulares e 32% de públicos.

Tratando de vagas existentes nesses cursos, obtêm-se os seguintes dados: 46.264 vagas em instituições particulares e apenas 9.442 vagas públicas, perfazendo-se um total de 55.706. Observa-se, de antemão, que embora dois terços das instituições de ensino superior fossem privadas e um terço pública, em se tratando de vagas, a disparidade era drástica. Em percentual, tem-se 83% de vagas particulares e 17% de vagas públicas. Vê-se que, naquela época, apenas dois terços dos cursos pertenciam à iniciativa privada, contudo, essas instituições concentravam um número muito maior de vagas do que as instituições públicas. Diante das informações acima, pode-se verificar que as instituições particulares compreendem um número cinco vezes maior de vagas que as públicas, o que poderia induzir a pensar que as suas estruturas condissessem com essa realidade, de forma que a capacidade física e de gestão das faculdades públicas seriam sensivelmente menor. Contudo, a realidade não era esta, pois, em raros casos as instituições privadas tinham mais estrutura física que as públicas e, mais importante que este indicador, ressalta-se que, naquele ano de 1995 [19], aquelas instituições eram constituídas por 74.720 docentes, devendo-se evidenciar um total de 4.867 doutores, enquanto as públicas eram compostas por 86.925 professores, sendo 17.941 com titulação de doutorado. Por ilação, pode-se afirmar que já naquela época havia uma tendência de educação em massa nos cursos particulares, pois, embora os cursos públicos tivessem melhores estruturas, inclusive com corpo docente em número e qualidade superiores, havia cinco vezes mais vagas nos cursos privados.

Outro fator importante quando da contextualização do início dos últimos dez anos, ou seja, o ano de 1995, é a concorrência (relação candidato por vaga) para se adentrar a um curso de Direito, como segue: 6,94 em instituições privadas e 16,93 em públicas. Os fatores tratados no parágrafo anterior, que indicam para uma relativa superioridade qualitativa dos cursos públicos em relação aos particulares, coadunados com o fato de que na faculdade privada há o ônus da mensalidade, justificam em parte a diferença na concorrência para o vestibular, mas há ainda que se frisar que o já excessivo número de vagas reforçava a disparidade.

Não se têm, ainda, os dados nos anos de 2004 e 2005, quando se completaria o campo de pesquisa parametrizado neste trabalho, motivo pelo qual utilizar-se-ão dados de 2003, ano do último Censo da Educação Superior, realizado pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP –, vinculado ao Ministério da Educação. É importante ressaltar, contudo, que a ausência dos dados de 2004 e 2005 não altera o panorama que se demonstra neste trabalho, pois não houve qualquer fato contundente que viesse a, substancialmente, interferir na previsibilidade e continuidade das progressões aqui tratadas.

Assim, em 2003, havia 704 instituições que ofereciam cursos de Direito, sendo 113 públicas e 591 privadas. Fazendo-se um olhar comparativo com os dados anteriores, de 1995, podemos verificar o óbvio: que a iniciativa privada abriu muito mais instituições que o setor público, fazendo com que, em 2003, 84% das instituições fossem particulares.

Voltando-se para o quesito vagas, temos: 197.988 vagas no total, distribuídas em 12.696 públicas e 185.292 particulares. Diante dos números, vê-se que o aumento de vagas públicas se deu no patamar de 34%, enquanto o crescimento privado se deu em 301%. Com isso, verifica-se que saltou de cinco vezes mais para quinze vezes mais o número de vagas particulares sobre o total de vagas públicas para Direito. Ocorre, porém, que o número de docentes entre os dois tipos de instituições tratados não caminhou da mesma forma, senão vejamos: Em 2005 [20], havia 267.986 docentes na educação superior brasileira. Desses, 88.246 serviam à iniciativa pública, enquanto 179.740 à iniciativa privada, ou seja, o dobro de docentes em instituições particulares, lecionando para quinze vezes mais discentes. Ademais, é importante ressaltar que 62,7% dos professores com titulação de doutorado estavam vinculados à iniciativa pública, contra 37,3% ligados ao setor privado. É falacioso acreditar que, diante desse panorama, o grupo dos cursos privados poderia lecionar com a mesma capacidade (quantitativa e qualitativa) que o grupo de instituições públicas.

Em se tratando de concorrência, proporcionalmente houve leve diminuição em instituições públicas, que passaram a ter 14,09 candidatos por vaga, porém, nos cursos particulares a diminuição foi extrema, apenas 2,41 candidatos por vaga. Ressalta-se, ainda, que essa concorrência de 2,41 candidatos por vaga, na realidade, tende a 1, pois, para aferi-lo, ignorou-se o fato de que a maioria dos candidatos concorre a uma vaga em diversas instituições de ensino e não somente em uma única.

Informa-se ainda, em complemento aos dados reais aferidos pelo Censo da Educação Superior, que hoje, segundo o INEP [21], temos 1.014 cursos de Direito em funcionamento. A reunião das informações acima dispostas não tem o objetivo de criticar, num primeiro momento, o grande número de cursos (o que, por si só, não indica a perda de qualidade), mas pretende demonstrar que as iniciativas pública e privada, nesse ramo de negócio, têm caminhado em direções distintas, e ambas aquém do que se espera para um ensino exemplar. Isso em razão de que a burocracia e a falta de investimento nas faculdades de Direito do governo mantêm-nas sem poder agregar, em toda sua capacidade, valores a seus cursos, assim como, nas faculdades particulares, o mercantilismo coíbe uma boa evolução didático-pedagógica. Poucas instituições pregam a excelência do ensino como norte, investindo em corpo docente e apoiando propostas didáticas emanadas de um núcleo docente permanente capaz de atender às demandas de cada área do curso, pois, normalmente, essas medidas exigem a disponibilidade de capital sem retorno direto e vultuoso. Aliás, como exposto neste capítulo, a grande maioria das instituições particulares tem criado vagas com vistas à diminuição de custos e o aumento da lucratividade, o que é visível quando se analisa o número de vagas e de docentes (observando-se, ainda, a evolução na contratação de professores titulados) no decorrer dos últimos anos. Ocorre, contudo, que essa vulgarização da educação chegou ao limite em diversas instituições, que passam a não conseguir preencher as vagas, como se pode extrair das informações acerca da concorrência no vestibular. Este, dentre outros elementos, permite enfatizar que o caminho não é a banalização, mas, sobretudo no contexto hodierno, deve-se propender ao investimento em qualidade visando uma diferenciação de mercado.

2.2.3.Elementos subjetivos

Apresentados os elementos objetivos da situação geral dos cursos de Direito no Brasil, é necessário apresentar outros, que refogem à lógica matemática. Agora, apresentar-se-ão elementos concisos, porém subjetivos, acerca da contextualização desses cursos, ou seja, haverá a caracterização da situação hodierna mediante elementos peculiares ao Direito, e que somente poderão ser interpretados a partir do conhecimento específico da matéria. De antemão, deve-se antecipar que este é um ponto crucial deste trabalho, ou seja, o momento em que há, mais a fundo, a delimitação da crise, tratada preliminarmente na "parametrização da crise", no primeiro capítulo da presente monografia. Explicando-se melhor, em "elementos objetivos" foi possível comprovar que, de fato, por dados numéricos, estamos atravessando uma grande crise do ensino jurídico. Em contrapartida, em "elementos subjetivos" não se comprova qualquer caos, pelo contrário, simplesmente aponta a necessidade de diálogo constante sobre a matéria, com vistas à manutenção das características fundamentais do curso e ao aperfeiçoamento dos seus projetos, o que, mesmo que não ocorra na amplitude esperada, é presente no meio acadêmico e contribui efetivamente para a melhora do ensino jurídico, que, aliás, sob este ponto de vista isolado, ou seja, analisando-se o que de melhor se pode ter hoje e o que de melhor se pôde ter a dez anos, verifica-se que houve melhora substancial.

Analisando o ensino jurídico de forma isolada, Inês da Fonseca Pôrto [22] revelou a maneira com que se deu o processo da reforma do ensino do Direito:

O processo da reforma do ensino jurídico estruturou-se de forma complexa: procurou dialogar, primeiramente, com a diversidade do pensamento dos especialistas.

Em seguida, predispôs-se a dialogar com as surpresas de sua própria realidade, empiricamente desconhecida até então.

Manteve a mesma disposição para o diálogo com as diferenças e singularidades de cada uma das experiências dos cursos jurídicos que conheceu.

O produto desse diálogo permanente são os instrumentos da reforma – ou os parâmetros de qualidade –, cuja pretensão é encontrar, nas contradições da realidade do ensino jurídico, as condições para a superação da crise.

Como visto, sob esta ótica, não temos um ensino do Direito em crise, mas simplesmente a eterna necessidade de repensar a matéria, rediscutir e dialogar para evoluir sempre. E todos devem ser considerados. O que não se deve fazer é restringir a análise a apenas um parâmetro, com vistas à não mutilação do estudo. Assim, é possível verificar que, ao mesmo tempo, autores enfatizam a crise, estimulam a reforma e apresentam sugestões para a superação das dificuldades.

Ainda no ano de 2000, Paulo Luiz Netto Lôbo [23] indicou fatores que estariam possibilitando a efetiva concretização da última reforma do ensino jurídico no século XX, conforme segue:

a participação significativa e representativa da comunidade acadêmica (docentes, discentes e instituições de ensino) e da comunidade profissional (entidades profissionais da advocacia, da magistratura e do Ministério Público) na discussão e definição das diretrizes básicas, em sucessivos eventos nacionais e regionais, superando-se as desconfianças recíprocas; a crescente consciência da necessidade de refundamentação dos cursos jurídicos, para melhor compatibilizá-los aos novos paradigmas do direito e das profissões jurídicas, bem como às mudanças sociais que se aprofundaram no final do século; a insatisfação com modelos uniformes de diretrizes oficiais, fixadas sem discussão com os interessados, que não contemplem as especificidades da área de conhecimento do direito e as reais condições dos cursos; a compreensão mais abrangente do projeto pedagógico do curso de direito, que não se resume a mera reforma de grade curricular; a progressiva profissionalização acadêmica dos docentes dos cursos jurídicos, particularmente com o notável aumento de pós-graduados, nas últimas duas décadas; a melhor compreensão da necessidade de articular o ensino com a pesquisa e a extensão; a superação das resistências, ou da inércia, aos processos de avaliação permanente dos cursos jurídicos.

Mais uma vez, fala-se em reforma, diálogo e ressalta-se a existência de uma "crescente consciência da necessidade de refundamentação dos cursos jurídicos". Claro que os elementos trazidos acima não bastam para solucionar os problemas que envolvem o ensino do Direito, até porque o que se busca não é um resultado obtido por meio de uma fórmula matemática, mas a evolução constante.

Horácio Wanderlei Rodrigues [24], embora insista no termo "crise" em seus estudos, remete-nos também à idéia da necessidade de diálogo permanente e confirma que o que se busca não é a explicação por "fórmulas ingênuas e simplistas", como se pode verificar adiante:

A não-compreensão de seu aspecto multifacético, que atinge diversas instâncias e níveis, é um dos problemas centrais que reveste muitas das respostas que vêm sendo apresentadas. Outro problema, não menos grave, é a negação de seus elementos próprios, internos, vendo-a como mera conseqüência de uma crise político-econômica, bem como o seu oposto, ou seja, a visão da crise do ensino do Direito meramente como uma crise interna e desvinculada das questões políticas, econômicas, sociais e culturais.

A adoção dessa linha de pensamento motivou que este trabalho não se limitasse à apresentação de dados numéricos. Ao mesmo tempo, influenciou no sentido da manutenção das informações, por serem relevantes, uma vez coadunadas com uma visão global da problemática. Nesse sentido, cabe ressaltar que a crise não se restringe a simples asserções, mas abrange um conglomerado de fatores, de forma que, para enxergá-la, é preciso que haja a distinção entre uma ótica ampla, que analisa o conjunto dos cursos existentes no país, e uma ótica restrita, que visa o ensino isolado, tratando o Direito como matéria.

2.3.MEC versus OAB na autorização de novos cursos

Como previamente mencionado na introdução, a Ordem dos Advogados do Brasil se manifesta quanto às autorizações de novos cursos de Direito, conforme determinação expressa na Lei nº 8.906, de 1994 [25], pelo inciso XV do artigo 54 – "colaborar com o aperfeiçoamento dos cursos jurídicos, e opinar, previamente, nos pedidos apresentados aos órgãos competentes para criação, reconhecimento ou credenciamento desses cursos". Contudo, por ser a manifestação meramente opinativa, não há a vinculação da decisão do Ministério da Educação, que pode acolher ou não o parecer da OAB.

Nesse sentido, sempre houve uma discrepância muito grande entre os posicionamentos da OAB e do MEC, uma vez que aquela instituição historicamente emite pareceres desfavoráveis em todos os casos em que os cursos não condigam com a real necessidade qualitativa inerente à sociedade, indo de encontro com o posicionamento do Governo, por meio do Ministério, de expandir o ensino superior, autorizando indistintamente os cursos pleiteados, independentemente da posição da Ordem. A título de ilustração, informa-se que, em 2004 [26], o Ministério da Educação autorizou o funcionamento de cinqüenta novos cursos de Direito, dos quais apenas quatro tinham parecer favorável da OAB. Em 2006, dos setenta e sete cursos homologados pelo Ministro da Educação, apenas dois obtiveram parecer favorável da Comissão de Ensino Jurídico, ou seja, menos que três por cento.

A posição da OAB vai ao encontro das reflexões de Paulo Roberto de Gouvêa Medina, como segue [27]:

As perspectivas que se delineiam para o futuro não são, nesse particular, nada promissoras. O lobby de instituições privadas em prol de um regime de maior flexibilidade para a criação e o funcionamento de novos cursos é algo preocupante. Não se contesta que o ensino particular tem o seu papel a cumprir, no último grau, já que, dispondo de maiores recursos, pode suprir deficiências que se verificam em relação às universidades públicas, notadamente as federais, tolhidas, muitas vezes, no seu potencial de expansão e com problemas, até, para a própria manutenção, em face da política restritiva que o governo federal tem adotado, nesse campo. Mas os interesses empresariais e a ânsia de ganho não podem sobrepor-se à preocupação com a qualidade do ensino, como parece ocorrer em muitas instituições de ensino superior, na área privada.

Os números anteriormente apresentados e as perspectivas citadas logo acima levam a crer que o ensino do Direito não parece ter um futuro muito promitente, e é justamente por este motivo que se propõe a aprofundar o estudo desse tema.

É importante que se tenha em mente que embora o posicionamento oficial da OAB seja no sentido de que haja um refreamento de cursos de Direito em razão da baixa qualidade verificada nos cursos atuais e nos projetos de implantação de novos cursos, há quem conteste a real intenção da instituição, indicando que pode haver interesses corporativos que motivam a política adotada pela Ordem quanto ao tema. De toda forma, é consenso entre a OAB, os educadores e demais estudiosos da matéria que se deve avançar na reforma do ensino jurídico. O que não se pode é deixar que o pior ensino se alastre enquanto o ensino de excelência tenha dificuldades de desenvolvimento. Assim, independentemente dos reais interesses que permeiam a educação jurídica, deve-se, de início, ampliar os estudos e a discussão, com vistas a permitir que o bom ensino seja estimulado e possa, talvez, provocar que instituições de ensino que sempre atuaram na educação em massa, possam redirecionar seus esforços para obter um ensino diferenciado.


3.UMA VISÃO PANORÂMICA DOS PRINCÍPIOS E NORMAS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO JURÍDICA

Desde a época do Império [28], quando da criação do primeiro curso de Direito, verifica-se uma inversão de valores no que tange à fundamentação existencial do curso de Direito. Bem dizer, mesmo Portugal não tinha uma consistente fundamentação, acometendo-se o Brasil da mesma impropriedade. Desta forma, como observa Falcão [29]: "nasce o ensino jurídico pátrio: guardião dos ideais liberais do Estado constitucional, mas objetivando fornecer quadros para o aparelho estatal – centralizador".

A República Velha manteve praticamente inerte a situação, inclusive aproveitando, como bem delimita Flávio Galdino [30], o "status da formação jurídica retórica e literária (não técnica), descompromissado com a realidade social e a transformação do país". A única inovação foi a abertura no sentido de se propiciar o ensino livre, autorizando-se a criação de várias escolas de Direito, propiciando descomunal aumento de matrículas e, conseqüentemente, de bacharéis. Nada foi acrescentado por ocasião da Era Vargas, quando simplesmente não se deu qualquer importância à educação jurídica.

O tema somente começou a ser debatido em decorrência da insistência de San Tiago Dantas numa reforma do ensino do Direito, que tomou força por ocasião da aula inaugural do ano de 1955, da Faculdade Nacional de Direito, no Rio de Janeiro, tomando como tema "A educação jurídica e a crise brasileira". Deve-se ressaltar, ainda, o foco de Dantas no sentido de que se vinculasse o ensino jurídico à realidade social e aos conflitos sociais. Esta foi a primeira situação onde se propôs uma abordagem substancial sobre a problemática do ensino com o oferecimento de soluções práticas.

No período militar houve uma insatisfação política da classe média urbana, motivo pelo qual o governo adotou uma política expansionista da educação, mas focalizando a expansão com cursos de ciências exatas. Porém, o que se viu foi uma proliferação de cursos da área de ciências humanas, dada a maior facilidade de criação. A crise agravou-se em razão dos irrisórios investimentos: houve potencialização dos lucros e inevitavelmente nasceu a mercantilização do ensino. O Direito reduzia-se à norma, sem referenciais sociais ou filosóficos.

3.2.Contemporaneidade

A Constituição Federal de 1988 [31] trouxe uma idéia principiológica mais concisa da educação, devendo-se ressaltar o artigo 205, o artigo 206, especialmente, neste último, o caput e os incisos III e VII, e o artigo 209, como segue:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

...

III – pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

...

VII – garantia de padrão de qualidade.

Art. 209 – O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I – cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II – autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

No mesmo contexto, fortalecida pelo processo de democratização, a Ordem dos Advogados do Brasil, embora outras fossem suas funções, passou a possuir uma responsabilidade direta sobre o ensino do Direito quando da promulgação da Lei n. 8.906, de 1994 [32], o Estatuto da Advocacia e da OAB, que apregoou em seu artigo 54 inciso XV:

Art. 54 – Compete ao Conselho Federal:

XV – colaborar com o aperfeiçoamento dos cursos jurídicos, e opinar, previamente, nos pedidos apresentados aos órgãos competentes para criação, reconhecimento ou credenciamento desses cursos.

Nasceu, então, a Comissão de Ensino Jurídico responsável por se manifestar de forma não vinculativa, mas exercendo pressão sobre o Ministério da Educação, quanto à criação de novos cursos de Direito.

Com a Lei n. 9.394, de 1996 – LDB [33] –, dois passos importantes foram dados, quais sejam, a exigência da monografia e a obrigatoriedade do estágio, antes facultativo. Ademais, indicava o artigo 46 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, "a autorização e o reconhecimento de cursos, bem como o credenciamento de instituições de educação superior, terão prazos limitados, sendo renovados, periodicamente, após processo regular de avaliação".

Em 2001, o Decreto n. 3.860, de 2001 [34], pelo caput de seu artigo 28, enfatizou a necessidade de se submeter ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, os pedidos de criação e reconhecimento de cursos jurídicos em instituições de ensino superior, estabelecendo, ainda, no parágrafo 1º daquele artigo, o prazo de cento e vinte dias para que tal manifestação fosse emitida.

A referida norma foi expressamente revogada pelo Decreto 5.773, de 2006 [35], contudo, suas diretrizes continuaram basicamente inertes. Em verdade, o Decreto 5.773, de 2006, também conhecido como "decreto ponte", readequou os procedimentos para a abertura de cursos superiores, além de reunir as diversas portarias que tratavam do assunto. Quanto a inovações substanciais, deve-se ressaltar: a indicação para que a Ordem dos Advogados do Brasil se manifeste também acerca da renovação de reconhecimento de cursos de Direito, ampliando a letra da Lei n. 8.906, de 1994 [36]; e a atribuição, à Secretaria de Educação Superior – SESu –, da competência para autorizar, reconhecer e renovar o reconhecimento desses cursos, cabendo, a partir de então, ao Conselho Nacional de Educação – CNE –, apenas o julgamento de recursos.

Há ainda que tratar de um tópico bastante específico, a regulamentação própria da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da OAB. A edição de suas normas ocorre por meio de instruções normativas, as quais seguem: Instrução Normativa n. 01, de 1997, que "dispõe sobre os pedidos de autorização de cursos jurídicos novos"; Instrução Normativa n. 02, de 1997, que "divulga os critérios adotados para análise dos pedidos de reconhecimento de cursos jurídicos"; Instrução Normativa n. 03, de 1997, que "divulga os critérios para análise dos estágios, nos pedidos de autorização"; e Instrução Normativa n. 05, de 2003, que "dispõe sobre a tramitação dos processos de autorização e reconhecimento de cursos jurídicos, e dá outras providências". A Instrução Normativa n. 04, de 1997, foi expressamente revogada pela imediatamente subseqüente, por tratarem, ambas, de procedimentos.

As instruções normativas da OAB estão em fase de aperfeiçoamento e readequação de valores, pois a publicação do decreto ponte obrigou a revisão dos procedimentos e critérios, uma vez que diversas portarias, citadas ou consideradas no texto das normas, estariam, agora, revogadas.


Em razão da já explanada situação de desconforto envolvendo o Ministério da Educação e a Ordem dos Advogados do Brasil, Tarso Genro, então Ministro, instituiu o Grupo de Trabalho MEC - OAB, com a seguinte composição: Alayde Avelar Freire Sant’Anna, Mário Portugal Pederneiras e Roberto Fragale Filho, pelo Ministério da Educação; José Geraldo de Sousa Junior, Paulo Roberto de Gouvêa Medina e Raimundo Cezar Britto Aragão, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; André Macedo de Oliveira, pelo Ministério da Justiça; e Roberto Cláudio Frota Bezerra pelo Conselho Nacional de Educação. Participaram, ainda, dos trabalhos: Orlando Pilati (MEC), Walter José de Souza Neto (CF-OAB) e Renato De Vitto (MJ).

O grupo sistematizou as discussões e seus frutos em um relatório, nos termos da portaria de designação, apresentando, por conclusão, uma síntese orientadora, de forma a representar a dialética concebida durante os meses de trabalho [37]:

... a síntese orientadora exigida pela Portaria de constituição não poderia ser efetuada sob a estreita perspectiva dos critérios aplicáveis aos processos de autorização de abertura de novos cursos jurídicos. Na verdade, percebeu-se que os debates desenhavam pistas em três direções específicas: a construção de uma política pública para o ensino do Direito, a revisão dos procedimentos burocráticos aplicáveis aos processos de autorização e os próprios critérios em si.

Como visto, a síntese orientadora ficou dividida em três pontos principais: política pública, procedimentos burocráticos e critérios. A organização de elementos visou subsidiar ações do Ministro da Educação, com vistas a levar à sociedade, e em especial à comunidade acadêmica, novas perspectivas para um ensino de excelência, retornando às instituições de ensino a merecida confiança histórica. Ver-se-á, adiante, o posicionamento do grupo, regado por uma visão crítica, enfocando a confiabilidade e viabilidade do que se propõe no seu Relatório Final.

4.2.Política pública

Ao tratar da política pública para a área do Direito, o grupo prevê uma ampla discussão nacional sobre o ensino, focando suas bases [38]:

É preciso construir um sentido para o ensino jurídico: o que se deseja com sua transmissão? Quais são os pressupostos pedagógicos que o norteiam? É preciso enfrentar essas questões, pensando a política pública, as diretrizes que irão guiar o ensino jurídico nos próximos anos. Para tanto, sugere-se a realização, no segundo semestre de 2005, de Seminários Regionais e um Seminário Nacional sobre Educação Jurídica para elaborar, coletiva e publicamente, uma política pública que consiga expressar, setorialmente, as estratégias de expansão com qualidade e com inclusão social.

O pensamento do GT MEC-OAB sobre o ensino jurídico é no sentido de que devemos ainda refletir o ensino jurídico repensando a atualidade e trabalhando para a construção do futuro. E a linha de pensamento do grupo faz com que se remeta a Boaventura de Sousa Santos [39]:

... na última década se começaram a alterar significativamente as relações entre conhecimento e sociedade e as alterações prometem ser profundas ao ponto de transformarem as concepções que temos de conhecimento e de sociedade. Como disse, a comercialização do conhecimento científico é o lado mais visível dessas alterações. Penso, no entanto, que, apesar da sua vastidão, elas são a ponta do iceberg e que as transformações em curso são de sentido contraditório e as implicações são múltiplas, inclusive de natureza epistemológica.

...ao longo da última década, se deram alterações que desestabilizaram este modelo de conhecimento e apontaram para a emergência de um outro modelo. Designo esta transição por passagem do conhecimento universitário para o conhecimento pluriversitário.

Boaventura indica as transformações sociais e, por decorrência, jurídicas, dos últimos dez anos, afirmando, inclusive, que esta é apenas a "ponta do iceberg". E as observações do GT MEC-OAB comprovam a previsão de Boaventura, pois o Grupo de Trabalho absorveu justamente esse entendimento, ao afirmar que é preciso avançar ainda mais, com a expectativa de que se possa justamente "triturar todo esse gelo". Cabe ressaltar, porém, que o aprofundamento proposto pelo MEC-OAB não foi realizado, pois em nenhum momento, após a entrega do material, abriu-se discussão decorrente do Relatório Final. Sabe-se que diversos grupos de professores discutiram o tema, com reuniões e seminários realizados, mas uma política firme no sentido de se repensar a reforma com participação ativa de instituições particulares, organizações civis e governo, cuja necessidade, aliás, é consenso entre os educadores, nunca foi efetivada. Mesmo com sérios riscos de estar insistindo na inocuidade é preciso ressaltar a importância do envolvimento público nas políticas educacionais com vistas a viabilizar a melhoria da educação ministrada no Brasil.

4.3.Critérios para criação de cursos de Direito

4.3.1.Contexto Institucional e Necessidade Social

Em princípio, é imprescindível que o leitor tenha uma noção básica do termo "necessidade social", pois, diante deste, concentra a maioria das controvérsias entre a OAB e o MEC. Esclarecimento: a Ordem, na análise dos pedidos de autorização de cursos de Direito, utiliza-se do critério denominado "necessidade social", estampado em sua Instrução Normativa n. 01, de 1997, mais especificamente no artigo 1.o; o Ministério aboliu o uso de tal critério a partir do Parecer CES/CNE n. 293, de 1998 [40], entendendo que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, promulgada em 1996, não mais comportaria tal condição. Assim, a OAB fundamentava-se, na elaboração de seus pareceres, no referido critério, enquanto o MEC o ignorava, em razão de já ter abolido tal de seus regramentos.

Ocorre que, na verdade, nunca havia tido uma interlocução mais aprofundada sobre o tema, entre as duas instituições, com vistas a permitir, por meio da dialética, a propiciação de consensial saída para a problemática. Uma oportunidade para que o tema fosse tratado era imprescindível, sobretudo porque o cerne da discussão envolvia um grande mal entendido, qual seja o de se confundir "necessidade social" com "demanda social".

A priori, entendia o MEC ser a necessidade social uma mera balizadora de demanda social. Daí não fazer sentido, de fato, continuar com o critério a partir de 1996, simplesmente para atender uma suposta reserva de mercado dos advogados. Porém, a Ordem nunca tratou o critério como sendo um fator meramente geográfico e populacional. Pelo contrário. Necessidade social, para a OAB, sempre englobou quantidade e qualidade num só corpo. O termo é sustentado com vistas a estudar a estrutura da região que subsidiaria o sustento de um curso de Direito, analisando disponibilidade e qualidade do corpo docente, órgãos que poderiam absorver estagiários, livrarias e bibliotecas existentes, infra-estrutura destinada ao curso, qualidade da organização didático-pedagógica, dentre outros elementos.

Assim, a necessidade social vinha para assegurar que a sociedade local tivesse a disponibilidade de um curso que realmente atendesse a seus anseios, longe, portanto, de se confundir com a idéia de demanda social.

Durante os primeiros contatos do GT MEC - OAB, os representantes do MEC e do CNE rechaçavam a idéia da absorção do critério da necessidade social como elemento obrigatório do relatório final, pois eles ainda tinham uma visão superficial do propósito da Ordem em mantê-lo.

Pois bem, após intermináveis discussões, o grupo pôde se posicionar em um meio termo, onde a necessidade social tornava-se, então, ponto essencial na análise dos cursos, observando-se todos aqueles pontos qualitativos que empregava a Ordem a seu conceito. Contudo, ressalvou-se que não se poderia vincular o critério à idéia quantitativa, em relação a distâncias ou a volume populacional, devendo o seu valor estar firmado essencialmente na qualidade.

Perfeita ficou a delimitação dada pelo grupo, pois se manteve a imprescindibilidade da qualidade, permitindo-se a autorização de todos os cursos com boa qualidade, para qualquer região do país, e fazendo com que, dessa forma, os vindouros atuem pela lei de mercado, massacrando os cursos de má qualidade já existentes.

4.3.2.Organização didático-pedagógica

Inicialmente deve-se expor, sobre este tópico, disposição das diretrizes curriculares nacionais para o curso de Direito, expressa no artigo 2.o da Resolução n. 09, de 2004 [41], da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação:

Art. 2º A organização do Curso de Graduação em Direito, observadas as Diretrizes Curriculares Nacionais se expressa através do seu projeto pedagógico, abrangendo o perfil do formando, as competências e habilidades, os conteúdos curriculares, o estágio curricular supervisionado, as atividades complementares, o sistema de avaliação, o trabalho de curso como componente curricular obrigatório do curso, o regime acadêmico de oferta, a duração do curso, sem prejuízo de outros aspectos que tornem consistente o referido projeto pedagógico.

§ 1° O Projeto Pedagógico do curso, além da clara concepção do curso de Direito, com suas peculiaridades, seu currículo pleno e sua operacionalização, abrangerá, sem prejuízo de outros, os seguintes elementos estruturais:

I - concepção e objetivos gerais do curso, contextualizados em relação às suas inserções institucional, política, geográfica e social;

II - condições objetivas de oferta e a vocação do curso;

III - cargas horárias das atividades didáticas e da integralização do curso;

IV - formas de realização da interdisciplinaridade;

V - modos de integração entre teoria e prática;

VI - formas de avaliação do ensino e da aprendizagem;

VII - modos da integração entre graduação e pós-graduação, quando houver;

VIII - incentivo à pesquisa e à extensão, como necessário prolongamento da atividade de ensino e como instrumento para a iniciação científica;

IX - concepção e composição das atividades de estágio curricular supervisionado, suas diferentes formas e condições de realização, bem como a forma de implantação e a estrutura do Núcleo de Prática Jurídica;

X -concepção e composição das atividades complementares; e,

XI - inclusão obrigatória do Trabalho de Curso.

Como visto, há a necessidade de se trabalhar seguindo certos parâmetros predeterminados pelos órgãos competentes, quais sejam, no caso, o Conselho Nacional de Educação e o Ministério da Educação.

Além do pleno atendimento dos critérios estabelecidos, é válido ressaltar a necessidade de reinclusão da propedêutica jurídica, normalmente tratada como "Introdução ao Estudo do Direito – IED", excluída das atuais diretrizes curriculares nacionais para o curso de graduação em Direito.

Sobre o assunto, Paulo Roberto de Gouvêa Medina esclarece [42] que, com a Reforma Francisco Campos, surgiu a "matéria Introdução à Ciência do Direito, colocada no primeiro ano como indispensável propedêutica do ensino dos diversos ramos do direito". E complementa:

Ao mesmo tempo em que se transferia a Filosofia do Direito para o curso de doutorado, criava-se a cadeira de Introdução, que, além de fornecer uma visão panorâmica do direito, daria ao estudante noções básicas sobre as idéias jurídicas, examinando as concepções filosóficas a seu respeito. Posteriormente, com a Resolução CFE n. 3/1972, a matéria passou a denominar-se Introdução ao Estudo do Direito.

A vigente Resolução n. 9, de 29 de setembro de 2004, aprovada pelo Conselho Nacional de Educação, pela primeira vez, desde a sua instituição, não alude a essa matéria fundamental – a única, dentre as que compunham o currículo do curso de direito, que não permitia, no antigo regime didático, pudesse o estudante prosseguir no curso sem nela haver sido aprovado, uma vez que não comportava a chamada dependência.

Também por isso, o Relatório Final do Grupo de Trabalho MEC-OAB explicitou, ao tratar da estrutura curricular [42]:

O eixo fundamental tem por objetivo integrar o estudante no campo do Direito, sob a perspectiva de seu objeto, apontando ainda para as relações do Direito com outras áreas do saber, pertinentes à compreensão de seu método e finalidades. Assim, além de explorar diferentes áreas do saber e suas conexões com o campo jurídico, ele deve apresentar a oferta de conteúdos relacionados com a Propedêutica Jurídica, de forma a permitir, de uma banda, uma melhor delimitação do próprio objeto de estudos e, de outra banda, uma mais adequada percepção das diferentes conexões estabelecidas com as outras áreas. Em suma, ele deve apresentar, ao menos, os conteúdos abaixo destacados, podendo ainda incorporar outras que julgar pertinentes ao seu projeto pedagógico.

Como apresentado, há problemas estruturais quanto às diretrizes curriculares do curso jurídico e tais envolvem justamente as já explanadas divergências concernentes aos novos anseios da sociedade e os princípios básicos que norteiam o Direito.

4.3.3.Corpo docente

Em se tratando de corpo docente, há que se ressaltar duas características essenciais ao bom funcionamento de um curso: nível adequado de titulação e o compromisso do docente com a instituição. E o que se propõe a discorrer neste ponto é justamente a forma com a qual se podem efetivar tais características.

Considerando a primeira característica – titulação –, deve-se observar a necessidade de haver um corpo docente qualificado, contendo não somente especialistas, mas professores dotados de pós-graduação stricto sensu – mestrado e doutorado. Embora seja sabido que o país não dispõe da quantidade de mestres e doutores quanto o necessário para o bom desempenho de todas as instituições existentes, ressalta-se a essencialidade de se ter um corpo docente de boa qualidade, adequado às necessidades regionais, primando, nesse viés, por um mínimo de professores titulados.

Já em referência ao compromisso do docente com a instituição, deve-se enfocar o fator "regime de contratação". Há a necessidade de uma maior interação e um vínculo mais estreito do docente com a IES, de forma que aqueles façam da instituição um segundo lar. Daí decorre a imprescindibilidade de se ter, nos quadros, grande quantidade de professores contratados em tempo integral ou parcial, fazendo do regime horista uma excepcionalidade.

Os dois quesitos enfocados acima são pressupostos de um curso que tem por primazia a qualidade do ensino, contudo, não se pode esquecer de outros pontos, não menos importantes, mas que viabilizam a efetivação da qualidade sugerida nas características já citadas. Desses elementos importantes, ressaltam-se: o núcleo docente do curso, experiência profissional e gestão acadêmica.

O Núcleo docente de curso seria um grupo dotado de unidade e perenidade, emprestando "ao projeto pedagógico a desejada e pretendida verossimilhança para sua efetiva implantação". [43]

A Experiência profissional resume-se à importância da experiência prática no contexto do ensino – ao menos a metade do corpo docente deve ter, no mínimo, quatro anos de experiência, considerando, contudo, para nível de excelência, que a metade dos professores tenha doze anos de experiência.

A Gestão acadêmica envolve as atividades de direção e coordenação do curso, numa interação com os professores, e deve ser democrática e transparente. Menciona-se, ainda, no relatório final do GT MEC-OAB, que a gestão democrática "deve permitir a construção de novas práticas participativas de administração, assentadas em cima de uma lógica de respeito e tolerância e, sobretudo, incentivadora de ações cidadãs e da formação do conhecimento" [44]; e que uma gestão transparente deve possuir [45]:

...mecanismos de accountability, os quais são absolutamente necessários para a produção de uma dialética administrativa que, combinando os múltiplos esforços da comunidade, torne possível a conjugação dos vetores de crítica, transformação e conservação.

Assim, em moldes semelhantes aos de direção oriundos dos princípios básicos da administração de empresas, a gestão acadêmica satisfatória prega uma boa convivência entre a direção do curso e seus corpos discente e docente, permitindo uma adequada interação entre eles.

4.3.4.Instalações gerais

É indispensável que se ofereça, para o pleno funcionamento de um curso de Direito, uma infra-estrutura satisfatória, englobando, além do espaço destinado às salas de aula, o departamento dos docentes, a biblioteca e espaço condizente com as necessidades especiais inerentes à prática jurídica.

Nas salas de aula, devem-se valorizar, sobretudo, as condições físicas no que tange à ventilação, iluminação, acústica e mobiliários, cuja adaptação deve ser coerente com a dimensão do corpo discente. Em se tratando do espaço docente, há a necessidade de tornar o espaço adequado e agasalhador fazendo com que o professor se instale na instituição, transformando-a num campo de desenvolvimento acadêmico diário.

A biblioteca, segundo a legislação vigente (Portaria MEC n. 1.886, de 1994 [46]), deve ter no mínimo dez mil volumes para cada grupo de um mil alunos, devendo ser comprovada a compra de pelo menos trinta por cento do acervo no processo de autorização do curso. Não obstante, o Grupo de Trabalho entendeu não ser o caso de delimitar quantitativamente o acervo ou mesmo o espaço concernente à biblioteca. Fez, contudo, recomendações, indicando formas de planejamento e instalação. Nesse sentido, propôs o GT MEC-OAB que se disponibilizasse ao discente e ao docente uma bibliografia adequada e condizente com a proposta do projeto pedagógico, tanto qualitativamente quanto quantitativamente. Atualização do acervo é outro quesito essencial, discutido pelo grupo e estampado no relatório. Nessa linha, ainda se fez referência à necessidade de haver não somente obras como manuais e comentários legislativos, mas obras clássicas e monográficas, a fim de disponibilizar aos usuários uma diversificada variedade de conteúdo.

Especificamente ao curso de Direito, é essencial o espaço destinado à prática jurídica. Seria infundado, contudo, disponibilizar simplesmente um local, sem se ater às necessidades especiais para tanto. Por isso, deve-se ter um local com salas devidamente preparadas para a prática simulada ou real, com todo o aparato necessário, tanto em relação a móveis quanto material de informática e de expediente.

4.3.5.Resultados das avaliações oficiais

Entende-se por avaliações oficiais aquelas que o Ministério da Educação realiza para aferir se o curso tem conseguido transferir ao alunado um ensino satisfatório, denotando qualidade e viabilidade do curso. São elas: o Exame Nacional de Desempenho [47], antigo Exame Nacional de Cursos [48] ou, como comumente é chamado, Provão, e a Avaliação das Condições de Ensino, efetivado por meio do Relatório de Verificação in loco [49].

O Exame Nacional de Desempenho é realizado pelos alunos, ao final do primeiro e do último ano do curso superior, de forma a analisar, por meio da aplicação de uma prova, o desempenho dos discentes e, consequentemente, a qualidade do ensino proporcionado.

A Avaliação das Condições de Ensino é realizada por ocasião da autorização de um curso superior, quando, em regra, dois avaliadores designados pelo Ministério da Educação realizam visita à instituição a fim de preencher o Relatório de Verificação in loco, que é um formulário onde constam diversos quesitos cuja aferição é necessária para subsidiar manifestações por parte de entidades externas e setores do próprio MEC, subseqüentes no processo.

Faz-se referência, ainda, no documento final do Grupo de Trabalho, a dois instrumentos de avaliação, o Exame de Ordem e o OAB Recomenda, contudo, não são considerados oficiais, embora tenham reconhecida importância e influência.

O Exame de Ordem, previsto no artigo 58 inciso VI da Lei nº 8.906, de 1994 [50], e regulamentado pelo Provimento nº 109, de 2005 [51], é realizado três vezes por ano, objetivando a aferição de qualidade para que o bacharel em Direito possa pertencer aos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, tornando-se apto, portanto, a exercer a advocacia.

O OAB Recomenda é um programa realizado trienalmente, englobando, até o momento, três edições. Trata-se de uma avaliação com critérios previamente definidos, para que a OAB conceda às melhores instituições um selo de qualidade. Cabe ressaltar que não houve uma continuidade de critérios na elaboração dos trabalhos, e, como um dos pilares de avaliação – o Provão – foi extinto, é implícito que a não continuidade perdurará quando da definição de critérios para a próxima edição. Nas três versões foram utilizados dados do Exame de Ordem e do Exame Nacional de Cursos, apresentando os cursos de Direito que melhor desempenharam seu papel num período de cinco anos no primeiro OAB Recomenda e quatro nas demais versões.

4.4.Procedimentos

No que se refere aos caminhos burocráticos para autorização de novos cursos de Direito, é proposta uma alteração do sistema hoje implantado, e uma adição, a título de alternativa ao procedimento ordinário já existente, caracterizando-se como uma espécie de procedimento sumário.

Hoje, para a abertura de um curso de Direito, em resumo, temos os seguintes procedimentos: 1. protocolo do pedido de autorização no Sistema SAPIEnS, com o devido encaminhamento de material ao MEC; 2. visita da Comissão de Verificação designada pelo Ministério da Educação; 3. manifestação da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; 4. análise de mérito pela Secretaria de Educação Superior – SESu/MEC; 5. publicação de portaria de autorização pela própria SESu; 6. eventual recurso é analisado pelo Conselho Nacional de Educação.

Por ser bastante recente a edição do Decreto n. 5.773, de 2006 [52], é importante citar o antigo procedimento para conclusão do processo: 1. protocolo do pedido de autorização no Sistema SAPIEnS, com o devido encaminhamento de material ao MEC (idem); 2. visita da Comissão de Verificação designada pelo Ministério da Educação (idem); 3. manifestação da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (idem); 4. análise de mérito pela Secretaria de Educação Superior – SESu/MEC (idem); 5. deliberação da Câmara de Educação Superior do CNE; 6. apreciação pelo Ministro com vistas à homologação.

A alteração de procedimento realizada pelo decreto ponte não deixou ultrapassada a indicação do Grupo de Trabalho MEC – OAB, pois alterar-se-ia o referido processo, caso implementadas as propostas, conforme o seguinte: 1. Protocolo do pedido de autorização no SAPIEnS; 2. Visita da Comissão de Verificação designada pelo MEC; 3. Manifestação da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da OAB; 4. Manifestação do Comitê Assessor de Grande Área (que inclua a sub-área do Direito) da Secretaria de Educação Superior; 5. Deliberação do Comitê Técnico de Coordenação; 6. Apreciação de eventual recurso pela Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação; 7. Apreciação pelo Ministro da Educação com vistas à homologação.

A alternativa ao procedimento supramencionado seria a autorização por edital, conforme indicou o GT MEC-OAB [53]:

... procedimento sumário, fruto de uma política induzida, para implementação em áreas geográficas (e até mesmo) cursos previamente identificados, mediante a publicação de editais de chamada, com critérios diferenciados.

Essa forma de criação de curso deveria ter forma análoga à licitação, de maneira que o Ministério da Educação apontaria as regiões que necessitam da composição de um curso de Direito, publicando em edital. Assim, abrir-se-ia concorrência para a instalação do curso e o oferecimento de vagas, mediante benefícios concedidos pelo MEC, dentre os quais uma tramitação mais célere do processo.


5. PERSPECTIVAS PARA O ENSINO JURÍDICO NUM FUTURO PRÓXIMO

As perspectivas para o ensino superior devem ser debatidas com cautela. Como anteriormente citado, as universidades, historicamente fortes, entraram em colapso institucional em decorrência das mutações sociais no decorrer dos séculos, ou seja, num leniente processo. Hodiernamente, a sociedade, vinculada a fatores capitalistas, não suporta mais a abrangência da formação e da atuação universitária medieval, ocorrendo o desgaste do sentido da educação. Com isso, remetendo-se à "parametrização da crise", feita no primeiro capítulo deste trabalho, restam duas direções para os cursos de Direito: o caminho da mercantilização e o caminho da evolução no sentido de um ensino de excelência.

A primeira direção é a trilhada pela grande maioria dos cursos, em virtude de uma matemática simples de custo e lucro. O que se tenta fazer com o Direito é reduzi-lo a uma matéria técnica, o que é impossível, a não ser que se limite a atuação e o conhecimento da matéria. E o pior disso tudo é que a sociedade em geral permite e apóia essa mutilação. Tudo isso decorre do desprestígio por que passam as profissões tradicionais, especialmente no Direito. O Direito segue, gradativamente, mais desmoralizado, o que ocorre em razão de graves e freqüentes denúncias contra carreiras específicas de seus bacharéis, como magistrados e advogados envolvidos com o crime organizado. É a crise ética entranhada nas estruturas da sociedade e muito facilmente desenvolvida por profissionais que utilizam o conhecimento para a iniqüidade.

A título ilustrativo, no sentido de comprovar o excessivo aumento de profissionais desonrados, cita-se matéria veiculada pela Assessoria de Imprensa do Conselho Federal da Ordem dos Advogado do Brasil [54]:

A Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) julgou no triênio 2004/2006, gestão do presidente nacional da OAB, Roberto Busato, um total de 1.461 processos envolvendo faltas éticas e disciplinares cometidas por advogados em todo o Brasil. O número é quase o dobro do total de processos apreciados na gestão anterior (2001-2003), quando 843 processos disciplinares foram julgados. Dos 1.461 processos julgados, houve 1.227 condenações no triênio.

Entre os 1.461 processos julgados em âmbito nacional, 1.037 – o equivalente a 71% do total – estavam relacionados a violações aos incisos XX e XXI do artigo 34 da lei federal nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB). São casos de advogados que teriam se locupletado à custa de clientes ou se recusado a prestar contas às partes sobre quantias recebidas em demandas judiciais. Dos processos examinados pela OAB Nacional por essa razão, 85% dos advogados (881) foram condenados.

A segunda principal razão de processos disciplinares apreciados pela OAB nacional nesses três anos – um total de 131 processos – foram violações ao inciso XXIII do artigo 34 da Lei nº 8.906/94. Esse dispositivo versa sobre o não pagamento de contribuições, multas e preços de serviços devidos à OAB, depois de terem sido notificados a fazê-lo. Oitenta e sete por cento dos profissionais (ou um total de 114) que foram alvo de processo por esse motivo foram condenados.

A terceira maior razão das demandas que chegaram a ser analisadas pela OAB nacional nesta gestão foram violações ao inciso XXV do artigo 34 do Estatuto, referente a condutas incompatíveis com a advocacia. Cento e dezessete do total de 1.461 processos examinados pela Segunda Câmara no triênio estiveram relacionados com conduta irregular e entre os advogados processados por este motivo, 83% (ou 97 em números absolutos) foram condenados.

Como visto, há um claro aumento no número de reclamações quanto a advogados, o que demonstra que estamos vivendo em momento de crise ética e crise educacional, pois a ética, embora decorrente da moral e desenvolvida com o crescimento e amadurecimento do ser humano, é importantíssima para que estes valores sejam identificados e adequados à realidade do exercício profissional. Quando se fala em crise educacional, devemos nos remeter novamente à generalização dos cursos de má qualidade, que formam profissionais despreparados, permitindo que tenhamos maus profissionais praticando ofícios do Direito.

Num outro viés, é sabido que um grupo seleto, com princípios fundados no real sentido da educação, insiste em se reciclar para poder acompanhar as exigências da modernidade. Embora seja um conjunto bastante modesto no quesito quantidade, há que se ressaltar a importância de sua existência, e identificar essa "luz no fim do túnel" com a proposta de Boaventura Sousa Santos, segundo o qual, deve-se "enfrentar o novo com o novo" [55]:

As transformações da última década foram muito profundas e, apesar de terem sido dominadas pela mercadorização da educação superior, não se reduziram a isso. Envolveram transformações nos processos de conhecimento e na contextualização social do conhecimento. Em face disso, não se pode enfrentar o novo contrapondo-lhe o que existiu antes. Em primeiro lugar, porque as mudanças são irreversíveis. Em segundo lugar, porque o que existiu antes não foi uma idade de ouro ou, se o foi, foi-o para a universidade sem o ter sido para o resto da sociedade, e, no seio da própria universidade, foi-o para alguns e não para outros.

A resistência tem de envolver a promoção de alternativas de pesquisa, de formação, de extensão e de organização que apontem para a democratização do bem público universitário, ou seja, para o contributo específico da universidade na definição e solução colectivas dos problemas sociais, nacionais e globais.

Dessa forma, é preciso repensar o ensino jurídico, evocando as antigas bases da educação, mas sem impô-las, adequando o saber jurídico tradicional às perspectivas da nova sociedade. É necessária e urgente uma reforma ampla, mas que não vise simplesmente procedimentos burocráticos, como ultimamente se tem feito.

Sem uma abrangente e contínua discussão sobre o assunto, certamente tornar-se-á estável o grave estágio em que se encontra a situação geral do ensino do Direito. Segundo Inês da Fonseca Pôrto [56], o produto do "diálogo permanente são os instrumentos da reforma – ou os parâmetros de qualidade –, cuja pretensão é encontrar, nas contradições da realidade do ensino jurídico, as condições para a superação da crise". E é nesse sentido que se destaca a importância do Grupo de Trabalho MEC-OAB, pois foi, notadamente, uma expressão de diálogo entre instituições de singular importância para o aperfeiçoamento do ensino. O Relatório Final do GT é um instrumento rico em informações e posicionamentos que podem contribuir com o meio acadêmico no sentido de gerar uma dialética em prol do ensino jurídico.

Embora seja quase impossível reverter a situação para a qual caminhou a educação no Brasil, não se pode descansar na busca da qualidade e menos ainda ignorar aqueles que primam por essa educação, até porque nem mesmo as instituições medíocres ignoram o fato de estarem fora do seleto grupo de melhores instituições de ensino do Brasil. Exemplo claro disto é a repercussão que causa programas como o OAB Recomenda, os seminários desenvolvidos pela Comissão de Ensino Jurídico da OAB, os seminários promovidos pela Associação Brasileira de Ensino do Direito – ABEDi –, dentre outros.

A propósito das citações de programas e eventos acima, cabe tecer algumas considerações com vistas a salientar a boa contribuição que tais eventos disponibilizam. Os seminários de ensino jurídico patrocinados pela OAB Nacional reúnem, normalmente a cada dois anos, dirigentes de faculdades de Direito de todo país, cabendo destaque ao painel "experiências exemplares", onde as próprias instituições inscritas trazem suas experiências para diálogo com os demais participantes, com vistas a proporcionar que se agregue valor, por novas idéias, aos cursos em funcionamento e, eventualmente, àqueles que ainda encontram-se esboçados na cabeça dos docentes. O OAB Recomenda é bastante questionado porque não permite diálogo com as instituições, porém, é um importante identificador de faculdades que lecionam cursos com excelência. O programa identifica os cursos de Direito com melhor desempenho no país, observando-se, sobretudo, o "exame de ordem" e a avaliação de desempenho do MEC (antigo ENC ou Provão e atual ENADE). O destaque da OAB a estes cursos é ansiosamente esperado a cada três anos, pois, além do mérito no meio acadêmico e perante a sociedade, há, por certo, retornos financeiros. A ABEDi também promove seus seminários, reunindo seus associados para proporcionar uma dialética sobre assuntos pré-determinados, com vistas a aperfeiçoar o ensino entre os interessados. Como visto, há diversos meios para comunicação entre os cursos de Direito de todo o país, estando ao alcance de quem realmente queira desenvolver e praticar uma educação jurídica de qualidade.

Por fim, embora haja, à disposição do meio acadêmico, diversos meios para aperfeiçoamento de cursos, pode-se verificar que é complicado, pelo panorama atual, acreditar em boas perspectivas, porém, mesmo que tenhamos poucas instituições interessadas em formar bacharéis virtuosos, são justamente estes que poderão, com efetividade, contribuir para uma sociedade mais digna e justa. Do contrário, estimular-se-á a "bacharelice", de forma a perpetuar a frase de Paulo Roberto de Gouvêa Medina [57]: "Os cursos jurídicos no Brasil floresceram sob a égide do bacharelismo. E proliferam, hoje, sob o signo da bacharelice".


CONCLUSÃO

Com vistas a poder contribuir para uma cultura de reforma permanente do da educação, o presente trabalho procurou expor a sua evolução, voltando-se, contudo, para o ensino jurídico. Pretendeu-se demonstrar, no decorrer deste estudo, que, num contexto geral, ou seja, numa visão panorâmica, a educação e, por conseqüência, o ensino jurídico, estão em crise. Há que se ressaltar, porém, que esta crise é verificada apenas num âmbito macro, pois, analisando-se minuciosamente cada uma das instituições, considerando seu progresso acadêmico no decorrer dos anos e, ainda, os frutos desse processo, deve-se admitir que houve significativa melhora. O motivo da crise é, então, o fato de que esse bom desenvolvimento se dá em um grupo muito distinto e em quantidade relativamente singela.

Na visão macro, conforme denominação acima, pode-se dizer que o ensino jurídico enfrenta uma série de problemas que tomaram proporção em decorrência não só de sua história conturbada e sem critérios concisos, mas também de uma decadência geral da educação. Embora houvesse muito trabalho e estudo por parte dos pensadores do ensino, no decorrer dos anos não foram verificadas ações governamentais efetivas em prol da sua qualidade, o que fez com que a educação mergulhasse no descaso mercantilista. Especificamente quanto ao Direito, as últimas medidas realizadas no sentido de se barrar o expansionismo desenfreado de cursos de qualidade duvidosa foram verificadas por ocasião da gestão do Ministro Tarso Genro, que atendendo a reiterados pedidos da OAB para que o MEC preocupasse mais com o ensino jurídico (em tese, em razão dos desastrosos resultados dos exames de ordem e das manifestações da Comissão de Ensino Jurídico), agiu de forma a controlar de perto a abertura de novos cursos.

Embora a atitude do Ministro Tarso Genro tenha sido louvável e corajosa, por ir contra os reais interesses financeiros e políticos do governo, refrear a abertura de novos cursos de Direito não resolve o problema do ensino jurídico. Sofrear a autorização de novos cursos não passa de uma medida de contenção. Esta medida é, na realidade, anódina, pois em nada se contribuiu com a melhora da qualidade. Em momento algum, aliás, falou-se em detalhes sobre qualidade a não ser no Grupo de Trabalho, que elaborou o relatório do qual tratamos em capítulo específico, onde os apontamentos foram discorridos e discutidos, fazendo-se uma análise voltada para a interpretação das colocações do grupo. É importante lembrar, contudo, que os pensamentos constantes do Relatório Final não foram efetivados. Assim, uma das poucas medidas que poderia gerar uma discussão com o meio acadêmico em prol de uma melhora efetiva da educação jurídica foi esquecida no tempo. É ignóbil acreditar que a simples proibição de abertura de novos cursos contribua para a melhora do contexto geral. Na realidade, é preciso repensar a reforma, discutir a qualidade dos cursos existentes e criar caminhos para a melhora de cada um desses, criando, inclusive, a possibilidade de que novos cursos sejam autorizados já com a idéia de qualidade e excelência.

Embora se reconheça que algumas propostas tratadas no relatório final do GT MEC-OAB foram absorvidas pelo Ministério da Educação em suas novas normas, como a incorporação do critério da necessidade social [58] e a readequação dos procedimentos para abertura de cursos [59], nada mais de substancial foi feito. Aliás, o que ocorre é um sistema de trocas, pois, em contrapartida às duas medidas benéficas, tem-se a insistência, por exemplo: em permitir que as instituições de ensino superior reduzam o tempo de conclusão do curso de Direito; na não obrigatoriedade da monografia, mas simplesmente na entrega de trabalho de conclusão de curso, sem apresentação em banca; e na não obrigatoriedade da aplicação da disciplina "Introdução ao Estudo do Direito", de indiscutível importância na iniciação acadêmica do curso.

O diagnóstico do problema que se tornou o ensino jurídico no Brasil é sabido por todos (sociedade civil, instituições e governo). Ressalta-se, por isso, que a inércia em que permeia a maioria dos responsáveis pela educação é criminosa. Não se pode continuar com venda nos olhos enquanto a situação de descaso e desqualificação impera nos corredores das faculdades. É preciso haver uma urgente reforma do ensino superior, especialmente quanto ao Direito, com vistas não a refrear a abertura de cursos, mas a exigir qualidade e ética. Para tanto, salienta-se a necessidade de que se discuta, permanentemente, sobre os futuros da educação jurídica, num contexto em que se alteraria, também, todo o sistema educacional, com vistas a viabilizar que o bacharel em Direito retorne auspiciosamente à sociedade os conhecimentos adquiridos nos anos em que freqüentou o curso.

E esta reforma somente se faz com dialética produzida por meio de discussões entre representantes do meio acadêmico, associações voltadas para o tema, instituições e governo, sendo que este último deve vir imbuído de vontade política. É preciso mudar para melhor, demonstrando que um ensino de excelência deve ser orgulho da instituição. Claro que o retorno financeiro é importantíssimo para os empresários do setor e a idéia de que cursos em massa representam menos saída de capital e mais lucro ainda é muito presente. Ocorre, porém, que a atualidade demonstra que talvez essa não seja a melhor saída, pois se vê que as instituições que formam em massa estão com sérias dificuldades em completar novas turmas, tendo que apelar para "vantagens" como a abolição da obrigatoriedade da monografia de final de curso, facilidades para averiguação de presença nas aulas, vestibulares alternativos e até mesmo para seleções camufladas, onde o número de candidatos é muito inferior à quantidade de vagas, de forma que todos que pretendem ingressar nessas faculdades têm certeza de sua aceitação.

Ao mesmo tempo, instituições renomadas, públicas ou não, demonstram que os altos investimentos dispensados com a melhoria da educação são revertidos na credibilidade dos alunos e da sociedade, o que se pode comprovar por meio de fatos como a manutenção dos vestibulares (que, aliás, são concorridos), a manutenção de elementos didáticos importantes como a monografia final de curso com defesa perante banca (o que, em tese, afugentaria ingressantes) e até mesmo com resultados satisfatórios no exame de ordem e na avaliação oficial do Ministério da Educação, antigo Exame Nacional de Cursos – ENC –, ou Provão, e, hoje, Exame Nacional de Desempenho – ENADE. Além desses elementos, vê-se que estas instituições são costumeiramente premiadas pela excelência de ensino e, em razão da qualidade ser uma essência entranhada nos fundamentos desses cursos, tais destaques são repetitivos. Exemplo disso é o OAB Recomenda, que analisa resultados do Provão e do exame de ordem para indicar as instituições que lecionam um curso de Direito merecedor de realce, pela sua excelência no ensino. Na sua última edição (terceira), oitenta e sete cursos foram recomendados, cabendo ressaltar que, dos sessenta recomendados na segunda edição, cinqüenta e dois foram novamente gratificados. Frisa-se, ainda, que dos cinqüenta e dois cursos premiados na primeira edição, em 2001, quarenta e sete permaneceram na segunda edição e quarenta e cinco participam ainda pela terceira vez.

Nesse contexto, recorre-se novamente aos apontamentos de Paulo Roberto de Gouvêa Medina [60]:

Quando se observa que cerca de 60.000 novos bacharéis saem, anualmente, das nossas Faculdades de Direito e se verifica que o índice de aprovação deles nos Exames de Ordem e concursos públicos é, proporcionalmente, cada vez menor, há razões para se preocupar com o nível do ensino ministrado.

A queda da qualidade do ensino é, porém, apenas o efeito imediato desse fenômeno. Impende considerar que as conseqüências da criação indiscriminada de cursos jurídicos atingem também os interesses da cidadania, são suscetíveis de comprometer a formação ética dos novos bacharéis e repercutem, em última análise, na atuação jurídica do Estado e na vida das instituições.

Os cursos de direito têm por finalidade formar novos profissionais, aptos a exercer a advocacia e a ingressar nas várias carreiras jurídicas. Mas, não é esse o seu único objetivo, porquanto as Faculdades de Direito, historicamente, têm tido por missão formar cidadão atuante, capazes de servir à comunidade em que vivem, assumindo a defesa das suas grandes causas, emprestando apoio e orientação aos seus concidadãos, mostrando-se aptos a despontar, eventualmente, como seus representantes nas Casas legislativas e nos altos cargos da administração pública.

Ao mesmo tempo, caracterizando a amplitude esperada para o ensino, é importante citar Inês da Fonseca Pôrto [61]:

A distância entre o mundo do aluno (cada vez mais restrito) e o mundo do direito (cada vez mais distante) é eliminada (ou subestimada). Uma das possibilidades deste distanciamento deve estar no fato de que os saberes dos contextos excluídos fazem parte da realidade quotidiana, são saberes do senso comum. O conhecimento jurídico é construído contra essas evidências e, portanto, contra uma realidade compartilhada por todos.

Para Freire, o ensino exige apreensão da realidade circundante de forma a reconstruí-la e recriá-la a partir de novas referências. Diferentemente de Freire, para quem o ensino deve sempre buscar conhecer diferentes dimensões da prática, o ensino jurídico optou por reduzir essas dimensões plurais à univocidade do contexto da cidadania.

A univocidade do saber jurídico – que visa não a reflexão sobre as informações, mas o seu acúmulo – acaba alienando o processo de ensino/aprendizagem, ao invés de enriquecê-lo.

Como visto, o Direito caminha contrariamente às suas origens, mesmo que ao encontro das primordiais necessidades sociais. Em decorrência desse fenômeno, segue o Direito à autoflagelação, uma vez que, ao primar pelo conhecimento técnico e absorção de conteúdo em detrimento da discussão propedêutica e filosófica, acaba por ignorar a ética e os fundamentos basilares que levaram o direito a se compor da importância que tem perante a sociedade. Assim, embora num primeiro momento possa parecer que o estudo do Direito hodierno trabalhe em prol da sociedade, vê-se que o contexto é falacioso, insurgindo-se quando da verificação da ética e dos princípios gerais do Direito. Por isso, cabe ao Estado, à sociedade e à OAB lutar para que haja o retorno da ética e da qualidade dos profissionais, o que se dá com a melhoria das condições para a educação jurídica, que, por sua vez, ocorrerá quando houver imposição estatal em favor da excelência.

A reforma do curso de Direito deve ser permanente. Não se pode parar de discutir e repensar as formas de atuação do curso, agregando seus valores primordiais e levando em consideração o contexto social. O Grupo de Trabalho MEC – OAB foi uma experiência válida e bastante frutífera, porém é preciso que essas iniciativas sejam valorizadas, com suas sugestões consideradas, senão como diretrizes, como elementos que venham a compor um plano de desenvolvimento capaz de, efetivamente, contribuir com a melhoria da qualidade do ensino. Ressalta-se ser uma atitude criminosa a ação de determinados agentes estatais que simplesmente ignoram a existência de ricos trabalhos sobre a educação, por ser mais prático e menos desgastante e dispendioso do que possibilitar uma revolução pro societate.

No decorrer dos últimos dez anos, alguns grupos se formaram para discutir a educação jurídica. Estudiosos altamente qualificados para tratar do assunto encontram-se em quantidade satisfatória no país. Por derradeiro, fica a esperança de que haja, então, vontade política e uma nova orientação empresarial, devendo-se remeter, especialmente no que diz respeito à relação "empresários versus didata", ao exposto no capítulo anterior, quando se tratou de perspectivas e se mostrou a que a saúde financeira de uma instituição pode e deve caminhar junto com a boa qualidade do ensino, para que se possam efetivar medidas que servirão a melhorar sobremaneira a educação e, por conseqüência, os profissionais do ramo do Direito.


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Notas

  1. PORTARIA MEC N. 3.381, de 20 de outubro de 2004. DOU de 21.10.04, Seção 2, p. 12.
  2. LEI N. 8.906, de 04.07.94. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). DOU de 05.07.94, p. 10093.
  3. A título de aprofundamento na matéria, quanto à existência ou não de crise de qualidade no ensino jurídico, o professor Horácio Wanderlei Rodrigues dá indicações que há sim uma crise, o que vai de encontro com os apoiamentos indicados neste trabalho, que afirma existir crise apenas num contexto geral. Na obra "Crises do ensino do direito no Brasil" o citado autor aponta, inclusive, subdivisões do que caracteriza "crise": 1. Crise estrutural (crise do paradigma político-ideológico; crise do paradigma epistemológico); 2. Crise funcional (crise do mercado de trabalho; crise de identidade e legitimidade dos operadores do Direito); 3. Crise operacional (crise administrativa; crise acadêmica, subdividindo-se em crise didático-pedagógica e crise curricular). Cabe ressaltar que a presente monografia não acompanha o entendimento acima, porém, a tem como de singular importância para a formação de juízo sobre o tema. Referência: RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Crises do ensino do direito no Brasil. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2005. p. 35.
  4. Morin, Edgar. A cabeça bem-feita. Repensar a reforma. Reformar o pensamento. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. p. 65.
  5. Jhering, Rudolf von. A evolução do Direito. 2. ed. Salvador: Progresso, 1956. p. 333.
  6. Picard, Edmond. O Direito puro. 2. ed. Salvador: Progresso, 1954. p. 253-254.
  7. Hespanha, António Manuel. Cultura Jurídica Européia. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2005. p. 35.
  8. Ibidem. p. 36.
  9. Cabe ressaltar que se trata, esta afirmação, de "via de regra", ou seja, o "dever ser" no contexto do sistema democrático, de forma a afastar casos fortuitos e sistemas ditatoriais, onde esta colocação poderia ser descabida.
  10. Morin, Edgar. A cabeça bem-feita. Repensar a reforma. Reformar o pensamento. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. p. 115.
  11. Dados comprobatórios quanto ao aumento de vagas serão apresentados em exposição específica sobre o tema, no capítulo "Entendendo a evolução do ensino do Direito", especificamente no tópico "Elementos objetivos".
  12. Dados acerca da qualidade dos cursos de Direito em funcionamento no Brasil podem ser verificados, entre outras, nas seguintes fontes: edições anuais do Guia do Estudante, da Editora Abril, onde se informa, especialmente aos formandos de segundo grau que pretendem prestar vestibular, dados qualitativos e quantitativos dos cursos em funcionamento no Brasil; na página da internet do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais Anísio Teixeira – órgão vinculado ao Ministério da Educação – e que publica dados do antigo Exame Nacional de Cursos – ENC ou Provão – e do Exame Nacional de Desempenho – ENADE; e na edição trienal do OAB Recomenda, publicação da Ordem dos Advogados do Brasil ao final de cada gestão da Entidade, que indica os cursos de Direito de destaque no país, apresentando os dados que levaram o curso a merecer tal distinção.
  13. Os elementos constantes do presente trabalho acerca da história da universidade (especialmente tratada neste capítulo) foram obtidos por meio da seguinte obra: CHARLE, Christophe; Verger Jacques. Tradução de: Elcio Fernandes. Historia das universidades. São Paulo: Unesp, 1996.
  14. SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade. 7. ed. Porto, Portugal: Edições Afrontamento, 1999. p. 163.
  15. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Disponível em: http://www.educacaosuperior.inep.gov.br/funcional/busca_instituicao.stm. Acesso em: 24 set. 06.
  16. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Disponível em: http://www.educacaosuperior.inep.gov.br/funcional/busca_instituicao.stm. Acesso em: 25 set. 06.
  17. SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade. 7. ed. Porto, Portugal: Edições Afrontamento, 1999. p. 168.
  18. As informações constantes deste tópico (2.2.1) foram obtidas por meio do CENSO 1991-2003 - Dados Estatísticos dos Cursos de Direito, por Categoria Administrativa, segundo as Regiões Geográficas e as Unidades da Federação, fornecido pelo INEP/MEC. Ademais, foram utilizados: CENSO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR – Curso de graduação em Direito – ANO 2004; e CENSO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR – Curso de graduação em Direito – ANO 2005.
  19. Os dados acerca do corpo docente são referências do ensino superior, em 1995, englobando todos os cursos, não tendo sido possível a utilização de dados específicos da área do Direito em razão do INEP não ter disponibilizado tais informações. Porém, ressalta-se que os referenciais são adequados em virtude de que a realidade do curso de Direito, no quesito "corpo docente", era a mesma do contexto geral. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Disponível em: http://www.inep.gov.br/superior/censosuperior/sinopse/1995/2.1.6Centro.htm. Acesso em 7 mar. 07.
  20. Os dados acerca do corpo docente são referências do ensino superior, em 1995, englobando todos os cursos, não tendo sido possível a utilização de dados específicos da área do Direito em razão do INEP não ter disponibilizado tais informações. Porém, ressalta-se que os referenciais são adequados em virtude de que a realidade do curso de Direito, no quesito "corpo docente", era a mesma do contexto geral. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Disponível em: http://www.inep.gov.br/download/superior/2004/censosuperior/Resumo_Tecnico_Cadastro_Docentes2005_1.pdf. Acesso em 7 mar. 07.
  21. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Disponível em: http://www.educacaosuperior.inep.gov.br/funcional/busca_curso.stm. Acesso em: 24 set. 06.
  22. PÔRTO, Inês da Fonseca. Ensino Jurídico, diálogos com a imaginação. Construção do projeto didático no ensino jurídico. Sergio Antonio Fabris Editor: Porto Alegre, 2000. p. 63.
  23. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Ensino Jurídico: realidade e perspectivas. In: -OAB Ensino Jurídico. Balanço de uma experiência. Brasília: Conselho Federal da OAB, 2000. p. 147-148.
  24. RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Crises do ensino do direito no Brasil. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2005. p. 34.
  25. LEI N. 8.906, de 04.07.94. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). DOU de 05.07.94, p. 10093.
  26. Dados obtidos a partir de pesquisa junto à Imprensa Nacional, ao Ministério da Educação e à Ordem dos Advogados do Brasil – Conselho Federal.
  27. MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa. Ensino Jurídico, Literatura e Ética. Brasília: OAB Editora, 2006. p. 144-145.
  28. Sobre a história do ensino do Direito no Brasil, pode-se aprofundar a partir da leitura das obras citadas na bibliografia desta monografia, especificamente dos autores Flávio Galdino, Horácio Wanderlei Rodrigues e Paulo Roberto de Gouvêa Medina.
  29. Apud GALDINO, Flávio. A Ordem dos Advogados do Brasil na Reforma do Ensino Jurídico. In: -Ensino Jurídico OAB 170 anos de cursos jurídicos no Brasil. Brasília: Conselho Federal da OAB, 1997. p. 159.
  30. GALDINO, Flávio. A Ordem dos Advogados do Brasil na Reforma do Ensino Jurídico. In: -Ensino Jurídico OAB 170 anos de cursos jurídicos no Brasil. Brasília: Conselho Federal da OAB, 1997. p. 160.
  31. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988, de 05.10.88. DOU de 05.10.88, p. 1.
  32. LEI N. 8.906, de 04.07.94. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). DOU de 05.07.94, p. 10093.
  33. LEI N. 9.394, de 20.12.96. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. DOU de 23.12.96, p. 27833.
  34. DECRETO N. 3.860, de 09.07.01. Dispõe sobre a organização do ensino superior, a avaliação de cursos e instituições, e dá outras providências. DOU de 10.07.01, p. 2 (Revogado pelo Decreto n. 5.773, de 09.05.06).
  35. DECRETO N. 5.773, de 09.05.06. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de ensino. DOU de 10.05.06, p. 6 (São expressamente revogados os Decretos de n. 1.845, de 28 de março de 1996, 3.860, de 9 de julho de 2001, 3.864, de 11 de julho de 2001, 3.908, de 4 de setembro de 2001, e 5.225, de 1º de outubro de 2004).
  36. LEI N. 8.906, de 04.07.94. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). DOU de 05.07.94, p. 10093.
  37. GRUPO DE TRABALHO MEC-OAB. Ministério da Educação e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Relatório Final. Brasília, 2005. p. 53.
  38. GRUPO DE TRABALHO MEC-OAB. Ministério da Educação e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Relatório Final. Brasília, 2005. p. 53.
  39. SANTOS, Boaventura Sousa. A Universidade no Século XXI: Para uma reforma democrática e emancipatória da Universidade. São Paulo: Cortez, 2004. p. 28-29.
  40. PARECER CES/CNE N. 293, de 1998.
  41. RESOLUÇÃO CES/CNE N. 09, de 29.09.04. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito e dá outras providências. DOU de 01.10.04, Seção 1, p. 17-18.
  42. MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa. Ensino Jurídico, Literatura e Ética. Brasília: OAB Editora, 2006. p. 89.
  43. GRUPO DE TRABALHO MEC-OAB. Ministério da Educação e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Relatório Final. Brasília, 2005. p. 37.
  44. GRUPO DE TRABALHO MEC-OAB. Ministério da Educação e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Relatório Final. Brasília, 2005. p. 46.
  45. Ibidem. p. 48.
  46. Ibidem. p. 48.
  47. PORTARIA MEC N. 1.886, de 30.12.94. Fixa as diretrizes curriculares e o conteúdo mínimo do curso jurídico. DOU de 04.01.95. Embora a Resolução n. 9, de 2004, tenha revogado expressamente a Portaria MEC 1.886, de 1994, entende-se que, no máximo, a primeira teria derrogado-a, pois, não obstante serem normas de hierarquias diversas e impassíveis de predominância, a referida resolução não foi regulada quanto a diversos critérios, perfazendo vacatio legis, motivo pelo qual ainda se recorre, em parte, à antiga norma.
  48. LEI N. 10.861, de 14.04.04. Institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES e dá outras providências. DOU de 15.04.04, p. 3.
  49. LEI N. 9.131, de 24.11.95. Altera dispositivos da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, e dá outras providências. DOU de 25.11.95, edição extra.
  50. PORTARIA MEC N. 4.361, de 29.12.04. DOU de 30.12.2004, Seção 1, p. 66-67.
  51. LEI N. 8.906, de 04.07.94. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). DOU de 05.07.94, p. 10093.
  52. PROVIMENTO OAB N. 109, de 05.12.05. Estabelece normas e diretrizes do Exame de Ordem. Diário da Justiça de 09.12.2005, Seção 1, p. 663/664 (Retificação: DJ, 15.12.2005, Seção 1, p. 587).
  53. DECRETO N. 5.773, de 09.05.06. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de ensino. DOU de 10.05.06, p. 6
  54. GRUPO DE TRABALHO MEC-OAB. Ministério da Educação e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Relatório Final. Brasília, 2005. p. 35.
  55. CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Disponível em: <http://www.oab.org.br/noticia.asp?id=8652>. Acesso em: 2 mar. 07.
  56. SANTOS, Boaventura Sousa. A Universidade no Século XXI: Para uma reforma democrática e emancipatória da Universidade. São Paulo: Cortez, 2004. p. 44.
  57. PÔRTO, Inês da Fonseca. Ensino Jurídico, diálogos com a imaginação: Construção do projeto didático no ensino jurídico. Sergio Antonio Fabris Editor: Porto Alegre, 2000. p. 39.
  58. MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa. Ensino Jurídico, Literatura e Ética. Brasília: OAB Editora, 2006. p. 57.
  59. PORTARIA MEC N. 2.477, de 18.08.04. Regulamenta procedimentos de autorização de cursos superiores de graduação em Instituições de Ensino Superior. DOU de 19.08.2004, Seção 1, p. 19 (Revogada pela Portaria MEC n. 1.028, de 15.05.06 em razão de incorporação do texto no Decreto 5.773, de 09.05.2006).
  60. DECRETO N. 5.773, de 09.05.06. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de ensino. DOU de 10.05.06, p. 6.
  61. MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa. Ensino Jurídico, Literatura e Ética. Brasília: OAB Editora, 2006. p. 57.
  62. PÔRTO, Inês da Fonseca. Ensino Jurídico, diálogos com a imaginação: Construção do projeto didático no ensino jurídico. Sergio Antonio Fabris Editor: Porto Alegre, 2000. p. 39.

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SOUZA NETO, Walter José de. A necessidade de se repensar a reforma do ensino jurídico no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2308, 26 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13751. Acesso em: 25 abr. 2024.