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Incidência de CSLL e CPMF sobre receitas de exportação

Incidência de CSLL e CPMF sobre receitas de exportação

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Parecer da Procuradoria da Fazenda Nacional, no sentido de que a regra de não incidência de contribuições sociais sobre "receitas decorrentes de exportação" prevista no art. 149, §2º, I, da Constituição, não abrange a CSLL e a CPMF.

EXCELENTÍSSIMOS SENHORES MINISTROS DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

1. CPMF. CSLL. Receitas de Exportação. Imunidade Tributária. Art. 149, § 2º, I, CF. EC 33/2001.

Prejudicial:

2. Há duas espécies de contribuições sociais: as gerais (art. 149, CF) e as da seguridade social (art. 195, CF). Precedentes do STF.

3. A referida imunidade tributária não alcança as contribuições sociais da seguridade social.

4. A cogitada imunidade abarca as contribuições sociais gerais e as contribuições de intervenção no domínio econômico (art. 149, CF).

Mérito:

5. A citada imunidade tributária não alcança a CSLL nem a CPMF.

6. Autonomia tributária de receita, lucro e movimentação financeira. Precedentes do STF.

7. A EC 20/98 reconheceu a autonomia conceitual e normativa da receita, do faturamento e do lucro. A EC 33/01 chancelou essa autonomia na exoneração tributária das "receitas de exportação".

8. A receita é todo valor percebido pela pessoa jurídica, a qualquer título, ou seja, é o gênero dos ingressos.

9. O lucro é o resultado positivo do exercício, ou seja, o valor das receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não-operacionais.

10. A movimentação financeira é a operação liquidada ou o lançamento realizado pelas entidades financeiras, que representam circulação escritural ou física de moeda, e de que resulte ou não transferência da titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos.

11. Tributos específicos para cada uma dessas hipóteses de incidência (receita, lucro e movimentação financeira). Exonerações tributárias distintas para cada uma delas.

12. A constitucionalidade da incidência da CSLL (lucros) e da CPMF (movimentação financeira) sobre as pessoas jurídicas exportadoras.


Recurso Extraordinário n. 474.132

1. O presente memorial analítico tem como objeto o disposto no art. 149, § 2º, I, Constituição Federal, na redação estabelecida pela Emenda Constitucional n. 33, de 11.12.2001, que determinou a não-incidência, sobre as "receitas decorrentes de exportação", de contribuições sociais gerais e das contribuições de intervenção no domínio econômico, instituídas pela União Federal no exercício da exclusiva competência tributária autorizada no caput do art. 149, CF.

2. A indagação constante no referido recurso extraordinário consiste em saber se o disposto no mencionado inciso I do § 2º do art. 149, CF, afasta a exigência da CSLL (contribuição social sobre o lucro) e da CPMF (contribuição provisória sobre movimentações financeiras).

3.Com efeito, a mencionada EC 33/2001 estabeleceu nova redação ao disposto no art. 149, § 2º, I, CF, que passou a ter o seguinte enunciado:

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

.......

§ 2º. As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo:

I – não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;

......

4.A controvérsia reside no raio de alcance da não-incidência disposta no art. 149, § 2º, I, CF, na colacionada redação estabelecida pela EC 33/2001.

5.Há, em verdade, cinco questionamentos subjacentes:

5.1. As "receitas decorrentes de exportação" estão imunes a todas as contribuições sociais?

5.2. A referida "imunidade" alberga somente as contribuições sociais cuja matriz constitucional seja o art. 149?

5.3. Fora da matriz do art. 149, quais contribuições sociais foram alcançadas pela referida "imunidade" tributária?

5.4. A expressão "receitas" deve ser compreendida no sentido de corresponder aos "lucros" e às "movimentações financeiras" das pessoas jurídicas exportadoras?

5.5. Os termos "receita", "faturamento", "lucro" e "movimentação financeira" têm sentidos constitucionais específicos e distintos?

6. As respostas exigem uma interpretação constitucional sistemática e a análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

7. O objetivo específico do presente memorial é defender a validade do acórdão recorrido emanado da Egrégia Segunda Turma do Tribunal Federal da 4ª Região, que negou provimento ao apelo da Contribuinte e manteve incólume a sentença de primeiro grau denegatória da segurança postulada, julgando válida a incidência da CSLL e da CPMF, respectivamente, sobre os "lucros" e sobre as "movimentações financeiras" da Empresa.


II. O ACÓRDÃO RECORRIDO

8. O aludido acórdão recorrido tem a seguinte ementa:

TRIBUTÁRIO. AMS. EC 33/2001. IMUNIDADE. CSLL. CPMF.

1. A imunidade sobre as receitas decorrentes de exportação, prevista no art. 149, § 2º, I, CF/88, introduzida pela EC 33/2001, não alcança a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, porquanto receita e lucro são tributados distintamente.

2. Precedentes da 1ª e da 2ª Turmas desta Corte Regional.

3. Tal imunidade também não alcança as outras contribuições da Seguridade Social, que têm por matriz constitucional o art. 195, § 4º, da CF/88, dentre elas a CPMF, por terem tratamento diferenciado.

Precedentes desta Turma.

9. O voto-vencedor, a despeito de visitar o entendimento do Excelso Supremo Tribunal Federal manifestado no RE 138.284 (Relator Ministro CARLOS VELLOSO, J. 01.07.1992, DJ. 28.08.1992), acerca das espécies de contribuições e de suas naturezas tributárias, resolve a questão a partir de outros fundamentos.

10. De efeito, no acórdão recorrido a CSLL não é alcançada pela regra imunizante do art. 149, § 2º, I, CF, por ter hipótese de incidência específica e distinta de "receita". No caso da CSLL, a base de cálculo é o "lucro" (art. 195, I, c, CF). O entendimento esposado na Corte Regional é o de que "receita" e "lucro" são hipóteses autônomas e que servem como base de cálculo de contribuições sociais diversas.

11. Nessa perspectiva, recorda o aresto objurgado que essa distinção entre as bases de cálculo das contribuições sociais (art. 195, I, alíneas, CF) foi reforçada pela legislação infraconstitucional correspondente que exonerou as "receitas decorrentes de exportação" da incidência da COFINS (Contribuição Social sobre o Faturamento) e sobre o PIS/PASEP (Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público), visto que essas citadas contribuições sociais têm a "receita" como base de cálculo.

12. Em reforço de seu entendimento, o voto-vencedor colaciona excerto de voto condutor proferido nos autos da Apelação em Mandado de Segurança n. 2003.70.09.005966-1, da Egrégia 1ª Turma do TRF 4, da lavra do Juiz JOÃO SURREAUX CHAGAS, que dada a limpidez argumentativa, merece ser transcrito neste espaço:

"Contudo, a questão não se encerra neste ponto. Com efeito, a regra imunitória refere-se expressamente a receitas decorrentes de exportação, enquanto a pretensão envolve a contribuição incidente sobre o lucro.

Poder-se-ia argumentar que a questão é apenas terminológica, pois o lucro decorrente de exportação advém necessariamente de receita de exportação, e se a receita não pode ser tributada, também não o pode o lucro que ela produz.

Ocorre que receita e lucro, em que pese serem conceitos econômicos intimamente imbricados, são diferenciados explicitamente e tratados à parte enquanto fatos geradores de contribuições sociais para a seguridade social.

De fato, o art. 195 da CF/88 prevê, em alíneas diversas de seu inciso I, a contribuição social incidente sobre a receita ou o faturamento (alínea "b") e a contribuição incidente sobre o lucro (alínea "c"). As contribuições são diversas, com disciplinas legais independentes, correspondendo a primeira à COFINS e ao PIS-PASEP e a segunda à CSLL - contribuição sobre o lucro líquido.

Portanto, receita e faturamento são tributados distintamente. Todas as empresas, em geral, devem uma contribuição social para a seguridade social devida em decorrência da receita ou faturamento apurados, e outra incidente sobre o lucro auferido. Assim como todas as empresas devem a contribuição incidente sobre a folha de salários e demais pagamentos efetuados a pessoas físicas que lhe prestem serviço, a terceira hipótese de incidência que enseja a obrigação de pagar contribuição à seguridade social prevista no art. 195 da CF/88, ao lado da receita ou faturamento e do lucro.

Dessa forma, havendo previsão de tributação autônoma das três dimensões da atividade empresarial - pagamento de salários, faturamento apurado e lucro auferido -, o fato de existir previsão constitucional ou legal de não tributar determinadas receitas não implica na não-tributação do pagamento dos salários necessários para que a receita pudesse ingressar na empresa, nem do lucro que ela eventualmente possa gerar.

Outrossim, a exoneração da contribuição das receitas advindas da exportação e não do lucro delas decorrentes está em consonância com a política econômica de desoneração das exportações, necessária para dar maior competitividade aos produtos nacionais no mercado internacional.

Com efeito, os incentivos fiscais à exportação - dentre eles a exoneração das contribuições sobre a receita ou faturamento (COFINS e PIS) no caso de vendas para o mercado externo - permitem melhores condições para o desempenho das empresas no mercado internacional, excluindo tributos indiretos que influenciam negativamente na composição dos preços finais.

Contudo, isso não implica que, incrementadas as vendas para o exterior em decorrência dos incentivos concedidos, que desoneram a produção e a comercialização e possibilitam a redução dos preços do produto nacional no mercado internacional, seja o lucro assim auferido e majorado também exonerado da tributação, criando tratamento desigual em relação aos demais contribuintes no plano interno da economia.

Portanto, não há fundamento para a imunidade pretendida."

13. A partir desses fundamentos, e com esteio em outros precedentes do Egrégio TRF 4, o acórdão recorrido decidiu que a imunidade instituída pela EC 33/2001 (art. 149, § 2º, I, CF) não alcança a CSLL das empresas exportadoras.

14. No concernente à CPMF, o voto-condutor do acórdão recorrido fundamenta-se no reconhecimento de que o fato gerador dessa mencionada contribuição é a movimentação ou transmissão de valores e de créditos de natureza financeira e lançamentos de débitos e créditos em contas correntes, não havendo qualquer distinção para os créditos que eventualmente advenham de operações de exportação.

15. Nessa trilha, entendeu o voto-condutor que o fato gerador da CPMF não se confunde com a simples receita e relembra que se o pagamento fosse feito diretamente em moeda, não haveria incidência da cogitada contribuição tributária.

16. Com apoio em precedentes do TRF 4 e reforçando essa especificidade do fato gerador da CPMF, entendeu-se exigível a referida contribuição, independentemente de as "movimentações financeiras" decorrerem ou não das "receitas de exportação". Por fim, negou-se provimento ao apelo no tocante ao pedido de extensão da imunidade das receitas decorrentes de exportação às "receitas decorrentes das variações cambiais", a partir da distinção entre as espécies de receitas que não devem ser confundidas.

17. Em verdade, percebeu a decisão combatida que as "receitas das variações cambiais" podem advir da realização de exportações, mas isso não implica que as variações cambiais, que podem ser ativas ou passivas e, por conseqüência, geradoras de receitas ou despesas, sejam uma "receita de exportação".

18. Concluiu o aresto que esse tipo de "receita" é meramente de natureza financeira, não se confundido com a receita de exportação gerada pela operação de compra e venda, de sorte que a eventual variação cambial ativa (receita financeira) resulta da desvalorização da moeda, e não da operação de exportação propriamente dita.

19. Como mencionado, o acórdão recorrido prestigiou a sentença da lavra do Juiz Federal HERLON SCHVEITZER TRISTÃO que denegou a segurança postulada e manteve a incidência da CSLL e da CPMF, respectivamente, sobre os lucros e sobre as movimentações financeiras.

20. A mencionada sentença monocrática vislumbrou que a cogitada EC 33/2001 não exonerou todas as contribuições sociais devidas pelas empresas exportadoras, mas tão-somente aquelas que tenham as "receitas decorrentes de exportação" como hipótese de incidência. Em sua fundamentação, o juízo sentenciante partiu da leitura do art. 149, § 2º, I, CF, em cotejo com o disposto no art. 195, I, "b" e "c", CF, teceu as seguintes considerações:

"Ressalte-se que a própria Constituição estabeleceu o princípio da solidariedade na manutenção da seguridade social, prevendo como fatos geradores das contribuições sociais a ‘receita’ e o ‘lucro’, de forma distinta. Sob esse prisma, a norma acrescentada pela Emenda Constitucional n. 33/2001 não tem o condão de instituir a imunidade abrangendo a CSLL, incidente sobre o lucro, e a CPMF, incidente sobre a movimentação financeira, conforme entende a impetrante, vez que tal interpretação levaria as empresas exportadoras a não contribuírem para a manutenção da seguridade social, é dizer, estariam à margem da solidariedade prevista na Constituição."

21. Nessa senda, a sentença visitou o julgado do Supremo Tribunal Federal nos autos do RE 227.832 (Relator Ministro CARLOS VELLOSO, J. 01.07.1999, DJ. 28.06.2002) que cuidou da COFINS sobre o faturamento das operações de energia, minerais e petróleo, e, em uma interpretação sistemática, restringiu o termo "tributo" para "imposto", de sorte que o art. 153, § 3º, CF, na redação coeva, sofreu essa referida "redução teleológica".

22. Naquele recordado julgamento do RE 227.832, uma das razões usadas pelo STF foi o reconhecimento de que sempre que o texto constitucional cometeu exonerações dos "tributos" da seguridade social o fizera expressamente. Assim, o mandamento maior é a solidariedade no financiamento (art. 195, caput, CF). Todavia, de modo excepcional e expresso, é possível a exoneração das obrigações sociais, como disposto no art. 195, § 7º, CF.

23. Nessa linha, a sentença fundamentou a questão da CPMF e a sua incidência sobre as movimentações financeiras das empresas exportadoras perspectivando a intenção do legislador constituinte derivado do seguinte modo:

"Ademais, se a intenção do legislador constituinte derivado fosse excluir as receitas de exportação da incidência das contribuições sociais cujo fato gerador não é a receita, é de se indagar porque o mesmo legislador, quando da aprovação da Emenda Constitucional n. 37, de 12 de junho de 2002, que prorrogou a cobrança da CPMF, não previu, no art. 85 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a criação de contas correntes para depósito das receitas de exportação, imunes à incidência da CPMF. A resposta não pode ser outra senão de que é possível a cobrança da referida contribuição sobre a movimentação financeira de tais receitas".

24. Com esses fundamentos, o decisum entendeu que nem o lucro nem a movimentação financeira da Contribuinte (empresa exportadora) sofreram a imunização da EC 33/2001. O correto entendimento escoteiro, repita-se, foi sufragado pelo acórdão objeto do presente recurso extraordinário.


III. A PRETENSÃO DA CONTRIBUINTE

25. Em 03.12.2003, a Contribuinte impetrou o presente mandado de segurança preventivo n. 2003.72.08.011391-2 perante Vara Federal de Itajaí - SC, e formulou, no que interessa, o seguinte pedido:

"d) ao fim requer seja concedida segurança no mérito para determinar em definitivo que a Impetrante não mais se submeta ao recolhimento de CSLL e CPMF sobre suas receitas de exportação, inclusive sobre as receitas das variadas cambiais ativas, e não apenas para as vendas de produtos, bem como seja determinada a repetição do indébito de tudo o que foi pago indevidamente a título de CSLL e CPMF sobre as receitas de exportação e de variações cambiais ativas, pela via da compensação tributária, nos moldes do artigo 170 do Código Tributário Nacional, combinado com o artigo 74 da Lei n. 9.430/96, regulamentado pelo Decreto n. 2.138/97, que permitem a compensação com quaisquer tributos federais, tudo devidamente atualizado nos mesmos moldes em que a Receita Federal atualiza seus créditos, bem como com a incidência da taxa SELIC."

26. Em sua inicial, a Contribuinte aduz que com o advento da EC 33/2001 passou a não ser mais submetida à incidência e conseqüente recolhimento de "contribuições sociais" sobre suas receitas de exportação.

27. Nada obstante, informa a Contribuinte, o Fisco Federal vem aplicando a regra de imunidade de forma restritiva, interpretando-a como se somente estivessem sob o abrigo da referida imunidade as receitas de exportação que servem de base de cálculo para o PIS e a COFINS, ao passo que o legislador constituinte derivado foi bem mais abrangente, fazenda referência de modo genérico ao termo "Contribuições Sociais", abarcando, assim, para o seu campo de aplicação, a CSLL e a CPMF.

28. A Contribuinte recorda a natureza de contribuição social da CPMF a partir da destinação social de sua arrecadação, vez que abrange todos os campos da seguridade social, nos termos constantes no ADCT (arts. 74, 75, 84 e 85). Sugere que a CPMF seria a mais social das contribuições sociais.

29. Também lembra a Contribuinte a gênese da CSLL e a previsão expressa de exclusão do lucro decorrente de exportações incentivadas de que trata o art. 1º do Decreto-Lei n. 2.413/88 e o art. 19 do Decreto-Lei n. 1.598/77 (art. 2º, "c", 3, Lei n. 7.689/88 – redação originária). Informa que essa mencionada previsão legal foi revogada pela Lei n. 7.988, de 28.12.1989.

30. A Contribuinte relata que no texto originário da lei instituidora da COFINS estava disposta a isenção da referida contribuição social quanto às receitas decorrentes da venda de mercadorias ou serviços destinados ao exterior (art. 7º da Lei Complementar n. 70/91).

31. Informa a extensão de isenção das receitas de exportação ao PIS/PASEP, mediante a edição da Medida Provisória n. 1.858-6/99. Com base nessas informações, induz que a edição da EC 33/2001 visou atribuir maior abrangência à desoneração das receitas de exportação, no que pertine à não-incidência das contribuições sociais.

32. Nessa perspectiva, entende que as receitas de exportação não mais podem ser apropriadas, para tributação, por "contribuições sociais", dito assim, de modo genérico, pelo legislador constituinte derivado.

33. Alega que a EC 33/2001 confirmou as isenções das receitas de exportação no que se refere ao PIS e à COFINS e fez com que voltasse à tona a exclusão do lucro das exportações no tocante à CSLL, bem como abrangesse também a CPMF.

34. Argumenta que a EC 33/2001 não poderia ter apenas as contribuições do PIS e da COFINS, visto que esses tributos já estavam exonerados das receitas de exportação, sendo desnecessário elevar essa exoneração ao altiplano constitucional.

35. Justifica a edição da EC 33/2001 no sentido de ampliar o rol de contribuições sociais que não poderiam incidir sobre as receitas de exportação, dentre elas, reitera, a CSLL e a CPMF.

36. A Contribuinte invoca a necessidade de interpretação extensiva às imunidades tributárias e evoca interesses da política econômica nacional de incentivo às exportações nacionais, daí que, segundo a Contribuinte, permitir a incidência e posterior recolhimento da CSLL e da CPMF sobre as receitas de exportação importaria em inegável desestímulo às empresas exportadoras, já que seria um contra-senso incentivar as exportações e ao mesmo tempo tributar o lucro e a movimentação financeira originados de tais operações dirigidas ao mercado externo.

37. No concernente a suposta imunidade em relação à CSLL, tece o seguinte argumento:

"Não há que se objetar que a imunidade seria para receita, ao passo que a CSLL tributa o lucro, já que a ‘receita’ é componente inexorável do ‘lucro’. Ou seja, o lucro provém de uma receita, não havendo que se falar em lucro sem que antes se verifique a existência de uma receita. Assim, embora distintos, os conceitos são equivalentes, e possuem pontos de intersecção, os quais devem ser enaltecidos para fins de uma interpretação ampla que prestigie a finalidade político-econômica da nora regra da imunidade".

38. A tese central é a de que o "lucro" tributado pela CSLL não passa de "receita" depurada. Portanto, não poderia o Fisco, ao exigir a CSLL, considerar o "lucro ajustado" sem excluir as "receitas" decorrentes de exportação. Assim, não apenas as "receitas" de exportação estão exoneradas, mas os "lucros" de exportação, porquanto estes lucros dependem daquelas receitas.

39. No tocante a CPMF, prega a ausência de riqueza substantiva como fato gerador dessa citada contribuição social, apoiando-se em manifestação do Ministro ILMAR GALVÃO em voto proferido no julgamento da ADI 2.666 (Relatora Ministra ELLEN GRACIE, J. 03.10.2002, DJ. 06.12.2002), mas que foi rejeitada pelo Plenário do STF para eventual decretação de inconstitucionalidade do aludido tributo.

40. A Contribuinte justifica a não-incidência da CPMF sobre as suas movimentações financeiras com a seguinte passagem:

"Assim, se a CPMF está sendo recolhida sobre a movimentação de valores que ingressaram na conta bancária do contribuinte por intermédio de operações de exportação, resta evidente que o quê está sendo tributado, a bem da verdade, é a própria receita de exportação, já que a sua movimentação bancária é apenas um dado momento fático eleito pelo legislador para fazer incidir o tributo.

Portanto, a movimentação financeira de valores e créditos é apenas um elemento da hipótese de incidência da CPMF, e sua base de cálculo é o patrimônio do contribuinte. Em outras palavras: a base de cálculo da CPMF é o valor, o quantum, que está sendo movimentado na conta bancária do contribuinte.

Se o valor que está sendo submetido a uma movimentação financeira diz respeito a uma receita de exportação, a CPMF irá se apropriar de tal valor na condição de sua base de cálculo, o que é inteiramente vedado pela Emenda Constitucional n. 33/2001."

41. Com esteio no magistério doutrinário de ALFREDO AUGUSTO BECKER (Teoria Geral do Direito Tributário) e no de PAULO DE BARROS CARVALHO (Curso de Direito Tributário) acerca do núcleo da hipótese de incidência tributária, que vem a ser a base de cálculo do tributo, entende que se o valor da operação movimentada financeiramente decorre de receitas de exportação, essa mencionada movimentação financeira não pode ser objeto de incidência da CPMF.

42. Para robustecer sua conclusão pertinente a CPMF, colaciona precedente do STF nos autos do RE 211.790 (Relator Ministro ILMAR GALVÃO, J. 12.11.2002, DJ. 19.12.2002), concernente ao IPMF, no qual a Corte decidiu que não poderia o citado imposto incidir sobre a movimentação financeira de uma instituição de educação, em homenagem à imunidade estabelecida no art. 150, VI, "c", e § 4º, CF.

43. Alinhavando similitudes entre o IPMF e a CPMF, defende que a cobrança de tributo sobre a movimentação financeira das empresas exportadoras irá desenganadamente onerar os recursos provenientes da exportação.

44. Em linhas gerais, são esses os principais argumentos que alicerçam as pretensões da Contribuinte e que serão oportunamente combatidos.


IV. AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

45. A jurisprudência do STF sobre o tema das contribuições sociais é farta, assim como abundante é o cardápio de contribuições no sistema tributário nacional.

46. Preciosa é a lição de MISABEL DE ABREU MACHADO DERZI ao dizer que "a Constituição de 1988 afastou, irrefutavelmente, a discussão sobre o caráter tributário das contribuições parafiscais. A tese que sempre foi defendida por Aliomar Baleeiro, mais uma vez, encontrou consagração indiscutível no atual sistema jurídico brasileiro" (Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, Ed. Forense, p. 592).

47. Com efeito, o Ministro CARLOS VELLOSO, no indefectível RE 138.284 (J. 01.07.1992; DJ 28.08.1992), descortinou o quadro das espécies tributárias de modo bastante didático:

"As diversas espécies tributárias, determinadas pela hipótese de incidência ou pelo fato gerador da respectiva obrigação (CTN, art. 4º), são as seguintes: a) os impostos (CF, arts. 145, I, 153, 154, 155 e 156); b) as taxas (CF, art. 145, II); c) as contribuições, que podem ser assim classificadas: c.1. de melhoria (CF, art. 154, III); c.2. parafiscais (CF, art. 149), que são: c.2.1. sociais, c.2.1.1. de seguridade social (CF, art. 195, I, II, III), c. 2.1.2. outras de seguridade social (CF, art. 195, § 4º), c.2.1.3. sociais gerais (FGTS, o salário-educação, CF, art. 212, § 5º, contribuições para o SESI, SENAI, SENAC, CF, art. 240); c.3. especiais: c.3.1. de intervenção no domínio econômico (CF, art. 149) e c.3.2. corporativas (CF, art. 149). Constituem, ainda, espécie tributária: d) os empréstimos compulsórios (CF, art. 148).

....

Posta assim a questão, vejamos as contribuições parafiscais na Constituição de 1988.

A norma-matriz das contribuições parafiscais está contida no art. 149 e seu parág. único da Constituição:

....

O citado artigo 149 institui três tipos de contribuições: a) contribuições sociais, b) de intervenção, c) corporativas. As primeiras, as contribuições sociais, desdobram-se, por sua vez, em a.1) contribuições de seguridade social, a.2.) outras de seguridade social e a.3.) contribuições sociais gerais."

48. De tal sorte, a partir desse magistério jurisprudencial, ficou assentado que as Contribuições Sociais eram de duas espécies: as gerais, com esteio no artigo 149, CF, e as da seguridade social, com esteio no art. 195, CF.

49. Nesse prisma, é de ver que há dois regimes constitucionais das contribuições sociais: o geral (art. 149) e o específico da seguridade social (art. 195). As contribuições sociais da seguridade social são espécies do gênero contribuições sociais. E, à luz do texto constitucional, têm as contribuições da seguridade social um regime específico.

50. O magistério de MISABEL DERZI, em atualização ao clássico Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, de Aliomar Baleeiro, é nesse sentido (obra citada, p. 594-595):

"O conceito de contribuições sociais é assim mais amplo do que aquele de contribuições sociais destinadas a custear a Seguridade Social. O art. 149 regula o regime tributário das contribuições sociais em sentido amplo, regime que é comum aos demais tributos. Elas custeiam a atuação do Estado em todos os campos sociais, como o salário-educação (art. 212, § 5º), o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS, no custeio da casa própria) et alii. A grande diferença está em que as contribuições sociais em sentido lato não são objeto de qualquer exceção, sujeitando-se de forma integral ao regime constitucional tributário, mormente ao princípio da anterioridade da lei tributária ao exercício financeiro de sua eficácia, enquanto as contribuições sociais destinadas ao custeio da Seguridade Social submetem-se a regime constitucional próprio."

51. O reconhecimento jurisprudencial dessa diferença entre as contribuições sociais gerais (art. 149, CF) e as contribuições sociais da seguridade social (art. 195, CF) ficou explicitado no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.556, sob a relatoria do Ministro MOREIRA ALVES (J. 09.10.2002; DJ 08.08.2003), que cuidava da constitucionalidade da Lei Complementar n. 110/2001 e das exações criadas por esse diploma legislativo. De efeito, da ementa do referido julgado extrai-se passagem que interessa na solução da presente controvérsia:

"A natureza jurídica das duas exações criadas pela lei em causa, neste exame sumário, é a de que são elas tributárias, caracterizando-se como contribuições sociais que se enquadram na sub-espécie ‘contribuições sociais gerais’ que se submetem à regência do artigo 149 da Constituição, e não a do artigo 195 da Carta Magna."

52. Em voto-vencedor, o Ministro MOREIRA ALVES reconheceu que as contribuições sociais têm assentos constitucionais distintos:

"Sucede, porém, que, havendo no sistema constitucional vigente contribuições sociais que se submetem ao artigo 149 da Constituição (as denominadas ‘contribuições sociais gerais’ que não são apenas as tipificadas no texto constitucional, porque, se o fossem, não teria sentido que esse artigo 149 dispusesse que ‘compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais’) e contribuições sociais a que se aplica o artigo 195 da Carta Magna (as contribuições para a seguridade social), resta determinar em qual dessas sub-espécies se enquadram as duas contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar n. 110/2001".

53. Assim, a jurisprudência do STF, no ponto que interessa, reconheceu a existência de duas espécies constitucionais de contribuições sociais: as gerais, com regime constitucional disciplinado no art. 149, e as da seguridade social, com regime constitucional específico disciplinado no art. 195.

54. É certo que o caput do artigo 149 do texto constitucional faz expressa remissão às contribuições da seguridade social, de sorte que flagrante, à luz da Constituição, a existência de tratamentos distintos entre as contribuições sociais gerais e as contribuições sociais da seguridade social:

"Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo".

55. Portanto, o art. 149 cuida das contribuições sociais gerais, enquanto que as contribuições sociais da seguridade social têm no art. 195, itens, o seu tratamento constitucional específico.


V. AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DA SEGURIDADE SOCIAL E A IMUNIDADE DAS RECEITAS DECORRENTES DE EXPORTAÇÃO

56. O ponto de partida de uma adequada interpretação normativa é enunciado textual. E o limite da interpretação é o respeito ao comando expresso nos textos normativos. É cediço que interpretar é atribuir significação normativa às palavras da lei, em uma perspectiva sistemática e teleológica.

57.Em sede constitucional, a interpretação encetada pela Corte Constitucional há de considerar, repita-se, as palavras insertas no texto constitucional, um método jurídico sistemático e os precedentes da Corte.

58.Na presente controvérsia, a utilização desse "tripé metodológico" levará, forçosamente, a uma decisão que mantenha a incidência da CSLL e da CPMF sobre os "lucros" e sobre as "movimentações financeiras", respectivamente, das empresas exportadoras.

59. Conquanto em outra oportunidade tenha-se admitido a possibilidade de o comando constitucional do art. 149, § 2º, I, CF, alcançar as contribuições sociais da seguridade social, refletindo-se melhor sobre o tema evolui-se para negar essa possibilidade.

60.Essa evolução foi motivada pela diferença de regimes constitucionais entre as contribuições sociais gerais (art. 149) e as contribuições sociais da seguridade social (art. 195), conforme aludido no presente texto.

61. Pede-se licença para novamente transcrever o contido no art. 149, § 2º, I, CF:

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

.......

§ 2º. As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo:

I – não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;

62. Com efeito, o § 2º é expresso ao se referir às contribuições sociais do caput do art. 149. E, segundo a melhor doutrina refletida normativamente na própria jurisprudência do STF, as contribuições sociais do art. 149 se distinguem das contribuições sociais da seguridade social do art. 195.

63. As contribuições sociais da seguridade social não são espécies das contribuições sociais gerais, mas espécie de contribuição social, isso é inegável. Sucede que, por ser espécie, sempre recebeu um tratamento normativo (e jurisprudencial) distinto.

64. Se assim não fosse, não havia razão para o mencionado dispositivo se referir expressamente ao caput do art. 149. Se a intenção constitucional fosse ampliar a imunidade das "receitas decorrentes de exportação" às contribuições sociais da seguridade social, deveria dizê-lo expressamente. Como tem afirmado a jurisprudência do STF, sempre que o legislador constituinte quis exonerar as contribuições da seguridade social o fez explicitamente. Não é esse o caso.

65.Cirúrgico o entendimento esposado por Evandro Costa Gama (As contribuições sociais de seguridade social e a imunidade do art. 149, § 2º, I, da Constituição Federal - www.sinprofaz.org.br) no sentido da exclusão das contribuições sociais da seguridade social do alcance normativo do aludido art. 149, § 2º, I, CF, tendo como norte os regimes constitucionais específicos de cada uma dessas categorias de contribuições sociais (as gerais e as da seguridade social) e os princípios e regras regedores da Seguridade Social, em particular a sua excelsa finalidade:

"Esse princípio exerce – como característica peculiar de todo princípio – um papel fundamental na interpretação e aplicação das regras constitucionais e infraconstitucionais relacionadas com a cobrança das contribuições da seguridade social, estabelecendo o dever de solidariedade de todos os integrantes da sociedade no financiamento da Seguridade Social no Brasil.

Coerente com o princípio da solidariedade no custeio da Seguridade Social (art. 195, caput) e ciente da necessidade de equilíbrio orçamentário no referido setor (art. 195, § 5º), o Poder Constituinte de 1988 fixou a imunidade do § 7º do art. 195 em favor das entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

Vejam que a única imunidade prevista para as contribuições sociais de seguridade social foi fixada em favor de instituições que desenvolvam suas atividades na área da assistência social, isto é, dentro dos limites da Seguridade Social.

A correta interpretação e aplicação da imunidade do § 2º, I, do art. 149 da Constituição deverá levar em consideração a real distinção entre os regimes jurídicos das contribuições sociais gerais (art. 149, 1ª parte) e das contribuições sociais de seguridade social (art. 195), sob pena de desrespeito à vontade popular representada pelo Poder Constituinte de 1988."

66.Essa interpretação atende ao sistema constitucional, pois de um lado há a política de desoneração das exportações e de outro há a política de ampla repartição dos encargos da seguridade social. Na ponderação dos valores constitucionalizados, aparentemente colidentes, deve prevalecer o verdadeiro objetivo da Constituição: exoneram-se as contribuições sociais gerais e as de intervenção econômica, mas preservam-se as contribuições da seguridade social.

67.Em reforço a tal entendimento, tenha-se que a Lei n. 10.833/2003, art. 6º, inciso I, excluiu as receitas decorrentes de exportação da incidência a COFINS. A não-incidência, assim como a isenção e outros tipos de exoneração tributária, é um favor legal concedido pelo Estado dentro de suas conveniências políticas. A imunidade – que também é um tipo exonerativo de tributos - é a explícita exclusão da possibilidade de o Estado tributar determinadas pessoas ou atividades.

68.Assim, o disposto no referido art. 6º, I, Lei 10.833/2003, reforça a tese de que a imunidade objeto da presente análise não alcança as contribuições da seguridade social, visto que houve a necessidade de lei específica para exonerar as receitas de exportação da COFINS. Se realmente fossem imunes, a lei não seria necessária, uma vez que a imunidade dispensa intervenção legislativa.

69.Por essas razões, a Fazenda Nacional sustenta que as contribuições sociais da seguridade social estão foram da imunidade concedida pelo art. 149, § 2º, I, da Constituição Federal.

70.Contudo, em favor do princípio da eventualidade, acaso o STF entenda que as contribuições da seguridade sejam apanhadas pela imunidade contida no art. 149, § 2º, I, CF, a Fazenda defende que somente as contribuições incidentes sobre a receita estariam no raio de alcance da aludida imunidade tributária.


VI. A RECEITA, O FATURAMENTO E O LUCRO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

71. É um truísmo afirmar que explicitar os significados dos termos constitucionais na solução de processos judiciais (casos concretos ou ações abstratas) seja uma das excelsas missões do Supremo Tribunal Federal.

72. A Constituição da República elenca no art. 195 as hipóteses de incidência das contribuições sociais da seguridade social:

"A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:

a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;

b) a receita ou faturamento;

c) o lucro;

II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;

III – sobre a receita de concursos de prognósticos;

IV – do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar."

73. Nos recentes julgamentos acerca da ampliação da base de cálculo da COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social e do PIS/PASEP – Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público, o STF confirmou o entendimento de que o faturamento é a receita bruta das vendas de mercadorias, de serviços ou de mercadoria e serviços (RREE 390.840, 346.084, 358.273 e 357.950, todos sob a respectiva redação e relatoria do Ministro MARCO AURÉLIO, J. 09.11.2005, DJ. 15.08.2006).

74. Tratava-se, na ocasião, da apreciação da constitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei n. 9.718/98:

"Entende-se por receita bruta a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas".

75. Segundo o STF, a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente do tipo de atividade por ela exercida e da classificação contábil adotada não configura faturamento (receita bruta), mas a receita, em sentido amplo.

76. O STF julgou inconstitucional o aludido § 1º, art. 3º, Lei 9.718/98, porque à época de sua edição o art. 195, I, "b", CF, não elencava a "receita" como base de cálculo de financiamento da seguridade social, mas tão-somente o "faturamento". E faturamento – recorde-se o julgamento do RE 150.755 (Redator Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 18.11.1992, DJ. 20.08.1993) – é a receita bruta da venda de mercadorias, serviços ou mercadorias e serviços.

76. O mesmo significado ao termo constitucional "faturamento" foi atribuído pelo STF no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 1 (Relator Ministro MOREIRA ALVES, J. 01.12.1993, DJ. 16.06.1995). Em seu voto, o Relator reafirma o conceito de faturamento estabelecido pela jurisprudência do STF:

"Note-se que a Lei Complementar n. 70/91, ao considerar o ‘faturamento como a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza’ nada mais fez que lhe dar a conceituação de faturamento para efeitos fiscais, como bem assinalou o eminente Ministro Ilmar Galvão, no voto que proferiu no RE 150.764, ao acentuar que a receita bruta das vendas de mercadorias e de mercadorias e serviços ‘coincide com o de faturamento, que, para efeitos fiscais, foi sempre entendido como o produto de todas as vendas, e não apenas das vendas acompanhadas de fatura, formalidade exigida tão-somente nas vendas mercantis a prazo (art. 1º da Lei 187/32)."

77. No julgamento dos reclamados RREE 390.840, 346.084, 358.273 e 357.950, o Ministro CEZAR PELUSO, em voto-vencedor, entendeu que o faturamento "se traduz na soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais". Com a costumeira clareza, disse Sua Excelência:

"Faturamento nesse sentido, isto é, entendido como resultado econômico das operações empresariais típicas, constitui a base de cálculo da contribuição, enquanto representação quantitativa do fato econômico tributado. Noutras palavras, o fato gerador constitucional da COFINS são as operações econômicas que se exteriorizam no faturamento (sua base de cálculo), porque não poderia nunca corresponder ao ato de emitir faturas, coisa que, como alternativa semântica possível, seria de todo absurda, pois bastaria à empresa não emitir faturas para se furtar à tributação."

78. Em seu percuciente voto, o Ministro CEZAR PELUSO demonstra que "receita" e "faturamento" são grandezas econômicas distintas:

"Ainda no universo semântico normativo, faturamento não pode soar o mesmo que receita, nem confundidas ou identificadas as operações (fatos) ‘por cujas realizações se manifestam essas grandezas numéricas’.

A Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/1976) prescreve que a escrituração da companhia "será mantida em registros permanentes,com obediência aos preceitos da legislação comercial e desta Lei e aos princípios de contabilidade geralmente aceitos" (art. 177), e, na disposição anterior, toma de empréstimo à ciência contábil os termos com que regula a elaboração das demonstrações financeiras, verbis:

Art. 176. Ao fim de cada exercício social, a diretoria fará elaborar com base na escrituração mercantil da companhia, as seguintes demonstrações financeiras, que deverão exprimir com clareza a situação do patrimônio da companhia e as mutações ocorridas no exercício:

I – balanço patrimonial;

II – demonstração dos lucros ou prejuízos acumulados;

III – demonstração do resultado do exercício; e

IV – demonstração das origens e aplicações de recursos.

Nesse quadro normativo, releva apreender os conteúdos semânticos ou usos lingüísticos que, subjacentes ao vocábulo receita, aparecem na seção relativa às "demonstrações do resultado do exercício". Diz, a respeito, o art. 187 daquela Lei:

Art. 187. A demonstração do resultado do exercício discriminará:

I – a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos e os impostos;

II – a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços vendidos e o lucro bruto;

III- as despesas com vendas, as despesas financeiras, deduzidas das receitas as despesas gerais e administrativas, e outras despesas operacionais;

IV – o lucro ou prejuízo operacional, as receitas e despesas não operacionais;

V – o resultado do exercício antes do Imposto de Renda e a provisão para o imposto;

VI – as participações de debêntures, empregados, administradores e partes beneficiárias, e as contribuições para instituições ou fundos de assistência ou previdência de empregados;

VII – o lucro ou prejuízo líquido do exercício e o seu montante por ação do capital social.

§ 1º. Na determinação do resultado do exercício serão computados:

a) as receitas e os rendimentos ganhos no período, independentemente da sua realização em moeda; e

Como se vê sem grande esforço, o substantivo receita designa aí o gênero, compreensivo das características ou propriedades de certa classe, abrangente de todos os valores que, recebidos da pessoa jurídica, se lhe incorporam à esfera patrimonial. Todo valor percebido pela pessoa jurídica, a qualquer título, será, nos termos da norma, receita (gênero). Mas nem toda receita será operacional, porque pode havê-la não operacional. Segundo o disposto no art. 187 da Lei nº 6.404/76, distinguem-se, pelo menos, as seguintes modalidades de receita:

i) receita bruta das vendas e serviços;

ii) receita líquida das vendas e serviços;

iii) receitas gerais e administrativas (operacionais);

iv) receitas não-operacionais.

Não precisa recorrer às noções elementares da Lógica Formal sobre as distinções entre gênero e espécie, para reavivar que, nesta, sempre há um excesso de conotação e um deficit de denotação em relação àquele. Nem para atinar logo em que, como já visto, faturamento também significa percepção de valores e, como tal, pertence ao gênero ou classe receita, mas com a diferença específica de que compreende apenas os valores oriundos do exercício da "atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços" (venda de mercadorias e de serviços). De modo que o conceito legal de faturamento coincide com a modalidade de receita discriminada no inc. I do art. 187 da Lei das Sociedades por Ações, ou seja, é "receita bruta de vendas e de serviços".

Donde, a conclusão imediata de que, no juízo da lei contemporânea ao início de vigência da atual Constituição da República, embora todo faturamento seja receita, nem toda receita é faturamento.

Esta distinção não é nova na Corte."

79. O Ministro CARLOS BRITTO, nesse mesmo julgamento da COFINS, trilha caminho similar ao identificar o faturamento como sinônimo de receita operacional. Disse Sua Excelência:

"Por isso, estou insistindo na sinonímia "faturamento" e "receita operacional", exclusivamente, correspondente àqueles ingressos que decorrem da razão social da empresa, da sua finalidade institucional, do seu ramo de negócio, enfim.

Logo, receita operacional é receita bruta de tais vendas ou negócios, mas não incorpora outras modalidades de ingresso financeiro: royalties, aluguéis, rendimentos de aplicações financeiras, indenizações etc."

80. Assim, à luz da jurisprudência tradicional, mansa, pacífica, dominante e assentada do Excelso Supremo Tribunal Federal, receita e faturamento correspondem a grandezas econômicas distintas e que ensejam tratamentos fiscais diferenciados.

81. Receita, segundo o STF,designa o gênero, compreensivo das características ou propriedades de certa classe, abrangente de todos os valores que, recebidos da pessoa jurídica, se lhe incorporam à esfera patrimonial. Todo valor percebido pela pessoa jurídica, a qualquer título, será, nos termos da norma, receita (gênero).

82. Faturamento, segundo o STF, também significa percepção de valores e, como tal, pertence ao gênero ou classe receita, mas com a diferença específica de que compreende apenas os valores oriundos do exercício da "atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços" (venda de mercadorias e de serviços).

83.Por força do reconhecimento de que "receita" e "faturamento" são grandezas econômicas distintas, o STF julgou inconstitucional a ampliação da base de cálculo da COFINS, estabelecida pelo art. 3º, § 1º, Lei n. 9.718/98.

84. A terceira grandeza econômica merecedora de significação constitucional para efeitos tributários é o "lucro".

85. No julgamento do imperecível RE 138.284, o Relator Ministro CARLOS VELLOSO confirmou o que estava estabelecido no texto constitucional ao dizer que a hipótese de incidência da CSLL é o lucro. Aduziu Sua Excelência:

"A consistência da hipótese de incidência, ou a consistência do lucro, a sua base de cálculo, está definida no art. 2º, como sendo ‘o valor do resultado do exercício’. Os parágrafos 1º e 2º do mencionado artigo estabelecem regras para o cálculo desse resultado".

....

"É que o lucro, apurado no dia 31 de dezembro, é o resultado de diversos negócios jurídicos realizados durante o exercício, 1º de janeiro a 31 de dezembro. A incidência é sobre esse lucro, que é o saldo positivo de entradas e de saídas, de fatos ocorridos durante o exercício."

86. O "leading case" da CSLL foi o RE 146.733 (Relator Ministro MOREIRA ALVES, J. 29.06.1992, DJ. 06.11.1992), julgamento no qual o STF reconheceu constitucionalmente válidos, no que nos interessa imediatamente, os arts. 1º, 2º e o 9º, da Lei n. 7.689/1988, que têm os respectivos enunciados:

"Fica instituída contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas, destinada ao financiamento da seguridade social".

"A base de cálculo da contribuição é o valor do resultado do exercício, antes da provisão para o Imposto de Renda".

"Ficam mantidas as contribuições previstas na legislação em vigor, incidentes sobre a folha de salários e a de que trata o Decreto-Lei n. 1.940, de 25 de maio de 1982, e alterações posteriores, incidente sobre o faturamento das empresas, com fundamento no art. 195, I, da Constituição Federal".

87. O STF reconheceu que "faturamento" e "lucro" são grandezas econômicas distintas, e que ambos podem ser objetos específicos de contribuições sociais da seguridade social, a COFINS e a CSLL, respectivamente.

88. Nada obstante o julgamento do RE 150.764 (Redator Ministro MARCO AURÉLIO, J. 16.12.1992, DJ 02.04.1993) que decretou a inconstitucionalidade do referido art. 9º da Lei n. 7.689/88, mas contextualizado ao FINSOCIAL, sem, contudo, negar a dualidade entre "faturamento" e "lucro" como hipóteses de incidência distintas e sujeitas a contribuições sociais diversas, como restou assentado pelo STF ao reconhecer válida a COFINS (faturamento) e a CSLL (lucro).

89. Relembre-se que a Emenda Constitucional n. 20/98 deu nova redação ao art. 195, I, "b", CF, e a Lei n. 10.833/2003 tornou possível a "receita" como hipótese de incidência da COFINS. Nessa trilha, segundo a jurisprudência do STF, receita, faturamento e lucro são grandezas econômicas diversas que podem ensejar específicas contribuições sociais da seguridade social.

90.A base de cálculo da CSLL é o lucro da pessoa jurídica, como prescrito na Constituição e na Lei n. 7.689/88. Esse lucro é apurado antes da provisão do imposto de renda da pessoa jurídica, como reconhecido nos aludidos RREE 138.284 e 146.733.

91. Sobre essa "identidade" de base de cálculo e de técnica de apuração entre a CSLL e o IRPJ, o entendimento manifestado pelo Ministro ILMAR GALVÃO, no RE 146.733:

"Irrelevante, igualmente, para tanto, a circunstância de a sua cobrança e fiscalização serem realizadas pelos agentes encarregados do Imposto de Renda. Está mais do que claro que a lei não quis transferir para a ‘caixa única’ do Tesouro Nacional o produto da arrecadação da contribuição social, ao incumbir a Receita Federal de administrar e fiscalizar o tributo. O que, razoavelmente, se deve entender é que cabe aos agentes da Receita Federal disciplinar e realizar os lançamentos pertinentes, fiscalizando as empresas, a fim de evitar sonegações e retardamentos nos recolhimentos. Enfim, obviou-se a duplicidade de meios com vistas à arrecadação dos dois tributos, já que têm eles, praticamente, fonte de referência comum, seja, o balanço anual das empresas. A Constituição não veda essa providência posta em prática no prol do interesse público."

92. Nessa senda, o lucro base de cálculo da CSLL é a renda da pessoa jurídica base de cálculo do IRPJ, com as nuanças específicas de cada um desses tributos.

93. No julgamento do RE 201.456 (Redator Ministro NELSON JOBIM, J. 02.05.2002, DJ. 17.10.2003), o STF entendeu que o conceito de renda, para efeitos tributários, é eminentemente legal. Segundo o Ministro NELSON JOBIM, "o conceito de lucro real tributável é puramente legal e decorrente exclusivamente da lei, que adota a técnica da enumeração taxativa".

94. Nada obstante, em termos de essência, a Corte entendeu que "renda pressupõe acréscimo patrimonial ou a disponibilidade jurídica ou econômica".

95. No RE 200.844 (Relator Ministro CELSO DE MELLO, J. 25.06.2002, DJ 16.08.2002), a Suprema Corte reafirmou o decidido no aludido RE 201.465, quanto ao conceito de renda (lucro). Eis elucidativa passagem do voto do Ministro CELSO DE MELLO:

"O Supremo Tribunal Federal, ao examinar a ratio subjacente ao art. 3º, n. I, da Lei n. 8.200/91, cuja eficácia veio a ser revigorada pela Lei n. 8.682/93 (art. 11), e ao manifestar-se a respeito do benefício em referência, cuja outorga foi motivada, unicamente, por razões de política legislativa, deixou assentado, no tema (a) que o diferimento previsto na regra legal mencionada – que traduz mero "favor legis" – não consubstancia hipótese configuradora de empréstimo compulsório, rejeitando, por incabível, a incidência do disposto no art. 148, caput, da Constituição e (b) que o conceito normativo de renda (e de lucro real) representa noção revestida de caráter simplesmente legal, cabendo, ao legislador comum, definir-lhe o conteúdo e delinear-lhe o sentido, desde que observados – como no caso o foram - critérios de razoabilidade, em estrita consonância com os padrões fundados no princípio da proporcionalidade."

96. Nessa perspectiva, é na legislação do IRPJ e da CSLL que se encontra o significado de renda (lucro) acolhido pelo STF.

97. Dessa sorte, nos termos do art. 247 do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto n. 3.000/99):

"o lucro real é o lucro líquido do período de apuração ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas pela legislação fiscal, com a observância da legislação comercial".

98. Quanto a CSLL é dizer que são contribuintes todas as pessoas jurídicas domiciliadas no País e as que lhe são equiparadas pela legislação do imposto sobre a renda. A sua base de cálculo é o lucro líquido do período de apuração antes da provisão do IRPJ.

99. Certeiro é o conceito de lucro, base de cálculo da CSLL, enunciado pelo Ministro CEZAR PELUSO na AC 1.738, malgrado o entendimento – precário e cautelar - contrário à tese fazendária:

"Não deixa dúvida a respeito de sua natureza, a conceituação do lucro, qualquer que seja o fim que se considere, fiscal, contábil, ou econômico. A CSLL incide sobre o resultado do exercício, ajustado por adições e exclusões previstas no art. 2º, § 1º, ‘c’, da Lei federal n. 7.689/88. Mas esse lucro nada mais é do que o resultado positivo do exercício, ou seja, o valor das receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não-operacionais:..."

100. É de ver, pois, de modo insistente, que receita, faturamento e lucro recebem do STF significações específicas, conquanto estejam "umbilicalmente" relacionadas visto que a receita é a fonte da qual decorre o faturamento que é fonte da qual decorre o lucro.

101. Recordem-se esses específicos significados:

101.1. Receita: todo valor percebido pela pessoa jurídica, a qualquer título, será, nos termos da norma, receita (gênero).

101.2. Faturamento: compreende apenas os valores oriundos do exercício da "atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços" (venda de mercadorias e de serviços).

101.3. Lucro: o resultado positivo do exercício, ou seja, o valor das receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não-operacionais.

102. É fora de toda a dúvida que o legislador constituinte (originário ou derivado) atribuiu a essas três grandezas econômicas distintas conseqüências tributárias diversas. A jurisprudência do STF, como demonstrado, tem sido fiel testemunha da "vontade" da Constituição: tributações específicas sobre citadas grandezas econômicas distintas: a receita, o faturamento e o lucro.

103. Nessa perspectiva, assim como o texto constitucional estabeleceu tributação diferenciada para cada uma das mencionadas grandezas (receita, faturamento e lucro), com tributos específicos para cada uma delas, o mesmo sucede em relação à exoneração tributária.

104. Ou seja, à luz do texto constitucional não é possível estender, salvo expressa determinação constitucional, às demais grandezas econômicas as eventuais exonerações tributárias concedidas a outra e determinada grandeza, visto que cada uma delas possui um regime jurídico peculiar e distintivo das demais.


VII. AS MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

105. A CPMF – Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira foi instituída pela Emenda Constitucional n. 12, de 15.08.1996, e teve sua vigência prorrogada até 31.12.2007, por força do disposto na Emenda Constitucional n. 42, de 19.12.2003. É cediço que desde 1º de janeiro de 2008 a CPMF deixou de existir juridicamente.

106. A hipótese de incidência da CPMF, nos termos enunciados pela EC 12/96, "é a movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira".

107. A regulamentação infraconstitucional da CPMF foi exercida pela Lei n. 9.311, de 24.12.1996.

108. O parágrafo único, art. 1º, Lei 9.311/96, dispunha:

"Considera-se movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira qualquer operação liquidada ou lançamento realizado pelas entidades referidas no art. 2º, que representam circulação escritural ou física de moeda, e de que resulte ou não transferência da titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos".

109. O fato gerador foi disposto no art. 2º da citada Lei 9.311/96:

Art. 2° O fato gerador da contribuição é:

I - o lançamento a débito, por instituição financeira, em contas correntes de depósito, em contas correntes de empréstimo, em contas de depósito de poupança, de depósito judicial e de depósitos em consignação de pagamento de que tratam os parágrafos do art. 890 da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, introduzidos pelo art. 1° da Lei n° 8.951, de 13 de dezembro de 1994, junto a ela mantidas;

II - o lançamento a crédito, por instituição financeira, em contas correntes que apresentem saldo negativo, até o limite de valor da redução do saldo devedor;

III - a liquidação ou pagamento, por instituição financeira, de quaisquer créditos, direitos ou valores, por conta e ordem de terceiros, que não tenham sido creditados, em nome do beneficiário, nas contas referidas nos incisos anteriores;

IV - o lançamento, e qualquer outra forma de movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira, não relacionados nos incisos anteriores, efetuados pelos bancos comerciais, bancos múltiplos com carteira comercial e caixas econômicas;

V - a liquidação de operação contratadas nos mercados organizados de liquidação futura;

VI - qualquer outra movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira que, por sua finalidade, reunindo características que permitam presumir a existência de sistema organizado para efetivá-la, produza os mesmos efeitos previstos nos incisos anteriores, independentemente da pessoa que a efetue, da denominação que possa ter e da forma jurídica ou dos instrumentos utilizados para realizá-la.

110. A CPMF se encarta na categoria de contribuição social da seguridade social pela destinação constitucional de sua arrecadação. Inicialmente, estabeleceu a EC 12/96, o produto da arrecadação foi destinado integralmente ao Fundo Nacional de Saúde, para financiamento das ações e serviços de saúde.

111. A Emenda Constitucional n. 21, de 18.03.1999, que prorrogou a cobrança da CPMF, aumentando-lhe a respectiva alíquota, determinou que o "resultado aumento da arrecadação", decorrente da modificação da alíquota, seria destinada ao custeio da previdência social.

112. A Emenda Constitucional n. 37, de 12.06.2002, prorrogadora da cobrança da CPMF, manteve as citadas destinações constitucionais (saúde e previdência) e adicionou o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (assistência social) como destinatário do produto de arrecadação da cogitada contribuição. Ou seja, a CPMF atendia aos três "braços" da seguridade social: a saúde, a previdência e a assistência social. Indiscutível a sua qualidade de contribuição social da seguridade social. Inquestionável, nessa linha, o seu caráter de contribuição social da seguridade social.

113. O antecedente remoto da CPMF foi o IPMF – imposto provisório sobre as movimentações financeiras instituído pela Emenda Constitucional n. 3/93, regulamentado pela Lei Complementar n. 77/93.

114. Esse referido imposto foi judicialmente questionado perante o Supremo Tribunal Federal nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 939 (Relator Ministro SYDNEY SANCHES, J. 15.12.1993, DJ. 18.03.1994) que decretou a inconstitucionalidade parcial da legislação instituidora do IPMF, em acórdão cuja ementa restou vazada nos seguintes termos:

EMENTA:

1.Direito Constitucional e Tributário. Ação Direta de Inconstitucionalidade de Emenda Constitucional e de Lei Complementar. I.P.M.F. Imposto Provisório sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira - I.P.M.F. Artigos 5., par. 2., 60, par. 4., incisos I e IV, 150, incisos III, "b", e VI, "a", "b", "c" e "d", da Constituição Federal. 1. Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação a Constituição originaria, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua e de guarda da Constituição (art. 102, I, "a", da C.F.).

2. A Emenda Constitucional n. 3, de 17.03.1993, que, no art. 2., autorizou a União a instituir o I.P.M.F., incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no parágrafo 2. desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica "o art. 150, III, "b" e VI", da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutáveis (somente eles, não outros): 1. - o princípio da anterioridade, que e garantia individual do contribuinte (art. 5., par. 2., art. 60, par. 4., inciso IV e art. 150, III, "b" da Constituição); 2. - o princípio da imunidade tributaria recíproca (que veda a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que e garantia da Federação (art. 60, par. 4., inciso I,e art. 150, VI, "a", da C.F.); 3. - a norma que, estabelecendo outras imunidades impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre: "b"): templos de qualquer culto; "c"): patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; e "d"): livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão;

3. Em conseqüência, e inconstitucional, também, a Lei Complementar n. 77, de 13.07.1993, sem redução de textos, nos pontos em que determinou a incidência do tributo no mesmo ano (art. 28) e deixou de reconhecer as imunidades previstas no art. 150, VI, "a", "b", "c" e "d" da C.F. (arts. 3., 4. e 8. do mesmo diploma, L.C. n. 77/93). 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente, em parte, para tais fins, por maioria, nos termos do voto do Relator, mantida, com relação a todos os contribuintes, em caráter definitivo, a medida cautelar, que suspendera a cobrança do tributo no ano de 1993.

115. O julgamento da citada ADI 939 foi emblemático, porquanto discutiu-se o tema da "validade jurídica de Emenda Constitucional" e a sindicância judicial dos atos normativos do poder constituinte derivado.

116. Naquela oportunidade, como dito, Tribunal acolheu, parcialmente, a impugnação e decretou a inconstitucionalidade dos dispositivos da EC 3/93 e da LC 77/93 que desrespeitaram o princípio da anterioridade (art. 150, III, "b", CF) e as imunidades tributárias constantes no texto constitucional (art. 150, VI, CF).

117. Ou seja, a Suprema Corte chancelou a tributação da "movimentação ou transmissão de valores e créditos e direitos de natureza financeira", reconhecendo a autonomia conceitual e normativa dessa hipótese de incidência tributária.

118. Nada obstante o reconhecimento da validade constitucional do IPMF, a União Federal, por meio do Congresso Nacional, no uso de sua competência de poder constituinte derivado, instituiu a cogitada CPMF, via mencionada EC 12/96. A movimentação financeira deixou de ser tributada por um imposto e passou a ser hipótese de incidência de uma contribuição social.

119. A referida EC 12/96, instituidora da CPMF, sofreu ataque judicial perante a Suprema Corte por meio das ADINs 1.497 e 1501.

120. No julgamento das Medidas Cautelares nas ADINs 1.497 e 1.501 (Relator Ministro MARCO AURÉLIO, J. 09.10.1996, DJ. 13.12.2002), a Corte manteve incólume a CPMF. As ementas dos acórdãos têm idêntico teor:

TRIBUTO - CONTRIBUIÇÃO - CPMF - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 12/96 - INCONSTITUCIONALIDADE - EC 12/96. Na dicção da ilustrada maioria, não concorre, na espécie, a relevância jurídico-constitucional do pedido de suspensão liminar da Emenda Constitucional nº 12/96, no que prevista a possibilidade de a União vir a instituir a contribuição sobre a movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira, sem a observância do disposto nos artigos 153, § 5º, e 154, inciso I da Carta Federal. Relator vencido, sem o deslocamento da redação do acórdão.

121. O STF confirmou o entendimento já manifestado em relação ao IPMF (ADI 939), no sentido da possibilidade de instituição de tributo, no caso específico contribuição social, sobre "as movimentações financeiras", haja vista, recorde-se, a autonomia conceitual e normativa dessa referida hipótese de incidência em face das outras hipóteses de incidências constantes no texto constitucional.

122. Ou seja, segundo o STF, "as movimentações financeiras" seriam hipóteses de incidências idôneas para a instituição de tributos, no caso específico, de uma contribuição social para a seguridade social.

123. As outras Emendas Constitucionais (21 e 37) que prorrogaram a cobrança da CPMF, ou aumentaram sua alíquota, também foram impugnadas perante o STF (ADINs 2.031, 2.666, 2.673 e 3.271), mas, no que importa, não lograram êxito no sentido de que fosse reconhecida pela Suprema Corte a inconstitucionalidade de tributo (contribuição social) incidente sobre "as movimentações financeiras" dos contribuintes, reforce-se.

124. De sorte que, na presente controvérsia, deve-se reconhecer a autonomia conceitual e normativa das seguintes hipóteses de incidências tributárias: receita, lucro e movimentação financeira.

125. Daí que cada uma dessas referidas hipóteses de incidência (receita, lucro e movimentação financeira) tem uma específica contribuição social expressa e distintamente estabelecida no texto constitucional, porquanto cada uma delas tem significação, para efeitos tributários, distinta e peculiar, conseqüentemente, inconfundíveis. A saber:

125.1. RECEITA: todo valor percebido pela pessoa jurídica, a qualquer título, será, nos termos da norma, receita (gênero).

125.2. LUCRO: o resultado positivo do exercício, ou seja, o valor das receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não-operacionais.

125.3. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA: a operação liquidada ou lançamento realizado pelas entidades financeiras, que representam circulação escritural ou física de moeda, e de que resulte ou não transferência da titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos.

126. Com espeque nos textos constitucional e legal, em face da receita, têm-se as contribuições securitárias do PIS e da COFINS. Em face do lucro há a CSLL. E, por fim, em face das "movimentações financeiras" havia a CPMF. Ou seja, contribuições e hipóteses de incidências inconfundíveis e com plena autonomia normativa e conceitual.

127. Isso significa que, nos aspectos constitucionais tributários, os termos "receita", "lucro" e "movimentação financeira", têm significações distintas e conseqüências tributárias diversas e inconfundíveis, repita-se à exaustão.

128. Portanto, o regime constitucional tributário relacionado à "receita" não alcança os regimes constitucionais tributários relacionados ao "lucro" ou às "movimentações financeiras". Cada uma dessas mencionadas hipóteses de incidência, nunca é demais relembrar, tem seu privativo estatuto jurídico.


VII. AS EXONERAÇÕES TRIBUTÁRIAS DA SEGURIDADE SOCIAL NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

129. A exoneração tributária significa a ausência da obrigação de pagar o tributo, ensina SACHA CALMON NAVARRO COELHO (Teoria Geral do Tributo e da Exoneração Tributária, RT, p. 118).

130. Segundo o consagrado autor, há vários tipos exonerativos, e os mais costumeiros são: a imunidade, a isenção, a não-incidência e a alíquota-zero. Para cada um desses tipos de exoneração tributária, o sistema jurídico-normativo atribui características próprias, e a jurisprudência do STF, no particular, empresta soluções específicas.

131. De grande força simbólica foi o julgamento do RE 227.832 (Relator Ministro CARLOS VELLOSO, J. 01.07.1999, DJ 28.06.2002) no qual o STF entendeu legítima a incidência da COFINS sobre o faturamento da empresa, em uma interpretação harmônica entre o § 3º do art. 155, CF, e o caput do art. 195, CF, com redações anteriores às Emendas Constitucionais 20/1998 e 33/2001.

132. Cuidava-se, na espécie, de ação na qual se postulava a imunidade à COFINS em face das operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais, por força do disposto no § 3º, art. 155, CF, na redação dada pela EC n. 3/1993:

"À exceção de impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro tributo poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País".

133. A questão constitucional controvertida estava em saber se a expressão "nenhum outro tributo" alcançava a COFINS incidente sobre o faturamento das pessoas jurídicas que tinham as aludidas atividades empresariais.

134. Nada obstante a expressão "nenhum outro tributo" e o reconhecimento de que a COFINS fosse um tributo, o STF entendeu, mediante uma redução teleológica, interpretar o termo "tributo" como "imposto", em consonância com os princípios constitucionais que irradiam do sistema da seguridade social.

135. Em seu voto, o Ministro Relator (CARLOS VELLOSO) recordou, de modo contundente, que quando a Constituição desejou conceder imunidade no tocante às contribuições sociais foi expressa: § 7º do art. 195: "são isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei".

136. O eminente Relator se fiou em sentença lavrada por SACHA CALMON NAVARRO COELHO, outrora Juiz Federal, que em análise ao § 3º, art. 155, CF, enunciou:

"Dizer que o art. 155, § 3º, da CF, barra as contribuições parafiscais, mormente as sociais, seria o mesmo que dizer dispensados da mantença da seguridade social e das contribuições do art. 149 da Carta, as empresas de mineração, as concessionárias de energia elétrica, a indústria e o comércio de combustíveis e lubrificantes líquidos e gasosos, o que seria um absurdo lógico, altamente atentatório aos princípios da capacidade contributiva (art. 145, § 1º) e da igualdade tributária (art. 150, II), sem falar no art. 195, caput, da CF que defere a todos o dever de contribuir para a seguridade social".

137. Em passagem extremamente didática o Ministro CARLOS VELLOSO indicou as linhas se seu raciocínio jurídico:

"Ora, a interpretação puramente literal e isolada do § 3º do art. 155 da Constituição levaria ao absurdo, conforme linhas atrás registramos, de ficarem excepcionadas do princípio inscrito no art. 195, caput, da mesma Carta – ‘a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei...’ – empresas de grande porte, as empresas de mineração, as distribuidoras de derivados de petróleo, as distribuidoras de eletricidade e as que executam serviços de telecomunicações – o que não se coaduna com o sistema da Constituição, e ofensiva, tal modo de interpretar isoladamente o § 3º do art. 155, a princípios constitucionais outros, como o da igualdade (CF, art. 5º e art. 150, II) e da capacidade contributiva. Não custa reiterar a afirmativa de que a Constituição, quando quis excepcionar o princípio inscrito no art. 195, fê-lo de forma expressa, no § 7º do mesmo art. 195."

138.Daí que, segundo o Ministro CARLOS VELLOSO, em termos de seguridade social, as exonerações tributárias são específicas e excepcionais.

139. Outro voto que merece ser visitado foi o proferido pelo Ministro NELSON JOBIM que adentrou a seara jurídico-contábil no qual analisa a incidência do ICMS (sobre o valor da venda), bem como o alcance das expressões "operações relativas" e "tributos" contidas no referido § 3º, art. 155, CF.

140. No tocante à imunidade tributária da seguridade social, o Ministro JOBIM asseverou:

"A Constituição tem imunidade específica. Ela atendeu a sua preocupação quando disse, no § 7º, que são isentos de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes. Lá ela tratou do que tinha de tratar, e no lugar próprio".

141.Para chegar à conclusão de que a COFINS não está fora da incidência das aludidas "operações", o Ministro JOBIM reconstrói os significados e as repercussões jurídicas dos termos "receita bruta", "lucro bruto", "receitas financeiras", "receitas operacionais", "faturamento" e "lucro líquido".

142. A despeito de cuidar da COFINS, o Ministro JOBIM analisa a CSLL das empresas de mineração e a base de cálculo deste aludido tributo: o lucro líquido. Conquanto seja longa, a lição do Ministro Jobim vem a cavalheiro e explicita exaustivamente a operacionalização da incidência da CSLL sobre o lucro das pessoas jurídicas (fls. 1006-1009 do acórdão do RE 227.832):

"Na receita bruta de uma empresa mineral que, exclusivamente, opera com mineral, para tirarmos fora aquilo que, efetivamente, não é pedido, ou seja, receitas fora da área mineral, pergunto: teríamos a receita bruta, que seria de quê? A venda do produto, os resultados operacionais dele. No final, descontaríamos deste resultado operacional do produto para apurarmos as receitas líquidas, que é conceito técnico. Abateríamos o quê? Vendas canceladas, descontos incondicionais, impostos incidentes sobre vendas, que são descontados: ICMS, imposto de exportação, ISS, PIS. Faturamento da COFINS também é descontado, aí teríamos o conceito de receita líquida, que é o conceito legal.

Depois da receita líquida temos que abater, ainda, o custo dos produtos da aplicação própria. Os custos das mercadorias revendidas, o custo de serviços vendidos e chegamos a um outro conceito, que é o de lucro bruto. Vejam, esse conceito, que é o terceiro, partiu de quê? Da venda do mineral. Aí, no conceito de lucro bruto, ganhos apurados em razão de variações monetárias, decorrentes da atualização do direito de crédito, calculados com base em índices ou coeficientes aplicáveis por disposição legal. Incluo, ainda, outras receitas financeiras, que seriam ganhos líquidos, para chegar ao imposto de renda, auferidos ao mercado de venda, variável, receita de juros sobre capitais e outras; incluo, ainda, no conceito de lucro bruto, outras receitas operacionais, resultados positivos em participações societárias, dividendos, etc. Abato, desses números, despesas operacionais, gastos estruturais e gerais necessários à atividade da empresa, variações monetárias passivas e outras operações financeiras.

Estou chegando ao cálculo para a incidência de diversos tributos e contribuições, como é que se calcula isso. Eu parti de receita bruta, cheguei ao conceito de receita líquida. Logo após, cheguei ao conceito de lucro bruto. Depois, cheguei ao conceito de lucro operacional, que são tributos técnicos. Ao lucro operacional, a que estou chegando, somo as receitas não operacionais e deduzo as despesas não operacionais. Aí, chegou a um outro conceito, para efeito de imposto de renda, que é o resultado do período básico. Deste resultado do período básico, tenho que abater participação em debêntures, participação de empregados, participação de administradores e partes beneficiárias, contribuições para assistência e previdência de empregados, chegando ao lucro líquido sobre o qual incide a contribuição sobre o lucro líquido. Sobre este valor, incide oito por cento para as empresas reais e dezoito por cento para as pessoas jurídicas, ou seja, temos, aqui, o lucro deste cálculo que é a base de cálculo da contribuição sobre o lucro líquido.

Para chegar ao lucro líquido base da contribuição social sobre o lucro líquido, parti de onde? Dos resultados das operações e vendas da empresa. Ele vendeu, negociou com o minério de mercado, e teve um resultado de lucro líquido. Não incidiria, portanto, a valer o raciocínio, a contribuição sobre o lucro líquido. Se o raciocínio fosse verdadeiro, não teríamos a possibilidade de cobrar contribuição social sobre o lucro líquido de empresas, na parte correspondente aos valores originários da atividade de mineração ou de telecomunicações.

Depois de apurado esse lucro líquido, deduzo a alíquota, o valor devido da contribuição social para chegar a um outro conceito de lucro líquido, o lucro ‘b’, que é o lucro líquido básico menos o pago para a contribuição social. Ainda abato a provisão do imposto de renda, nos balanços da empresa, e chego ao lucro líquido do período-base, que é o lucro contábil, que ainda, não é o lucro tributário. Somo a estes valores, ainda, custos, soma de parcelas não dedutíveis, despesas operacionais, enfim, uma série de valores. Excluo, também, uma série de valores: lucro sobre a exploração correspondente a exportações incentivadas –

inclusive discutimos este assunto, aqui, do BEFIEX -, resultado não tributável das sociedades cooperativas e chego, portanto, a um terceiro tipo de lucro, que é o lucro real, antes da compensação de prejuízos.

Vou trabalhar a compensação de prejuízo. O que abato? Compenso prejuízos fiscais do próprio período-base: atividades geral ou rural. Chego a um outro conceito, que é o lucro real após a compensação dos prejuízos do próprio período-base. Ainda tem que bater outras compensações. Quais são? Compensação dos prejuízos fiscais de períodos bases anteriores, atividades gerais, rurais etc., para se chegar ao lucro real.

Se esta empresa só tem operação de minério, só tem negócios em telecomunicações e combustíveis, ela não paga imposto de renda? Ao final, o resultado final do lucro real nada mais é do que operação básica, que está isenta.

....

Sr. Presidente, concluindo, procurei demonstrar – espero ter feito – que tudo o que diz respeito a tributos, impostos ou contribuições de qualquer natureza que incidam sobre empresas que operam com energia elétrica, serviço de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais, no País, têm como base um resultado financeiro decorrente dessa atividade: a venda de energia elétrica, os serviços de telecomunicações e derivados de petróleo.

Será que precisamos dar às ‘operações relativas a energia elétrica’ o conceito pretendido nesse recurso, ou seja, o conceito de que esteja imune não só a operação como também o resultado dessa operação, que é exatamente o valor financeiro decorrente dessa atividade? É isso que estamos discutindo? Será que esse conceito de operação financeira inclui também o resultado dessa operação? Se incluirmos dentro do conceito de operação financeira o resultado, teremos que assumir a responsabilidade de que só incidirão o ICM, o imposto de exportação e de importação. Não incidiria o Imposto de Renda, a COFINS, o PIS, a contribuição sobre o lucro líquido, nada disso incidiria porque estaríamos na base de todo o cálculo, ou seja, no início estaríamos com a base das operações.

Corre o risco o Ministro Sepúlveda Pertence de pensar que a expressão ‘derivados de petróleo’ vai acabar estourando eventualmente nesses tecidos modernos, que são todos derivados de petróleo, ou seja, em relação aos pólos industriais de polietileno e outros que são derivados de petróleo. Pretendo propor, no exame do meu voto, a análise das conseqüências que isso está nos levando. Há necessidade de se entender, então – aqui vem o ponto – o que contém a expressão ‘operações’. Operações no sentido de incluir seus resultados, ou não? Esse é o ponto fundamental. Se incluirmos, dentro do conceito de operação, os seus resultados, teríamos que incluir os outros tributos, porque ao fim e ao cabo, conforme foi demonstrado claramente, na composição da renda do lucro tributável de uma pessoa jurídica que só opera com mineração, estaria contido sempre na base a venda de energia elétrica, ou estaria sempre originário disso, logo, seria decorrente de operação. Mas como isso não é admissível, porque a demonstração absurda mostra a falsidade da interpretação extensiva, a interpretação teria que ser restritiva, no sentido de que operações relativas a energia elétrica ou a essas atividades não incluam os seus resultados, já que seus resultados são base de outros tributos."

143. A longa exposição do Ministro JOBIM se amolda à questão objeto do presente recurso extraordinário, sendo extremamente atuais as graves advertências quanto às conseqüências de enxergar uma imunidade total em relação a todas as contribuições sociais (gerais e da seguridade social) que incidam sobre as pessoas jurídicas que tenham a exportação como objeto de sua atividade empresarial típica.

144. Ainda em sede do RE 227.832, em debates envolvendo os Ministros MOREIRA ALVES, SEPÚLVEDA PERTENCE, CARLOS VELLOSO, MARCO AURÉLIO e NELSON JOBIM, acerca de inclusão ou não do "faturamento" dentro do termo "operação", o Ministro MOREIRA ALVES entendeu que o "faturamento" era uma etapa da "operação" e se é uma etapa da "operação", "operação" o faturamento é.

145. O Ministro CARLOS VELLOSO redargüiu a essa referida conclusão (ou premissa naquele caso) do Ministro MOREIRA ALVES recordando que:

"A lei escolheu como fato gerador, o faturamento, certo que a operação pode ser uma etapa do faturamento, mas não é faturamento. Em termos econômicos, há relevância, mas temos de considerar a hipótese de incidência sob o ponto de vista jurídico, e uma coisa é distinta da outra, eminente Ministro."

146. Em seu voto no multimencionado RE 227.832, o Ministro ILMAR GALVÃO trouxe à baila a nova redação do art. 195, CF, nos termos da Emenda Constitucional n. 20/1998 que incluiu a "receita" como nova hipótese de incidência, além das existentes "faturamento" e "lucro", de modo que a partir de então cada uma dessas hipóteses de incidência teriam concepções próprias. E, conseqüentemente, repercussões tributárias diversas.

147. Ao final do julgamento, o STF entendeu que a expressão "tributo", contida na redação do dispositivo constitucional controvertido, não alcançava as contribuições sociais da seguridade social, em particular a COFINS e que, em se tratando de exoneração tributária da seguridade social, havia – como há - expressa cláusula constitucional (art. 195, § 7º, CF), visto que nessa seara as exonerações deveriam ser excepcionais e interpretadas restritivamente, em homenagem ao mandamento constitucional da universalidade dos contribuintes (art. 195, caput).

148. A compreensão externada pelo Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE no julgamento da ADI 1.441 (Relator Ministro OCTÁVIO GALLOTTI, J 28.06.1996, DJ 18.10.1996) revela o destaque especial que as contribuições sociais da seguridade social sempre mereceram do STF:

"Contribuição social é um tributo fundado na solidariedade social de todos para financiar uma atividade estatal complexa e universal, como é a da Seguridade".

149.Nessa perspectiva, é de se reconhecer que para o STF, qualquer exoneração tributária relativa às contribuições da seguridade social deve ser restritiva, direta e específica, interpretando-a a partir dos superiores interesses protegidos pela seguridade social (saúde, previdência e assistência).

150.Nada obstante, nos autos da Ação Cautelar n. 1.738, sob a relatoria do Ministro CEZAR PELUSO, o STF concedeu efeito suspensivo ao respectivo RE 558.989. O eminente Relator aduziu:

"É que o lucro, como entidade e vantagem provinda das receitas de exportação, não pode ser atingido, de maneira transversa, por nenhuma contribuição social, vedada, que está, a incidência desta sobre aquelas. Se se não pode tributar o mais (a receita), a fortiori não se poderia gravar o menos (o lucro).

....

Não precisa, pois, grande esforço por ver, logo, que o preceito da imunidade tende a excluir toda receita decorrente de exportação à incidência de quaisquer contribuições sociais e da CIDE...

....

Entendimento que se prefigura acertado é, pois, o de que a norma não se predestina a imunizar as receitas de exportação apenas das contribuições incidentes sobre a receita, mas, sim, de contribuições sociais em geral e da CIDE, como, com todas as letras, consta do § 2º, inc. I...

....

Do exposto, defiro a liminar, para suspender, até a decisão definitiva do recurso extraordinário a que se refere esta ação, a eficácia do acórdão impugnado, determinando que se abstenha a autoridade fazendária de exigir CSLL sobre todas as grandezas específicas que decorram de receitas de exportação. – sublinhamos.

151.A mencionada compreensão foi explicitada em um juízo cautelar e precário. Em que pese a força dos argumentos e a respeitabilidade de seus emissores, a Fazenda Nacional demonstrará o equívoco, venia concessa, das premissas e das conclusões dos que enxergam as "receitas decorrentes de exportação" exoneradas do recolhimento da CSLL. E, no presente caso, além da CSLL, da CPMF.

152. Isso porque, com a devida vênia, essa interpretação escancarada da não-incidência das contribuições sociais da seguridade social não respeita o "espírito" da Constituição em sede tributária e, em particular, da Seguridade Social, que tem na "solidariedade universal" a pedra angular do sistema contributivo, como tem acentuado a jurisprudência do STF.

153.A despeito do entendimento fazendário no sentido de que as contribuições da seguridade estejam fora do alcance da cogitada imunidade, vez mais, em homenagem ao princípio da eventualidade, se pugnará pela normal incidência tanto da CSLL quanto da CPMF.


VIII. A CSLL E A CPMF E A IMUNIDADE DAS RECEITAS DECORRENTES DE EXPORTAÇÃO

154.De efeito, a decorrência lógica da exclusão das contribuições sociais da seguridade social do alcance da aludida imunidade tributária é a prejudicialidade da discussão acerca da incidência ou não-incidência da CSLL e da CPMF nos lucros e movimentações financeiras auferidos das receitas de exportação.

155. Nada obstante, se, por eventualidade, repita-se, as contribuições da seguridade social estiverem ao alcance da cogitada imunidade tributária, essa imunidade é restrita às contribuições sociais da seguridade social incidentes sobre a receita (art. 195, I, "b", CF).

156.O art. 195, caput e incisos, estabelece as hipóteses de incidência das contribuições sociais da seguridade social. Novamente pede-se licença para sua transcrição:

"Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidente sobre:

a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;

b) a receita ou o faturamento;

c) o lucro;

II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;

III – sobre a receita de concursos de prognósticos;

IV – do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar."

157. Ressumbra, de imediato, a exclusão da análise dos aludidos incisos III e IV, art. 195, CF, pois não há que se cogitar de "receitas decorrentes de exportação" oriundas das "receitas de concursos de prognósticos" ou - ainda mais absurdo – "do importador de bens ou serviços do exterior".

158.A referida exclusão imediata situa-se na clássica disposição da não-incidência natural, uma dedução lógica, como ensina SACHA CALMON (obra citada, pp. 139 e ss.).

159.Quanto às demais hipóteses de incidência, os préstimos doutrinários de Evandro Costa Gama (artigo citado) são providenciais:

"Por outro lado, mesmo que se admitisse ser aplicável a citada imunidade às contribuições sociais de seguridade social – que entendemos ser inaplicável pelas razões já expostas, tal imunidade só alcançaria a contribuição do art. 195, I, "b" (a COFINS), que tem como fato gerador a receita ou o faturamento, uma vez que as demais contribuições não possuem na materialidade de seus fatos geradores o ser "receita".

Quanto às contribuições sociais sobre a folha de salário e demais rendimentos do trabalho, sobre a remuneração do trabalhador e sobre a receita de concursos de prognósticos, não encontramos posição defendendo a extensão da imunidade do art. 149, § 2º, I, às referidas contribuições. No entanto, encontramos manifestações favoráveis à extensão da referida imunidade à Contribuição sobre o Lucro Líquido – CSLL.

Tal pretensão, com todo o respeito aos seus defensores, deve ser afastada, por ser a figura do "lucro" – fato gerador da CSLL – fenômeno totalmente distinto de "receita". O lucro caracteriza-se pela mais-valia resultante da subtração de todas as despesas permitidas em lei do montante de receitas auferidas pela pessoa jurídica. Nem todas as despesas realizadas são passíveis de dedução da base de cálculo da CSLL (art. 13, incisos I a VII, Lei nº 9.249/95), assim como outras, sem relação com a atividade fim da pessoa jurídica, têm suas respectivas deduções autorizadas, como, por exemplo, doações a entidades civis sem fins lucrativos (art. 13, § 2º, Lei nº 9.249/95).

Além disso, para efeito de apuração da base de cálculo da CSLL, os prejuízos fiscais existentes são passíveis de compensação, nos períodos posteriores, no limite de 30% do lucro líquido ajustado (art. 58, Lei nº 8.981/95), o que só comprova a distinção entre os fenômenos "receita" e "lucro", uma vez que este não é fruto exclusivo da equação "receitas menos despesas".

Ao término do presente artigo, podemos afirmar, com convicção, que a interpretação e aplicação da imunidade do art. 149, § 2º, I, não alcança as contribuições sociais previstas no art. 195 da Constituição, por força do regime jurídico específico das Contribuições Sociais de Seguridade Social."

160.Conquanto o ilustre articulista tenha aduzido a inexistência de posição defendendo a extensão da cogitada imunidade em relação à "folha de salários" e à "contribuição do trabalhador", alínea "a" do inciso I, e inciso II, art. 195, CF, se se aceitar a premissa/conclusão de que tudo que advenha das receitas de exportação é imune a todas as contribuições sociais, inclusive as da seguridade social, mister se faz surpreender essa situação inusitada, pois se está diante de um verdadeiro Midas imunizante.

161. Induvidosamente "a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício" com empresas exportadoras é custeada pelas receitas decorrentes das exportações. Uma vez aceito o paroxismo de que todas as contribuições sociais incidentes sobre grandezas direta ou indiretamente decorram das receitas de exportação, chegar-se-á ao absurdo de as pessoas jurídicas exportadoras não contribuírem sobre a hipótese de incidência do art. 195, I, "a", CF.

162. Nessa linha de raciocínio extremada, a hipótese de incidência do art. 195, II, CF, também estaria imunizada se "as receitas" (salários e rendimentos) dos trabalhadores advierem de receitas decorrentes de exportações. O absurdo da tese leva a sua inviabilidade.

163. Um dos limites da interpretação jurídica é a razoabilidade das conclusões e das conseqüências das decisões. Uma interpretação que chegasse a conclusão de que todas as contribuições sociais não devem incidir sobre nenhuma grandeza direta ou indiretamente relacionada com as receitas decorrentes das exportações é desarrazoada, data venia.

164. A conseqüência de uma decisão judicial nesse sentido (da total imunidade às contribuições sociais) acarretaria graves danos ao sistema da seguridade social e causaria uma absurda desigualdade entre os setores econômicos brasileiros, com reflexos nas políticas interna e internacional.

165.Se a vontade da Constituição fosse exonerar as grandezas econômicas direta ou indiretamente relacionadas com as receitas decorrentes das exportações de todas as contribuições sociais, inclusive as da seguridade social, isso deveria estar enunciado explicitamente.

166. Todavia, na presente hipótese, cuida-se da incidência da contribuição social da seguridade social incidente sobre o lucro (e sobre a movimentação financeira) das contribuintes jurídicas auferido das receitas decorrentes de exportações.

167.A CSLL é contribuição social incidente sobre o lucro das pessoas jurídicas instituída pela Lei n. 7.689, de 15.12.1988, cuja base de cálculo é o lucro, nos termos em que autorizado pelo art. 195, I, "c", CF.

168.Com estribo no texto constitucional, percebe-se que o próprio constituinte estabeleceu 5 (cinco) bases de cálculo para as contribuições sociais nas hipóteses do referido inciso I do art. 195:

1ª: a folha de salário;

2ª: demais rendimentos do trabalho, pagos ou creditados a qualquer título, à pessoa física prestadora de serviços;

3ª: a receita;

4ª: o faturamento; e

5ª: o lucro.

169.Quanto à imunidade relacionada à "folha de salário" e "demais rendimentos pagos", assim como em relação às hipóteses de incidência dos incisos II, III e IV do art. 195, CF, demonstrou-se o absurdo da tese e a inviabilidade de pretensão eventualmente existente. Igual destino se reserva à pretensão relacionada à CSLL, a despeito de ilustrada opinião divergente.

170.Ao longo desta exposição, revelou-se que para efeitos tributários, "receita" e "lucro" são grandezas econômicas distintas e merecedoras de tratamentos normativos diversos, conquanto estejam umbilicalmente relacionados. O lucro decorre da receita, isso é inquestionável, mas tanto o lucro quanto a receita têm verdadeira autonomia fiscal.

171.Essa "autonomia fiscal" é reconhecida pela doutrina especializada sobre o tema (MARCO AURÉLIO GRECO: Contribuições – uma figura ‘sui generis; JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO: Contribuições sociais no sistema brasileiro; WERTHER BOTELHO SPAGNOL: As contribuições sociais no direito brasileiro; e NICOLAU KONKEL JUNIOR: Contribuições sociais – doutrina e jurisprudência) e pela remansosa e aturada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como se demonstrou.

172.Essa referida "autonomia fiscal" chancelada pela jurisprudência do STF, além dos precedentes já recordados, pode ser vislumbrada de modo incontestável no julgamento do RE 336.134 (Relator Ilmar Galvão, J. 20.11.2002, DJ 16.05.2003), no qual o STF reconheceu válido o aumento da alíquota da COFINS e, no ponto em que interessa imediatamente, o direito de abater até um 1/3 do valor pago a título de COFINS com a CSLL efetivamente paga (art. 8º, § 1º, Lei 9.718/98).

173. Nesse citado julgamento, a Corte entendeu válida, sem ofensa ao magno princípio da isonomia, a possibilidade de compensação de 1/3 (um terço) do valor pago a título de COFINS com a CSLL efetivamente paga por cuidar-se de dois tributos distintos com bases de cálculo diversas. A COFINS, à época, o faturamento. A CSLL o lucro.

174.Se acaso a base de cálculo da COFINS fosse a receita, como atualmente, a sorte do julgado não seria diferente. Isso porque, como acentuado, "receita", "faturamento" e "lucro" são grandezas econômicas distintas e que recebem tratamento jurídico diverso, a despeito de suas relações "umbilicais".

175.O ponto central da exclusão da CSLL da imunidade concedida às receitas decorrentes de exportação reside na diferença conceitual entre "lucro" e "receita" e na diversidade de tributos (contribuições) incidentes.

176.A Fazenda Nacional reitera o entendimento de que as contribuições sociais da seguridade social não estão alcançadas pela aludida imunidade às receitas decorrentes de exportação. Todavia, se o STF acolher a tese de que as contribuições da seguridade social são alcançadas, somente aquela incidente sobre as "receitas". Nenhuma outra contribuição social da seguridade social foi exonerada à incidência sobre as pessoas jurídicas que aufiram grandezas decorrentes de receitas de exportação. No presente caso, a CSLL e a CPMF.

177. Nos termos da Lei n. 10.833/2003 a base de cálculo da COFINS é o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. Segundo a recordada jurisprudência do STF, está-se diante de "receita". O "faturamento", segundo essa mencionada jurisprudência, é a receita decorrente da vendas de mercadorias e serviços ou da prestação de serviços.

178.O "lucro", já foi demonstrado, é decorrente de todas as "receitas", após as "depurações" legalmente permitidas. Nos termos da Lei n. 7.689/1988, a base de cálculo da CSLL é "o valor do resultado do exercício", antes da provisão do imposto de renda.

179.Essa distinção entre "receita" e "lucro" foi reforçada pela Emenda Constitucional n. 20/1998. Com efeito, a redação primitiva do inciso I do art. 195, CF, dispunha "apenas" acerca da "folha de salários, do faturamento e de lucro", como bases de cálculo das contribuições sociais da seguridade social incidentes sobre as empresas. A referida EC 20/1998 inseriu a "receita" como nova hipótese de incidência, além das já existentes. Isso ficou patente nos citados precedentes jurisprudenciais do STF.

180.A EC 33/2001 (que instituiu a imunidade das receitas de exportação em relação às contribuições sociais gerais - art. 149, CF - como defende a Fazenda Nacional ou, por eventualidade, uma vez aceita a possibilidade de alcance às contribuições da seguridade social, apenas a contribuição sobre as receitas estariam alcançadas - art. 195, I, b, CF) deve ser compreendida em face da aludida EC 20/1998.

181.Isso porque se a EC 20/1998 não tivesse criado uma nova hipótese de incidência (a receita), provavelmente a vontade constitucional emanada da EC 33/2001 talvez fosse no sentido de alcançar tanto o "faturamento" quanto o "lucro" decorrentes das receitas de exportação.

182.Mas, a EC 20/1998 estabeleceu a "receita" como hipótese de incidência autônoma de contribuição da seguridade social, daí que a EC 33/2001 – se alcançar a seguridade social – imuniza apenas a contribuição da seguridade incidente sobre a receita.

183.De outra feita, se se der à expressão "receita decorrente de exportação" o poder de exonerar tributariamente todas as contribuições sociais, inclusive as da seguridade social, também, a fortiori, autoriza a dizer que todas as demais hipóteses de incidência perderam sentido, pois uma vez tributada a "receita", desnecessário tributar o "faturamento", o "lucro" e todas as demais grandezas direta ou indiretamente relacionadas com a "receita".

184.Essa aludida interpretação, reconheça-se, é equivocada e não encontra eco nem na jurisprudência do STF nem na melhor e mais séria doutrina fiscal brasileira.

185. Esse entendimento interpretativo levaria ao extremo de se insinuar que a EC 20/1998, ao instituir a "receita" como nova hipótese de incidência das contribuições sociais da seguridade social, revogou as demais hipóteses de incidência existentes, visto que tanto o "faturamento" quanto o "lucro" e a "folha de salários etc." decorrem das receitas auferidas pelas pessoas jurídicas. A conclusão é inaceitável. A premissa é falsa e sofismática.

186. Nem a EC 20/1998 inviabilizou as contribuições sociais da seguridade social incidentes sobre "faturamento", "lucro", "folha de salários etc." com a inserção da "receita" como nova fonte de custeio, nem a EC 33/2001 autorizou a extensão da imunidade tributária às contribuições sociais que não incidissem diretamente sobre as receitas decorrentes de exportação.

187.Tudo quanto foi relatado em face da CSLL (lucro) serve para a CPMF (movimentações financeiras). Com efeito, as movimentações financeiras decorrentes das receitas de exportação não se confundem com as próprias receitas. São hipóteses normativas diversas, como exaustivamente demonstrado.

188.O argumento da Contribuinte no sentido da ausência de riqueza substantiva a ensejar a instituição de um tributo (no caso a CPMF), esgrimido magistralmente pelo Ministro ILMAR GALVÃO na ADI 2.666, foi rejeitado pelo Plenário do STF.

189.Desde os julgamentos envolvendo o IPMF, a Corte tem decidido que o legislador pode tributar as "movimentações financeiras" das pessoas físicas ou jurídicas, visto que há a indispensável autonomia conceitual e normativa para esse desiderato.

190.Daí que a tributação, via CPMF, das movimentações financeiras das empresas exportadoras ou das receitas de variação cambial não foi alcançada pela exoneração das receitas de exportação, como assentou o acórdão recorrido.

191.Quanto ao citado precedente no RE 211.790, não autoriza sua extensão à presente demanda. Por uma razão simples. A regra geral das imunidades tributárias se destina aos impostos, em vez das contribuições. Segundo o texto constitucional e a pacífica jurisprudência do STF, sempre que o constituinte decidiu imunizar (exonerar) as contribuições (sobretudo as da seguridade social) fê-lo direta e expressamente.

192.Dessa sorte, qualquer exoneração tributária relacionada às contribuições sociais da seguridade social está adscrita à indispensável e expressa autorização estatal. No caso de imunidade tributária - a mais importante das exonerações, haja vista o assento constitucional – se torna, venia permissa, inadmissível uma interpretação que alcance todas as contribuições da seguridade social, em manifesta e acintosa violação ao princípio da solidariedade social.


IX. CONCLUSÕES

Alfim e ao cabo, a Fazenda Nacional chega às seguintes conclusões:

1ª. À luz do texto constitucional, há o regime constitucional das contribuições sociais gerais (art. 149) e o regime constitucional das contribuições sociais da seguridade social (art. 195).

2ª. A EC 33/2001 instituiu, em relação às receitas decorrentes de exportação, imunidade em face das contribuições sociais gerais, por expressa disposição normativa ao se referir às contribuições sociais do caput, nos termos constantes no § 2º, inciso I, do art. 149, CF.

3ª. Receita, Faturamento, Lucro e Movimentação Financeira são hipóteses de incidências distintas e receptoras de tratamentos jurídicos específicos, com conseqüências tributárias diversas.

4ª. Receita, segundo o STF, designa o gênero, compreensivo das características ou propriedades de certa classe, abrangente de todos os valores que, recebidos da pessoa jurídica, se lhe incorporam à esfera patrimonial. Todo valor percebido pela pessoa jurídica, a qualquer título, será, nos termos da norma, receita (gênero).

5ª. Faturamento, segundo o STF, também significa percepção de valores e, como tal, pertence ao gênero ou classe receita, mas com a diferença específica de que compreende apenas os valores oriundos do exercício da "atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços" (venda de mercadorias e de serviços).

6ª. Lucro é o resultado positivo do exercício, ou seja, o valor das receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não-operacionais.

7ª. Movimentação financeira é a operação liquidada ou lançamento realizado pelas entidades financeiras, que representam circulação escritural ou física de moeda, e de que resulte ou não transferência da titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos.

8ª. As exonerações tributárias relacionadas às contribuições da seguridade social são explícitas e relacionadas com as finalidades da própria seguridade social (saúde, previdência e assistência), descabendo interpretação extensiva nessa situação.

9ª. Se, por eventualidade, entender-se que a imunidade concedida pela EC 33/2001 alcança as contribuições sociais da seguridade social, ela restringe-se àquela que tem a "receita" como hipótese de incidência.

10ª. A EC 20/1998, ao instituir a "receita" como nova fonte de custeio (hipótese de incidência) da seguridade social, não revogou nem excluiu as demais hipóteses de incidência, mormente o "faturamento" e o "lucro".

11ª. É constitucionalmente inadequada, com a devida vênia, a interpretação de que todas as contribuições sociais que tenham grandezas econômicas direta ou indiretamente relacionadas com as receitas decorrentes de exportação estão inviabilizadas e que não podem ser cobradas das pessoas jurídicas que tenham como objeto social de sua atividade empresarial típica a exportação.


X. REQUERIMENTO DA FAZENDA NACIONAL

Ante o exposto, a Fazenda Nacional pede que seja negado provimento ao referido recurso extraordinário, reconhecendo-se a validade da incidência da CSLL e da CPMF, respectivamente, sobre os lucros e sobre as movimentações financeiras da Contribuinte (pessoa jurídica exportadora), mantendo-se incólume o acórdão do TRF 4 objeto do presente apelo extremo.

Nestes termos, pede e espera deferimento.

Brasília, Sexta-feira, 02 de maio de 2008.

LUÍS CARLOS MARTINS ALVES JR.
            Procurador da Fazenda Nacional
            Coordenação-Geral da Representação Judicial
            Núcleo de Acompanhamento Especial do STF


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

Incidência de CSLL e CPMF sobre receitas de exportação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1773, 9 maio 2008. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16687. Acesso em: 20 abr. 2024.