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Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos.

Breves notas e reflexões

Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Breves notas e reflexões

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Seria de bom alvitre a criação de um diploma que sistematize e organize as normas – princípios e regras – regentes dos processos coletivos.

INTRODUÇÃO

Objetiva-se, por intermédio deste Trabalho, o estudo do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, que atualmente se encontra em análise no Ministério da Justiça, a fim de verificar o seu grau de contribuição à prestação jurisdicional e à efetividade do processo.

Haja vista a legislação pátria dos processos coletivos, por vezes, contraditória, lacunosa e pouco efetiva, constata-se a necessidade em inová-la e aperfeiçoá-la em pontos que não atendem à demanda da realidade social.

Diante disso, e devido à massificação dos conflitos de interesses que se tornam cada vez mais complexos, seria de bom alvitre, para parte da doutrina, a criação de um diploma que sistematize e organiza as normas – princípios e regras – regentes dos processos coletivos.

Como objetivo geral, o presente trabalho visa a analisar, à luz da efetividade dos direitos coletivos lato sensu e das disposições constitucionais, as alterações jurídicas decorrentes de eventual aprovação do Projeto do Código de Processos Coletivos. Por objetivos específicos, busca cotejar a atual legislação referente aos processos coletivos com o Projeto em comento.

Em outros termos, o alvo aqui traçado consiste em apresentar visão geral do Anteprojeto, bem como tratar de questões específicas da citada proposta. Pretende-se, assim, evidenciar, sem obviamente esgotar a complexa matéria, os pontos positivos e os que se afiguram verdadeiro retrocesso ao direito processual civil coletivo pátrio.

O presente Estudo encontra-se cindido em três capítulos.

O Capítulo 1 cuida da evolução histórica dos processos coletivos desde a sua origem que remonta o direito estadunidense até os dias de hoje. Esse escorço histórico aclarará a situação fática e jurídica em que se encontram os processos coletivos no Brasil contemporaneamente, que ensejou o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, objeto do vertente estudo.

Na segunda parte, serão apresentados alguns dos pontos mais relevantes do Anteprojeto, dando-se especial atenção às modificações por ele alvitradas. Ademais, nesta seção, objetivando realçar as novidades trazidas pelo Anteprojeto em análise, cotejar-se-á a realidade hodierna dos processos coletivos – leis, jurisprudência e entendimentos doutrinários - com os termos do que se propõe no diploma em comento.

O Capítulo 3, por seu turno, versará sobre reflexões imbuídas de espírito crítico acerca das principais questões tratadas no capítulo precedente. Com isso, em cada item haverá conclusão específica sobre os méritos, falhas ou insuficiências do Anteprojeto. Ou seja, será cada item ou considerado como avanço ou como retrocesso no que que tange à evolução do direito processual coletivo brasileiro. Para tanto, será trazida opinião de conceituados estudiosos dos respectivos temas, que teceram pareceres sobre o teor do Anteprojeto.

Findando o conteúdo investigatório, nas considerações finais constará conclusão acerca de todo o Anteprojeto de Código de Processos Coletivos, que, sintetizando o expendido durante o desenvolvimento da pesquisa, manifestará o grau de contribuição ou atraso oriundo do diploma em análise.


Capítulo 1

DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DOS PROCESSOS COLETIVOS

1.1.. DIREITOS COLETIVOS LATO SENSU

A fim de se entender o que vem a ser os processos coletivos, bem como qual é a sua situação atual no ordenamento jurídico brasileiro, faz-se necessário, de plano, conhecer a evolução histórica dos direitos coletivos em sentido amplo, que são tutelados pela ação coletiva.

Na perspectiva moderna do processo que é visto como instrumento para a concreção do direito substantivo - a sua razão de ser -, e não mais como um fim em si mesmo, o estudo de qualquer instituto processual deve sempre ter em mira e encetar pela definição do direito material tutelado [01]. As normas processuais devem ser criadas, modificadas e mantidas consoante as necessidades de efetivação do direito material.

Portanto, o conceito de processos coletivos está umbilicalmente ligado ao dos direitos coletivos em sentido amplo.

Os direitos que serão neste subitem analisados, em sua perspectiva histórica, são catalogados como de 2ª e 3ª dimensões ou gerações, na evolução dos direitos fundamentais. Eles compõem os chamados direitos coletivos lato senso.

Para melhor compreensão da realidade dos direitos em comento, relevante se faz proceder a sucinto exame retrospectivo da evolução dos direitos fundamentais, em que se incluem os direitos coletivos em sentido amplo.

As declarações dos Direitos Fundamentais - Estados Unidos [02] - e dos Direitos do Homem e do Cidadão – França -, proclamadoras dos princípios da liberdade, igualdade, propriedade e legalidade, foram as primeiras a proclamar em verdade o ideário dos direitos humanos.

Esses direitos tornaram-se conhecidos, pela doutrina, como os de 1ª Geração ou Dimensão, caracterizados pelo dever de abstenção do Estado perante os cidadãos. Por isso, são denominados direitos negativos ou de liberdade [03]. São próprios do Estado Liberal, inspirados no ideal Iluminista, segundo o qual tais direitos seriam suficientes para que o indivíduo atinja a felicidade.

Posteriormente, percebeu-se que não era possível garantir a liberdade de fato e diminuir a exploração da maioria pela minoria somente por meio da abstenção estatal nas relações interindividuais. Diversos movimentos sociais eclodiram durante o Séc. XIX denunciando os vícios do liberalismo puro, que favorecia somente a burguesia em detrimento do proletariado [04].

Em 1917, os direitos fundamentais sociais foram declarados reconhecidos formalmente pela Constituição mexicana, que outorgou ao Estado o encargo de realizar prestações positivas intervindo na ordem econômica e social. Logo, em 1919, a famosa Constituição alemã de Weimar caracterizou-se por instituir direitos coletivos [05]. No Brasil, esses direitos foram inscritos, pela primeira vez, na Constituição de 1934 [06].

O Estado, então, passou a ter obrigações de dar e fazer, visando a mudar a sociedade. Surgiram, assim, os direitos dos trabalhadores, que substitui a simples liberdade de trabalhar ou não dos direitos de 1ª Dimensão, de exigirem determinadas condições e limites ao seu labor. Surgia, nas sociedades capitalistas, o Estado de Bem-Estar Social, com uma maior participação do Estado na condução da vida em sociedade [07].

Esses são conhecidos como direitos de 2ª Geração ou Dimensão.

Quando parecia que o trilho da evolução dos direitos fundamentais já havia sido cabalmente percorrido, surgiram os direitos de 3ª Geração ou Dimensão.

No Século XX, novos conflitos no modelo socioeconômico vigente evidenciaram a necessidade da criação de outros direitos fundamentais. A guerra fria, que trouxe a iminente ameaça da destruição da humanidade por meio do desenvolvimento da energia nuclear, bem assim o vertiginoso crescimento das organizações transnacionais, que passaram a explorar descomedidamente os recursos naturais de países em desenvolvimento, são exemplos desses impasses. Em tal período, recrudesceram os interesses ou direitos [08] transindividuais ou metaindividuais que abrangem categorias, grupos, classes de pessoas, por vezes, deveras numerosas. Tais interesses sempre têm, por fim, a qualidade de vida.

Assim, os direitos humanos foram ampliados a fim de abrangerem os direitos ao meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, à completa informação, à paz, à autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, à qualidade de vida, à conservação e utilização do patrimônio histórico e cultural, etc. Essa terceira geração de direitos foi denominada pela doutrina como "de Solidariedade" ou "de Fraternidade". Isso porque há tão-somente um vínculo de fato – e não jurídico - entre os integrantes do grupo, da classe de pessoas ou da categoria, que são igualmente protegidos [09].

Após tais avanços, foram cabalmente acolhidos pelo teoria constitucional os direitos coletivos em sentido amplo, objetos do presente trabalho.

Nesta quadra do vertente trabalho, afigura-se mister, para a exata compreensão do que será exposto deixar claro o significado dos direitos coletivos lato sensu ou em sentido amplo, bem como interesses difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos. Todos eles são frutos da evolução dos direitos humanos nos moldes expendidos.

1.1.1. Dos direitos coletivos stricto senso

Antes de conceituar e diferenciar os direitos citados, deve-se lembrar que em alguns casos a sua distinção em relação aos coletivos se mostra difícil.

Impende, assim, atentar para importante lição apresentada por Demian Guedes, a saber:

Cabe advertir que se apresenta inútil erguer-se um muro entre interesses difusos e coletivos, na medida em que sua diferenciação no caso concreto muitas vezes se apresenta inviável, uma vez que ambos são espécies de interesses metaindividuais – o que não ocorre com os direitos individuais homogêneos, que se apresentam como verdadeiros direitos individuais, sendo coletiva apenas a forma de sua tutela em juízo. Porém, em que pese a similitude daqueles interesses, vale apontar algumas marcas essenciais de cada um, no tocante ao seu surgimento e às suas características fundamentais [10].

Os direitos coletivos, em sentido estrito, apresentam-se como espécie intermediária entre os aqueles de natureza pública em geral e os de natureza privada.

A fim de estancar qualquer hesitação sobre o que são os direitos coletivos, cabe visualizar o Código de Defesa do Consumidor [11], que em seu art. 81, inciso II, conceitua [12] tais direitos como sendo:

II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.

Verifica-se, portanto, que são características elementares desses direitos a transidividualidade com determinação relativa dos titulares (não têm titular individual e a ligação entre os vários titulares coletivos decorre de uma relação jurídica-base. Também se pode asserir, do conceito acima citado, que são interesses indivisíveis (não podem ser satisfeitos nem lesados senão em forma que afete a todos os possíveis titulares) [13].

Como exemplos desses direitos podem ser citados os consumidores lesados, os aposentados vítimas de uma norma inconstitucional que os fere, os trabalhadores de uma empresa que institui jornada de trabalho claramente contrária aos direitos consagrados na Consolidação da Legislação Trabalhista, etc. O importante para essa espécie é que se trate de um grupo determinado ou determinável de pessoas interessadas e afetadas [14].

1.1.2. Dos direitos difusos

Os direitos difusos, por sua vez, são delimitados pelo Código de Defesa do Consumidor, no parágrafo único do artigo 81, como sendo "os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato".

Segundo Celso Antonio Pacheco Fiorillo, "o direito difuso possui a natureza de ser indivisível. Não há como cindi-lo. Trata-se de um objeto que, ao mesmo tempo, a todos pertence, mas ninguém em específico o possui" [15].

Extrai-se do acervo jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal:

E M E N T A: MEIO AMBIENTE - DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA INTEGRIDADE (CF, ART. 225) - PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU CARÁTER DE METAINDIVIDUALIDADE - DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO (OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO) QUE CONSAGRA O POSTULADO DA SOLIDARIEDADE - NECESSIDADE DE IMPEDIR QUE A TRANSGRESSÃO A ESSE DIREITO FAÇA IRROMPER, NO SEIO DA COLETIVIDADE, CONFLITOS INTERGENERACIONAIS – (...) - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar, em benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral" [16].

Os interesse difusos possuem características marcantes de abstração, consistentes na indeterminação do titular da relação jurídica de direito material. Ademais, o bem jurídico a ser protegido é indivisível – sendo essa a sua similitude em relação aos interesses coletivos [17].

Os interesses difusos são aqueles pertencentes a grupos não determinados de pessoas como preceitua José Marcelo Menezes Vigliar, in verbis:

São interesses menos determinados de pessoas, sendo que entre elas não há vínculo jurídico ou fático muito preciso. Eles perfazem um conjunto de interesses individuais, no qual cada um, dos elementos do grupo indeterminado de pessoas, possui o seu interesse, mas que guardam pontos comuns entre si, criando, assim, o interesse difuso (...) [18].

Ademais, a Lei nº 8.078 [19], conhecida como Código de Defesa do Consumidor, assevera, por mais de uma vez, que as relações consumeristas não se restringem àquele indivíduo que se direciona à loja e adquire determinado produto em contraposição ao comerciante que o vendeu. Nesse sentido, a coletividade de consumidores ganha proteção específica [20].

E, por derradeiro, a Lei nº 8.884 [21] reconhece que a infração contra a ordem econômica encaixa-se na órbita dos interesses em tela, da mesma forma da recente Lei nº 9605 de 1998, com o escopo da proteção ao meio ambiente.

A título de exemplo dos direitos difusos seguem as seguintes situações: um desastre ecológico numa base de extração de petróleo ou até a veiculação de propaganda enganosa por empresa prestadora de serviços.

Acerca do tema em comento, interessante é a lição extraída de decisão do Supremo Tribunal Federal:

Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos [22].

Por fim, vem pertinentes os dizeres de Luís Roberto Barroso ao distinguir os interesses difusos dos coletivos stricto sensu, segundo os quais "assim como os difusos, os interesses coletivos em sua acepção estrita também são indivisíveis relativamente ao seu objeto; mas a diferença em relação àqueles é que se está diante de uma pluralidade determinada ou determinável de pessoas, todas ligadas em virtude da mesma relação jurídica básica" [23].

1.1.3. Dos direitos individuais homogêneos

A característica de indivisibilidade do bem tutelado visualizada nos direitos difusos e coletivos em sentido estrito não se aplica aos direitos individuais homogêneos. Estes, conforme o preceituado pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 81, inciso III, são os "decorrentes de origem comum".

Verifica-se, assim, que são interesses pertencentes a titulares determináveis ou determinados ligados por uma situação de fato comum entre si, isto é, compartilhada por todos. São uniformes e acidentalmente coletivos [24].

Tais direitos são, em sua essência, isto é, ontologicamente, meros direitos subjetivos individuais comuns [25].

Eles, apesar de serem em sua natureza direitos individuais, são reunidos a fim de serem evitadas decisões conflitantes e contraditórias, bem assim em homenagem ao princípio da economia processual e otimização da prestação jurisdicional. Poderia, assim, cada um dos seus titulares buscar os seus direitos de maneira individual. Todavia, em virtude de inúmeros motivos, dentre os quais podem ser citadas a pequena monta de dano causado a cada um, a sua reparação é buscada coletivamente [26].

São exemplos desses direitos: impugnação pelos contribuintes da exação tributária tida como inconstitucional, ou o dos consumidores a serem indenizados pela quantidade menor de produto existente na embalagem [27].

1.1.4. Direitos coletivos em sentido amplo e ordenamento jurídico

De acordo com o que foi exposto, em resumo, vê-se que os interesses coletivos lato sensu, em sua totalidade, a que se fez menção, encontram-se albergados pelo ordenamento jurídico pátrio.

Não obstante o reconhecimento desses direitos pelo Estado, este somente criou mecanismos processuais eficazes para a efetivação dos direitos coletivos em sentido amplo quando da terceira dimensão de direitos. Até então era aceita a errônea idéia segundo a qual os interesses coletivos não eram juridicamente tuteláveis, sob a falácia de que dependiam de fatores extrajurídicos para a sua concreção [28]. Permaneceram assim os direitos fundamentais descritos nesse subitem por muito tempo descobertos de proteção jurídica eficaz, razão por que não foram respeitados durante extenso lapso temporal.

1.2.. SURGIMENTO E EVOLUÇÃO DOS PROCESSOS COLETIVOS

Como dito acima, o processo é instrumento, o que não lhe tira a sua importância, mas, ao contrário, acentua o seu valor na atividade jurisdicional, vez que ele tem a notável função de garantir a concretização dos direitos no mundo fático.

De nada adianta o reconhecimento formal de inúmeros direitos, se não há meios para que estes sejam cumpridos na prática. Nunca é demais rememorar que direitos garantidos no papel, sem mecanismos garantidores da sua observância, não passam de boas recomendações ou conselhos [29].

Como brilhantemente asseverou Norberto Bobbio: "Finalmente, descendo do plano ideal ao plano real, uma coisa é falar dos direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez mais extenso, e justificá-los com argumentos convincentes; outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva" [30].

Sob esse prisma, o da efetividade, é que ocorreu a evolução dos processos coletivos. O processo civil, depois do surgimento dos direitos coletivos em sentido amplo, teve que ser remodelado. Há que se lembrar que o atual Código de Processo Civil, de 1973, tem cunho marcadamente individualista, assim como a legislação tradicional do processo civil, que fora criada para tutelar os direitos individualistas de primeira dimensão.

Discorrendo sobre a incompatibilidade do processo civil individual para a proteção dos direitos coletivos em sentido amplo, interessante é o seguinte excerto da lavra do professor Álvaro Luiz Valery Mirra:

Como apontado pela doutrina especializada, o processo civil, entre nós, na sua origem e nas codificações que se sucederam, foi estruturado para ser palco e veículo de disputas envolvendo direitos individuais e conflitos intersubjetivos, dentro de uma concepção individualista e formal, de inspiração liberal, que invariavelmente privilegiava a tutela de situações de confronto entre indivíduos isolados ou dispostos em grupos bem definidos ou entre estes e o Estado, considerado ele mesmo, no âmbito processual, uma pessoa singular. O próprio direito de ação inclusive, norma tradicional do processo civil individualista, em tal contexto, sempre foi definido como um direito subjetivo, colocado à disposição da pessoa, a fim de que esta faça valer seus direitos próprios e individuais contra todos que porventura os violem [31].

Com o decorrer do tempo, foram sendo criados e colocados à disposição dos cidadãos meios por intermédio dos quais era e é possível tutelar e fazer valer os interesses coletivos lato sensu, tornando imperativos os mandamentos estatais no sentido de se preservar tais bens – que atualmente se enquadram na categoria dos bens jurídicos, isto é, juridicamente tuteláveis.

Ademais, como bem ensina Luiz Guilherme Marinoni,

além da necessidade de um processo civil que pudesse dar conta de direitos transindividuais, percebeu-se que ele também deveria voltar-se aos direitos que podem ser lesados em face dos conflitos próprios à sociedade de massa. A sociedade moderna abre oportunidade a situações em que determinadas atividades podem trazer prejuízo aos interesses de grande número de pessoas, fazendo surgir problemas ignorados nas demandas individuais [32].

À luz dos objetivos referidos, nos Estados Unidos, no final da década de 40, passou-se a disciplinar as ações coletivas nas Federal Rules [33], maximizando, assim, a tradição herdada do direito inglês [34]. Esse instrumento tem sido utilizado por consumidores em grupos organizados ou informais, ou até mesmo isoladamente, com o intento de pleitearem indenização por um dano uniformemente causado ou então homogeneamente sofrido.

Todavia, como pondera Ada Pellegrini Grinover,

As dificuldades práticas, quanto à configuração e requisitos de uma ou outra de suas categorias, com tratamento processual próprio, levaram o Advisory Committee on Civil Rules a modificar a disciplina da matéria na revisão feita pels Federal Rules de 1966, as quais estão sendo novamente trabalhadas para eventuais modificações [35].

O Bill of Peace, do direito inglês, no Século XVII, já admitia a defesa judicial dos interesses metaindividuais, com inconveniente de que todos os interessados comparecessem ao tribunal [36].

Segundo Marilia de Castro Neves Vieira,

O VII Congresso Internacional de Direito Processual que se realizou em Würzburg, Alemanha Ocidental, entre 12 e 17 de setembro de 1983 tratou, entre outros, do tema da legitimidade ativa na tutela dos interesses difusos. A relatoria do tema Proteção dos interesses difusos, fragmentados e coletivos no processo civil coube aos Profs. Mauro Cappelletti, de Florença, e Bryan Garth, de Indiana [37].

O Brasil, por seu turno, foi o primeiro país integrante do sistema civil law a introduzir em seu ordenamento jurídico a tutela dos interesses difusos e coletivos, de natureza indivisível.

A tutela dos direitos transindividuais iniciou-se a partir da Constituição de 1934, que, influenciada pela Constituição Alemã de Weimar, instituiu a ação popular [38]. Tal instrumento após ser suprimido pela Constituição totalitária de 1937 foi novamente inserido no ordenamento jurídico por meio da Constituição de 1946.

O principal diploma legislativo formulado especificamente sobre o tema é a Lei da Ação Civil Pública [39], que já estava prevista na Lei n.º 6938 de 1981.

Em 1988, soergueu-se ao nível constitucional a defesa de tais direitos [40].

Sobre as ações constitucionais, gênero do qual faz parte a ação civil pública, o professor Paulo de Tarso Brandão apresenta brilhante lição, reforçando a fileira daqueles que tutelam a não aplicação dos valores individualistas na tutela dos direitos coletivos:

Ressaltada a natureza jurídica dos instrumentos processuais conhecidos por Ações Constitucionais, fácil é concluir que eles necessitam urgentemente receber o tratamento no interior de uma teoria geral própria, abandonando-se definitivamente a teoria geral do Direito Processual Civil. (...) A necessidade da construção de uma teoria geral para os instrumentos destinados à tutela dos denominados ´novos´ direitos está estreitamente ligada aos temas da efetividade dos direitos e do acesso à justiça, que são temas, igualmente, co-relacionados entre si [41].

Em 1990, por fim, adotou-se o Código de Defesa do Consumidor, cujas disposições processuais são aplicáveis à tutela de todo e qualquer interesse ou direito transindividual. Tal Código inseriu no âmbito dos processos coletivos a defesa dos denominados interesses individuais homogêneos, que possibilitaram ações indenizatórias dos prejuízos individualmente sofridos, o que no direito norte-americano corresponde às class actions for damages [42].

A Constituição da República de 1967, com redação empregada pela Emenda Constitucional nº 1 [43], determinava, em seu artigo 153, § 31 que "qualquer cidadão será parte legítima para propor ação popular que vise anular atos lesivos ao patrimônio de entidades públicas".

A proteção aos direitos metaindividuais somente adquiriu maior solidez com a edição da Lei nº 4717 [44], quando se conceituou o que poderia ser considerado patrimônio. Também, em tal diploma legislativo aumentou-se o leque de legitimados para a sua propositura, como se verifica da leitura do seu artigo 1º:

Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, § 38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos.

No que tange à atuação do Ministério Público, cumpre gizar que, não obstante não ter sido prevista a sua legitimidade para a propositura da demanda, há norma no sentido de que deve ele assumir o pólo ativo nos casos de eventual desistência da ação pelo autor. Outrossim, estabeleceu-se a atuação ministerial como custos legis.

Pode-se considerar que a Lei da Ação Popular trouxe progresso no que tange à defesa dos direitos coletivos em sentido amplo. Todavia, avançou menos do que devia e podia, pecando pela timidez, acanhamento e parcimônia.

Luiz Guilherme Marinoni comentando-a afirma que

embora represente louvável homenagem à democracia participativa, permitindo que qualquer cidadão possa ir a juízo para a proteção do patrimônio público, é certo que o cidadão normalmente não tem condições (econômicas, jurídicas e mesmo interesse efetivo) de postular, perante o Judiciário, em oposição à Administração Pública ou a grandes empresas (eventualmente beneficiadas pelo ato lesivo). Essa dificuldade, assim, praticamente anula o benefício introduzido pela Lei da Ação Popular, muito embora ainda se encontrem no foro algumas ações específicas que dele se valham para proteção dos interesses públicos [45].

Em 1981, a Lei n.º 6938, que instituiu a política nacional do meio ambiente, concedeu inicialmente a legitimidade ao Ministério Público para buscar a responsabilização civil do causador do dano ambiental.

Em que pese todos os avanços na legislação pátria descritos acima, o marco cabal nessa evolução do direito processual coletivo no Brasil é a Lei da Ação Civil Pública, de 1985 – n.º 7347. Este diploma legislativo, como o próprio nome indica, tratou da ação civil pública, que visa a tutelar os interesses coletivos em sentido amplo, com abrangência muito ampla em relação não só aos legitimados à propositura da ação (artigo 5º), mas também no que tange ao seu objeto (artigo 1º). Consagrou-se, em seu artigo 1º, a proteção ao meio ambiente, consumir e bens e direitos de valor paisagístico, artístico, estético, histórico e turístico.

A Constituição da República hodierna, promulgada no ano de 1988, incluiu em seu texto, como princípio fundamental, a cidadania, erigindo à categoria das garantias individuais, bem como a defesa dos consumidores e a possibilidade do exercício da gestão participativa.

Um dos principais meios para a efetivação desta democracia, vale dizer, é a ação civil pública, por meio da qual o cidadão pode em questões de interesse público, por meio da atuação do Poder Judiciário, fazendo valer os seus direitos.

Nesse sentido, cabe colacionar importante asseveração de Hugo Filardi:

Sob o prisma da democracia participativa, onde todos devem ter respeitados seus direitos fundamentais e a possibilidade de questionar e influir nas decisões governamentais, a Ação Civil Pública, calcada na legitimidade adequada e na representatividade e provimentos jurisdicionais aproveitáveis aos tutelados, mostra-se um eficaz instrumento na distribuição de justiça e na retomada do respeito e confiança dos indivíduos nas instituições estatais. (...) Portanto, a tutela coletiva desponta como meio justo de solução destes conflitos, e o Poder Constituinte originário a consagrou também com a previsão dos institutos do mandado de segurança coletivo e o mandado de injunção coletivo [46].

A CRFB, ademais, ao dispor sobre as atribuições e poderes do Ministério Público, entregou a esta instituição a proteção dos interesses metaindividuais, consoante o inciso III, do art. 129 , a saber:

promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Não se pode olvidar, outrossim, a garantia fundamental da ação popular trazida pela Lei Maior, em seu art. 5, LXXIII, que também tem por finalidade a proteção de interesses difusos.

O professor Alexandre de Moraes ao discorrer sobre a ação popular afirma o seguinte:

A ação popular popular, juntamente com o direito de voto em eleições, plebiscitos e referendos, e ainda a iniciativa popular de lei e o direito de organização e participação de partidos políticos, constituem formas de exercício da soberania popular (CF, arts. 1º e 14), pela qual, na presente hipótese, permite-se ao povo, diretamente, exercer a função fiscalizatória do Poder Público, com base no princípio da legalidade dos atos administrativos e no conceito de que a res pública (República) é patrimônio do povo [47].

De acordo com Gianpaolo Poggio Smanio,

Notamos, então, pelos dois dispositivos constitucionais analisados, que a Constituição Federal não somente reconheceu a existência dos interesses difusos e coletivos mas também estabeleceu um "sistema de garantia" desses interesses, definindo titulares do direito à proteção e instrumentos jurídicos de proteção, ao conferi-la ao Ministério Público, por intermédio do inquérito civil e da ação civil pública, e ao cidadão, por meio da ação popular [48].

Prosseguindo na direção da efetiva tutela dos direitos metaindividuais e em cumprimento ao disposto na CRFB, surgiu o Código de Defesa do Consumidor, em 11.09.1990, por intermédio da Lei nº 8.078. O seu principal progresso, no que se refere à ação coletiva, foi o de estender a incidência da Ação Civil Pública a todo direito difuso ou coletivo ou individual homogêneo, ou seja, a todo o interesse coletivo em sentido amplo.

Hoje, em razão da alteração do artigo 1º da Lei da Ação Civil Pública, este diploma legislativo também dispõe que a tutela da Ação Civil Pública serve para a proteção de qualquer interesse difuso ou coletivo, inclusive por infração da ordem econômica e da economia popular.

Após a promulgação do Código de Defesa do Consumidor, consolidou-se um sistema integrado de processos coletivos, também conhecido por microssistema jurídico de tutela transindividual. Isso tendo em vista o preceituado nos arts. 90 do Código de Defesa do Consumidor 21 da Lei da Ação Civil Pública:

Art. 90. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Código de Processo Civil e da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive no que respeita ao inquérito civil, naquilo que não contrariar suas disposições.

Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor [49].

Outro considerável avanço do Código de Defesa do Consumidor é apontado por Luiz Guilherme Marinoni:

De início a Lei da Ação Civil Pública foi concebida para regular apenas as ações de responsabilidade civil, de obrigação de fazer e de não fazer, e as cautelares. Hoje, porém, em vista do art. 83 do CDC – que consagra o direito à adequada tutela jurisdicional -, são cabíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada e efetiva tutela dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos (art. 81 do CDC). Aliás, não seria razoável excluir os direitos individuais que podem ser lesados em face das relações da sociedade de massa (ditos direitos individuais homogêneos – art. 81, parágrafo único, III, do CDC) do campo de incidência da ação coletiva [50].

Rodolfo Camargo Mancuso também traz elucidativas lições sobre o objeto atual da ação civil pública:

Hoje pode-se dizer que o objeto da ação civil pública é o mais amplo possível, graças à (re) inserção da cláusula "qualquer outro interesse difuso ou coletivo" (inc. IV do art. 1.º da Lei 7.347/85, pelo art. 110 do CDC). Essa abertura veio, na seqüência, potencializada por alguns adendos: a) no caput do art. 1º da Lei 7.347/85 a responsabilidade ali referida passou a estender-se aos danos morais (e ao somente aos patrimoniais), conforme redação da Lei nº 8.884/94; b) a ação pode também referir-se à "infração da ordem econômica e da economia popular" (inc. V do art. 1.º da Lei 7.347/85, cf. M.P. 2180-35/2001); c) por conta do art. 6º do Estatuto da Cidade (lei 10.257/2001), tornou-se possível, via ação civil pública, a defesa da ordem urbanística [51].

Outras leis outrossim adotaram a defesa dos interesses transindividuais.

Em apertada síntese, esse é o panorama do atual microssistema jurídico das ações coletivas no Brasil, com as quais é possível tutelar todos os direitos coletivos lato sensu, em que se incluem os interesse coletivos stricto sensu, os difusos e os individuais homogêneos.

Em vista dessa conjuntura, surgiu a idéia da criação de um Código Brasileiro de Processos Coletivos.

A elaboração do Código Modelo de Processos Coletivos para Ibero-América, aprovado nas Jornadas do Instituto Ibero-americano de Direito Processual, na Venezuela, em outubro de 2004, também pode ser considerado um dos motivos ensejadores do Anteprojeto. Esse Código serviu como modelo do Anteprojeto, de modo a tornar mais homogênea a defesa dos interesses e direitos transindividuais [52].

Ada Pellegrini Grinover, Kazuo Watanabe e Antonio Gidi elaboraram a primeira proposta de um Código Modelo, proposta essa que aperfeiçoou as regras do microssistema brasileiro de processos coletivos, sem desprezar a experiência das class-actions norte-americanas. Boa parte dessas regras, que foram apefeiçoadas com a participação ativa de outros especialistas ibero-americanos (e de mais um brasileiro, Aluísio de Castro Mendes), passaram depois do Código Modelo para o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos [53].

O Código Modelo foi discutido, no final de 2003, ao ensejo do encerramento do curso de pós-graduação stricto sensu da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, por professores e pós-graduandos da disciplina "Processos Coletivos", ministrada por Ada Pellegrini Grinover e Kazuo Watanabe, para verificar como e onde suas normas poderiam ser incorporadas, com vantagem, pela legislação brasileira. E assim surgiu a idéia da elaboração de um Código Brasileiro de Processos Coletivos, que aperfeiçoasse o sistema, sem desfigurá-lo. Posteriormente, ao final do curso de 2004, outra turma de pós-graduandos, além da primeira, trouxe aperfeiçoamentos à proposta, agora também contando com a profícua colaboração de Carlos Alberto Salles e Paulo Lucon. Nasceu assim a primeira versão do Anteprojeto, trabalhado também pelos mestrandos, doutorandos e professores da disciplina, durante o ano de 2005 [55].

O Instituto Brasileiro de Direito Processual, por intermédio de seus membros, ofereceu diversas sugestões. No segundo semestre de 2005, o texto foi analisado por grupos de mestrandos da UERJ e da Universidade Estácio de Sá, sob a orientação de Aluísio de Castro Mendes, daí surgindo mais sugestões. O IDEC também foi ouvido e aportou sua contribuição ao aperfeiçoamento do Anteprojeto. Colaboraram na redação final da primeira versão do Anteprojeto juízes das Varas especializadas já existentes no país. Foram ouvidos membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e de diversos Estados, que trouxeram importantes contribuições [56].

A primeira versão do Anteprojeto foi apresentada pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual ao Ministério da Justiça, em dezembro de 2005. Submetido a consulta pública, sugestões de aperfeiçoamento vieram de órgãos públicos (Casa Civil, Secretaria de Assuntos Legislativos, PGFN e Fundo dos Interesses Difusos), bem como dos Ministérios Públicos de Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo. As sugestões foram criteriosamente examinadas por professores e pós-graduandos da turma de 2006 da disciplina "Processos Coletivos" da Faculdade de Direito da USP e diversas delas foram incorporadas ao Anteprojeto. Este foi reapresentado ao Ministério da Justiça, como versão final, em dezembro de 2006, estando lá até hoje para a devida análise [57].


Capítulo 2

ALTERAÇÕES PROPOSTAS PELO ANTEPROJETO DO CÓDIGO BRASILEIRO DE PROCESSOS COLETIVOS

2.1. PRINCIPAIS ALTERAÇÕES

No presente capítulo, serão apresentadas apenas algumas – as mais relevantes – novidades processuais apresentadas pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos.

A fim de se tornar o texto mais claro, inteligível e preciso neste item, os cotejamentos feitos adiante, entre o que dispõe a atual legislação e o Anteprojeto em comento, foram catalogados de acordo com os institutos do processo civil coletivo objeto das modificações.

2.2. COMPETÊNCIA

Quanto à competência o Anteprojeto traz algumas inovações relevantes que merecem ser vistas. Antes, porém, há que ser apreciada a legislação atual, a fim de que seja possível o entendimento das propostas em comento.

2.2.1. Aspectos gerais

A legislação contemporânea dos direitos coletivos, formada pelo microssistema legal da Lei da Ação Popular (Lei 4717), da Lei da Ação Civil Pública (7.347/85) e do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078), no que se refere à competência, apresenta-se bastante contraditória, vaga e imprecisa, sendo considerada pela doutrina como o principal obstáculo a ser vencido no que se refere a ação coletiva no Brasil.

O art. 2º da Lei da Ação Civil Pública dispõe que:

as ações previstas nesta lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.

Sob o comando dessa fórmula, bastava que nos limites territoriais de determinada comarca ou circunscrição judicial repercutissem, de qualquer modo, lesões a direitos considerados metaindividuais para que se firmasse nelas a competência para processamento da ação civil pública. Os juízos afetados, quando o dano atingisse mais de uma comarca ou circunscrição territorial, possuíam competência concorrente de acordo com o citado dispositivo.

Em seguida sobreveio o Código de Defesa do Consumidor, que em seu art. 93 trouxe a seguinte nova:

Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça local:

I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;

II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente.

A primeira modificação, em verdade objetivou somente corrigir interpretações que não admitiam a competência da Justiça Federal para processar e julgar causas cujo dano ocorrera em comarcas que não eram sede de juízo federal, ao argumento de que o art. 2º da Lei da Ação Civil Pública, em consonância com o § 3º da CRFB, restringia a competência da Justiça Federal em tais casos.

Para juristas que esposavam tal entendimento, como o art. 2º da Lei da Ação Civil Pública previa que o foro competente era o do local do dano, e tendo em vista os casos cujo dano ao bem coletivo se dava em lugares onde não havia sede de vara federal, a competência para o processo e julgamento de tais feitos seria da Justiça Estadual, apesar de a causa ser de interesse da União, visto ser esta a única justiça existente no local do dano [58].

Com a redação do art. 93, restou patente a competência da Justiça Federal para as causas cujo dano ocorrera em comarcas que não abrigam sede de juízo federal. O juízo competente é aquele ao qual o local do dano está sujeito, isto é, é a seção ou subseção judiciária federal competente.

A segunda novidade, trazida pelo inciso II do art. 93 do Código de Defesa do Consumidor, refere-se à citação dos termos "danos de âmbito local, regional ou nacional", a fim de ajustar, então, a competência jurisdicional à seguinte lógica: na hipótese de os danos serem reputados meramente locais, a competência recairia no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, repetindo-se, aí, o mesmo critério já fixado pelo art. 2º da Lei da Ação Civil Pública; na hipótese de os danos reputarem-se de âmbito regional ou nacional, a competência concorreria entre o foro da capital do Estado ou do Distrito Federal [59].

O citado inciso provocou divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da revogação ou não do art. 2º da Lei da Ação Civil Pública [60].

Também não houve consenso doutrinário e jurisprudencial sobre o que seriam os danos coletivos locais, regionais e nacionais. A conceituação de tais elementos mostrou-se bastante complexa e subjetiva. Ora, a confusão se deu principalmente em virtude da escolhe de critérios não jurídicos para a definição da competência. Usou-se o critério que pode ser entendido como a divisão político-administrativa (municípios e estados-membros) ou territorial (por regiões, tais como norte, sul, nordeste, sudeste e centro-oeste, mas, lamentavelmente, não se utilizou a acepção jurídica [61].

A fim de solucionar o atual impasse existente acerca da competência das ações coletivas, o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos previu o seguinte:

Art. 22. Competência territorial– É absolutamente competente para a causa o foro:

I – do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;

II – de qualquer das comarcas ou sub-seções judiciárias, quando o dano de âmbito regional compreender até 3 (três) delas, aplicando-se no caso as regras de prevenção;

III - da Capital do Estado, para os danos de âmbito regional, compreendendo 4 (quatro) ou mais comarcas ou sub-seções judiciárias;

IV – de uma das Capitais do Estado, quando os danos de âmbito interestadual compreenderem até 3 (três) Estados, aplicando-se no caso as regras de prevenção;

IV- do Distrito Federal, para os danos de âmbito interestadual que compreendam mais de 3 (três) Estados, ou de âmbito nacional.

§ 1º A amplitude do dano será aferida conforme indicada na petição inicial da demanda.

§ 2º Ajuizada a demanda perante juiz territorialmente incompetente, este remeterá incontinenti os autos ao juízo do foro competente, sendo vedada ao primeiro juiz a apreciação de pedido de antecipação de tutela.

§ 3º No caso de danos de âmbito nacional, interestadual e regional, o juiz competente poderá delegar a realização da audiência preliminar e da instrução ao juiz que ficar mais próximo dos fatos.

§ 4º Compete ao juiz estadual, nas comarcas que não sejam sede da Justiça federal, processar e julgar a ação coletiva nas causas de competência da Justiça federal.

Do dispositivo, vislumbram-se as seguintes modificações de maior relevância, a saber: o estabelecimento do foro competente, único, para julgamento nos casos de dano regional e interestadual; a delegação de competência ao juízo estadual para processar e julgar os feitos nas comarcas que não sejam sede da Justiça Federal.

Críticas às modificações em questão serão feitas no próximo capítulo.

2.2.2. Juízos especializados

O art. 18 do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos apresenta outra interessante e oportuna inovação ainda sobre competência, qual seja, a previsão expressa de juízos especializados para processamento e julgamento das causas coletivas.

Vale dizer que especialização, no sentido utilizado pelo dispositivo, é a sociológica [62], isto é, a diferenciação resultante da divisão de trabalho. Com a aplicação do citado artigo, nos casos em que possível, haverá juízos exclusivos para processar e julgar as lides coletivas.

Isso porque as causas coletivas são cada vez mais complexas, exigindo, dos operadores do direito, conhecimentos específicos e profundos sobre determinadas áreas às questões pertinentes, o que torna imperiosa a especialização desses profissionais, inclusive a dos juízes.

O parágrafo único do artigo em comento traz importante restrição à norma estabelecida pelo caput, garantindo a competência dos juízos residuais comuns para a liquidação e execução dos danos sofridos em virtude de violação a interesses ou direitos individuais homogêneos.

A razão de ser da ressalva é que os direitos individuais homogêneos, como é sabido, são direitos individuais em essência, vez que apenas se agregam como átomos a formarem a matéria momentanemente na fase de conhecimento da lesão de origem comum, mas se desintegram, novamente, tornando ao estado característico individual na fase de cumprimento do julgado [63].

2.3. REFORMULAÇÃO DO SISTEMA DAS PRECLUSÕES

Preclusão é vocábulo advindo do latim praecludere, que significa fechar, encerrar, impedir [64].

Constitui a perda de faculdade processual ou a extinção do direito a que a parte tivera de realizar o ato, ou de exigir determinada providência judicial [65].

As espécies de preclusão dão-se em função de três fatores determinantes, cuja classificação dá-se na seguinte forma.

Preclusão consumativa: ocorre quando a parte pratica ato dentro do prazo legal e não poderá praticá-lo novamente, vez que já consumado. Exemplo: prolatada a sentença, a parte sucumbente, recorre. Ainda que não expirado o prazo recursal, o ato processual cabível já foi praticado, não cabendo a interposição de novo recurso [66].

Preclusão lógica: ocorre quando a parte pratica ato incompatível com anteriormente já praticado. Exemplo: prolatada sentença condenando o Réu a pagar determinada quantia ao Autor, aquele, espontaneamente, deposita tal quantia na conta do Autor ou mesmo em Juízo. Após, ainda no prazo recursal, o Réu interpõe recurso de apelação (CPC, art. 503 e § único) [67].

Preclusão temporal: ocorre quando a parte, no prazo processual legal ou judicial fixado para a prática do ato, não o pratica [68].

Preclusão, nas precisas palavras de PAULO HENRIQUE DOS SANTOS LUCON e DANIELA MONTEIRO GABBAY,

garante a ordem, coerência e direcionamento aos atos processuais, impedindo avanços e recuos que tumultuem a seqüência das fases procedimentais. É o impulso que movimenta o encadeamento dos atos processuais e assegura celeridade na resolução de conflitos.

No processo civil coletivo atual, toda essa sistemática relativa à preclusão é observada, nada sendo especial em relação ao processo ortodoxo de cunho individualista.

O mesmo ocorre com o previsto no Anteprojeto em comento, com apenas uma exceção, que se vislumbra no artigo 5º, parágrafo único:

Parágrafo único. A requerimento da parte interessada, até a prolação da sentença, o juiz permitirá a alteração do pedido ou da causa de pedir, desde que seja realizada de boa-fé, não represente prejuízo injustificado para a parte contrária e o contraditório seja preservado, mediante possibilidade de nova manifestação de quem figure no pólo passivo da demanda, no prazo de 10 (dez) dias, com possibilidade de prova complementar, observado o parágrafo 3º do artigo 10.

Nesse preceito, verifica-se que foi cindida a regra atual do processo civil, segundo a qual, efetivada a citação, não é mais permitido ao autor modificar a causa de pedir sem o consentimento do réu, bem como, passada a fase de saneamento, não é possível a alteração nem mesmo com o consentimento do réu.

Tal imodificabilidade da causa de pedir tem o condão de determinar estabilização da demanda e igualmente possibilitar a defesa mais ampla do réu, porque os fatos narrados na inicial noticiam ao mesmo qual será o tema e os limites da controvérsia, razão por que no citado parágrafo único se respeitou o direito ao contraditório do réu, que deve ser ouvido sobre a alteração e, ademais, ter oportunizado o seu direito de manifestar as suas alegações sobre a matéria, com a respectiva produção de provas.

2.4. REFORMULAÇÃO DO SISTEMA DA COISA JULGADA

O instituto da coisa julgada, no âmbito das ações coletivas, atualmente, é tratado de maneira bastante semelhante à do processo meramente individual. Há somente três diferenças entre ambos os processos.

Antes de detalhar as dessemelhanças, há de se gizar o fato de que a coisa julgada material para todos os tipos de processo – individual e coletivo - é a imutabilidade da sentença que sempre ocorrerá nos casos em que houver julgamento definitivo que aborde o mérito da questão, isto é, a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais discutível por recurso ordinário ou extraordinário, conforme preceitua o artigo 467 do Código de Processo Civil

Art. 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário [69].

Para Adriano Perácio de Paula, a autoridade da coisa julgada reside "na imutabilidade derivada do comando emergente de uma sentença, não se identificando apenas com o caráter formal de definitividade e de intangibilidade da decisão, mas tornando imutáveis quaisquer dos efeitos do próprio ato" [70].

A primeira particularidade da coisa julgada no âmbito dos processos coletivos se verifica na tutela dos direitos difusos e coletivos em sentido estrito. Nesses casos a coisa julgada é dita secundum eventum litis, isto é, segundo as circunstâncias do caso em apreço.

Isso porque o Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 103, juntamente com o art. 16 da Lei da Ação Civil Pública, possibilitam a propositura de nova ação, nos casos de improcedência do pedido por insuficiência de provas, dês que fundada em novas provas. Essa particularidade faz o processo coletivo romper com o princípio da cognição exauriente visto nos processos individuais [71].

Sobre o tema, a doutrina diz que

(...) igualmente não deixa de ser uma utilidade providencial, a opção de o legislador do CDC determinar a possibilidade da coisa julgada secundum eventum litis. Em outros termos, a coisa julgada de acordo com o resultado da demanda. De modo que, sendo julgada improcedente uma ação civil pública, poderá a mesma ser renovada até pelo próprio autor, desde que munido de novas provas, e sem prejuízo das ações individuais [72].

Mesmo em relação à ação popular, a lógica é idêntica: A sentença proferida na ação popular tem eficácia erga omnes, quando seja de recebimento ou de rejeição. Quando a sentença de rejeição tiver por fundamento a deficiência de provas, qualquer cidadão poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento, produzindo novas provas. É o que decorre do art. 18.

A segunda peculiaridade do instituto da coisa julgada no processo coletivo diz respeito aos direitos individuais homogêneos, estando consagrada no art. 103, III, do Código de Defesa do Consumidor. Segundo tal dispositivo, a coisa julgada formada nessa ação é erga omnes somente no caso de procedência da ação para beneficiar todos os sujeitos titulares de direitos individuais postulados, bem como seus sucessores.

Sobre o tema, Celso Antonio Pacheco Fiorillo traz elucidativa explicativa:

Nas ações coletivas para a defesa de direitos individuais homogêneos, a coisa julgada terá efeitos erga omnes, em benefício do consumidor (in utilibus), somente se houver procedência do pedido (secundum eventum litis). Caso o pedido seja julgado improcedente, por ser infundada a pretensão ou mesmo por insuficiência de provas, aludida circunstância não inibirá a ação (com o mesmo objeto) individual do consumidor [73].

A terceira especialidade do processo coletivo no que tange à coisa julgada encontra-se disposto no art. 16 da Lei da Ação Civil Pública. Segundo prescreve esse dispositivo

a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator.

O legislador, por intermédio desse artigo, objetivou delimitar a eficácia da coisa julgada dentro dos lindes de competência do juiz competente para a causa coletiva.

Eis, portanto, o panorama atual da coisa julgada em relação aos processos coletivos.

No Anteprojeto em comento a coisa julgada tem lugar de destaque no art. 13, que dispõe o seguinte:

Art. 13. – Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova.

Par. 1º. Tratando-se de interesses ou direitos individuais homogêneos (art. 3º, III, deste Código), em caso de improcedência do pedido, os interessados poderão propor ação a título individual.

Par. 2º. Os efeitos da coisa julgada nas ações em defesa de interesses ou direitos difusos ou coletivos (art. 4º, I e II, deste Código) não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 34 e 35 deste Código.

Par. 3º. Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

Par. 4º. A competência territorial do órgão julgador não representará limitação para a coisa julgada erga omnes.

Par. 5º. Mesmo na hipótese de sentença de improcedência, fundada nas provas produzidas, qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento, no prazo de 2 (dois) anos contados do conhecimento geral da descoberta de prova nova, superveniente, que não poderia ser produzida no processo, desde que idônea, por si só, para mudar seu resultado.

Par. 6º - A faculdade prevista no parágrafo anterior, nas mesmas condições, fica assegurada ao demandado da ação coletiva julgada procedente.

As normas sobre coisa julgada dos dispositivos em análise, embora se atendo ao regime vigente, são simplificadas, contemplando, como principal novidade, a possibilidade de repropositura da ação, no prazo de 2 (dois) anos contados da descoberta de prova nova, superveniente, idônea para mudar o resultado do primeiro processo e que neste não foi possível produzir. Por fim, não se pode olvidar a norma contida no parágrafo quarto do citado artigo, que tem por objetivo revogar o artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública.

2.5. RESTRUTURAÇÃO DA LITISPENDÊNCIA, CONEXÃO E CONTINÊNCIA

Antes de adentrar às modificações propostas dos institutos de processos coletivos, referidos neste subitem, faz-se mister o descrever como o processo civil brasileiro hodierno, tanto o individual quanto o coletivo, vem cuidando da litispendência, conexão e continência.

No processo civil individual, litispendência, conexão e continência são assuntos tratados em dispositivos diferentes, tendo por objeto, todavia, idênticos elementos – que também são conhecidos como elementos da ação -, a saber: partes, pedido e causa de pedir.

Sobre os elementos da ação, cumpre colacionar os ensinamentos de Celso Antonio Pacheco Fiorillo:

Os elementos são dados de identidade de uma ação, de forma a personaficá-la, individualizá-la no mundo jurídico. A utilidade da identificação dos elementos da ação liga-se à compreensão de determinados fenômenos processuais, como a litispendência, a perempção, a coisa julgada material, a conexão, a continência e a prejudicialidade externa, bem como à resolução de questões a ele relacionados [74].

Ainda acerca dos elementos da ação, salienta Vicente Greco Filho com propriedade:

O problema da identificação das ações tem importância fundamental para dois institutos: a litispendência e a coisa julgada. Ambas as figuras são impeditivas da repetição da demanda, ou porque a ação ainda está em andamento (litispendência), ou porque a ação já se encerrou definitivamente (coisa julgada). A jurisdição, quando provocada ou quando esgotada, atua apenas uma vez, resolvendo definitivamente a lide, sendo proibida a repetição da causa [75].

A Litispendência – lide pendente – refere-se, na sua conceituação clássica adotada pelo Código de Processo Civil, a dois ou mais casos iguais, ou seja, os que envolvam as mesmas partes, pedido e causa de pedir, conforme os parágrafos do artigo 301 do Estatuto Processual Pátrio:

§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.

§ 2º Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.

§ 3º Há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso.

Cumpre frisar, também, que a citação válida induz litispendência, consoante o disposto no art. 219 do Código de Processo Civil.

A questão da litispendência em relação às ações coletivas não havia recebido tratamento legal até o advento do Código de Defesa do Consumidor, que em seu art. 104 dispõe o seguinte:

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

Do tal dispositivo, nota-se que o mesmo cuidou somente da hipótese de ajuizamento concomitante de ações individuais, desprezando, assim, a possibilidade de serem instaurados vários processos coletivos, fato que vem tornando-se cada vez mais freqüente e problemático [76].

Sobre o dispositivo ainda, cabe dizer que a doutrina tem estendido a todas as categorias de ações coletivas o preceito do art. 104, sem embargo do sentido literal do dispositivo.

A conexão– art. 103, do Estatuto Processual – verifica-se, por seu turno, nos casos em que duas ou mais ações que possuem o mesmo objeto (pedido) ou causa de pedir.

Por fim, a Continência - art. 104, do Código de Processual Civil – é o fenômeno processual visto nas ações em que haja identidade de partes, causa de pedir e o pedido de uma, por ser mais amplo, abrange o da outra.

A doutrina acrescenta o que segue sobre a continência:

A continência, por sua vez, ocorre sempre que entre duas ou mais ações houver identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o objeto de uma, por ser mais amplo, abranger o das outras. Vale verificar a inexistência de continência entre uma ação coletiva para a defesa de direito individual homogêneo e uma ação individual, já que, tendo partes diferentes (o primento atua como substituto processual – art. 91 do Código de Defesa do Consumidor - , enquanto o segundo, como legitimado ad causam), apenas os requisitos do pedido (o da ação coletiva seria continente em relação ao da ação individual) e da causa de pedir (eventualmente a mesma) estariam preenchidos [77].

No processo coletivo também se verifica a ocorrência desses institutos. É possível perfeitamente haver litispendência entre duas ações baseadas em direitos coletivos, vez que basta imaginar a mesma Associação ingressando com ação civil pública em face da indústria "X", pedindo a retirada de uma propaganda do ar, duas vezes.

Ademais, há que se atentar para a seguinte peculiariedade: se duas ações são propostas pelo MP, uma na cidade de Londrina, por exemplo, e outra em Cascavel, o STJ não aceita a ocorrência de litispendência, devendo ser respeitados os limites da competência territorial.

Nesse esteira, segue o seguinte julgado:

PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LITISPENDÊNCIA - LIMITES DA COISA JULGADA.

1. A verificação da existência de litispendência enseja indagação antecedente e que diz respeito ao alcance da coisa julgada. Conforme os ditames da Lei 9494, "a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorialdo órgão prolator".

2. As ações que têm objeto idêntico devem ser reunidas, inclusive quando houver uma demanda coletiva e diversas ações individuais, mas a reunião deve observar o limite da competência territorial da jurisdição do magistrado que proferiu a sentença.

3. Hipótese em que se nega a litispendência porque a primeira açãoestá limitada ao Município de Londrina e a segunda ao Município de Cascavel, ambos no Estado do Paraná [78].

Esse é o atual panorama da Litispendência, Conexão e Continência verificado no hodierno ordenamento jurídico pátrio.

No Anteprojeto em análise tais institutos não sofrem alterações de grande relevância a ponto de converter a natureza dos institutos.

A mais importante inovação é a constante do artigo 5º do Anteprojeto que diz que se deve atentar mais para o bem jurídico a ser tutelado que a outros aspectos – como legitimados por exemplo -, a saber:

Art. 5º – Nas ações coletivas, a causa de pedir e o pedido serão interpretados extensivamente, em conformidade com o bem jurídico a ser protegido.

Isso significa que na análise dos elementos da ação para a verificação dos institutos em análise, dar-se-á maior ênfase à causa de pedir e pedido em seu aspecto material e objetivo.

Para a verificação de litispendência, de acordo com a proposta, basta que os mesmos interesses dos mesmos substituídos sejam objeto de duas ações. Não importa que os legitimados - ou seja, os substitutos - sejam diversos.

Nesse mesmo sentido, ressaltando que no cotejo das ações coletivas se deve levar em conta a identidade do bem jurídico a ser tutelado, sem promover significativas alterações, segue o art. 6º do Anteprojeto:

Art. 6º. Relação entre demandas coletivas – Observado o disposto no artigo 22 deste Código, as demandas coletivas de qualquer espécie poderão ser reunidas, de ofício ou a requerimento das partes, ficando prevento o juízo perante o qual a demanda foi distribuída em primeiro lugar, quando houver:

I – conexão, pela identidade de pedido ou causa de pedir ou da defesa, conquanto diferentes os legitimados ativos, e para os fins da ação prevista no Capítulo III, os legitimados passivos;

II – conexão probatória, desde que não haja prejuízo à duração razoável do processo;

III – continência, pela identidade de partes e causa de pedir, observado o disposto no inciso anterior, sendo o pedido de uma das ações mais abrangente do que o das demais.

§ 1ºNa análise da identidade do pedido e da causa de pedir, será considerada a identidade do bem jurídico a ser protegido.

§ 2ºNa hipótese de conexidade entre ações coletivas referidas ao mesmo bem jurídico, o juiz prevento, até o início da instrução, deverá determinar a reunião de processos para julgamento conjunto e, iniciada a instrução, poderá determiná-la, desde que não haja prejuízo à duração razoável do processo;

§ 3ºAplicam-se à litispendência as regras dos incisos I e III deste artigo, quanto à identidade de legitimados ativos ou passivos, e a regra de seu parágrafo 1º, quanto à identidade do pedido e da causa de pedir ou da defesa.

Outra questão bastante relevante sobre litispendência diz respeito às demandas individuais que versam sobre o mesmo objeto das ações coletivas. O Anteprojeto, elaborado no âmbito da UERJ-Unesa, esposou o entendimento do sistema de vinculação de exclusão – opt-out -, segundo o qual devem os interessados no processo, caso não queiram vincular-se à ação coletiva, solicitar o desacoplamento do litígio coletivo dentro do prazo fixado pelo juiz.

A versão oficial do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos manteve também o estabelecido no art. 104 do Código de Defesa do Consumidor, reafirmando que a demanda coletiva não induz litispendência para as ações individuais.

2.6. AMPLIAÇÃO DO ROL DE LEGITIMADOS E REPRESENTATIVIDADE ADEQUADA

2.6.1. Ampliação do rol de legitimados

Outra importante modificação apresentada pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, seguindo a trilha do Código Modelo [79] de Processos Coletivos para a Ibero-América, apresenta-se no sentido de aumentar o rol de legitimados para a propositura da ação coletiva, passando a considerar como legítimo o indivíduo.

Desse modo, o Anteprojeto distancia-se dos dois distintos modelos tradicionais de legitimação atualmente conhecidos, a saber: o norte-americano, que privilegia os indivíduos, e o europeu que concede atribuição para o poder público e associações [80].

Sobre os legitimados para a propositura das ações coletivas, o Anteprojeto dispõe o seguinte:

Art. 20. Legitimação. São legitimados concorrentemente à ação coletiva ativa:

I – qualquer pessoa física, para a defesa dos interesses ou direitos difusos, desde que o juiz reconheça sua representatividade adequada, demonstrada por dados como:

a – a credibilidade, capacidade e experiência do legitimado;

b – seu histórico na proteção judicial e extrajudicial dos interesses ou direitos difusos e coletivos;

c – sua conduta em eventuais processos coletivos em que tenha atuado;

II – o membro do grupo, categoria ou classe, para a defesa dos interesses ou direitos coletivos, e individuais homogêneos, desde que o juiz reconheça sua representatividade adequada, nos termos do inciso I deste artigo;

III - o Ministério Público, para a defesa dos interesses ou direitos difusos e coletivos, bem como dos individuais homogêneos de interesse social;

IV – a Defensoria Pública, para a defesa dos interesses ou direitos difusos e coletivos, quando a coletividade ou os membros do grupo, categoria ou classe forem necessitados do ponto de vista organizacional, e dos individuais homogêneos, quando os membros do grupo, categoria ou classe forem, ao menos em parte, hiposuficientes;

V – as pessoas jurídicas de direito público interno, para a defesa dos interesses ou direitos difusos e, quando relacionados com suas funções, dos coletivos e individuais homogêneos;

VI - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, bem como os órgãos do Poder Legislativo, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos indicados neste Código;

VII – as entidades sindicais e de fiscalização do exercício das profissões, restritas as primeiras à defesa dos interesses e direitos ligados à categoria;

VIII - os partidos políticos com representação no Congresso Nacional, nas Assembléias Legislativas ou nas Câmaras Municipais, conforme o âmbito do objeto da demanda, para a defesa de direitos e interesses ligados a seus fins institucionais;

IX - as associações civis e as fundações de direito privado legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano, que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses ou direitos indicados neste Código, dispensadas a autorização assemblear ou pessoal e a apresentação do rol nominal dos associados ou membros.

Assim, resta patente a ampliação do rol de legitimados para ingressar com as ações coletivas apresentada pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos em análise.

2.6.2. Representatividade adequada

Na versão de dezembro de 2005, o anteprojeto assumido pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual limitou a aferição da representatividade adequada das pessoas físicas.

Para a aferição da representatividade adequada, foram estabelecidos os seguintes parâmetros exemplificativos: a credibilidade, capacidade, prestigio e experiência do legitimado; seu histórico na proteção judicial e extrajudicial dos interesses ou direitos dos membros do grupo, categoria ou classe; sua conduta em outros processos coletivos; a coincidência entre os interesses dos membros do grupo, categoria ou classe e o objeto da demanda; e o tempo de instituição da associação e a representatividade desta ou da pessoa física perante o grupo, categoria ou classe [81].

O sistema vigente de tutela coletiva, integrado principalmente pelos estatutos pertinentes à ação popular, à ação civil pública e à defesa do consumidor, contenta-se com um controle mais abstrato e formal em relação aos legitimados, cabendo ao juiz, no máximo, a aferição do tempo de existência da associação, quando esta for autora, e, se não, da dispensa deste pré-requisito.

O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, ao contrário, atribui ao magistrado um controle de admissibilidade centrado na adequação da representatividade do legitimado e da relevância social da demanda coletiva, bem como, diante dos interesses individuais homogêneos, em relação à predominância de questões comuns sobre as individuais e da superioridade (utilidade) da tutela coletiva no caso concreto.

Cumpre esclarecer que, de acordo com o art. 20 do Anteprojeto, na hipótese de interesse coletivo ou individual homogêneo, além dos requisitos do inciso I do mencionado artigo, o adequado representante individual deverá ser membro do grupo, categoria ou classe. Essa qualidade, assim como nos Estados Unidos da América, de onde a norma tem inspiração, é conferida judicialmente [82].

A falta de representação adequada não deve, todavia, levar o processo à extinção sem resolução do mérito. O Anteprojeto em questão prevê a continuidade do feito até os seus ulteriores termos, mesmo nos casos de inexistência de representatividade adequada, quando impõe ao juiz o dever de intimar o Ministério Público e, quando possível, outros legitimados adequados para o caso, para que assumam, caso queiram, a titularidade do processo.

2.7. GRATIFICAÇÃO AOS INDIVÍDUOS, ASSOCIAÇÕES E SINDICATOS

O Anteprojeto em análise também apresenta outra novidade quando propõe a criação de gratificação financeira para o legitimado pessoa física, sindicato, associação ou fundação, nos casos em que a atuação em defesa dos direitos coletivos seja relevante e tenha logrado êxito na defesa dos direitos coletivos.

Isso de acordo com o art. 17, § 3º, transcrito abaixo:

§ 3º Se o legitimado for pessoa física, entidade sindical ou de fiscalização do exercício das profissões, associação civil ou fundação de direito privado, o juiz, sem prejuízo da verba da sucumbência, poderá fixar gratificação financeira, a cargo do Fundo dos Direitos Difusos e Coletivos, quando sua atuação tiver sido relevante na condução e êxito da demanda coletiva, observados na fixação os critérios de razoabilidade e modicidade.

Assim, a gratificação será arbitrada pelo juiz da causa, que decidirá conforme o desempenho do representante na tutela dos direitos coletivos.

2.8. PROVA

No Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, a tradicional formula adotada pelo Código de Processo Civil [83] - segundo a qual o ônus da prova cabe ao autor quanto à comprovação do fato constitutivo do seu direito, enquanto ao réu a do fato impeditivo, extintivo ou modificativo – não foi acolhida.

O art. 11 do Anteprojeto estabelece a formula que atribui o ônus da prova à parte que detiver conhecimentos técnicos ou informações específicas sobre os fatos ou maior facilidade em sua demonstração:

Art. 11. Provas – São admissíveis em juízo todos os meios de prova, desde que obtidos por meios lícitos, incluindo a prova estatística ou por amostragem.

§ 1º Sem prejuízo do disposto no artigo 333 do Código de Processo Civil, o ônus da prova incumbe à parte que detiver conhecimentos técnicos ou informações específicas sobre os fatos, ou maior facilidade em sua demonstração.

§ 2ºO ônus da prova poderá ser invertido quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação, segundo as regras ordinárias de experiência, ou quando a parte for hipossuficiente.

§ 3º Durante a fase instrutória, surgindo modificação de fato ou de direito relevante para o julgamento da causa (parágrafo único do artigo 5º deste Código), o juiz poderá rever, em decisão motivada, a distribuição do ônus da prova, concedendo à parte a quem for atribuída a incumbência prazo razoável para sua produção, observado o contraditório em relação à parte contrária (artigo 25, parágrafo 5º, inciso IV).

§ 4º . O juiz poderá determinar de ofício a produção de provas, observado o contraditório.

§ 5º.Para a realização de prova técnica, o juiz poderá solicitar a elaboração de laudos ou relatórios a órgãos, fundações ou universidades públicas especializados na matéria.

O Anteprojeto também se pronunciou sobre a admissão de prova estatística ou por amostragem. O art. 11 supratranscrito tratou do tema.

2.9. FUNDO DOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS

Representa o fundo em questão outra novidade relevante é a trazida pelo diploma em análise.

O art. 27 do Anteprojeto de Código de Processos Coletivos Brasileiro, qual seja:

Art. 27. Do Fundo dos Direitos Difusos e Coletivos.O Fundo será administrado por um Conselho Gestor federal ou por Conselhos Gestores estaduais, dos quais participarão necessariamente, em composição paritária, membros do Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à realização de atividades tendentes a minimizar as lesões ou a evitar que se repitam, dentre outras que beneficiem os bens jurídicos prejudicados, bem como a antecipar os custos das perícias necessárias à defesa dos direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos e a custear o prêmio previsto no parágrafo 3º do artigo 17.

Esse dispositivo permite o levantamento de valores do citado Fundo para o custeio de perícias de ações coletivas, visando a resolver o que hoje é um dos grandes obstáculos ao Ministério Público na defesa dos direitos coletivos lato sensu, a saber, a falta de recursos para custeá-la.

Sobre o tema, pertinente é a observação formulada por Dorival Moreira dos Santos:

Não se olvide que a maioria das ações é movida pelo Ministério Público e seria no mínimo injusto e inviável exigir-se que custeie todas as perícias necessárias, dada à resistência constante da parte requerida – autentica praxe – em fazê-lo pelo desinteresse na apuração de prováveis responsabilidades por atos ilícitos [84].

De outro lado, vale mencionar o teor do art. 17, § 4º, que veda o adiantamento de honorários periciais, assim como custas, emolumentos ou quaisquer outras despesas nas ações coletivas, previsão legal atualmente constante do art. 18 da Lei da Ação Civil Pública [85].

2.10. VALOR DA CAUSA

O artigo 22, § 4º, do Anteprojeto dispensa a menção expressa do valor da causa nos casos em que essa quantia é incomensurável ou inestimável:

§ 4º Na hipótese de ser incomensurável ou inestimável o valor dos danos coletivos fica dispensada a indicação do valor da causa.

Tal modificação segue a linha constitucional do processo célere, uma vez que atualmente sói ocorrer discussões sobre ausência do valor da causa ou sobre atribuição de valores. Tais celeumas serão atalhadas caso seja acatada a proposta em comento.

2.11. AÇÃO COLETIVA PASSIVA

O Anteprojeto em análise propõe inovar sobremodo a legislação, admitindo a possibilidade da ação coletiva passiva, o que corroborará entendimento jurisprudencial e doutrinário sobre o tema, conforme se verifica do art. 38 e seguintes:

Art. 38. Ações contra o grupo, categoria ou classe – Qualquer espécie de ação pode ser proposta contra uma coletividade organizada, mesmo sem personalidade jurídica, desde que apresente representatividade adequada (artigo 20, I, "a", "b" e "c"), se trate de tutela de interesses ou direitos difusos e coletivos (artigo 4º, incisos I e II) e a tutela se revista de interesse social.

Parágrafo único.O Ministério Público e os órgãos públicos legitimados à ação coletiva ativa (art. 20, incisos III, IV, V e VI e VII deste Código) não poderão ser considerados representantes adequados da coletividade, ressalvadas as entidades sindicais.

Art. 39. Coisa julgada passiva –A coisa julgada atuará erga omnes, vinculando os membros do grupo, categoria ou classe e aplicando-se ao caso as disposições do artigo 12 deste Código, no que dizem respeito aos interesses ou direitos transindividuais.

Art. 40. Aplicação complementar às ações coletivas passivas – Aplica-se complementarmente às ações coletivas passivas o disposto no Capítulo I deste Código, no que não for incompatível.

Parágrafo único.As disposições relativas a custas e honorários, previstas no artigo 16 e seus parágrafos, serão invertidas, para beneficiar o grupo, categoria ou classe que figurar no pólo passivo da demanda.

Pode-se pensar, assim, em ações entre associação de pais e de mantenedoras de instituições de ensino, bem como de consumidores e de fabricantes de determinados produtos.


Capítulo 3

REFLEXÕES SOBRE AS ALTERAÇÕES PROPOSTAS PELO ANTEPROJETO DE CÓDIGO BRASILEIRO DE PROCESSOS COLETIVOS

3.1. CRÍTICAS ÀS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES

O vertente capítulo versa sobre análises críticas direcionadas às inovações do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, apresentadas no segundo capítulo deste Trabalho.

De plano, as alterações serão vistas pontualmente, conforme a ordem em que foram abordadas no capítulo anterior; porém, agora, de maneira crítica e apresentando a opinião da doutrina sobre os temas.

Em outras palavras, esta seção desta Obra visa a demonstrar eventuais progressos e/ou retrocessos provenientes das propostas do Anteprojeto, tanto dos dispositivos isoladamento, como do conjunto de instrumentos processuais apresentados por esse anteprojeto de diploma legal.

3.2. COMPETÊNCIA

3.2.1. Aspectos Gerais

A responsável pela versão final do Anteprojeto, que foi enviado para o Congresso Nacional, a professora Ada Pelegrini, justificou o teor das propostas sobre competência da seguinte maneira.

Sobre a localização do dispositivo que aborda a competência no processo coletivo, agora deslocado para as Disposições Gerais, a autora afirma que no Código de Defesa do Consumidor o mesmo "figura indevidamente entre as regras que regem a ação em defesa de interesses ou direitos individuais homogêneos, o que tem provocado não poucas discussões" [86].

De fato, a alteração em questão apresenta-se razoável, vez que elimina qualquer possibilidade de interpretações restritivas para a aplicação do dispositivo somente para as ações relativas a direitos ou interesses individuais homogêneos, o que favorece a segurança jurídica. Há que se estender o dispositivo sobre competência a todos os direitos coletivos, incluindo o difusos e coletivos em sentido estrito.

A fim de justificar a manutenção dos termos "local", "regional" e "nacional", que atualmente são sobremodo criticados pela doutrina [87], por não haver conceito único e inconteste acerca sua extensão e profundidade, o Anteprojeto procedeu a uma aleatória definição do que seriam aqueles conceitos, estabelecendo a competência dos juízos das capitais dos Estados para causas que versem sobre danos que atinjam quatro ou mais comarcas ou até três Estados e a competência exclusiva do Distrito Federal para ações coletivas que se fundamentam em danos nacionais ou interestaduais que envolvam mais de três Estados.

A competência concorrente entre o Distrito Federal e as capitais dos Estados verificada na legislação contemporânea foi bastante restringida pelo Anteprojeto em análise, sob a justificativa da experiência hoje vivenciada de "proliferações de demandas e de decisões contraditórias", bem como sob o fundamento de que é necessário evitar investidas do Legislativo atualmente consubstanciadas em proposta de Emenda Constitucional que pretende atribuir ao STJ a competência para decidir a respeito do foro competente, vez que regras de competência devem ser fixadas pela lei e não pelos tribunais [88].

Ou seja, a solução ofertada pelo Anteprojeto aos problemas por todo conhecidos é a de insistir na centralização de competência para o julgamento das causas coletivas.

A professora Ada Pellegrini defende tais propostas, ao argumento de que

a relativa centralização da competência vem balanceada pela maior flexibilidade da legitimação entre os diversos órgãos do Ministério Público, que poderão atuar fora dos limites funcionais e territoriais de suas atribuições (quer em relação ao inquérito civil, quer em relação à propositura da demanda – conforme, aliás, já permite a Lei Nacional do Ministério Público). A mesma flexibilidade é atribuída a outros entes legitimados [89].

De outro norte, comentando o Anteprojeto em questão, ELTON VENTURI aduz que:

No entanto, quer nos parecer que tais problemas não sejam fruto propriamente da ausência da centralização da competência jurisdicional no Distrito Federal ou nas capitais, mas sim do solene e freqüente descumprimento da regra referente à obrigatória reunião de feitos conexos ou continentes perante o juízo prevento, expressamente prevista no parágrafo único do art. 2º, da LACP [90].

Além disso, acrescenta o doutrinador que o princípio constitucional fundamental do Juiz Natural [91] continua a ser desrespeitado com a proposta do Anteprojeto, haja vista que privilegia aspectos subjetivos na fixação da competência.

Sobre a referida garantia constitucional, preleciona Nelson Nery Jr. que um dos pressupostos indispensáveis à concretização do juiz natural reside justamente na objetividade dos critérios de determinação de competência dos juízes [92].

Ademais, as regras de competência contidas nas propostas do Anteprojeto, ao garantir a competência absoluta das capitais dos Estados e do Distrito Federal, se afiguram evidente retrocesso no que tange ao princípio constitucional do acesso à justiça, segundo o qual o Poder Judiciário deve ser acessível ao interessado.

Apresentando semelhante entendimento, segue parecer elaborado pelo Ministério Público de Minas Gerais, que fundamenta sua opinião com o ilustrativo exemplo:

Imaginemos danos em quatro comarcas que se situam em regiões do interior do Estado, bem distantes da Capital do Estado, como ocorre com comarcas do Vale do Jequitinhonha, no Estado de Minas Gerais. Seguindo-se a orientação do dispositivo, estará sendo dificultada a coleta de provas diretamente pelo Juiz julgador. Além disso, vários obstáculos poderão surgir quanto à fiscalização do cumprimento das decisões que fixem obrigações específicas [93].

O mesmo raciocínio do exemplo vale para a competência absoluta concedida ao Distrito Federal.

Inclusive,

por ocasião dos debates nos Programas de Pós-Graduação da UERJ e da Unesa, em torno do Anteprojeto, a questão da competência territorial foi a única que não alcançou consenso entre os dois grupos. Na Unesa, prevaleceu o entendimento de que as ações coletivas devem ser ajuizadas, tal como previsto inicialmente na Lei de Ação Civil Pública, no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano e, em caso de abrangência de mais de um foro, a fixação devendo ocorrer pela prevenção [94].

A fim de se imunizar às oportunas críticas recebidas, a última versão do Anteprojeto trouxe a seguinte norma em seu art. 22, § 3º:

No caso de danos de âmbito nacional, interestadual e regional, o juiz competente poderá delegar a realização da audiência preliminar e da instrução ao juiz que ficar mais próximo dos fatos [95].

Não obstante a tentativa de corrigir o erro, o dispositivo não logrou êxito em seu intento, vez que, segundo os seus termos, para a efetivação do princípio do acesso à justiça, o interessado ficará à mercê do juiz da capital dos Estados ou do Distrito Federal, o que se mostra incompatível com o regime constitucional vigente.

Outrossim, vale salientar que a concentração de competência com a delegação da instrução probatória fere ainda o princípio da identidade física do juiz, consagrado no art. 132 do Código de Processo Civil [96].

Ainda sobre a mencionada tentativa de tornar justo e aceitável o dispositivo em análise, forçoso é citar a seguinte observação: "Não há estrutura suficiente no Distrito Federal para receber todas essas ações, o que também dificultará a coleta de provas, quando o DF não for atingido pelo dano" [97]. Idêntica ponderação se subsume às capitais dos Estados, que não dispõem de estrutura consentânea com o número de processos que teriam de processar e julgar, caso seja aprovada tal medida, o que torna ululante que o presente dispositivo concorre contra a efetividade e celeridade do processo coletivo.

Outra norma que labora contra a efetiva e célere proteção dos bens coletivos em sentido amplo é a expressa no § 2º, do art. 22 do Anteprojeto, que veda ao juiz incompetente a apreciação da antecipação de tutela.

Ora, tal vedação é inconstitucional - fere o art. 5º, XXXV, da Constituição da República -, pois, em situação de extrema urgência, nada impede que o juiz defira a antecipação da tutela e declare sua incompetência, remetendo imediatamente os autos ao juiz territorialmente competente, o qual poderá ratificar a decisão, revogá-la ou até modificá-la [98].

Feitas as críticas às normas do Anteprojeto que tratam da competência, que, conforme demonstrado, atentam contra o devido processo legal coletivo, faz-se mister, agora, apresentar soluções ou medidas que melhor se adaptariam à tutela prática dos direitos e interesses coletivos.

De início, saliente-se que a solução para tornar efetivo e democrático o processo civil coletivo, no tocante à competência, é serem aplicadas as normas processuais já existentes atualmente no ordenamento jurídico. O que enseja a proliferação de demandas alvos de decisões contraditórias não é a legislação hodierna.

Não é a concentração de competência, o que causaria todos os malefícios supradescritos, que resolveria o problema da enxurrada de processos sobre o mesmo objeto, o que dá azo a decisões contraditória e confusas, prejudicando, assim, a efetiva proteção aos bens jurídicos coletivos.

Para sanar os conflitos citados, bastaria que fossem aplicados os institutos da litispendência, prevenção, conexão e continência, amiúde e com maior precisão. Ora, se houvesse sido proposta mais de uma ação sobre o mesmo objeto, seria suficiente que o juízo que tomou conhecimento posteriormente à propositura da ação remetesse os autos para o juízo prevento. Para tanto, mera comunicação indicando-lhe o critério objetivo seria apta para tornar incontroverso o juízo competente e fazer com que o segundo juízo a tomar ciência do caso remetesse os autos ao foro competente [99].

Sendo tão simples a solução apresentada, por que ela ainda não é concretizada atualmente? A resposta também é simples: porque não há meios burocráticos e tecnológicos que permitam essa interação entre os juízos de diferentes localidades. Essa é a principal razão por que ainda há muita confusão sobre competência das ações coletivas no Brasil.

Nesse ponto, vale a pena conferir decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA E AÇÃO POPULAR (SISTEMA TELEBRÁS) - CONEXÃO - PREVENÇÃO (CPC, ARTIGOS 103, 106, 219). 1 - Se na conceituação inscrita no art. 103 do CPC, "reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir", não há como se possa recusar a "conexão" em função dos "nomes" com que se possam rotular as ações. 2 - Ocorrendo a "conexão" (art. 103 do CPC), a "competência" do órgão julgador se define pela "prevenção" daquele que despachou em primeiro lugar (art. 106 do CPC). 3 - As ações civis públicas, cujas sentenças de procedência fazem coisa julgada "erga omnes" (Lei n. 7 347, de 24.07.85, art. 16), e as ações populares, cuja propositura "previne" a jurisdição do Juízo para todas as ações posteriores entre as mesmas partes e com os mesmos fundamentos (Lei n. 4 717, de 29.06.65, art. 5º, parágrafo 3º), pertencem ao grupo de ações (como também as ações discriminatórias - Lei n. 6 383, de 07.12.76, art. 23) prejudiciais e de "juízo universal", que exigem, no interesse da estabilidade da ordem jurídica, a concentração das causas, com elas conexas, num único Juízo definido pela prevenção, "a fim de evitar decisões contraditórias, estimuladoras da denominada "guerra de liminares", que atingem o prestígio e a respeitabilidade da Justiça, causando perplexidade à opinião pública " (CC n. 22.693/DF, STJ). 4 - Conflito conhecido. Declarada competência do Juízo da 8ª Vara Federal do Distrito Federal, Suscitado. CC 1998.01.00.072231-8/MA; CONFLITO DE COMPETENCIA 22/03/1999 DJ p.69 [100].

Portanto, resta patente que as mudanças propostas pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos representam atraso na tutela de direitos coletivos e trazem consigo diversos aspectos negativos, que se efetivados concorrerão para inefetividade do processo e para a obstaculização da concretização dos interesses e direitos coletivos, isso sem mencionar as máculas de inconstitucionalidades expostas acima que o caracterizam.

3.2.2. Juízos especializados

Pelos motivos que serão expostos a seguir, de plano, salienta-se que a inovação, consistente na criação de juízos especializados, é bastante interessante.

Acerca da previsão, no Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, da criação de juízos especializados para processar e julgar as lides coletivas, o professor Aluísio Gonçalves de Castro Mendes afirma o seguinte:

É notório que, nos dias de hoje, o Poder Judiciário vem sendo chamado a resolver problemas cada vez mais intrincados, sob o prisma técnico e político. Os processos coletivos são palco de conflitos internos da sociedade, relacionados, por vezes, com políticas públicas e com relevantes questões econômicas e, em certos casos, com complexidade científica. O elevado número de processos e a variedade de matérias submetidas aos juízes vêm exigindo dos órgãos judiciais, por um lado, uma formação cultural e multidisciplinar, mas, por outro, também elevado nível de profissionalização e de especialização, para fazer frente, em tempo condizente com a expectativa da sociedade contemporânea e com a especificidade relacionada aos casos, ao volume de decisões a serem proferidas. A realidade vem impondo, por conseguinte, a especialização dos órgãos judiciais, para que estes possam estar estruturados e preparados para a respectiva matéria [101].

Na mesma trilha segue a posição adotada pelo Ministério Público de Minas Gerais, para quem esse dispositivo dá amparo a uma reivindicação dos estudiosos sobre o tema.

O professor Elton Venturi, além de assentir com a especialização dos juízos competentes para o processamento e julgamento dos feitos coletivos, acresce o seguinte:

Todavia, a relevância da criação de tais varas não residiria tão-somente na sua especialização, mas, acima de tudo, na possibilidade de nelas se concentrar, com exclusividade, o processamento e julgamento de toda e qualquer ação cujo objetivo recaia na tutela de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, independentemente da extensão dos danos a serem apreciados ou dos limites territoriais da vara especializada [102].

E prossegue o autor, ao afirmar que a especialização, desde que não fosse acompanhada da centralização da competência territorial nas capitais dos Estados e no Distrito Federal, concorreria para a "concretização do princípio da imediação (aproximando os jurisdicionados do juiz atuante e o mais próximo possível do local do dano)" [103].

Assim, inconteste ser salutar a criação de varas especializas, vez que a complexidade e profundidade das lides coletivas contemporâneas reclamam operadores do direito – em especial, juízes – dedicados exclusivamente à causa coletiva, a fim de que lhes seja possível resolver de maneira mais adequada, experiente e profissional os conflitos tempestivamente.

3.3. REFORMULAÇÃO DO SISTEMA DAS PRECLUSÕES

A principal reforma proposta pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Procesos Coletivos relacionada à preclusão, como visto retro, é permitir a alteração do pedido e da causa de pedir, até a sentença, dês que seja feita de boa-fé e não haja prejuízo para o demandado, observado sempre o contraditório.

Ou seja, o Anteprojeto permitiu a flexibilização do sistema de preclusão atualmente conhecido que não permite a alteração da causa de pedir e do pedido após a fase de saneamento.

Essa alteração encontra guarida na opinião dos doutrinadores, tais como RICARDO DE BARROS LEONEL, para quem

É possível afirmar que tal solução, mitigando a rigidez tradicional inerente à imutabilidade da demanda, significa um avanço no âmbito do sistema processual coletivo. É aceito e modo geral, pois é dado notório da experiência forense que os conflitos de natureza coletiva possuem um dinamismo que se destaca daquele inerente aos conflitos tradicionais de natureza individual [104].

Para a doutrina, como visto, a flexibilização em comento será muito bem vinda, pois não raro os direitos e interesses coletivos têm a sua extensão e profundidade somente verificada com exatidão após o encerramento da fase de saneamento processual, o que impede a tutela do que foi descoberto, porém não consta da inicial. Assim, nova ação há que ser proposta, acarretando desperdício de tempo e recursos processuais para a resolução da nova lide, bem como o risco de haver decisões contraditórias para fatos conexos, o que implica descrédito do Poder Judiciário frente a questões de grande relevância.

Esse avanço, que se encontra em plena harmonia com o princípio da instrumentalidade das formas, regente do processo civil contemporâneo, já estava previsto no art. 10, § 2º do Código Modelo de Processos Coletivos para Ibero-América, o qual permite a alteração da causa de pedir e do pedido em qualquer tempo ou grau de jurisdição, desde que realizada de boa-fé, não represente prejuízos injustificáveis e seja observado o contraditório [105].

Assim, há quem sustente que essa inovação se mostra deveras tímida, uma vez que deveria ter avançado mais, ao permitir a modificação em todos os momentos do processo e em todos os órgãos jurisdicionais [106], e não somente até a sentença, visto que os fatos novos podem ser conhecidos após a sentença de juiz a quo.

Por fim, não se pode olvidar da lição apresentada pelos professores PAULO HENRIQUE DOS SANTOS LUCON e DANIELA MONTEIRO GABBAY, para quem os resultados da vertente inovação "são imprevisíveis, pois embora a reforma legislativa seja importante, ela não é suficiente para implementar uma mudança de mentalidade" [107].

Ou seja, em que pese o avanço acarretado pela inovação em análise – em comparação à legislação atual, oriunda do processo civil individual tradicional -, o espírito do dispositivo tem que ser incorporado pelos juízes, quando da sua aplicação, a fim de que ele se transforme num instrumento por meio do qual se oferte um processo civil coletivo mais efetivo e preocupado com os resultados práticos e não somente em atender a normas dogmáticas e teóricas.

Isso porque de nada adiantará esse instrumento se os juízes o interpretarem restritivamente, reputando sempre de má-fé o pedido para a sua aplicação ou considerando-o prejudicial à parte contrária, o que pode tornar a sua efetivação e eficácia praticamente nula.

Concluindo, não se pode olvidar que meras mudanças legislativas não alteram a realidade social e jurídica. Há que se manejar as lei com razoabilidade e bom senso.

3.4. REFORMULAÇÃO DO SISTEMA DA COISA JULGADA

Em resumo, a reformulação do sistema da coisa julgada proposta pelo Anteprojeto busca simplificar as normas vigentes, sem alterá-las substancialmente. Sobre o tema, a principal novidade apresentada é a possibilidade de repropositura da ação, no prazo de 2 (dois) anos contados do conhecimento geral da descoberta de prova nova, superveniente, idônea para mudar o resultado do primeiro processo e que neste não foi possível produzir.

Sobre o tema, vale citar lição da lavra do professor Eduardo Arruda Alvim:

Com efeito, hoje, e, mais claramente, no Anteprojeto de Código de Processos Coletivos, é permitida a liquidação e execução dos danos individuais em caso de procedência de ação visando interesses difusos ou coletivos em sentido estrito (pelas vítimas e seus sucessores [108].

A possibilidade de repropositura da ação no prazo de dois anos contemplada no Anteprojeto segue a trilha do efetivo processo civil coletivo, preocupado cada vez mais com a efetividade processual, em outros termos, com a frutuosidade da atividade processual que deve sempre buscar, ao máximo, a tutela dos bens jurídicos em geral, mormente dos bens jurídicos coletivos, dos quais dependem a vida e a dignidade de todas as pessoas e até mesmo das futuras gerações.

Há que se buscar cada vez mais meios para se proteger os bens difusos, razão por que andou bem o Anteprojeto ao prever tal inovação.

Andou bem o Anteprojeto ao manter a regra atual da extensão da coisa julgada in utilibus ou secundum eventum litis [109], inclusive nas relações entre a ação coletiva e as ações individuais simultâneas, atalhando, assim, a repetição desnecessária de ações para proteger bens coletivos [110].

Outra modificação que mererece ser destacada é a inexistência da atual distinção entre eficácias erga omnes e ultra partes, tal como observado no hodierno Código de Defesa do Consumidor [111].

Há que se gizar também o desaparecimento, no § 1º do art. 13, da ressalva vista atualmente no Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 103, II, segundo a qual o interessado que atuar como litisconsorte sofrerá os efeitos da improcedência do processo. Salutar a retirada de tal observação, vez que ela representa, no mínimo, desestimulo e inibição à participação do interessado como litisconsorte. Caso haja julgamento negativo do pedido no processo coletivo, se o interessado participou como litisconsorte não poderá ingressar com a mesma demanda novamente, se não, o resultado negativo não o afetará, mas sim o positivo.

Assim, verifica-se que diante de demandas envolvendo direitos individuais homogêneos e em caso de improcedência do pedido, aos interessados estará aberta a possibilidade de ingresso com ações individuais, mesmo que tenham participado do processo coletivo como litisconsortes. Andaram neste ponto bem os autores do Anteprojeto de Processos Coletivos, em virtude dos argumentos expostos.

Por fim, deve-se elogiar a norma contida no parágrafo quarto do artigo em comento, que corrobora a tese segundo a qual a alteração levada a efeito no art. 16 da Lei da Ação Civil Pública pela Lei 9494 [112] é flagrantemente inconstitucional. Não se pode de modo algum aceitar ou admitir a norma concebida no art. 16.

Sobre o tema arremata com maestria Luiz Guilherme Marinoni:

Ora, da mesma forma que uma fruta não deixará de ter sua cor apenas por ingressar em outro território, só se pode pensar em uma sentença imutável frente à jurisdição nacional, e nunca em face de parcela dessa jurisdição. Se um juiz brasileiro puder decidir novamente a causa já decidida em qualquer lugar do Brasil (da jurisdição brasileira), então é porque não existe , sobre a decisão anterior, coisa julgada. O pensamento da regra chega a ser infantil, não se lhe podendo dar nenhuma função ou utilidade [113].

Assim, uma vez aprovada a modificação, será ilidida a atual problemática acerca da competência territorial do órgão prolator nas ações civis públicas, tal como previsto na Lei da Ação Civil Pública.

3.5. RESTRUTURAÇÃO DA LITISPENDÊNCIA, CONEXÃO E CONTINÊNCIA

Como dito no capítulo pretérito, no Anteprojeto em análise tais institutos não sofrem alterações de grande relevância a ponto de converter a natureza dos institutos.

Destaca-se a modificação do art. 5º do Anteprojeto que diz que se deve atentar mais para o bem jurídico a ser tutelado que a outros aspectos. Assim, para a verificação de litispendência, basta que os mesmos interesses dos substituídos sejam objeto de duas ações.

Sobremaneira louvável tal dispositivo que funcionará como vetor de interpretação dos processos coletivos, no sentido torná-los mais e mais próximos do tão desejado atualmente processo efetivo e instrumental.

A vertente novidade concretiza com perfeição e se encontra em harmonia com o princípio da economia, previsto na alínea "g" do art. 2, pelo qual se busca o máximo de resultado possível com o emprego de menor tempo e recursos.

Neste ponto, vale atentar para as palavras da professora Ada Pellegrini Grinover:

Os conceitos de conexidade, continência e litispendência são extremamente rígidos no processo individual, colocando entraves à identificação das relações entre processos, de modo a dificultar sua reunião ou extinção. No Anteprojeto, o que se tem em mente, para identificação dos fenômenos acima indicados, não é o pedido, mas o bem jurídico a ser protegido; pedido e causa de pedir serão interpretados extensivamente; e a diferença de legitimados ativos não será empecilho para o reconhecimento da identidade dos sujeitos. Isso significa que as causas serão reunidas com maior facilidade e que a litispendência terá um âmbito maior de aplicação [114].

Em relação ao art. 6º, há quem sustente não ter sido feliz o autor do Anteprojeto em virtude de que trata os diferentes institutos da litispendência, da conexão e da continência da mesma maneira, como se fossem um só.

Entende o professor Luiz Norton Baptista de Mattos que não se deve dar à conexão e à continência idêntico tratamento ofertado à litispendência, vez que frente a esta não deve haver processamento e julgamento conjunto de demandas, mas, sim, deve uma ser extinta, com a ressalva da remessa de cópia para a demanda preventa [115].

Irretorquível a ponderação do professor, haja vista que o Anteprojeto de Processos de fato deixou a desejar quando deu tratamento igual a institutos processuais distintos.

3.6. AMPLIAÇÃO DO ROL DE LEGITIMADOS E REPRESENTATIVIDADE ADEQUADA

3.6.1. Ampliação do rol de legitimados

Em relação à ampliação dos legitimados à propositura da ação coletiva, mais precisamente à inclusão entre eles do indivíduo, vale comentar que a medida constitui expressivo avanço no sentido de tornar o processo coletivo democrático e acessível a todos.

Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, sobre o tema, aduz com precisão que:

O direito moderno, de matriz constitucional ou processual, vem apontando na direção do acesso à Justiça, da ampliação da legitimidade e da instrumentalidade do processo. A limitação da legitimação do indivíduo, diante de interesses individuais homogêneos, deixa de produzir resultados positivos: economia processual e judicial; maior acesso ao Judiciário; melhoria da prestação jurisdicional, em termos de tempo e qualidade devido à redução do número de feitos; preservação do princípio da igualdade etc. Mas em termos de interesses de natureza indivisível, o resultado é a denegação absoluta de Justiça [116].

Patente está que o Anteprojeto aproxima-se do princípio constitucional da inafastabilidade do Poder Judiciário.

Trata-se, portanto, de avanço considerável, que deve ser acompanhado de outras medidas no mesmo sentido, sob pena de não ser bastante para melhorar a realidade.

3.6.2. Representatividade adequada

Trata-se de instrumento posto à disposição do juiz para coibir eventuais abusos na utilização da legitimação individual para a tutela de direitos coletivos em sentido amplo.

Com esse mecanismo que possibilitará ao juiz controlar e afiançar a existência de representação razoável, apropriada, conveniente, isto é, adequada, o que implicará na defesa tenaz dos direitos coletivos.

Assim, a cidadania e democracia participativa serão incentivadas no direito coletivo pátrio, pois as oportunidades atualmente vistas na ação popular serão por demais estendidas e ampliadas.

Sobre o tema vale atentar para excerto da lavra do professor Marcos Flávio Mafra Leal:

Certamente o pagamento de honorários é um estímulo e poderá surgir uma advocacia especializada em buscar direitos coletivamente ajuizáveis. Não há mal algum nisso, pelo contrário, pode representar um avanço em termos de cidadania e realização de direitos, desde que os conselheiros de ética da OAB funcionem extrajudicialmente e o Ministério Público e os juízes fiscalizem o andamento do processo [117].

Sobre a crítica à legitimação individual, de que esta é inoportuna mercê do individualismo e despreparo do povo para líder com questões coletivas, vale dizer que o mesmo raciocínio pode utilizado para o voto. Não se legitima de modo algum o tolhimento ao direito do voto em virtude de que o povo ainda não sabe exerce-lo adequadamente com espírito cidadão. Pelo contrário, se ainda não sabe emprega-lo corretamente, é por meio da sua prática, da experiência, que aprenderá a manuseá-lo com eticidade e para proveito de todos.

Há, todavia, quem critique o acolhimento de tal teoria pelo Anteprojeto em análise:

Prevê o controle judicial (ope judicis) da representatividade adequada (art. 19), o que é inconstitucional, pois a Constituição brasileira não admite esse controle, conforme se nota dos seguintes dos art. 5º, LXX, LXXI, LXXII, LXXIII, 114, 129, III e seu § 1º etc [118].

E continua a reprovação afirmando que:

No Brasil, o controle da representatividade adequada, por imposição constitucional, é feito previamente, ope legis (pelo próprio legislador). A implantação desse mecanismo no País, além de flagrantemente inconstitucional — salvo nas hipóteses da dispensa de requisitos às associações para facilitar o acesso à justiça — tal controle irá gerar incidentes indesejados que impedirão o andamento do processo coletivo. É mais uma tentativa de americanização do sistema jurídico brasileiro [119].

Portanto, a legitimidade adequada se mostra em consonância com os princípios constitucionais da democracia participativa e com o acesso ao Judiciário.

3.7. GRATIFICAÇÃO AOS INDIVÍDUOS, ASSOCIAÇÕES E SINDICATOS

Outra medida que caminha no sentido de por intermédio do ativismo judicial dar concretude aos princípios da adequada tutela processual e da participação dos cidadãos nas causas coletivas.

Vale, aqui, destacar os comentários de Aluisio Gonçalves de Castro Mendes:

A medida, assim, pode representar um estímulo para o incremento na participação da sociedade civil nas demandas coletivas, tendo em vista que, no Brasil, a esmagadora maioria das ações coletivas ainda é ajuizada tão-somente pelo Ministério Público [120].

Inobstante o louvável intento da vertente norma em comento, há que se atentar para a vital importância da atuação dos magistrados a fim de concretizá-la com bom êxito. Isso porque eles terão o encargo de, com o mais absoluto bom senso, remunerar tão-somente os que merecerem, incentivando a profícua defesa dos direitos coletivos. Conduta dos juízes diversa disso decerto concorrerá para inefetividade e desrespeito aos direitos coletivos.

3.8. PROVA

É lugar comum entre a doutrina que o atual sistema processual individualista de distribuição de provas não mais se coaduna com a proteção efetiva dos direitos coletivos, não servindo, portanto, para o processo coletivo moderno e voltado para a concretização dos interesses coletivos em sentido amplo.

Isso pois o vetusdo sistema enfatiza a iniciativa das partes na produção das provas – pois as considera de interesse particular e não público -, as quais se se mantiverem inertes não terão os seus direitos atendidos. Nesse sistema, não se leva em consideração a desigualdade entre as partes que por falta de conhecimento, educação e informação podem não saber como provar ou o que provar, bem como se despreza o interesse estatal – do detentor do monopólio da Jurisdição – em pacificar as relações sociais, compondo as lides com pronunciamentos que se aproximam o máximo possível da realidade dos fatos [121].

O professor Marcelo Abelha Rodrigues não ostenta opinião diversa:

A manutenção do atual sistema de distribuição do encargo probatório para as lides civis, tal como previsto no art. 333 e, subsidiariamente, o art. 130 do CPC, constitui uma forma grave de violação ao devido processo legal, porque ofende tanto o aspecto subjetivo quanto objetivo da prova, já que: não dá às partes as mesmas chances processuais, considerando a intensa desigualdade estabelecida no plano material que se reflete no processo; deixa refém o Estado-juiz, que terá que proferir um julgamento com base em elementos de convicção que talvez não traduzam com precisão a real situação dos direitos em conflito [122].

Para resolução desse problema frente à distribuição do ônus probatório no processo coletivo, a doutrina apresenta três caminhos distintos, a saber: a criação de presunções ou ficções jurídicas, que até prova em contrário serão admitidas como verdadeiras, como hoje é visto nos atos administrativos; a criação de técnicas de inversão do ônus da prova, como verificado no art. 6, VIII, do Código de Processo Civil; por fim, a adoção de um sistema flutuante ou dinâmico de distribuição dos encargos probatórios, de forma que o juiz frente ao caso concreto verifica a quem cabe o ônus da prova, segundo as facilidades (técnicas e econômicas) para produzir a prova [123].

Da leitura do art. 11 do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, vê-se que o critério adotado é o dinâmico de distribuição do ônus da prova, cabendo a prova dos fatos a quem tiver maior proximidade com eles e maior facilidade para demonstrá-los.

Segundo parte da doutrina, a novidade ofertada pelo Anteprojeto é assaz ponderada, sensata e, nos dizeres de Édis Milaré:

O equilíbrio do Anteprojeto está justamente no fato de que ele não proíbe, nem impõe, como regra absoluta e imutável, a inversão do ônus da prova nas ações coletivas. Não há uma regra estanque, e sim dinâmica. O Anteprojeto não afasta a regra geral do CPC (art. 333) e demonstra razoabilidade ao permitir que a distribuição do ônus da prova seja feita de acordo com a proximidade das partes em relação a ela [124].

E continua o renomado jurista:

Arriscamo-nos a dizer que o Anteprojeto, neste ponto, acabou afastando uma possível influencia da relação jurídica de direito material sobre a distribuição dos encargos no processo. Com isso a prova será atribuída a quem, processualmente, tiver melhores condições de produzi-la (tornando a instrução mais célere, eficiente e econômica), independentemente de have ou não um desequilíbrio no campo do direito material [125].

Assiste razão ao célebre doutrinador, pois a novidade do Anteprojeto – carga dinâmica do ônus probatório – apresenta a salientada diferença em relação ao CDC, por exemplo, que estabelece a inversão do ônus da prova tendo em vista as condições subjetivas materiais do individuo.

Essa distinção tem relevância nos casos em que o Ministério Público, por exemplo, atuar. Como cediço, o parquet conta com razoável estrutura, não podendo ser considerado, materialmente, como legitimado hipossuficiente. Todavia, em muitos casos em que atua, a colheita do material probatório pode-lhe ser de difícil ou impossível acesso, razão por que o encargo da prova não deve pesar sobre seus ombros, sob pena de o direito ou interesse tutelado não ser de fato protegido pelo Estado-juiz.

3.9. FUNDO DOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS

O dispositivo relativo ao fundo de direitos difusos e coletivos consiste em expressiva inovação destinada a solucionar o problema do custeio das perícias, que geralmente são requeridas pelo autor, que em regra não dispõe de condições para arcá-las.

Também, deve-se consignar que não seria justo o Ministério Público – legitimado mais atuante na defesa dos interesses difusos e coletivos – custeasse as perícias, como lamentavelmente o faz atualmente. Isso porque o erário não deve ser (mal) empregado para arcar com custos que moralmente são de responsabilidade do autor do ato lesivo aos direitos coletivos.

Sobre o tema, deveras pertinente é a lição apresentada por Paulo de Bessa Antunes ao comentar a realidade sobre o financiamento das perícias das ações civis públicas:

O objetivo da lei ao determinar que o autor não deve adiantar as despesas foi o melhor possível, porém distante da realidade concreta da vida forense. O certo é que as perícias em geral são realizadas por profissionais autônomos indicados pelo juiz da causa e aceito pelas partes. Eles, evidentemente, são técnicos que atuam profissionalmente e precisam ser remunerados em tempo hábil. Receber os honorários, ao fim de um processo judicial, não raramente, significa aguardar por longuíssimos anos para receber pro labore facto. Em tese, os peritos poderiam se conformar com tal situação e esperar. Entretanto, a perícia na ação civil pública com freqüência necessita de equipamentos, laboratórios, testes e ouitros elementos custosos [126].

Prossegue o renomado autor:

É fato que o legislador tentou solucionar questões orçamentárias dos órgãos públicos que não dispunham de verbas específicas para o pagamento das perícias. O Ministério Público Federal, que é o exemplo que conheço, tem feito incluir em seus orçamentos verbas para perícia, de forma que o experts possam ser remunerados adequadamente e no tempo correto [127].

O fundo em questão, além de gerar recursos para o custeio das perícias – grande incômodo do Ministério Público -, fornecerá recursos para a gratificação destinada aos legitimados que cumpriram com desvelo, acuidade e obtiveram sucesso na defesa dos direitos coletivos.

Sobre o presente instituto, há apenas uma crítica a ser feita, direcionada ao § 4º do citado artigo, que mantém a atual vedação de adiantamento das custas, honorários e perícias. Ora, tendo em mira a efetividade da prestação jurisdicional e um processo justo e próximo da realidade, não se pode olvidar que os profissionais técnicos colaboradores de grande importância do Estado-juiz não podem trabalhar gratuitamente, esperando o final de lento processo para receber a remuneração devida a seus trabalhos. Configura-se tal medida verdadeiro acinte a esses profissionais, que, assim, não se vêm motivados para concorrer com eficácia para o deslinde justo das causas coletivas.

Ademais,

o montante retirado para a indispensável produção de prova pericial retornará ao Fundo ao final do processo, quando o juiz determinar quem arcará e quanto deverá dispor por esse trabalho técnico-científico. Esse mecanismo provisório de utilização de parcelas desses recursos é um importante instrumento de ampliação da utilidade do Fundo e, indiscutivelmente, um obstáculo nítido que se transpõe na busca do resultado mais rápido à solução da lide [128].

Dessarte, o Fundo se mostra solução bastante ponderada e viável para a efetivação do processo coletivo. Todavia, a vedação ao adiantamento das perícias deve ser revisto, sob pena de afigurar-se funesto freio inibitório ao progresso aspirado pelos autores do Anteprojeto com a criação do Fundo.

3.10. VALOR DA CAUSA

A modificação, que dispensa a indicação do valor da causa em determinados casos em que ele é incomensurável ou inestimável, como dito segue a linha constitucional do processo célere e, por consectário lógico, efetivo.

Louvável é a norma, mercê de que hoje há muitos casos cujo deslinde se procrastina por discussões infindáveis acerca do valor da causa.

Sobre a alteração, oportuno o comentário da lavra do professor Dorival Moreira dos Santos:

O Anteprojeto mais uma vez sinaliza com a finalidade de alcance da celeridade processual, cumprindo a função instrumentalizadora do comando constitucional expresso na EC 45. (...) E com acerto o art. 16 do anteprojeto prevê o cálculo dos honorários advocatícios sobre o valor da condenação; coloca, assim, definitivamente, uma pá de cal em uma das fissuras do CPC que, rotineiramente, foi e é utilizada como mote para dificultar o andamento dos feitos submetidos aos ritos ali albergados. É o lacre da brecha que eventualmente poderia haver no futuro Código de Processo Coletivo, quando a peça inicial estiver desprovida desse valor da causa [129].

A autora Ada Pellegrini Grinover, por ocasião da Exposição de Motivos do Anteprojeto em comento, afirma que "a fixação do valor da causa é dispensado quando se trata de danos inestimáveis, evitando-se assim inúmeros incidentes processuais, mas seu valor será fixado na sentença" [130].

Assim, conclui-se pela compatibilidade da referida alteração do § 4º do art. 22, do Anteprojeto, com os princípios do acesso à justiça, tutela coletiva adequada, flexibilização da técnica processual, proporcionabilidade e razoabilidade – todos dispostos expressamente no art. 2º do Anteprojeto -, e, por que não dizer, com os princípios constitucionais normatizadores do processo justo e democrático. Portanto, irreparável a proposta neste ponto.

3.11. AÇÃO COLETIVA PASSIVA

A previsão expressa de ação coletiva passiva pode ser considerada uma das mais impetuosas inovações trazidas pelo Anteprojeto.

Sobre o tema vale dizer que esta ação tornará o futuro Código atual e compatível com a realidade do direito processual coletivo construído pela jurisprudência que hodiernamente já admite a ação coletiva passiva [131].

De há bastante tempo os grupos coletivamente organizados vêm desrespeitando a ordem jurídica, o que implica ofensa a direitos subjetivos de titulares diversos, geralmente pessoas naturais ou jurídicas.

As famigeradas torcidas organizadas, que se reúnem para praticar atos de violência e vandalismo são exemplos típico da ação de grupos organizados para ferir a ordem jurídica constitucional. Também, é cabível citar os sindicatos representativos de determinada classe trabalhista que causam prejuízo a toda a sociedade ao praticar atos ilegais em, por exemplo, movimentos grevistas. Ou por que não lembrar do caso em que uma associação de moradores impede o tráfego de carros em uma determinada rua, sem apresentar motivo justo para tanto [132].

Diante casos como esses, a doutrina atual e jurisprudência têm demonstrado forte inclinação no sentido de admitir a ação coletiva passiva, haja vista ser o meio pelo qual as mencionadas agressões à ordem jurídica podem ser estancadas e resolvidas [133].

Em razão do exposto, a inovação do Anteprojeto é bem vinda ao mundo jurídico, por satisfazer premente necessidade da sociedade atual.

Segundo o Anteprojeto, fica conferida capacidade processual expressa para a coletividade organizada, ainda que sem personalidade jurídica, subordinando-se esta capacidade, à avaliação da representatividade adequada do grupo.

Peca, todavia, segundo a doutrina, o Anteprojeto ao tratar sobre o tema em comento, em virtude de tratá-lo com parcimônia:

Hipóteses como a interrupção da prescrição dos direitos da coletividade, da revelia, do abandono da causa ou da perda da representatividade adequada pelo legitimado passivo, da possibilidade ou não de o juiz proferir sentença em favor da coletividade ré, caso julgue improcedente o pedido etc. Poderiam ter sido exploradas para o enriquecimento do pretenso texto legislativo [134].

Em que pese esta crítica, não custa repetir, digna de louvor é a presente inovação que consagrará em lei a previsão de casos cada vez mais corriqueiros atualmente, a fim de ordená-los de modo mais consentâneo com o respeito aos direitos e interesses individuais e coletivos.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

É ponto pacífico entre os estudiosos das causas jurídicas que, em razão da conjuntura atual da sociedade, os direitos coletivos em sentido amplo devem ser objeto de grande desvelo e atenção por parte do Poder Judiciário, a fim de serem pacificados os conflitos sociais que mais crescem nos dias de hoje, bem assim afiançados direitos inerentes a todo o ser humano.

Não é possível prescindir atualmente de um sistema processual consentâneo e adequado à tutela dos direitos coletivos, vez que o processo civil de cunho meramente individualista, ainda refém dos princípios defendidos pela revolução burguesa de 1789 - laisser-faire -, não é capaz de protegê-los e efetivá-los com eficiência.

Mormente com a criação das leis da ação popular, da ação civil pública, do Código de Defesa do Consumidor, juntamente com a explícita menção constitucional sobre o tema, criou-se legislação específica no Brasil de processos coletivos, isto é, um microssistema processual coletivo.

Assim, contando também com a relevante contribuição dos doutrinadores e da jurisprudência, é possível hodiernamente falar-se no processo civil coletivo como um ramo jurídico processual autônomo, haja vista ser este dotado de princípios e normas próprios.

Entretanto, apesar dos consideráveis avanços e da modernidade da legislação pátria, entende parte considerável da doutrina – por que não dizer, corrente majoritária - que o sistema processual coletivo do Brasil ainda é por demais escasso em relação ao conteúdo de que trata, apresentando falhas e omissões, bem como contradições, impropriedades, incoerências e normas obsoletas.

À luz de tal entendimento, doutrinadores da envergadura da professora Ada Pellegrini Grinover entenderam por bem que era o momento propício para a confecção de um código brasileiro de processos coletivos que unificasse a legislação processual coletiva, além de apresentar inovações, com o objetivo de sanar as omissões e brechas vistas na legislação atual.

Por tudo o que foi exposto, tal tendência tutelada por parte dos mais brilhantes processualistas brasileiros, no sentido de que atualmente é tempo de se elaborar um Código de Processos Coletivos, demonstra-se coerente, legítima e razoável.

À luz dos pontos analisados nos capítulos 2 e 3, dessome-se que o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos representa sensível avanço em direção à criação de um processo consentâneo com a efetiva proteção dos direitos coletivos.

Isso porque há nele, numa visão geral, mais virtudes que defeitos, entre as quais podemos citar avanços nos seguintes pontos: juízos especializados, preclusão, coisa julgada, litispendência, conexão, continência, legitimação, gratificação, ônus da prova, fundos dos direitos difusos e coletivos, valor da causa, ação coletiva passiva, etc.

No capítulo 2 do presente trabalho, foram narradas as principais inovações do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, assim como se efetuaram comparações entre a atual legislação processual coletiva e os termos do Anteprojeto em comento.

A terceira parte desta pesquisa tratou de reflexões acerca do conteúdo do Anteprojeto, ocasião em que, com fundamento no entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre o assunto, se apontaram méritos, lacunas e defeitos verificados em tal diploma, bem como foram sugeridas algumas modificações ao texto do Anteprojeto analisado.

À luz dos pontos analisados no mencionado capítulo, verifica-se que o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos representa sensível avanço no sentido da criação de um processo consentâneo com a efetiva proteção dos direitos coletivos.

Isso porque nele, numa visão geral, há mais virtudes que defeitos, entre as quais podemos citar avanços nos seguintes pontos/institutos: juízos especializados, preclusão, coisa julgada, litispendência, conexão, continência, legitimação, gratificação, ônus da prova, fundos dos direitos difusos e coletivos, valor da causa, ação coletiva passiva, etc.

Entre os poucos retrocessos contemplados, o principal está relacionado aos aspectos gerais da competência para o processar e julgar a ação coletiva.

Concluindo, em apertada síntese, o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos vem em boa hora e recheado de novidades que contribuíram para o avanço do já louvável processo civil coletivo pátrio, carecendo apenas de alguns retoques para tornar-se excelente, isto é, para harmonizar-se plenamente com o princípio da dignidade humana.


Notas

  1. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do Processo, p. 150.
  2. Bill of Rights. Tal expressão designa a histórica Declaração de Direitos formulada na Inglaterra em 1689, como decorrência da chamada Revolução Gloriosa de 1688, a qual depôs Jaime II, sucedendo a este monarca Gulherme de Orange, estando o poder do monarca, a partir de então, limitado pela monarquia constitucional, superando-se a realeza de direito divino. A partir do Bill of Rights, assinala Pedro Salvetti Netto, o rei não mais pôde governar sem o apoio parlamentar, isto porque estabelece o majestoso documento depender do Parlamento não só a cobrança de impostos, como, também, a SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, p. 159/160.permanência dos exércitos.
  3. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 515.
  4. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, p. 159/160.
  5. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, p. 161.
  6. BRASIL. Constituição (1934). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil.
  7. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, p. 161.
  8. Esses termos são considerados pela doutrina majoritária como expressões sinonímias.
  9. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, p. 163.
  10. GUEDES, Demian. A legitimação individual para a Ação Civil Pública. p. 42.
  11. BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.
  12. "Independentemente de a própria lei fixar o conceito de interesse coletivo, é conceito de Direito Constitucional, na medida em que a Carta Política dele faz uso para especificar as espécies de interesses que compete ao Ministério Público defender (CF, art. 129, III)." (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RE nº 213.015, Rel. Min. Néri da Silveira, j. 24/05/02)
  13. ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de Direitos Coletivos e Defesa Coletiva de Direitos, p. 34 e 35.
  14. ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de Direitos Coletivos e Defesa Coletiva de Direitos, p. 35.
  15. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco, Curso de Direito Ambiental brasileiro, p. 6.
  16. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI-MC nº 3.540-1, Rel. Min. Celso de Mello, j. 1º/09/05.
  17. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco, Curso de Direito Ambiental brasileiro, p. 7.
  18. VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Ação civil pública, p. 45.
  19. BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.
  20. VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Ação civil pública, p. 45.
  21. BRASIL. Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994. Transforma o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providências.
  22. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 163.231, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. 29/06/01.
  23. BARROSO, Luís Roberto. O Direito Consitucional e a efetividade de suas normas, p. 55.
  24. MARINONI, Luis Guilherme. Curso de Processo Civil, p. 717.
  25. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 163.231, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. 29/06/01).
  26. MARINONI, Luis Guilherme. Curso de Processo Civil, p. 721.
  27. "A ação civil pública presta-se a defesa de direitos individuais homogêneos, legitimado o Ministério Público para aforá-la, quando os titulares daqueles interesses ou direitos estiverem na situação ou na condição de consumidores, ou quando houver uma relação de consumo. Lei 7.374/85, art. 1º, II, e art. 21, com a redação do art. 117 da Lei 8.078/90 (Código do Consumidor); Lei 8.625, de 1993, art. 25. (...). Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se a defesa dos mesmos, legitimado o Ministério Público para a causa." (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 195.056, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 30/05/03).
  28. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, p. 463/465.
  29. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do Processo, p. 150.
  30. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos, p. 99.
  31. MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente, p. 118.
  32. MARINONI, Luis Guilherme. Curso de Processo Civil. p. 720.
  33. A primeira disposição federal admitindo a tutela de interesses coletivos lato sensu foi a Equity Rule, de 1883. A Rule 23 norte-americana – que serviu de inspiração para a legislação de diversos países, inclusive do Brasil – confere legitimidade ativa ao cidadão para demandar na defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, desde que aferida, pelo juiz da causa, sua representividade adequada (representativeness).
  34. ALVIM, Arruda. Ação Civil Pública – Sua evolução normativa significou crescimento em prol da proteção às situações coletivas, p. 34.
  35. GRINOVER, Ada Pellegrini. Código modelo de processos coletivos para Ibero-América – Exposição de motivos. Disponível em <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&i ddoutrina=2077>
  36. GUEDES, Demian. A legitimação individual para a Ação Civil Pública, p. 44.
  37. VIEIRA, Marilia de Castro Neves. A tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos: legitimidade ativa e coisa julgada, p. 4.
  38. "Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a declaração de nulidade ou anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados e dos Municípios". Art. 113, 38.
  39. BRASIL. Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e dá outras providências.
  40. Artigo 129, III, da CRFB.
  41. BRANDÃO, Paulo de Tarso. Ações Constitucionais: novos direitos e acesso à justiça, p.182.
  42. VIEIRA, Marilia de Castro Neves. A tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos: legitimidade ativa e coisa julgada, p. 5.
  43. BRASIL. Constituição (1967). Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969.
  44. BRASIL. Lei nº 7.717, de 29 de junho de 1965 (Lei 4.717 AÇÃO POPULAR). Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e dá outras providências.
  45. MARINONI, Luis Guilherme. Curso de Processo Civil, p. 722.
  46. FILARDI, Hugo. Ação Civil Pública e o Acesso à Justiça, p. 11.
  47. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, p. 193.
  48. SMANIO, Gianpaolo Poggio. A tutela constitucional dos interesses difusos. p. 5.
  49.  
  50. MARINONI, Luis Guilherme. Curso de Processo Civil. p. 725.
  51. MANCUSO, Rodolfo Camargo. Direitos Processual Ambiental. p. 43.
  52. Exposição de motivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  53. Exposição de motivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>.
  54. Exposição de motivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>.
  55. Exposição de motivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  56. Exposição de Motivos do Anteprojeto.
  57. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 269.
  58. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 270.
  59. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 271.
  60. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 272.
  61. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
  62. ZAVASCKI, Teori Albino. Reforma do Processo Coletivo: indispensabilidade de disciplina diferenciada para direitos individuais homogêneos e para direitos transindividuais, p. 38.
  63. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
  64. SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de processo civil: processo de conhecimento, p. 208.
  65. JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil, p. 488.
  66. JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil, p. 489.
  67. JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil, p. 489.
  68. BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil.
  69. PAULA, Adriano Perácio de. Direito Processual do Consumo, p. 303.
  70. BATALHA, Wilson de Souza Campos. Direito Processual das Coletividades e dos Grupos, p. 112.
  71. PAULA, Adriano Perácio de. Direito Processual do Consumo, p. 312.
  72. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro, p. 378.
  73. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco Fiorillo. Curso de Direito Ambiental, p. 511.
  74. FILHO, Vicente Greco. Direito Processual Civil Brasileiro, p. 89.
  75. MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos: visão geral e pontos sensíveis, p. 28.
  76. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro, p.527.
  77. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 642462 / PR, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 8/03/05.
  78. "Art. 3º. Legitimação ativa. São legitimados concorrentemente à ação coletiva: I – qualquer pessoa física, para a defesa dos interesses ou direitos difusos de que seja titular um grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas por circunstâncias de fato; II – o membro do grupo, categoria ou classe, para a defesa dos interesses ou direitos difusos de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base e para a defesa de interesses ou direitos individuais homogêneos; III - o Ministério Público, o Defensor do Povo e a Defensoria Pública; IV – as pessoas jurídicas de direito público interno; V - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código; VI – as entidades sindicais, para a defesa dos interesses e direitos da categoria; VII - os partidos políticos, para a defesa de direitos e interesses ligados a seus fins institucionais. VIII - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos neste código, dispensada a autorização assemblear".
  79. LUCON, Paulo Henrique dos Santos; GABBAY, Daniela Monteiro. Superação do modelo processual rígido pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, à luz da atividade gerencial do juiz, p. 80.
  80. Art. 20 Anteprojeto
  81. LEAL, Márcio Flavio Mafra. Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos – Aspectos políticos, econômicos e jurídicos, p. 74.
  82. Art. 333 do Código de Processo Civil.
  83. SANTOS, Dorival Moreira dos. Anteprojeto do Código Brasileiro de Processo Civil Coletivo: inovações na prática processual em busca da efetividade, p.48.
  84. Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais. (Redação dada pela Lei nº 8.078, de 1990)
  85. GRINOVER, Ada Pellegrini. Código brasileiro de processos coletivos – Exposição de motivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  86. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 297.
  87. GRINOVER, Ada Pellegrini. Código brasileiro de processos coletivos – Exposição de motivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  88. GRINOVER, Ada Pellegrini. Código brasileiro de processos coletivos – Exposição de motivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  89. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 297.
  90. Segundo o art. 5º, LIII, da Constituição da República "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente"; ainda, dispõe o art. 5º, XXXVII, da Constituição da República, que "não haverá juízo ou tribunal de exceção".
  91. NERY JR., Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 6. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 69-70.
  92. Análise crítica ao Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos realizada por comissão do Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=1533>
  93. MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos: visão geral e pontos sensíveis, p. 20.
  94. Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Disponível em: < http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  95. O art. 132, do Código de Processo Civil, dispõe: "O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido, ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor.
  96. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 300.
  97. Análise crítica ao Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos realizada por comissão do Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=1533>
  98. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 300.
  99. BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. CC 1998.01.00.072231-8/MA, Rel. Juiz Luciano Tolentino Amaral, j. 3/03/99.
  100. MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos: visão geral e pontos sensíveis, p. 19.
  101. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 298.
  102. VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo, p. 298.
  103. LEONEL, Ricardo de Barros. Causa de pedir e pedido nos processos coletivos: uma nova equação para a estabilização da demanda, p. 152.
  104. § 2º. O juiz permitirá a alteração do objeto do processo a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, desde que seja realizada de boa-fé, não represente prejuízo injustificado para a parte contrária e o contraditório seja preservado.
  105. Análise crítica ao Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos realizada por comissão do Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=1533>
  106. LUCON, Paulo Henrique dos Santos; GABBAY, Daniela Monteiro. Superação do modelo processual rígido pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, à luz da atividade gerencial do juiz, p. 87.
  107. ALVIM, Eduardo Arruda. Coisa julgada e litispendência no Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 191.
  108. BRAGA, Renato Rocha. A coisa julgada nas demandas coletivas, p.144.
  109. MATTOS, Luiz Norton Baptista de. A litispendência e a coisa julgada nas ações coletivas segundo o Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 213.
  110. ALVIM, Eduardo Arruda. Coisa julgada e litispendência no Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 189.
  111. BRASIL. Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997. Disciplina a aplicação da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, altera a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, e dá outras providências.
  112. MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento, p. 715.
  113. GRINOVER, Ada Pellegrini. Direito Processual Coletivo, p. 13.
  114. MATTOS, Luiz Norton Baptista de. A litispendência e a coisa julgada nas ações coletivas segundo o Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 199.
  115. MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos: visão geral e pontos sensíveis, p. 25.
  116. LEAL, Márcio Flavio Mafra. Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos – Aspectos políticos, econômicos e jurídicos, p. 74.
  117. Análise crítica ao Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos realizada por comissão do Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=1533>
  118. Análise crítica ao Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos realizada por comissão do Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=1533>
  119. MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos: visão geral e pontos sensíveis, p. 27.
  120. Análise crítica ao Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos realizada por comissão do Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=1533>
  121. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A distribuição do ônus da prova no Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 246.
  122. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A distribuição do ônus da prova no Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 249.
  123. MILARÉ, Édis; CASTANHO, Renata. A distribuição do ônus da prova no Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 260.
  124. MILARÉ, Édis; CASTANHO, Renata. A distribuição do ônus da prova no Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 260.
  125. MILARÉ, Édis. (cordenador). A Ação Civil Pública Após 20 anos: efetividade e desafios, p. 468.
  126. MILARÉ, Édis. (cordenador). A Ação Civil Pública Após 20 anos: efetividade e desafios, p. 468.
  127. DOS SANTOS, Dorival Moreira. Anteprojeto do Código Brasileiro de Processo Civil Coletivo: inovações na prática processual em busca da efetividade, p. 48.
  128. DOS SANTOS, Dorival Moreira. Anteprojeto do Código Brasileiro de Processo Civil Coletivo: inovações na prática processual em busca da efetividade, p. 45.
  129. Exposição de motivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  130. Exposição de motivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos Disponível em <http://www.mpcon.org.br/site/portal/jurisprudencias_detalhe.asp?campo=2897>
  131. MAIA, Diogo Campos Medina. A ação coletiva passiva: o retrospecto histórico de uma necessidade presente, p. 340.
  132. MAIA, Diogo Campos Medina. A ação coletiva passiva: o retrospecto histórico de uma necessidade presente, p. 340.
  133. MAIA, Diogo Campos Medina. A ação coletiva passiva: o retrospecto histórico de uma necessidade presente, p. 342.

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MOURA, Rafael Osvaldo Machado. Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. Breves notas e reflexões. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2607, 21 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17245. Acesso em: 19 abr. 2024.