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A eficácia preclusiva da decisão que emite juízo positivo de admissibilidade do processo

A eficácia preclusiva da decisão que emite juízo positivo de admissibilidade do processo

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Analisa-se a eficácia preclusiva da decisão que entende presentes os pressupostos processuais e as condições da ação.

RESUMO

O presente trabalho tem por finalidade analisar a eficácia preclusiva da decisão que emite juízo positivo de admissibilidade do processo, ou seja, que entende presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Para tanto, será analisado o instituto da preclusão, sua origem, fundamento, função, bem como as espécies de preclusão e a denominada preclusão pro judicato. Após serão analisados os denominados requisitos de admissibilidade do processo, ou seja, os pressupostos processuais e as condições da ação, seu conceito, tratamento legal, bem como o momento processual em que devem ser analisados. No último capítulo será analisada a eficácia da decisão que examina os requisitos de admissibilidade do processo, se possui ou não efeito preclusivo e em que casos. Ainda será analisado o tratamento do tema pela doutrina e pela jurisprudência brasileiras.

Palavras-chave: Monografia. Preclusão. Requisitos de admissibilidade do processo.

ABSTRACT

The present work has for purpose to analyze the preclusiva effectiveness of the decision that emits positive judgment of admissibilidade of the process, that is, that it understands gifts right of action and the conditions of the action. For in such a way, it will be analyzed the institute of the preclusion, its origin, bedding, function, as well as the species of preclusion and the called preclusion pro judicato. After, will be studied the requisite of admissibilidade of the process, that is, right of action and the conditions of the action, its concept will be analyzed, legal treatment, as well as the procedural moment where they must be analyzed. In the last chapter, will be analyzed the effectiveness of the decision that examines the requirements of admissibilidade of the process, if possesss or not preclusivo effect and where cases. Still, the treatment of the subject for the brazilian doctrine and jurisprudence will be studied.

Key words: Monograph. Preclusion. Requirements of admissibilidade of the process.


INTRODUÇÃO

A idéia de processo já traz em si a noção de sucessão ordenada de atos tendentes a um fim, qual seja, a solução da pretensão exposta a juízo. Para tanto, é necessário que as etapas processuais e as questões levantadas pelas partes ou observadas pelo Estado-juiz sejam solucionadas para que se possa avançar às fases seguintes. Nessa linha, tem a preclusão papel fundamental na marcha avante que deve ser o processo.

De fato, o fenômeno da preclusão, que impõe a impossibilidade de retorno do processo para exame de questão já levantada e examinada, ou repetição de ato já realizado (preclusão consumativa), ou ainda, que veda a reabertura de prazo já transcorrido (preclusão temporal), e que também impossibilita que a parte pratique ato incompatível com conduta processual já praticada (preclusão lógica), é responsável pelo andamento do processo, vedando infindáveis retrocessos. Tal fenômeno atinge não só as partes, mas também ao juiz, operando-se preclusão consumativa.

Pois bem, nesse lanço, interessante e polêmico é o tema da ocorrência ou não da preclusão em relação aos requisitos de admissibilidade do processo, ou seja, mais especificamente, em relação às condições da ação e pressupostos processuais. Com efeito, a doutrina processual majoritária e os Tribunais Pátrios, em sua maioria, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, baseados no teor do art. 267, §3º, do CPC, entendem possível o exame e o reexame da matéria, mesmo que já decidida em etapa processual anterior, entendendo que a preclusão não atinge a discussão acerca das condições da ação e dos pressupostos processuais.

No entanto, apesar de tal posicionamento, o tema suscita controvérsias, podendo-se visualizar um conflito maior, não só em relação à questão de forma que representa o processo, mas um verdadeiro conflito entre segurança jurídica e o ideal de concreção de justiça. Com efeito, quando se permite que a mesma questão – já decidida pelo Estado-juiz em etapa anterior – seja levantada novamente pelas partes ou até mesmo reexaminada determinada matéria, tal situação traz certa instabilidade, ou seja, há mitigação da segurança jurídica, no caso representada pela preclusão, em nome do ideal de justiça, ou de realização do direito. Há, ainda, outra temática de discussão envolvida, pois quando se permite que órgão jurisdicional diverso reanalise situação que já fora decidida (e da qual não foi interposto recurso próprio ou já o foi e foi definitivamente julgado) está-se tratando de um poder de revisão não previsto expressamente em lei e que foge ao conceito de reexame recursal próprio, tendo implicações na independência funcional dos magistrados, na evolução da marcha processual e também na segurança jurídica.

Assim, o objetivo do presente trabalho é o estudo dos efeitos da decisão que analisa os requisitos de admissibilidade do processo, ou seja, condições da ação e pressupostos processuais, se dela decorrem efeitos preclusivos ou não, e da possibilidade ou não de revisão de tal decisão em outras fases processuais ou por outro grau de jurisdição.

Para tanto, o presente trabalho foi estruturado da presente forma. No primeiro capítulo será examinado o instituto da preclusão, sua conceituação e escopo, suas espécies, bem como examinada a ocorrência de preclusão para o estado-juiz. No segundo capítulo, serão examinados os requisitos de admissibilidade do processo – as condições da ação e os pressupostos processuais – sua conceituação, fundamentos e o momento de exame. No terceiro capítulo, será examinada a discussão fundamental do presente estudo, qual seja, a ocorrência ou não de preclusão da decisão que examina a existência dos requisitos de admissibilidade do processo e a possibilidade de reexame da questão com base no art. 267, §3º, do CPC, em fase processual diversa ou diverso grau de jurisdição.


1. O INSTITUTO DA PRECLUSÃO

Para a consecução do objetivo do presente trabalho, o estudo da ocorrência ou não de preclusão da decisão que examina a presença ou não dos pressupostos processuais e condições da ação, faz-se interessante analisar as linhas fundamentais do instituto, ou seja, sua definição, seus fundamentos, as espécies de preclusão e a aplicação do instituto em relação ao julgador. Este é o objeto do presente capítulo. Assim:

1.1. CONCEITO E FUNDAMENTOS

Como acima exposto é o processo uma sucessão ordenada de atos, distribuídos em fases, cuja finalidade é a solução jurisdicional acerca do bem da vida ou direito discutido. Pois bem, no ordenamento jurídico brasileiro, pelo exame da Lei 5869/73, chega-se à conclusão que foi adotado pelo legislador um processo civil rígido, ou seja, divido em fases processuais, sendo que tal divisão não permite que se retroceda à fase já extinta, assim os atos a serem praticados na fase postulatória não podem, em regra, ser reabertos na fase instrutória e muito menos na decisória ou na recursal. Nesse lanço, tem o instituto da preclusão papel fundamental na impulsão do processo, como fato obstativo de retrocesso.

Embora não se pretenda, pela delimitação do presente estudo, fazer profunda análise histórica do instituto, interessante se faz, para bem entender a preclusão, citar, ainda que brevemente, sua origem. Segundo BEDAQUE [01], o instituto da preclusão tem sua origem no culto ao formalismo, podendo ser observada no direito romano medieval, apontando o autor seu aparecimento desde o direito romano antigo. Nessa linha, SICA (2006, p.7) refere que o fenômeno da preclusão pode ser observado desde a primeira fase do direito romano antigo, o período das ações da lei –per legis actiones-, em que o formalismo era exacerbado.

No entanto, consoante lição de GIANNICO (2007, p. 41 e ss.) é consenso na doutrina que o delineamento moderno do instituto é atribuído a Giuseppe Chiovenda, que teve inspiração nas lições de Oskar Von Bülow. Nesse sentido também é a lição de DIDIER JR. (2007, p. 247). Pois bem, sendo Chiovenda o delineador do instituto na sua visão moderna, interessante se faz recorrer ao conceito dado ao instituto pelo processualista. Inicialmente, consoante lição de Giannico (Ob. cit., p. 43), após formular um conceito inicial de preclusão, objeto de várias críticas, por abranger somente a preclusão dirigida às partes, Chiovenda reformulou o conceito de preclusão, entendendo como sendo preclusão:

"... a perda, ou extinção ou consumação de uma faculdade processual que se sofre pelo fato: a) de não haver observado a ordem assinalada por lei para seu exercício, como os termos peremptórios ou a sucessão legal de atividades e das exceções; b) ou de haver realizado uma atividade incompatível com o exercício da faculdade, como a apresentação de uma exceção incompatível com outra ou a prática de um ato incompatível com a intenção de impugnar uma sentença; c) ou de haver já exercitado validamente uma vez a faculdade (consumação propriamente dita)." CHIOVENDA, apud GIANNICO (ob.cit. p. 43).

Assim, como adiante se detalhará, Chiovenda formulou um conceito de preclusão que abarca descritivamente suas espécies (temporal, lógica e consumativa). No entanto, tal conceituação não ficou imune a críticas, posto que remete a preclusão às faculdades processuais, embora nos exemplos mencione decisão judicial, hipótese em que somente haveria preclusão para as partes, sendo necessário também se falar em preclusão de questões processuais, abarcando também o juiz, que fica impedido de resolver questões já decididas, nesse sentido é a lição de THEODORO JÚNIOR (2000, p.13).

Embora seja o conceito de preclusão tema polêmico na doutrina, a conceituação formulada por Chiovenda deixa clara a idéia do instituto que importa, consoante a lição de ARENHART E MARINONI (2007, p. 628), na perda de "direitos processuais" seja pelo decurso de tempo, pela adoção de conduta processual incompatível com a prática do ato ou ainda pela efetiva prática de ato processual. Ainda, para DIDIER JR (Ob. cit. p. 248), preclusão é tida como a perda de uma situação jurídica ativa processual: seja a perda de poder processual das partes, seja a perda de um poder do juiz. Ou seja, embora a conceituação doutrinária do instituto seja divergente, não havendo definição legal, o ponto comum é a idéia de perda de poder de praticar um ato pelo decurso de tempo ou por conduta processual incompatível ou ainda impossibilidade de repetir o ato.

Pois bem, do conceito de preclusão já se pode inferir seus fundamentos, sua razão de ser e seus objetivos. Assim, tem a preclusão fundamento e função de possibilitar o andamento da marcha processual e a vedação de retrocesso, de repetição de atos ou de retorno à fase processual já percorrida. Deveras, o instituto da preclusão está ligado às idéias de efetividade e celeridade processual, boa-fé processual e também ao ideal de segurança jurídica. Com efeito, o instituto da preclusão enquanto serve para impor curso avante ao andamento processual é instrumento de celeridade do processo, contribuindo para a realização do escopo de processo judicial efetivo, ou seja, aquele em que a solução ao jurisdicionado é dada em tempo útil. Tem fundamento na boa-fé, uma vez que impõe uma conduta ética às partes, que não poderão tumultuar o processo, ou guardar argumentos com o intuito de protelar o processo ou esperar o momento mais favorável para argüi-los e tampouco trancar o processo com rediscussão de matérias já resolvidas. Também, não há como se olvidar que, na medida em que a preclusão impede da rediscussão de matéria ou a prática extemporânea de ato ou sua repetição. é elemento de concretização de segurança jurídica.

Dessa forma, analisando o instituto em cotejo com as garantias processuais constitucionais vigentes no ordenamento pátrio, tem-se que o fenômeno da preclusão pode ser visto como instrumento de concreção das garantias de acesso à justiça e inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal de 1988), bem como da garantia de razoável duração do processo e celeridade processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal). Nesse contexto, o instituo da preclusão, longe de ser uma exacerbação à forma, como sua origem pode remeter, é hoje, um instrumento de efetividade processual e de consecução das garantias constitucionais processuais de acesso à Justiça e de processo célere e útil.

1.2.NATUREZA JURÍDICA

Vistos o conceito e os fundamentos da preclusão, importante esclarecer sua natureza jurídica. Pois bem, a definição da natureza jurídica da preclusão longe está de ser tema pacífico na doutrina, com efeito, pela eficácia da preclusão, há dificuldade de enquadramento do instituto seja como fato jurídico, como efeito de fato ou como sanção.

Primeiramente cumpre asseverar que, considerando as origens do instituto direito romano canônico e medieval, segundo lição de THEODORO JR. (Ob. cit, p. 12), a preclusão tinha o caráter de pena. No entanto, considerando que a preclusão recai sobre o não exercício de ônus processuais ou faculdades processuais pelas partes, ou pela vedação de repetição de atos processuais ou ainda impede que o juiz resolva novamente questão já resolvida, resta claro que não se pode confundi-la com sanção pela prática de ato ilícito, porque ato ilícito algum há no descumprimento de ônus ou não exercício de faculdades.

Em relação à preclusão ser fato jurídico ou efeito de fato/ato jurídico, há necessidade de exame mais aprofundado. Nesse sentido DIDIER JR. (Ob. cit., p. 254), examinando a natureza jurídica da preclusão, refere que tanto pode ser efeito de fato jurídico como pode compor o suporte fático de fato jurídico, como por exemplo, a preclusão compõe o suporte fático da coisa julgada e também do ato nulo de interposição intempestiva de recurso.

No entanto, embora se possa entender a preclusão como um efeito, parece acertada a lição de CINTRA, DINAMARCO E GRINOVER (2000, p. 327), que classificam a preclusão como fato jurídico impeditivo, in verbis

"Objetivamente entendida, a preclusão consiste em um fato impeditivo destinado a garantir o avanço progressivo da relação processual e a obstar seu recuo para as fases anteriores do procedimento."

Nesse sentido, consoante cita GIANNICO (Ob. cit., p. 75), que também entende ter a preclusão natureza de fato jurídico impeditivo, posicionam-se Stefano Riccio e Frederico Marques.

Já THEODORO JR. (Ob. cit., p. 12) classifica a preclusão como "...mecanismo que provoca a passagem de um estágio processual para outro, preservando a firmeza e a inatacabilidade dos atos processuais já consumados." Em que pese o entendimento do doutrinador, a classificação jurídica da preclusão como fato jurídico impeditivo parecer melhor enquadrar o instituto e acaba por esclarecer seus efeitos, sendo a classificação adotada no presente estudo.

1.3. ESPÉCIES DE PRECLUSÃO

As espécies de preclusão são extraídas da conceituação do instituo formulada por Chiovenda, como acima citado, sendo depreendidas da leitura do conceito as três espécies mais comuns de preclusão, quais sejam: temporal, lógica e consumativa, sendo que a doutrina processual pátria é unânime em reconhecer tais espécies. Assim, serão analisadas cada uma das espécies de preclusão.

Inicialmente, a espécie de preclusão de mais fácil identificação é a preclusão temporal. Tal preclusão ocorre quando a parte deixa de exercer no prazo imposto pela lei processual, determinada faculdade ou ônus processual. Assim, quando se desrespeita prazo para interposição de recurso, para apresentação de contestação e demais prazos próprios previstos nas leis processuais há a impossibilidade de prática do ato após o decurso do prazo. Nesse sentido, claro é o teor do art. 183 do Código de Processo Civil Pátrio, que refere:

"Art. 183. Decorrido o prazo, extingue-se independentemente de declaração judicial, o direito de praticar o ato, ficando salvo, porem, à parte provar que o não realizou por justa causa."

Tal espécie de preclusão ocorre, assim, quando a desobediência a prazos próprios e preclusivos, não incidindo em prazos impróprios como, ordinariamente são, os prazos fixados para a prática de atos pelo juiz. Já a preclusão lógica ocorre quando há, nas palavras de DIDIER JR. (2007, p. 252) "perda de faculdade/poder processual por se ter praticado ato incompatível com seu exercício.". Exemplo claro de tal efeito é a renúncia ao direito de recurso, se a parte, intimada da decisão, manifesta-se pela renúncia ao direito de recorrer, não pode, mesmo que ainda no curso do prazo para interposição de recurso, interpor o recurso a que renunciou.

Nesse lanço, interessante se faz citar a observação de DIDIER JR (ob. cit., p. 253) no sentido de ser a preclusão lógica expressão da boa-fé objetiva no campo processual e ainda refere que o magistrado também é atingido por tal espécie de preclusão. De fato, exemplifica o doutrinador, que quando o magistrado concede tutela antecipada por abuso de direito de defesa não pode deixar de condenar o demandando às penas da litigância de má-fé, ainda vê o autor como efeito da preclusão lógica a incompatibilidade entre o julgamento antecipado da lide e o julgamento de improcedência por falta de provas. Com a devida vênia ao doutrinador, não se consegue vislumbrar uma nítida preclusão lógica, mas sim impossibilidade de prática dos atos por ele elencados pela própria sistemática do processo e não por preclusão. No primeiro caso, por exemplo, a condenação nas penas da litigância de má-fé é também conseqüência da mesma conduta processual da parte que motivou a concessão da tutela, no segundo caso as hipóteses são excludentes por si só, não parecendo bem ser efeito da preclusão, mas da lógica do próprio sistema processual civil.

A preclusão consumativa, por sua vez, ocorre pela efetiva prática de ato processual ou de resolução de questão pelo magistrado (preclusão de questões -conforme lição de Humberto Theodoro Júnior acima citada). Tal espécie de preclusão encontra fundamento na vedação de repetição de atos já praticados, vedação do bis in idem, consoante ensinamento de DIDIER JR (ob. cit., p. 254). Esse tipo de preclusão, consoante entendimento doutrinário majoritário alcança tanto às partes – preclusão de faculdade processual já exercida – quanto ao julgador – quando fica impedido de resolver questão processual já resolvida. Expressão legal da preclusão consumativa, pelo menos em relação às partes, pode ser observado no art. 158 do CPC, sendo ainda, a preclusão de questões expressa nos arts. 471, 473 e no art. 516 do Diploma Processual Civil Pátrio.

Ainda, GIANNICO (2007, p. 127) traz outra espécie de preclusão, a denominada preclusão hierarquia que atinge o magistrado quando questão processual é resolvida, mediante recurso, em definitivo por instância hierarquicamente superior, restando o julgador impedido de rever a decisão, nas palavras do doutrinador, a definição de tal espécie de preclusão: "quando a perda advier de ato de terceiro, notadamente de decisão proferida por órgão jurisdicional hierarquicamente superior, desde que tenha havido cognição ampla e exauriente da questão decidida.".

Nesse lanço, cabível um questionamento se tal espécie de preclusão, a hierarquia, não estaria abarcada pela preclusão consumativa, posto que uma questão processual somente estará decidida, nos termos do art. 473 do CPC, se após a decisão inicial escoar o prazo recursal sem interposição de recurso ou após o julgamento do recurso interposto. De fato, somente estará decidida a questão se a decisão sobre sua resolução for definitiva tanto faz se tornar-se definitiva pelo decurso de prazo para recurso ou pelo esgotamento da via recursal, sendo questionável a utilidade da conceituação de preclusão hierárquica.

Pelo exposto, das espécies de preclusão aqui estudadas pode-se concluir que as partes serão atingidas pela preclusão temporal, lógica e consumativa e o magistrado somente pela preclusão consumativa e, se for considerada a espécie de preclusão hierárquica, por essa também.

1.4. A "PRECLUSÃO PRO JUDICATO"

Considerando que o objetivo-fim do presente trabalho é o exame dos efeitos preclusivos da decisão que examina a presença dos requisitos de admissibilidade do processo, necessário se faz aprofundar o exame da ocorrência de preclusão para o magistrado. Inicialmente convém citar a polêmica que envolve a expressão preclusão pro judicato.

Em que pese a maioria da doutrina utilizar a expressão como sinônimo de preclusão judicial, ou de preclusão que recai sobre a atividade do magistrado, na preclusão acerca da resolução de questões, tal acepção não é a correta. Nesse sentido, elucidativa é a lição de GIANNICO (Ob. cit., p. 130 e ss.) que despende um capítulo de sua obra para esclarecer a origem da expressão e o contexto em que foi utilizada. Assim, segundo o processualista, a expressão foi utilizada por ENRICO REDENTI, por volta de 1930, para explicar a eficácia da decisão que extingue processo de execução pela satisfação do crédito e impede a rediscussão do referido crédito e das questões a ele inerentes, ou os efeitos da decisão extintiva da ação monitória. Dessa forma, na lição de Redenti, preclusão pro judicato seria a eficácia semelhante à coisa julgada material que teria a decisão que extingue a execução para fins de obstar discussão acerca do crédito extinto.

No entanto, como bem elucida NEVES (2004, p. 24), também citado por GIANNICO (Ob. cit. p. 132), a maioria da doutrina brasileira (que não admite a preclusão pro judicato nos termos criados por Redenti), seguindo a confusão criada por Stefano Riccio que, embora tenha criticado a eficácia que o Redenti pretendia ver na decisão que extingue a execução ou a ação monitória, utilizou a expressão preclusão pro judicato para identificar a ocorrência de preclusão para o juiz na decisão de questões, utiliza o termo fora de sua acepção original (conceituação de Redenti) para identificar fenômeno diverso do entendido pelo criador do termo.

Dessa forma, no âmbito do presente estudo, serão utilizados os termos preclusão de questões, ou preclusão para o juiz ou ainda preclusão judicial, embora GIANNICO (Ob. cit., p. 134) também critique o uso da última expressão por equivaler a tradução de preclusão pro judicato, para identificar a ocorrência de preclusão para o juiz, isto é, impossibilidade de reexame de questão já examinada em definitivo, seja pelo próprio julgador ou questão decidida em definitivo por instância superior em recurso no curso do processo.

O exame mais detalhado acerca das questões decididas no curso do processo e os efeitos preclusivos da decisão que as examina será mais bem detalhado no capitulo três do presente estudo. Agora, a fim de criar o elo necessário à discussão pretendida – exame da ocorrência de preclusão da decisão que examina a presença dos requisitos de admissibilidade do processo – serão examinados, brevemente, o que se entende por requisitos de admissibilidade do processo.


2. OS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO PROCESSO- PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS E CONDIÇÕES DA AÇÃO

Como acima referido para a consecução do objetivo do presente estudo necessário se faz, ainda que de forma superficial, posto que o tema a ser tratado é extremamente complexo e provoca grandes discussões doutrinárias, analisar os requisitos de admissibilidade do processo, assim compreendidos os pressupostos processuais e as condições da ação.

2.1. CONCEITO E TRATAMENTO LEGAL

Inicialmente cumpre referir que o tema ação – direito de provocar o estado-juiz para recebimento da tutela estatal – é um dos mais tormentosos do direito processual, havendo grandes estudos a respeito de tal tema e muitas polêmicas que envolvem o direito de ação, os requisitos para seu exercício e as chamadas condições da ação. Todavia, no âmbito do presente trabalho, embora muito interessante a discussão a respeito do direito de ação e das condições da ação – se são efetivas, se compõem o mérito ou não, se a teoria eclética é a melhor teoria ou não, não se ingressará no estudo dessas polêmicas, posto que esse não é o objetivo primordial do estudo. Assim, serão analisados os temas condições da ação e pressupostos processuais tal qual o entendimento expresso no Código de Processo Civil, ou seja, como requisitos, condições ao exame do mérito da demanda.

Pois bem, a autonomia do direito processual e do direito de ação em relação ao direito material ou substancial é fruto da evolução da ciência e da doutrina processual, sendo hoje indiscutível a autonomia do direito de ação em relação ao direito material. Nesse lanço, cumpre referir que os pressupostos processuais e as condições da ação constituem, no ordenamento processual civil brasileiro, os requisitos para que se chegue à resolução do mérito da demanda, são, assim, condições de admissibilidade do processo, devendo sua presença ser constatada antes de examinado o mérito da demanda. A corroborar tal afirmação, o art. 267 do CPC, nos incisos IV (pressupostos processuais) e VI (condições da ação), deixa nítido tratar os institutos como requisitos de admissibilidade do processo ou requisitos para o exame do mérito da demanda.

Os pressupostos processuais, como bem refere BEDAQUE (ob. cit., p. 181), foram sistematizados por Oskar von Bülow como elementos de distinção entre a relação jurídica processual e a relação de direito material. Assim, constituem os pressupostos processuais em requisitos para que o processo nasça e desenvolva-se até o exame do mérito da demanda. Acerca de sua importância, interessante se faz citar a observação de BEDAQUE (Ob. cit., p. 186):

"Por isso, conclui-se serem os pressupostos processuais exigências legais destinadas à proteção de determinados valores inerentes às partes e à jurisdição, visando a possibilitar que o processo seja efetivo instrumento de acesso à ordem jurídica – ou, em outras palavras, que ele represente método justo de solução de controvérsias."

Assim, sendo os pressupostos processuais requisitos para o nascimento e desenvolvimento do processo, classificam-se, segundo a doutrina predominante, "corrente ampliativa", no dizer de BEDAQUE (Ob. cit., p. 188), em pressupostos processuais subjetivos, objetivos e negativos. Os primeiros dizem respeito às partes e ao juiz, sendo capacidade de ser parte, de estar em juízo e capacidade postulatória, em relação às partes, e, em referência ao magistrado, investidura, competência e imparcialidade. Os pressupostos processuais objetivos dizem respeito aos atos do processo, sendo, petição inicial apta, citação válida e regularidade do procedimento. Ainda, os pressupostos processuais negativos são ausência de litispendência e coisa julgada.

A doutrina adota diversas divisões em relação aos pressupostos processuais. Assim, ALMEIDA, WAMBIER E TALAMINI (2006, p. 199 e ss.) adotam a divisão entre pressupostos processuais de existência (petição inicial, jurisdição e citação, sendo a capacidade postulatória pressuposto de existência reflexo, implícito na petição inicial), de validade (petição inicial apta, órgão jurisdicional competente e imparcial, capacidade de ser parte e capacidade de estar em juízo) e pressupostos processuais negativos (inexistência de litispendência e coisa julgada).

Com a devida vênia, a classificação que melhor específica os pressupostos processuais é a trazida por José Orlando Rocha de Carvalho apud DIDIER (Ob. cit., p. 198), na seguinte forma: pressupostos processuais de existência, divididos em subjetivos (jurisdição e capacidade de ser parte), objetivos (existência de demanda – petição inicial); pressupostos processuais de validade, sendo subjetivos (competência e imparcialidade do juiz, capacidade processual e capacidade postulatória), objetivos, estes divididos em intrínsecos – dizem respeito à própria relação processual – correspondendo ao respeito ao formalismo processual conforme tipificação legal, e extrínsecos (externos à relação processual), equivalentes aos pressupostos negativos – ausência de litispendência, coisa julgada, perempção e convenção de arbitragem. Nesse ponto, cumpre observar que os pressupostos de validade objetivos intrínsecos – regularidade formal – são de impossível enumeração, posto que equivalentes à obediência às normas processuais que estabelecem as formalidades e os ritos para a prática dos atos processuais.

Assim, os pressupostos de existência subjetivos seriam a jurisdição, isto é que o juiz seja regularmente investido, de acordo com os requisitos constitucionais (art. 93 da Constituição Federal), capacidade de ser parte equivalente à personalidade jurídica, consoante disposições da Lei Civil. O pressuposto de existência objetivo – existência de demanda, corresponde à existência de pedido, posto que é vedado o exercício de jurisdição de ofício, nos termos do art. 2º do CPC, devendo a ação ser proposta nos termos do art. 263 do CPC e conter os elementos essenciais, em especial, como requisito de existência, o pedido, nos termos do art. 295, I, do Diploma Processual Civil.

Já os pressupostos de validade subjetivos referentes ao julgador correspondem à competência do juiz para exame da causa, consoante às normas constitucionais e infraconstitucionais de competência dos órgãos jurisdicionais, à imparcialidade, equivalente à ausência de impedimento ou suspeição para exame da lide, nos termos do art. 134 a 138 do CPC. Em relação às partes é exigida capacidade de ser parte, equivalente à aptidão para praticar os atos processuais nos termos do art. 12 do CPC, e a capacidade postulatória equivale à capacidade técnica para requerer a prestação jurisdicional, normalmente exigindo-se representação por advogado inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, salvo nos casos do art. 36 do CPC e demais casos previstos em lei. O pressuposto de validade objetivo intrínseco, qual seja, regularidade formal, equivale ao respeito à forma legal de prática dos atos processuais.

Em relação aos pressupostos processuais de validade objetivos extrínsecos equivalem aos pressupostos negativos, ou seja, casos em que a presença dos institutos da coisa julgada (art. 301, parágrafo 1º, do CPC), da litispendência (art. 301, parágrafos 2º e 3º, do CPC), da perempção (art. 268, parágrafo único do CPC) ou convenção de arbitragem impede o exame da demanda e a constituição válida de processo, culminando com a extinção do feito, nos termos do art. 267, V e VII, do CPC.

No tocante às condições da ação, o ordenamento processual civil pátrio tem inspiração nos ensinamentos de Enrico Túlio Liebman, adotando a teoria eclética do direito de ação, ou seja, segundo essa teoria o direito de ação, embora abstrato, é condicionado ao preenchimento de certos requisitos, somente se preenchidos esses se poderá chegar ao exame do mérito. As condições da ação dizem respeito à relação jurídica material ou ao pedido, mas, embora exijam que se analise a relação jurídica material, não se confundem com o mérito da demanda. Nesse sentido, esclarecedora é a lição de BEDAQUE (Ob. cit., p. 236):

"As condições da ação representam legítima limitação ao exercício da atividade jurisdicional no caso concreto, porque o processo iniciado sem a presença de uma delas é manifestamente inútil. Circunstâncias do próprio direito material revelam existir algum óbice a que a tutela jurisdicional seja concedida ao autor.

Embora o reconhecimento desse impedimento dependa de exame da relação jurídica substancial, não se verifica o julgamento do mérito, pois não há solução da crise de direito material. O objeto do processo permanece intocado, inexistindo solução para lide."

Dessa forma, embora o exame das condições da ação exija conexão com o direito material, não se invade o mérito da demanda, sendo utilizado um juízo de cognição menos profundo, derivado do exame dos elementos apresentados pelo autor em sua petição inicial, nesse lanço conveniente citar mais um esclarecimento do processualista acima citado (Ob. cit., p. 253):

"Em síntese, para não confundir condições da ação com o mérito, carência com improcedência, propõe a doutrina critério fundado na profundidade da cognição, que, como veremos, não é suficiente para solucionar todos os problemas relacionados ao tema, mas auxilia sobremaneira o intérprete a evitar confusões entre planos considerados diversos pelo legislador brasileiro."

Portanto, embora as condições da ação, adiante relacionadas, demandem que se analise sua presença ou não com um olhar acerca do direito material, não se confundem, nos termos do art. 267, VI, do CPC, com o mérito da demanda. As condições da ação, na definição dada por Liebman e adotada pelo ordenamento processual pátrio, equivalem a legitimidade para estar em juízo, interesse processual e possibilidade jurídica do pedido, estando as duas primeiras previstas no art. 3º do CPC e a última somente no art. 267, VI, que também refere as duas primeiras.

No âmbito do presente estudo não cabe analisar profundamente as condições da ação, pelo que somente será analisada superficialmente sua conceituação. A primeira das condições da ação - legitimidade de agir – corresponde, como refere DIDIER (Ob. cit., p. 165) a um vínculo entre os sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada, segundo BUZAID apud DIDIER (Ob. cit, p. 166)a legitimidade para causa é a pertinência subjetiva da ação. A legitimidade abrange tanto o pólo ativo da demanda quanto o passivo, no pólo ativo a legitimidade para a causa tem equivalência legal no art. 6º do CPC. Na definição de CINTRA, DINAMARCO E GRINOVER (Ob. cit., p.258) tem-se que "...é titular de ação apenas a própria pessoa que se diz titular do direito subjetivo material cuja tutela pede (legitimidade ativa), podendo ser demandado apenas aquele que seja titular da obrigação correspondente (legitimidade passiva).".

O interesse processual, por sua vez, corresponde a necessidade do uso da ação para obtenção da tutela e na utilidade do provimento jurisdicional pleiteado para a satisfação da pretensão. Elucidativa é a lição de CÂMARA (2007, p. 132):

"O interesse de agir é verificado pela presença de dois elementos, que fazem com que esse requisito do provimento final seja verdadeiro binômio: "necessidade da tutela jurisdicional" e "adequação do provimento pleiteado". Fala-se, assim, em "interesse-necessidade" e em "interesse-adequação". A ausência de qualquer dos elementos componentes desse binômio implica ausência do próprio interesse de agir."

A última e mais polêmica condição da ação é a possibilidade jurídica do pedido ou da demanda. Tal condição da ação diz respeito a não vedação do pedido formulado ou da causa de pedir pelo ordenamento jurídico vigente. Nesse sentido a lição de CÂMARA (Ob. cit., p. 134):

"Esse requisito deve ser verificado por um critério negativo, ou seja, deve-se buscar determinar os casos em que o mesmo está ausente. Assim é que se deve considerar juridicamente impossível a demanda quando o pedido ou a causa de pedir sejam vedados pelo ordenamento jurídico, não podendo o Estado-juiz, ainda que os fatos narrados na inicial tenham efetivamente ocorrido, prestar a tutela jurisdicional pretendida."

Segue o autor exemplificando como casos de impossibilidade jurídica a cobrança de dívida de jogo, o reconhecimento de domínio no curso de ação possessória, a prisão civil por dívida fora dos casos legais. A possibilidade jurídica do pedido foi formulada como condição da ação por Liebman considerando ação de divórcio, à época da formulação da teoria não era legalmente previsto o divórcio na Itália, sendo que após a previsão o doutrinador, como refere DIDIER (Ob. cit., p. 164), retirou do rol das condições da ação a possibilidade jurídica do pedido. Tal fato torna tormentosa na doutrina a questão da permanência ou não da possibilidade jurídica da demanda como condição da ação. Todavia, como o tema não é pacífico e há previsão legal da referida condição da ação, será considerada como condição da ação no presente trabalho.

Acerca da real função das condições da ação, interessante se faz citar a lição de BEDAQUE (Ob. cit., p. 407):

"Por fim, deve ser extraída das condições da ação sua verdadeira função no sistema processual: possibilitar ao juiz, de preferência logo no início do procedimento, de oficio, examinar os aspectos da relação material e impedir o prosseguimento inútil do processo."

Assim, em síntese, são os pressupostos processuais e as condições da ação instrumentos para a economia processual, para a celeridade, bem como de efetividade do processo. São requisitos para que se chegue ao exame do mérito da demanda, sendo que sua ausência gera a extinção do processo sem exame de mérito, salientando-se que no caso de ausência de condições da ação, diz-se que há carência de ação, seguindo a teoria eclética, nos termos acima expostos. Agora, conceituados os institutos, passar-se-á a examinar o momento em que deve ser examinada a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação.

2.2. MOMENTO DE EXAME DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE

Pois bem, traçadas linhas gerais acerca dos pressupostos processuais e das condições da ação, requisitos de admissibilidade do processo e necessários ao exame do mérito da demanda, cumpre verificar o momento em que sua presença deve ser examinada pelo juízo. Analisando o índice de disposições do Código de Processo Civil, notadamente os dispositivos referentes ao processo de conhecimento, de rito ordinário, pode-se observar a delimitação de fases processuais, assim, tem-se clara a divisão nas fases ou etapas postulatória, de saneamento, instrutória e decisória.

Nessa linha, considerando que os pressupostos processuais e as condições da ação são necessários para o desenvolvimento do processo e o enfrentamento do mérito da demanda, pode-se claramente concluir que sua presença deve ser aferida o mais breve possível a fim de evitar o trâmite de processo, com o dispêndio de tempo e recursos, fadado ao insucesso. Todavia, para bem analisar a questão cumpre verificar se o ordenamento jurídico pátrio prevê um momento especial para exame dos requisitos de admissibilidade do processo.

Analisando o Diploma Processual Civil tem-se que na fase postulatória, logo após a propositura da demanda o juiz fará um exame da petição inicial, nos termos dos arts. 284 e 285 do CPC. Nesse despacho liminar começa a atividade saneadora a ser promovida pelo magistrado durante todo o desenrolar do feito, devendo já nessa fase aferir a viabilidade da demanda, ou seja, se há regularidade na propositura da ação e se estão presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Nesse sentido, clara é a lição de BARBOSA MOREIRA (2008, p. 23):

"Distribuída a petição inicial, se necessário, ou apresentada diretamente ao juiz, tem este o dever de proferir o despacho liminar, no qual decidirá se o réu há de ser ou não citado. Por intuitivas razões de economia processual, que impõem negar seguimento ao feito quando manifestamente inviável – ou seja, quando logo se puder perceber a impossibilidade de chegar-se ao julgamento de mérito -, determina a lei que o órgão judicial, desde esse primeiro contato com a postulação do autor, efetue o controle da regularidade formal do processo e da admissibilidade da ação. As questões relativas a ambos esses aspectos normalmente constituem, no seu conjunto, o objeto do despacho liminar, cabendo ao juiz, obviamente, examiná-las de ofício. Inicia-se, assim, a atividade de saneamento do feito."

Deveras, por razões de economia processual, razoável duração do processo, celeridade e efetividade processual, deve o juiz, verificando que a ação proposta não obedece aos requisitos legais, seja pela ausência de condição da ação ou de pressuposto processual já verificável, extinguir a ação ou determinar a realização de ato que saneie o vício, nos termos do art. 284 do CPC. No caso, o ato que a lei qualifica como "despacho" é, na verdade, decisão que ou determinará o prosseguimento do feito, nos termos do art. 285, do CPC, ou determinará o saneamento, com ordem de emenda da inicial (art. 284 do CPC), ou culminará com o indeferimento da inicial nos termos do art. 295 do CPC, ocasião em que haverá verdadeira sentença, atacável pela via da apelação, nos termos do art. 296 do Diploma Processual Civil Pátrio.

Nesse ponto, considerando que as condições da ação representam um elo entre o direito processual e o direito material, interessante mencionar a polêmica doutrinária acerca do momento de sua aferição e das implicações disso no saneamento do feito. Como relata CÂMARA (Ob. cit., p. 135), a doutrina divide-se acerca do tema, havendo uma corrente preconizada por Liebman e sustentada por Dinamarco que considera que a presença das condições da ação deve ser demonstrada, podendo o autor valer-se da produção de provas para demonstrar a presença das condições da ação. Logo, para tal corrente doutrinária, verificando o juiz a ausência de condição de ação deveria, ao invés de indeferir a petição inicial (art. 295, II, III e parágrafo único, inciso III, do CPC) e extinguir o feito sem julgamento de mérito (art. 267, I, do CPC), abrir prazo para que o autor demonstrasse a presença de tais condições, devendo, inclusive, permitir a produção de provas.

Já outra corrente doutrinária, majoritária, sustenta a denominada teoria da asserção, para a qual, nos ensinamento de CÂMARA (Ob. cit., p. 135) "a verificação da presença das condições da ação se dá à luz das afirmações feitas pelo demandante em sua petição inicial, devendo o julgador considerar a relação jurídica deduzida em juízo in statu assertionis, isto é, a vista do que se afirmou.". Segue o doutrinador, afirmando que para verificar a presença das condições da ação deve o juiz entender por verdadeiras as afirmações deduzidas pelo autor na exordial e com base nelas realizar o juízo de admissibilidade da ação à luz das condições da ação.

A respeito do tema, DIDIER (ob. cit., p. 161-164) aduz que a decisão sobre a carência de ação, de acordo com a teoria da asserção seria sempre definitiva, citando como adeptos da corrente doutrinária Alexandre Câmara, Kazuo Watanabe, Flávio Luiz Yarshell, Leonardo Greco, José Carlos Barbosa Moreira, José Roberto dos Santos Bedaque, Sérgio Cruz Arenhart, Leonardo José Carneiro da Cunha, Araken de Assis e Luiz Guilherme Marinoni. Ainda, embora pregue a abolição das condições da ação como categoria jurídica, refere que "...à luz do direito positivo, a melhor solução hermenêutica é a adoção da teoria da asserção, que ao menos diminui os inconvenientes que a aplicação literal do §3º do art. 267 do CPC poderia causar.".

A corroborar tal entendimento pode-se citar a lição de BEDAQUE (Ob. cit., p. 407): "... deve ser extraída das condições da ação sua verdadeira função no sistema processual: possibilitar ao juiz, de preferência logo no início do procedimento, de ofício, examinar aspectos da relação material e impedir o prosseguimento inútil do processo." Logo, analisando a sistemática do Código de Processo Civil Brasileiro, embora tenha se filiado à teoria eclética de Liebman, parece que a solução mais acertada é a adoção da teoria da asserção, já que o art. 284 do CPC somente prevê possibilidade de regularização e emenda à inicial para a correção de "defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito...", ou seja, correção não de impeditivos de julgamento de mérito, mas de irregularidades formais. Assim, acaso detectada, no exame da exordial, a ausência de condição da ação deve, desde logo, ser declarada a carência de ação e extinto o feito, a fim de evitar a tramitação de processo inviável.

Acaso admitida a inicial e ordenada a citação do demandado para contestação, após o oferecimento desta, ocasião em que deve o demandado argüir as matérias de defesa processuais e de mérito, nos termos do art. 301 do CPC, em que há referência expressa a alguns dos pressupostos processuais e às condições da ação, os autos irão conclusos ao juiz que realizará o "julgamento conforme o estado do processo", nos termos dos arts. 329 a 331 do CPC. Em tal fase, deverá o juiz examinar, tendo em vista a resposta do demandando e as alegações argüidas, o estado que se encontra o processo, ordenando o saneamento do feito, analisando o cabimento da extinção nos termos dos arts. 267 e 269, II a V, julgando antecipadamente a lide, determinando a realização de audiência preliminar para fins de conciliação ou ainda, uma vez saneado o feito, fixará os pontos controvertidos e determinará a produção de provas.

Tal momento é a fase de saneamento por excelência. Com efeito, após a apresentação de contestação, ocasião em que poderá e deverá o demandado levantar todas as matérias de defesa, bem como desde já produzir provas, especialmente a documental, deverá o juiz analisar as questões processuais levantadas – aí se inclui o exame dos pressupostos processuais e das condições da ação – devendo sanear o feito, ou seja, resolver as questões processuais e eventualmente determinar diligências para a correção de vícios sanáveis e irregularidades detectadas. Ou seja, no dizer de BARBOSA MOREIRA (Ob. cit., p. 52), contém a decisão interlocutória de saneamento um juízo positivo de admissibilidade em relação à ação – já que o juiz deve analisar as questões levantadas pelo demandado e também as matérias cognoscíveis de ofício (aí se incluem os pressupostos processuais e as condições da ação), bem como há um juízo positivo de validade do processo.

Convém citar a lição de BARBOSA MOREIRA (Ob. cit. ,p. 52), acerca do dever de saneamento e de exame da admissibilidade da ação e da regularidade processual por parte do magistrado:

"Não é dado ao órgão judicial , salvo quando expressamente lho faculte a lei, diferir para outra oportunidade o exame de questões que integram o objeto da decisão de saneamento. Além de contrariar o disposto no art. 331 (onde o "poderá" não expressa mera faculdade, mas dever), combinado com o art. 329, tal prática não se compadece com o sistema do Código, tão sensível ao princípio da economia processual."

Ademais, segundo o doutrinador, mesmo que o magistrado não se pronuncie expressamente, o simples fato de proferir a decisão de saneamento, revela que analisou todas as hipóteses de extinção do processo tipificadas nos arts. 267 e 269 II a V, do CPC bem como a não ocorrência de nenhuma hipótese de julgamento antecipado da lide.

Pois bem, passada a fase de saneamento do feito, o itinerário normal a ser seguido é a produção de provas e a resolução do mérito da demanda. Todavia, conquanto o sistema processual seja rígido e divido em fases bem demarcadas, a atividade de saneamento permanece até a decisão final. Nesses termos, o art. 303 do CPC permite que o réu alegue novos fatos, matéria de ordem pública cognoscível de ofício pelo juiz ou alegável, por expressa autorização legal, a qualquer tempo e grau. Também o art. 267, parágrafo 3º, do Diploma Processual permite que seja conhecida de ofício, em qualquer tempo e grau, enquanto não proferida a sentença de mérito, a matéria prevista nos incisos IV, V e VI do art. 267 do CPC, ou seja, pressupostos processuais, pressupostos processuais negativos e condições da ação.

Diante de tal dispositivo legal que permite, em tese, que o juízo conheça dos requisitos de admissibilidade do processo, em "qualquer tempo e grau, enquanto não proferida a sentença de mérito", torna-se questionável a eficácia da decisão que saneia o processo, especialmente em relação à preclusão, tema polêmico, que será analisado no capítulo seguinte.


3. O EFEITO PRECLUSIVO DA DECISÃO QUE EXAMINA OS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO PROCESSO – OCORRÊNCIA OU NÃO

Como analisado no item final do capítulo anterior, embora a sistemática processual civil imponha ao juízo que analise desde o início do processo, ainda na fase postulatória, e mais apropriadamente na etapa de saneamento do feito a presença ou não dos requisitos de admissibilidade da ação – mais especificamente os pressupostos processuais e as condições da ação – o art. 267, §3º, do CPC, permite que tais matérias sejam objeto de exame, inclusive de ofício, a qualquer tempo e grau. Dessa possibilidade surgem questionamentos a respeito da eficácia preclusiva da decisão que reconheça a existência dos pressupostos processuais, seja ela prolatada na fase inicial da demanda, na fase de saneamento ou em momento posterior.

3.1. DA EFICÁCIA PRECLUSIVA DA DECISÃO QUE EXPRESSAMENTE EXAMINA OS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO PROCESSO

Como analisado no item final do capítulo anterior, embora a sistemática processual civil imponha ao juízo que analise desde o início do processo, ainda na fase postulatória, e mais apropriadamente na etapa de saneamento do feito a presença ou não dos requisitos de admissibilidade da ação – mais especificamente os pressupostos processuais e as condições da ação – o art. 267, §3º, do CPC, permite que tais matérias sejam objeto de exame, inclusive de ofício, a qualquer tempo e grau. Dessa possibilidade surgem questionamentos a respeito da eficácia preclusiva da decisão que reconheça a existência dos pressupostos processuais, seja ela prolatada na fase inicial da demanda, na fase de saneamento ou em momento posterior.

Deveras, em relação à decisão que reconhece a ausência de pressuposto processual de existência ou validade, ou reconhece a presença de pressuposto processual negativo ou a ausência de condição da ação não há maiores dúvidas, ocasionará a extinção do processo nos termos do art. 267, IV, V e VI, do Diploma Processual Civil, sendo decisão atacável pela via da apelação, que, acaso prolatada na fase postulatória, terá possibilidade de retratação pelo magistrado (art. 296 do CPC). Questionável é a regra do art. 268 do CPC que permite a repropositura da ação (salvo na hipótese da presença dos pressupostos processuais negativos- art. 267, V, do CPC), ou seja, a decisão tem eficácia preclusiva, mas não gera coisa julgada material, havendo questionamento doutrinário [02], principalmente no caso da extinção por carência de ação, acerca da não produção de coisa julgada. Todavia, como o presente estudo versa sobre preclusão, impossibilidade de rediscussão da matéria com eficácia endoprocessual, e tal fato não é objeto de controvérsia nesses casos, já que o feito é extinto, não se ingressará na polêmica da viabilidade de produção de coisa julgada material (impossibilidade de rediscussão da matéria com eficácia para além do processo, sendo inclusive pressuposto processual negativo).

Assim, o exame da controvérsia diz respeito aos efeitos da decisão que reconhece a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, seja de ofício, ou por provocação da parte. Teria tal decisão efeito preclusivo? Acaso admitido o efeito preclusivo, um primeiro e fundamental questionamento diz respeito à espécie de reconhecimento, bastaria que o juiz tacitamente reconhecesse a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, ou deveria haver decisão expressa a respeito? Mais, tal decisão vincularia as instâncias superiores?

Pois bem, em relação ao primeiro questionamento, salienta-se que há Súmula do Supremo Tribunal Federal, ainda não revogada, que reconhece a eficácia preclusiva da decisão que saneia o processo. Com efeito, o verbete de Súmula nº 424, refere: "Transita em julgado o despacho saneador de que não houve recurso, excluindo as questões deixadas, explícita ou implicitamente para a sentença." Contudo, desde já se adianta (tema que será mais bem desenvolvido no item seguinte) que a maioria da doutrina processual civil e da jurisprudência pátrias entendem que, em face da redação do art. 267, 3º, do CPC, a decisão interlocutória que reconhece a presença de pressuposto processual ou condição da ação não tem eficácia preclusiva. O art. 267, §3º, dispõe que "O juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e VI;...". Todavia, seria tal dispositivo legal aplicável aos casos em que há enfrentamento das matérias em decisão expressa? Em tal caso, haveria decisão interlocutória não preclusiva? No caso de decisão que extinguiu o feito nos termos do art. 267, IV a VI, do CPC e fora reformada em sede de agravo, haveria preclusão hierárquica para o juiz de primeiro grau? E para as instâncias superiores?

Esse é ponto fundamental do presente estudo. Com efeito, abordado o tema da preclusão, dos pressupostos processuais e das condições da ação e estabelecida a relevância de tais institutos para o desenvolvimento do processo, bem como constatado que são meios de operabilidade da efetividade, da celeridade e da economia processual, convém analisar a correlação entre os institutos. Desse modo, a questão fundamental é saber se a decisão que reconhece a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, à luz do ordenamento processual e do art. 267, §3º, do CPC, preclui ou não. Nesse sentido, a posição prevalente é de que em face do art. 267, §3º, do CPC, na medida em que permite que a matéria seja abordada, de ofício ou por provocação das partes, a qualquer tempo e grau, não haveria efeito preclusivo da decisão.

Porém seria esse o verdadeiro intuito do legislador, estabelecer vários procedimentos saneadores desde a fase postulatória para que questões que deveriam ser diagnosticadas logo no início do feito ou tão-logo possível possam se discutidas e rediscutidas "a qualquer tempo e grau"? Com a devida vênia, não parece que se deva negar qualquer efeito preclusivo à decisão que reconhece a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação. Deveras, em que pese ter o legislador conferido tratamento diferenciado a tais questões, a lógica do sistema, a efetividade processual e a segurança jurídica demandam uma melhor análise da questão.

Nesse lanço, desde já convém diferenciar os efeitos da decisão que analisa tacitamente a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação e da decisão que examina de forma direta, seja por meio de questionamento levantado pelas partes, seja de ofício, a presença dos requisitos de admissibilidade do processo e da ação. Aqui, deve-se examinar a questão lendo-se o disposto nos arts. 327 e 331 em cotejo com as garantias constitucionais da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, do dever de motivação das decisões, bem como considerando a segurança jurídica.

De fato, o art. 5º, XXXV, da CF/88 prevê a não exclusão da apreciação do poder judiciário de qualquer lesão ou ameaça a direito, tal garantia também impõe que todas as questões surgidas no curso do processo sejam examinadas pelo Judiciário. Da mesma forma, as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF) impõem que haja obediência ao trâmite estabelecido em lei para o processo, bem como que exista efetivo conhecimento não só dos argumentos da parte contrária, mas também das decisões judiciais, para possibilidade de defesa e discussão, o que mostra estreita correlação com o dever de motivar as decisões judiciais, nos temos do art. 93, IX, da Constituição Federal. Assim, considerando tais termos, parece que não se pode valorar da mesma forma a decisão que reconheça explicitamente a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação após discussão da matéria e de forma motivada e a decisão que apenas declara saneado o feito, ordenando o prosseguimento com a produção de provas.

Embora a decisão de saneamento implique, acaso ordenado o prosseguimento do feito, no reconhecimento implícito da presença de pressupostos processuais e condições da ação e, no dizer de BARBOSA MOREIRA, acima citado (Ob. cit., p. 52), que o juiz afastou a ocorrência das situações previstas no art. 267 do CPC, para fins de produção de efeitos, pelo menos no exame do efeito preclusivo, não se pode atribuir a mesma valoração dada à decisão que trate da matéria de forma expressa e clara. De fato, quando o juiz expressamente trata da presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, de forma clara e especifica, resta evidente para a parte que, consoante a sistemática adotada pelo CPC, acaso não concorde com o posicionamento do juízo, deve interpor o recurso de agravo. Deveras, prolatada uma decisão interlocutória, nos termos do art. 162, §2º e 522 do CPC, resta à parte que discordar do conteúdo interpor o recurso cabível, havendo meios processuais aptos e ciência da ocorrência de preclusão.

Diante desse quadro, em que pese o disposto no art. 267, §3º, do CPC, não há como negar que a decisão que expressamente e explicitamente analise e declare a presença de pressuposto processual ou de condição da ação, acaso não haja fato novo que acarrete a modificação da situação e superveniente ausência do requisito, tem sim eficácia preclusiva. Com efeito, para o juiz haverá a preclusão consumativa, posto que examinada e solucionada a questão, para a parte haverá preclusão temporal ou lógica, posto que, ciente da decisão e de seus efeitos, terá a oportunidade de interpor o recurso cabível, não o fazendo fica impossibilitada de provocar a rediscussão da matéria, isso não só pela preclusão, mas também pela boa-fé objetiva que deve pautar a conduta processual do juiz, das partes e dos demais envolvidos no processo. Essa é a solução que melhor se assenta com a sistemática processual, em que a preclusão é regra, bem como com a efetividade processual e com a segurança jurídica. Entrementes, não havendo alteração superveniente que acarrete a ausência do requisito reconhecido vedada fica sua discussão no bojo do processo, quer pelas partes, quer o reexame pelo Juízo e até por graus superiores.

Nesse lanço, acerca da eficácia da decisão para graus superiores de jurisdição, cumpre salientar que a parte, acaso quisesse levar a matéria à discussão, deveria fazê-lo no prazo próprio, não interposto o recurso cabível, ocorre a preclusão. Em relação à possibilidade de reapreciação por grau diverso de jurisdição, hierarquicamente superior ao prolator da decisão, cumpre destacar que a jurisdição e uma e todos os julgadores, ao menos em tese, são dotados de qualificação jurídica para apreciar as matérias, não havendo razão para permitir a infindável possibilidade de rediscussão da matéria já decidida (repita-se expressamente decidida e sem ocorrência de modificação superveniente que acarrete a ausência do requisito examinado) somente por haver diferença hierárquica entre os órgãos judiciais. Tal entendimento decorre da estrutura do sistema, da segurança jurídica e da efetividade processual, bem como tem relação com a independência funcional que é garantida aos magistrados e à presunção de qualificação técnica para exercício da jurisdição.

Da mesma forma, terá eficácia preclusiva a decisão, prolatada em grau de recurso, que declara a presença de condição da ação ou pressuposto processual. Imagine-se a seguinte situação, na fase postulatória, ou na fase de saneamento, há decisão que extingue o feito por ausência de legitimidade para a causa, nos termos do art. 267, VI, do CPC. Irresignada, a parte recorre, o Tribunal provê o recurso, afastando a carência de ação. Poderia o juiz prolator da decisão, sem que houvesse alteração superveniente, reexaminar a questão? Não tendo a parte recorrido da decisão do Tribunal, poderia a matéria ser objeto de reexame por grau superior? Parece que não. No primeiro caso, ocorreria a preclusão hierárquica e no segundo, não interposto o recurso, não poderia a parte levantar em ocasião superveniente a matéria e pelas mesmas razões de independência funcional e segurança jurídica acima expostas, a instância superior não poderia reexaminar a matéria.

Nesse ponto, interessante citar a lição de GIANNICO (Ob. cit., p. 57), que embora se filie à doutrina majoritária, entendendo que o art. 267, §3º, do CPC, possibilita o exame e reexame dos pressupostos processuais e condições da ação e, portanto, a matéria não estaria sujeita à preclusão, entende que a preclusão hierárquica é exceção a tal regra, incidindo em casos como o do exemplo acima. Interessante citar a conclusão do doutrinador:

"Esse é um dos pouquíssimos casos existentes em nosso sistema processual no qual há preclusão para o juiz, ainda que a matéria decidida seja de ordem pública. Nessa peculiar situação, simplesmente não poderá valer a citada regra de que toda matéria de ordem pública comporta decisão em qualquer tempo ou grua de jurisdição, e mesmo de ofício (CPC, art. 267, §3º).Permitir uma solução diversa do que essa implicaria verdadeira inversão ou quebra da ordem hierárquica, com o juiz desconsiderando o que acima dele fora decidido. Isso seria extremamente prejudicial não apenas à marcha regular do processo – já que acabaria de vez com o valor segurança jurídica (e, em última instância, com a própria eficiência da preclusão enquanto mecanismo de impulsionamento de do procedimento)-, como ainda desmantelaria a própria estrutura hierárquica de nosso Poder Judiciário. "

Diante de tal posicionamento, cabe levantar uma importante questão, por que somente a decisão hierarquicamente superior que verse sobre a matéria do art. 267, §3º, do CPC teria eficácia preclusiva? Se a decisão do primeiro grau expressamente analisou e declarou a existência dos pressupostos processuais e condições da ação e a parte não recorreu, tendo a oportunidade não o fez, por que não teria eficácia preclusiva? Aqui parece que a desconfiança na certeza e correção da decisão do primeiro grau – a mesma motivação que sustenta o número abusivo de recursos até a instância máxima, uma das causas da morosidade na solução dos feitos – é o fundamento para a diversidade de tratamento. Com efeito, se a Constituição Federal traz a exigência de um processo seletivo rigoroso para a seleção de magistrados e ainda prevê qualificação permanente, qual a razão de somente se ver segurança jurídica na decisão do segundo grau? Efetivamente, não há fundamentação lógica que sustente a diversidade de tratamento.

Salienta-se que há Súmula do Supremo Tribunal Federal, ainda não revogada, que reconhece a eficácia preclusiva da decisão que saneia o processo. Com efeito o verbete de Súmula nº 424, refere:"Transita em julgado o despacho saneador de que não houve recurso, excluindo as questões deixadas, explícita ou implicitamente para a sentença."

De outra banda, também não convence que o art. 267, §3º, do CPC permita reexame da matéria tão-só por se tratar de matéria de ordem pública. De fato, bem analisando o enunciado do dispositivo legal verifica-se que há possibilidade de conhecimento das matérias a qualquer tempo e grau, não se falando em possibilidade de reexame e rediscussão da matéria. Nesse sentido, precisa é a observação de DIDIER (Ob. cit., p. 485):

"Em primeiro lugar, convém precisar a correta interpretação que se deve dar ao enunciado do §3º do art. 267 do CPC. O que ali se permite é o conhecimento, a qualquer tempo, das questões relacionadas à admissibilidade do processo – não há preclusão para a verificação de tais questões, que podem ser conhecidas ex officio, até o trânsito em julgado da decisão final, mesmo pelos Tribunais. Não há qualquer referência no texto legal, porém, à inexistência de preclusão em torno das questões já decididas. A qualquer tempo é possível conhecer tais questões, controlar a regularidade do processo, desde que o processo ainda esteja pendente e que não tenha havido preclusão a respeito."

E mais, prossegue o doutrinador, referindo a confusão feita entre a possibilidade de conhecimento de ofício das questões e a viabilidade de examinar novamente as questões já decididas, concluindo: ‘’Não há preclusão para o exame das questões, enquanto pendente o processo, mas há preclusão para o reexame.". Para corroborar sua tese, que o art. 267, §3º do CPC, não permite o reexame da matéria, o doutrinador ainda cita que os arts. 471 e 473 do Diploma Processual Civil, que tratam de preclusão de questões e nenhuma exceção trazem em relação aos pressupostos processuais e às condições da ação.

No mesmo sentido, acerca dos efeitos preclusivos da decisão saneadora, é a lição de Calmon de Passos (1998, p. 460):

"Há, contudo, outro aspecto a considerar. O Código previu, no procedimento ordinário, o despacho saneador. Deu a esse despacho o alcance de declarar saneado o processo, vale dizer, afirma-lo expungido de vícios quanto à relação processual, condições da ação e validade dos atos na fase postulatória. Admitir-se que de sua prolação não decorram conseqüências de qualquer espécie importa afirmar-se um absurdo. Atribuir-lhe, por conseguinte, efeito preclusivo é, parece-nos, um imperativo de ordem técnica e de ordem lógica, inclusive por força do que dispõe o art. 473."

O referido processualista admite, pois, eficácia preclusiva ao saneador, trazendo contudo, no decorrer de sua obra (Ob. cit., p 461-470), exceções à ocorrência de preclusão, tais como os pressupostos de existência do processo, os pressupostos processuais negativos, incompetência absoluta, falta de pedido e falta de legitimidade processual.

Seguindo o entendimento de que se o juízo expressamente manifestar-se acerca da presença das condições da ação e pressupostos processuais haverá preclusão da matéria, posiciona-se SICA (Ob. cit., p. 230), aduzindo "Assim, aqui estamos cogitando da preclusão quando houver decisão explícita sobre a regularidade das condições da ação e dos pressupostos processuais.". Assim, para o doutrinador, somente quando houver manifestação expressa do juízo a respeito dos requisitos de admissibilidade do processo terá a decisão efeitos preclusivos. Essa parece ser a melhor solução a ser adotada, uma vez que somente a decisão motivada e explícita atende às garantias constitucionais de acesso à justiça, devido processo legal e motivação das decisões judiciais.

Nesse ponto, no presente trabalho, defende-se que se as questões referentes aos pressupostos processuais e às condições da ação foram objeto de efetivo exame e decisão pelo Juízo, não tendo a parte recorrido, ou se recorrida mantida a decisão, de tal decisão decorrem efeitos preclusivos, tantos às partes, quanto ao juiz. Deveras, como bem salientado por DIDIER não há autorização para reexame de matérias no art. 267, §3º, do CPC, sendo o efeito preclusivo da decisão fundado nos arts. 471 e 473 do CPC que não referem exceção em relação ao juízo de admissibilidade positivo do processo.

3.2. ENTENDIMENTO DA DOUTRINA E DA JURISPRUDÊNCIA ACERCA DO TEMA

Como antes já referido, a maioria da jurisprudência e da doutrina processual, entendem carecer a decisão que exare juízo de admissibilidade positivo do processo de efeitos preclusivos. De fato, entende a doutrina e os Tribunais que o teor do art. 267, §3º, do CPC excepciona da preclusão o exame dos pressupostos processuais e das condições da ação, possibilitando que sejam examinados e reexaminados a qualquer tempo e grau de jurisdição.

Nesse sentido ARENHART e MARINONI (Ob. cit., p. 629) referem que "O exame de matéria de ordem pública, como as condições da ação ou os pressupostos processuais, não preclui jamais.". Ainda, posicionando-se pela inocorrência de preclusão em relação à matéria versada no art. 267, estão GIANNICO (Ob. cit., p. 166), CINTRA, DINAMARCO E GRINOVER (2000, p. 259), SILVA (2000, p. 211), ALMEIDA, WAMBIER E TALAMINI (Ob. cit. 195), CÂMARA (Ob. cit., p. 379), THEODORO JÚNIOR (2003, p. 372), ARAGÃO (2000, p. 416) e NERY JÚNIOR (2003, p. 630).

Já BARBOSA MOREIRA (Ob. cit., p. 53) refere que a decisão de saneamento produz preclusão não só em relação às questões decididas explicitamente mas também em relação às implicitamente decididas "excetuadas apenas aquelas que, à luz de regra legal específica ou do sistema do Código, possam ser resolvidas posteriormente...". Assim, o doutrinador não refere expressamente se entende que o art. 267, §3º, do CPC permita o reexame da matéria ou não.

Favoráveis à tese da preclusão da decisão que emite juízo positivo de admissibilidade do processo estão, consoante acima citado, DIDIER, SICA (somente para as questões explicitamente decididas) e CALMON DE PASSOS, que refere algumas exceções, como antes referido.

A jurisprudência majoritária, contudo, concorda com a maioria da doutrina processual civil pátria, negando eficácia preclusiva à decisão de saneamento. Nesse sentido são os julgados do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ART. 535 DO CPC. OMISSÕES. ISS. EXECUÇÃO FISCAL. CDA. NULIDADE. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. MATÉRIA APRECIÁVEL DE OFÍCIO EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. REQUISITOS DA CDA. DEFESA DO EXECUTADO.

1. O aresto recorrido não está eivado de omissão, pois resolveu a matéria de direito valendo-se dos elementos que julgou aplicáveis e suficientes para a solução da lide.

2. Nulidade da inscrição em dívida ativa é matéria de ordem pública insuscetível de preclusão nas instâncias ordinárias, pois se consubstancia em condição da ação executiva fiscal. Precedentes.

3. As questões de ordem pública referentes às condições da ação e aos pressupostos processuais da execução podem e devem ser conhecidas de ofício pelos tribunais de segundo grau. Precedentes.

4. A Certidão de Dívida Ativa deve preencher todos os requisitos constantes do art. 202 do Código Tributário Nacional – CTN de modo a permitir ao executado a ampla defesa. Ao agregar em um único valor os vários exercícios do tributo em execução, o exeqüente impossibilita a exata compreensão do quantum objeto de cobrança e causa prejuízo à defesa do executado.

5. Extinta a execução em face da nulidade da CDA, perdem o objeto as discussões referentes à prescrição e às matérias processuais correlatas.

6. Agravo regimental não provido. (grifo nosso)

(AgRg no REsp 968.707/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/08/2008, DJe 23/09/2008)

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL.MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRECLUSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PUBLICAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO EM JORNAIS LOCAIS. APLICAÇÃO DO ARTIGO 605 DA CLT. NECESSIDADE. CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE E EXIGIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PUBLICIDADE E DA NÃO-SURPRESA FISCAL. ACÓRDÃO RECORRIDO NO MESMO SENTIDO DO ENTENDIMENTO PACIFICADO NO STJ. APLICAÇÃO DA SÚMULA 83/STJ.

1. A apelação é o recurso por excelência, consagrado por todos os nossos matizes europeus e pelos sistemas latino-americanos do mesmo tronco científico do que o nosso, singularizando-se pelo fato de dirigir-se ao pronunciamento último do juízo e pela sua ampla devolutividade, que investe o tribunal no conhecimento irrestrito da causa, concretizando o dogma do duplo grau de jurisdição.

2. O Código de Processo Civil adstringe a atuação do tribunal aos limites da impugnação (art. 515, caput), vigorando a máxima tantum devoluttum quantum appellatum. Todavia, o tribunal exerce cognição mais vertical do que o juiz a quo, porquanto lhe é lícito conhecer de questões que sequer foram apreciadas em primeiro grau, muito embora cognoscíveis ex officio, haja vista a ampla devolutividade da irresignação, na medida em que a apelação é recurso servil ao afastamento dos "vícios da ilegalidade" e da "injustiça", encartados em sentenças definitivas ou terminativas.

3. Conseqüentemente, as fronteiras da instância ad quem são delimitadas apenas em extensão pela impugnação, não se admitindo, em nome da ampla devolutividade, o conhecimento de pedidos novos ou de exceções materiais não aduzidas pelo demandado, salvo as objeções que, tal como poderiam ter sido conhecidas de ofício em primeiro grau, pelo princípio da identidade, também autorizam o tribunal a conhecê-las. (Precedentes: REsp 847390 / SP , 1ª Turma, DJ de 22/03/2007; REsp 872427 / SP, 4ª Turma, DJ de 05/02/2007; REsp 781050 / MG, 4ª Turma, DJ de 26/06/2006; REsp 426030 / SP , 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 05/12/2005).

4. In casu, a necessidade de publicação dos editais na forma do art.605, da CLT, infirma pressuposto válido e regular para o desenvolvimento do processo, autorizando-se que a referida matéria seja apreciada pelo Tribunal a quo, não obstante não tivesse sido articulada pela parte. Isto porque ao juiz é dado acatar o pedido do autor com base em fundamentos diversos dos veiculados pela parte, mas cognoscíveis de ofício consoante o brocardo latino iura novit curia.

5. Nesse segmento, é cediço que as matérias de ordem pública, cognoscíveis de ofício pelo juiz, que versem sobre condições da ação e pressupostos processuais, não são suscetíveis à ocorrência da preclusão.

6. A notificação do lançamento do crédito tributário constitui condição de eficácia do ato administrativo tributário, mercê de figurar como pressuposto de procedibilidade de sua exigibilidade.

7. Hipótese em que a controvérsia a ser dirimida nos presentes autos cinge-se aos seguintes tópicos: (a) se há a necessidade de publicação de editais em jornais de circulação local; e (b) sendo publicado o edital no Diário Oficial torna-se desnecessária sua publicação em jornal local de maior circulação.

8. A notificação constitui-se ato administrativo de intercâmbio procedimental que imprime eficácia a outro ato administrativo - o lançamento - no sentido de dar ciência ao sujeito passivo da formalização do crédito tributário e dos termos de sua exigibilidade, consoante a lição de Paulo de Barros Carvalho, in "Curso de Direito Tributário", Saraiva , 1998, p. 274.

9. Consectariamente, a sua falta implica em ausência de pressuposto válido e regular de constituição e desenvolvimento do processo.

10. " As entidades sindicais são obrigadas a promover a publicação de editais concernentes ao recolhimento do imposto sindical, durante 3 (três) dias, nos jornais de maior circulação local e até 10 (dez) dias da data fixada para depósito bancário" (art. 605, da CLT) 11. Deveras, a publicação de editais, em consonância com o art. 605, do CLT, deve preceder ao recolhimento da contribuição sindical, porquanto além de constituir forma de notificação do lançamento do crédito tributário, deve atender ao princípio da publicidade dos atos administrativos e o que veda a surpresa fiscal.

12. Precedentes das Primeira e Segunda Turmas desta Corte Superior: RESP n.º 722.962/PR, Rel. Castro Meira, DJ de 23.05.2005; RESP n.º 631.226/PR, Rel. ª Min.ª Eliana Calmon, DJ de 26.09.2005; AgRg no AG n.º 640.347/PR, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 30.05.2005;

RESP n.º 332.885/ES, Rel. Min. José Delgado, DJ de 27.09.2004; RESP n.º 330.955/ES, Rel. Min. José Delgado, DJ de 11.03.2002.

13. É cediço nesta Corte que a publicação do edital no Diário Oficial não supre a exigência legal de se publicar no jornal de maior circulação local. Precedente: REsp 864965 / PR, Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 09.11.2006.

14. "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida." (Súmula 83/STJ).

15. Agravo Regimental desprovido. (grifo nosso)

(AgRg no Ag 922.099/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/06/2008, DJe 19/06/2008)

PROCESSO CIVIL. QUESTÕES PRELIMINARES APRESENTADAS NA CONTESTAÇÃO E AFASTADAS PELA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. APRECIAÇÃO NO SEGUNDO GRAU. APELAÇÃO. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE INTERESSE.

POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. ANULAÇÃO DE ACÓRDÃO PROFERIDO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. FUNDAMENTO. ART. 535. NÃO OBRIGATORIEDADE. IRREGULARIDADE NEM SEMPRE DECORRE DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. EMBARGOS INFRINGENTES E RECURSO EXTRAORDINÁRIO OU ESPECIAL. REGRA VIGENTE ANTES DA LEI 10.352/01. PRAZOS. FLUÊNCIA SIMULTÂNEA, QUANDO PARTE DA DECISÃO ESTIVESSE SUJEITA AOS INFRINGENTES.

- As questões preliminares veiculadas na contestação e afastadas pela sentença de improcedência da ação devem ser enfrentadas no segundo grau, independentemente da interposição de apelação pelo réu, até porque este careceria de interesse para tanto. Precedentes.

- Sendo a possibilidade jurídica do pedido uma das condições da ação, matéria de ordem pública, portanto indisponível, ela não se encontra sujeita à preclusão nas instâncias ordinárias. Precedentes.

- O pedido de anulação de acórdão proferido em sede de embargos de declaração não precisa, forçosamente, amparar-se na violação do art.

535 do CPC. Isso porque, nem sempre a irregularidade do julgado decorre de omissão, contradição ou obscuridade, podendo haver ofensa a outros dispositivos legais.

- Antes das alterações impostas ao art. 498 do CPC pela Lei nº 10.352/01, o sistema então vigente fazia fluir simultaneamente os prazos para os embargos infringentes e o recurso especial ou extraordinário, nas hipóteses em que apenas parte da decisão fosse suscetível daqueles embargos.

Recurso especial do primeiro recorrente (BNDES) conhecido e provido, ficando prejudicado o exame do recurso especial do segundo recorrente (DI GREGÓRIO NAVEGAÇÃO LTDA.) ficando prejudicado o exame do recurso especial do segundo recorrente (DI GREGÓRIO NAVEGAÇÃO LTDA.) (grifo nosso)

(REsp 641.257/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/05/2008, DJe 23/06/2008)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA INSTITUIDORA DO TRIBUTO APÓS O JULGAMENTO DOS EMBARGOS. INOVAÇÃO DO PEDIDO. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC.

1. Cuida-se de recurso especial interposto por Kisolda Oxigênio Indústria e Comércio Ltda. contra acórdão do TRF da 4ª Região que, por unanimidade, reformou a decisão de primeiro grau, por entender: a) a alegação de que a contribuição exigida é inconstitucional não foi objeto de formulação no âmbito da inicial, constituindo inovação à lide; b) em face do que dispõe o art. 41, "caput", da Lei n. 6.830/80 a embargante tinha plenas condições de conhecer do conteúdo do processo administrativo referente à dívida executada; c) a CDA goza dos requisitos legais; d) a multa prevista no art. 35, III, "c", da Lei n. 9.528/97 deve ser reduzida para o patamar de 40% (quarenta por cento). Alega-se negativa de vigência dos artigos 16 da Lei n. 6.830/80, 126, 128, 245, 267, § 3º, 301, III, § 4º, 295, parágrafo único, 300, II, 535, II, do CPC e divergência jurisprudencial. Defende, em síntese, que: a) seja o acórdão atacado anulado por não haver sido suprido o vício da omissão; b) cabe ao juízo pronunciar-se de ofício acerca da inconstitucionalidade da exação cobrada; c) o tema pode ser ventilado em réplica ou mesmo em apelação, como no caso; d) este Tribunal já decidiu questão similar no julgamento do REsp 924.946/RR.

2. Se não houve omissão no acórdão a ser suprida pelo recurso integrativo, é inoportuna a alegação de ofensa do art. 535, II, do CPC.

3. A questão vertente à inconstitucionalidade do art. 3º, I, da Lei n. 7.787/89, suscitada em réplica e na apelação interposta pela recorrente, deve ser enfrentada pelo TRF da 4ª Região, porquanto tal argumento não se trata de inovação do pedido e, se confirmado, fulmina a exigibilidade do crédito vindicado pela Autarquia Previdenciária

4. Nesse sentido, o entendimento da Primeira Turma deste Tribunal: - In casu, a inconstitucionalidade das exações argüidas na presente demanda infirma a exigibilidade do próprio título em que aquela se funda, autorizando-se que a referida matéria seja apreciada pelo Tribunal a quo, não obstante não tivesse sido articulada na exordial dos embargos à execução. Isto porque ao juiz é dado acatar o pedido do autor com base em fundamentos diversos dos veiculados pela parte, mas cognoscíveis de ofício consoante o brocardo latino iura novit curia.

- Nesse segmento, é cediço que as matérias de ordem pública, cognoscíveis de ofício pelo juiz, que versem sobre questão de viabilidade da execução - liquidez e exigibilidade do título, condições da ação e pressupostos processuais -, não são suscetíveis à ocorrência da preclusão. (REsp 868.819/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 20/09/2007).

- De acordo com a jurisprudência pacificada nesta Corte, a inconstitucionalidade da norma instituidora do tributo pode ser argüida em qualquer momento ou grau de jurisdição, inclusive por meio de exceção de pré-executividade, razão pela qual nada obsta que seja feita em sede de apelação. (AgRg no Ag. 841.774/RJ, Rel. Min.Denise Arruda, DJ de 07/05/2007).

4. Recurso especial parcialmente provido. Ausência de violação do art. 535, II, do CPC. (grifo nosso)

(REsp 1016802/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/04/2008, DJe 21/05/2008)

PROCESSUAL CIVIL – COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS – COISA JULGADA – CONTRADIÇÃO: INEXISTÊNCIA – OMISSÃO: OFENSA AO ART. 535 DO CPC.

1. Hipótese em que o Tribunal de origem deixou de analisar alegação de ofensa à coisa julgada por entender que a questão estava preclusa, uma vez que decidida pelo juízo de 1º grau.

2. Inexistência de contradição, mas omissão quanto à tese de que as questões de ordem pública, dentre as quais se inclui a coisa julgada, não estão sujeitas à preclusão.

3. Viola o art. 535 do CPC acórdão que deixa de se pronunciar sobre questão oportunamente suscitada e que, se examinada, poderia, em tese, levar o julgamento a um resultado diverso do ocorrido.

4. Recurso especial provido em parte. (grifo nosso)

(REsp 853.316/CE, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/04/2008, DJe 15/04/2008)

ADMINISTRATIVO - AÇÃO POPULAR - LICITAÇÃO - CONTRATAÇÃO IRREGULAR - PREÇOS EXORBITANTES - SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA - PARTICIPAÇÃO EFICIENTE DO PREFEITO NA ILEGALIDADE AFIRMADA NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA - IMPOSSIBILIDADE DE REVOLVIMENTO DA MATÉRIA FÁTICA - PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVAS PARA SE AFIRMAR A AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PREFEITO - SÚMULA 07/STJ - ART. 267, § 3º, DO CPC - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM - QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA QUE NÃO ESTÁ ABARCADA NA PRECLUSÃO - PRECEDENTES - VIOLAÇÃO NÃO CONSTATADA.

1. Averiguar qualquer violação dos arts. 1º e 2º da Lei n. 4.717/65, bem como 6º do CPC, para analisar a tese recursal de que não teria existido ilegalidade na celebração do indigitado contrato e a lesividade ao erário, ou mesmo a falta de nexo causal entre qualquer omissão do ex-prefeito e o alegado dano, implica necessariamente em revolvimento da matéria probatória acostada aos autos, o que, de fato, é inviável em sede de recurso especial, por aplicação do enunciado 07 da Súmula do STJ.

2. Muito embora o acórdão recorrido, do Tribunal local, e a decisão agravada tenham entendido estar preclusa a questão da legitimidade passiva, por ter sido decidida em agravo de instrumento, tal posição não prospera, nos termos do artigo 267, § 3º, do CPC, e da pacificada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, devendo ser reformada a decisão monocrática neste particular.

3. De todo modo, não se há de ter o referido dispositivo processual por violado se o Tribunal a quo acabou por reanalisar o tema no julgamento da apelação e embargos de declaração quando, de modo fundamentado, considerou o recorrente parte legítima, uma vez que beneficiou-se ele do ato acoimado de nulo e lesivo ao erário. Ir além disso, para averiguar se não estariam preenchidos os requisitos do art. 6º da Lei n. 4.717/65, quando o acórdão recorrido afirma justamente o contrário, é impossível em sede de recurso especial (Súmula 07/STJ).

4. Assim, deve-se dar parcial provimento ao regimental, apenas para reformar a decisão agravada no sentido de conhecer em parte do recurso especial (art. 267, § 3º, do CPC), e negar-lhe provimento. Agravo regimental provido em parte, para conhecer em parte do recurso especial e negar-lhe provimento.

(AgRg no REsp 916.010/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/02/2008, DJe 02/04/2008)

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – REMESSA NECESSÁRIA – EFEITO DEVOLUTIVO – CONDIÇÃO DA AÇÃO – LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM – INSTÂNCIA ORDINÁRIA – PRECLUSÃO – NÃO-OCORRÊNCIA.

1. A remessa necessária devolve ao Tribunal de Apelação o exame de toda a matéria discutida nos autos.

2. Conforme orientação jurisprudencial desta Corte, o órgão judicial pode e deve conhecer de ofício das questões relacionadas às condições da ação, dentre as quais se insere a legitimidade passiva ad causam, nos termos do art. 267, §3°, do CPC. Não ocorrência de preclusão.

3. Embargos de divergência conhecidos e providos, determinando o retorno do autos à Primeira Turma para exame do especial por inteiro. (grifo nosso)

(EREsp 295.604/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/09/2007, DJ 01/10/2007 p. 203)

Assim, a posição consolidada do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de inexistência de preclusão acerca das matérias que trata o art. 267, §3º, do CPC, tese a que se filia o Tribunal Regional Federal da 4ª Região e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, senão:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PRECLUSÃO PRO IUDICATO. NÃO OCORRÊNCIA. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. LEGITIMIDADE DAS PARTES. AGRAVO IMPROVIDO. 1. O juiz pode indeferir o pedido de que o sócio-gerente venha a integrar o pólo passivo da execução, ainda que, em um momento anterior, tenha decido o contrário, uma vez que as questões de ordem pública, como a legitimidade das partes, não são atingidas pela preclusão. 2. Agravo de instrumento improvido. (grifo nosso)

(TRF4, AG 2007.04.00.037363-7, Segunda Turma, Relator Otávio Roberto Pamplona, D.E. 05/12/2007)

TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. EXECUÇÃO FISCAL. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS. REDIRECIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. As questões de ordem pública, como a legitimidade da parte, não são atingidas pela preclusão "pro judicato". 2. A interpretação sistemática das regras contidas na Lei 6.830/80 - LEF indica que, independentemente da natureza jurídica que se atribua às contribuições sociais, relativamente à responsabilidade pela dívida ativa, prevalecerá a aplicação do disposto no CTN. 3. Não é possível o redirecionamento da execução, na pessoa dos sócios-gerentes da empresa, em decorrência do mero inadimplemento da obrigação. Precedentes do TRF da 4ª Região e do STJ. (grifo nosso)

(TRF4, AG 2003.04.01.025105-5, Primeira Turma, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, DJ 15/10/2003)

TRIBUTÁRIO. CAUTELAR DE CAUÇÃO. PRECLUSÃO. PRESSUPOSTO PROCESSUAL. AJUIZAMENTO DA AÇÃO PRINCIPAL. ARTS. 471 E 267, § 3º, DO CPC. 1. A preclusão pro judicato não alcança as questões de ordem pública, que a qualquer tempo e grau de jurisdição podem ser conhecidas por constituírem, nos termos do artigo 471, II, hipótese excetuada prevista em lei. 2. Tratando-se de ação cautelar, o ajuizamento da ação principal (art. 806 do CPC) é tido como pressuposto processual específico desta espécie de ações. 3. A jurisprudência mais atual desta Corte e do STJ aceita o oferecimento de caução real por meio de ação cautelar para fins de expedição de certidão positiva com efeitos de negativa de débitos, ao fundamento de que o contribuinte não pode sofrer prejuízo com a demora da Fazenda Pública em ajuizar executivo fiscal. 4. A fixação da verba honorária, quando calculada com base no § 4º do art. 20 do CPC, não necessita enquadrar-se nos limites percentuais do § 3º do referido artigo, mas atende os mesmos critérios para apreciação, enumerados nas alíneas do § 3º. (grifo nosso)

(TRF4, AC 2001.71.00.009461-1, Segunda Turma, Relator Dirceu de Almeida Soares, DJ 16/07/2003)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. DÉBITOS DO FGTS. APLICAÇÃO DO CTN. RESPONSÁVEL TRIBUTÁRIO. SÓCIO-GERENTE. POSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. 1. As questões de ordem pública não são atingidas pela preclusão pro judicato. 2. Independentemente da natureza de que se reveste a contribuição para o FGTS, são aplicáveis as normas do CTN relativas à responsabilidade. 3. Descabida a inclusão de herdeira de um dos sócios-gerentes da empresa executada no pólo passivo da execução fiscal, na qualidade de responsável tributária, tendo em vista inexistência de prova de que os administradores tenham agido com excesso de mandato, infringência à lei ou ao contrato social. (grifo nosso)

(TRF4, AG 2000.04.01.140278-7, Primeira Turma, Relatora Luciane Amaral Corrêa Münch, DJ 16/01/2002)

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CHEQUE FALSIFICADO. INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DE CONTA-CORRENTE. FALSÁRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CARACTERIZADO. QUANTUM MANTIDO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECONHECIDA. Da ilegitimidade passiva da instituição financeira 1. Preambularmente, oportuno consignar que a legitimidade da parte é matéria de ordem pública e, como tal, pode ser conhecida até mesmo de ofício, não se operando os efeitos da preclusão quanto a esta questão. Inteligência do § 3º do art. 267 do CPC. 2. Inexistência da conta-corrente. Falsificação de talonário da instituição financeira. Ausência de qualquer participação do banco. Atuação exclusiva de terceiros, caso fortuito que afasta o dever de indenizar. 3. No caso em exame, a instituição financeira é parte ilegítima para figurar no pólo passivo da presente relação processual, uma vez que inexistente qualquer vínculo jurídico entre esta e a autora quanto à cártula que ensejou os danos narrados na exordial. Mérito do recurso em exame 4. A autora logrou comprovar os fatos articulados na exordial, no sentido de que foi inscrita indevidamente nos cadastros de proteção ao crédito por contrato que não celebrou. 5. Comprovada a falha na prestação do serviço, deve ser responsabilizada a ré pela indevida inscrição do nome da autora. Conduta abusiva da apelante na qual assumiu o risco de causar lesão à apelada, mesmo os de ordem extrapatrimonial, daí ensejando o dever de indenizar. 6. No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as conseqüências da conduta da ré, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita da demandada que faz presumir os prejuízos alegados pela parte autora, é o denominado dano moral puro. 7. O valor a ser arbitrado a título de indenização por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como as condições da ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, importando em enriquecimento ilícito. Quantum indenizatório mantido. Reconhecida a ilegitimidade passiva da instituição financeira demandada, julgado extinto o feito quanto a esta; e, no mérito, negado provimento ao apelo da empresa demandada. (grifo nosso)

(Apelação Cível Nº 70027026871, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 21/01/2009)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. AQUISIÇÃO DE QUOTAS DE EMPRESA. ILEGITIMIDADE ATIVA RECONHECIDA EM PRIMEIRO GRAU. PRELIMINARES AFASTADAS. SENTENÇA PARCIALMENTE DESCONSTITUÍDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE, NOS TERMOS DO ART. 515, § 4º, DO CPC. INEXISTÊNCIA DE PROVA ACERCA DO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. ART. 333, I, DO CPC. Cerceamento de defesa não evidenciado. Juntada a destempo de documentos que, em nada, contribuíram para a conclusão da sentença. Inexistência de prejuízo à parte. Inocorrência de preclusão pro judicato no que se refere às condições da ação. Não há eficácia preclusiva da decisão de saneamento quanto às questões de ordem pública. Pluralidade de autores e réus. Análise da legitimidade ativa em três perspectivas. Ilegitimidade reconhecida de autor que não figura nos mais relevantes instrumentos que embasam a ação (Contrato de Compra e Venda de Empresa Comercial, Instrumento Particular de Alteração Contratual e Procuração). Ilegitimidade ativa das pessoas físicas para litigar contra a empresa Ipiranga S/A. Contrato de Locação de Posto de Serviço Ipiranga firmado por pessoas jurídicas. Legitimidade reconhecida dos adquirentes das quotas de empresa para litigar contra os respectivos vendedores. Sentença desconstituída nesta parte. Mérito da causa analisado, conforme permissão do art. 515, § 3º, do CPC. Ação julgada improcedente. Inexistência de prova acerca da má-fé, dolo e intenção de locupletamento pelos réus. Fato constitutivo do direito da parte autora não demonstrado. Verba honorária mantida. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE DESCONSTITUÍDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE, NOS TERMOS DO ART. 515, § 3º, DO CPC. (grifo nosso)

(Apelação Cível Nº 70015697733, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudio Augusto Rosa Lopes Nunes, Julgado em 20/11/2008)

Dessa forma, a corrente majoritária da doutrina e da jurisprudência pátrias entendem que carece a decisão que emite juízo positivo de admissibilidade do processo de eficácia preclusiva. Em que pese tal posicionamento, considerando que o art. 267, §3º, do CPC, não refere expressamente a possibilidade de reexame da matéria, bem como art. 471 do CPC impõe a preclusão como regra geral, bem como a necessidade de segurança jurídica, a melhor solução a ser adotada para a resolução da questão é o reconhecimento de eficácia preclusiva da decisão que reconhece explicitamente a presença de pressupostos processuais e condições da ação, somente se permitindo o conhecimento da matéria em tempo ou grau diverso quando não houver decisão anterior ou ocorrer alteração superveniente que fundamente o reexame e a modificação da decisão.


CONCLUSÃO

Do estudo até aqui realizado pode-se verificar que tem a preclusão importância fundamental no andamento da relação processual, desempenha a verdadeira função de impulsiomento do processo. Deveras, a preclusão fortalece o andamento lógico do feito e impõe obediência às fases processuais, principalmente em um sistema processual rígido como o brasileiro, impedindo a prática extemporânea ou ilógica de atos ou ainda a repetição de atos ou o reexame de matérias já decididas.

Nesse sentido, verifica-se ser o instituto da preclusão um instrumento de efetividade processual, posto que impõe economia e celeridade ao processo, sendo forma de consecução da garantia constitucional da razoável duração do processo. Ademais, é a preclusão estreita correlação com o princípio da boa-fé processual, impedindo que as partes e até mesmo o magistrado adotem condutas incompatíveis com as anteriormente manifestadas, ou que haja protelação indevida do feito, ou omissão de argüição de questões.

Também são os requisitos de admissibilidade do processo – pressupostos processuais e condições da ação – instrumentos de efetividade processual, uma vez que, como condições para que se chegue à resolução do mérito, impedem o andamento indevido de feitos, devendo ser objeto de exame pelo juízo tão-logo seja proposta a ação, bem como na fase saneadora, após a apresentação de defesa. Para tal exame não fica o juízo dependente da provocação das partes, devendo examinar as matérias de ofício, nos termos do art. 267, §3º, do CPC, bem como fundamentar a decisão saneadora, obedecendo ao dever/garantia constitucional de motivação das decisões judiciais, consoante o disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal.

Fundamental é a discussão acerca da eficácia da decisão que exara juízo positivo de admissibilidade do processo, reconhecendo a viabilidade do processo para exame do mérito da ação, com a presença dos pressupostos processuais e condições da ação. Tal matéria é objeto de divergência doutrinária, devendo ser analisado com uma visão sistêmica e principiológica do sistema processual civil consoante o ordenamento jurídico vigente.

De fato, para bem resolver a questão, deve-se considerar a importância do instituto da preclusão, bem como dos requisitos de admissibilidade do processo, com uma interpretação sistêmica e teleológica das disposições dos arts. 267, §3º e 471 do CPC, bem como devem ser considerados o valor segurança jurídica, o princípio da boa-fé e as garantias constitucionais do devido processo legal, da razoável duração do processo e da motivação das decisões judiciais.

Assim, em que pese a doutrina e a jurisprudência majoritárias expressarem o entendimento de que o art. 267, §3º do CPC impede a ocorrência de preclusão da decisão de saneia o feito. O entendimento mais adequado na visão sistêmica proposta é aquele que concilia as disposições do dispositivo legal referido com o disposto no art. 471 do CPC, entendo-se que a preclusão é a regra e que a norma do art. 267, §3º do CPC não possibilita de forma expressa o reexame das questões.

Diante disso, uma vez que a decisão que emita juízo positivo de admissibilidade do processo expressamente analise, seja por provocação das partes ou de ofício, a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, de forma fundamentada, garantindo às partes não só o conhecimento da decisão mas também o exercício pleno da ampla defesa, deve ter eficácia preclusiva não só para as partes, mas também para o Juízo, inclusive para as instâncias hierarquicamente superiores. Dessa forma, somente seria possível o conhecimento da matéria que não fora explicitamente decidida ou acaso houvesse modificação superveniente que demandasse reexame da matéria, sendo essa a solução que melhor se amolda à sistemática processual vigente.


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Notas

  1. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2ªed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2007. p. 155.
  2. Nesse sentido, interessante é o enfrentamento da questão realizado por BEDAQUE (Ob. cit., p. 343-355) que aduz que nas hipóteses de falta de interesse e legitimidade seria possível a repropositura da ação desde que alterada a situação fática, já no caso de impossibilidade jurídica do pedido há decisão da lide, pelo que a decisão estaria apta ao trânsito em julgado.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Marcela de Jesus Boldori. A eficácia preclusiva da decisão que emite juízo positivo de admissibilidade do processo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2797, 27 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18583. Acesso em: 25 abr. 2024.