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Contraditório e coisa julgada em sede de tutela de interesses metaindividuais.

Uma leitura sobre o prisma das curvaturas

Contraditório e coisa julgada em sede de tutela de interesses metaindividuais. Uma leitura sobre o prisma das curvaturas

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1. Introdução

Muito se discute em sede de tutela de interesses metaindividuais sob a possível violação do direito ao contraditório e da ampla defesa, seja por meio dos expedientes da coisa julgada ou mesmo pelo fato de a legitimação ser definida pela lei como extraordinária.

Destarte, em nossa visão o que ocorre na realidade é que dada uma tradição individualista do nosso direito positivo, todas as garantias processuais e constitucionais são interpretadas como garantias individuais, no sentido de que seriam respeitadas e garantidas a partir e sempre que esta possibilidade de exercício individualizado da garantia fosse tutelado e observado.

Evidente, que a garantia processual-constitucional do contraditório e da ampla defesa estão firmados em nosso ordenamento como cláusula pétrea, mas tal garantia não deve e não pode ser necessariamente compreendida como garantida e respeitada tão somente a partir de uma garantia do exercício incondicional das razões de forma individualizada pelo sujeito titular do interesse dentro do processo.

Compreendemos como falsa a noção do contraditório e da ampla defesa apenas como um direito e garantia individual. Na realidade se trata sobretudo de um direito e garantia fundamental, como inserido no Título II da CF/88, não podendo ser compreendido apenas e tão somente como um direito individual, mas como uma garantia importante e necessária ao tecido social e que, portanto, pode e deve ser exercido sob parâmetros sociais mais elásticos, desde que atinja o seu escopo de garantir o adequado contraditório e a ampla defesa dos interesses dos membros sociais de forma adequada.

Tanto é assim, que o preceito constitucional em nenhum momento se refere a ser garantido "o direito do individuo e aos acusados em geral ao contraditório e a ampla defesa", como, por exemplo, fez o inciso XI do art. 5o que declina que "a casa é asilo inviolável do indivíduo", mas preceitua:

"Art. 5o. ---omissis --------

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, como os meios e recursos a ela inerentes."

Podemos observar que a lei assegura o contraditório e a ampla defesa aos litigantes e aos acusados em geral. Ora, como sabemos, a noção de litigante está ligada ao conceito de partes adversas no processo, ou seja, daqueles sujeitos legitimados na forma da lei atuar como partes num processo no objetivo e de ver tutelado um interesse.

Perfeitamente possível e compreensível que os meios e recursos inerentes à garantia ao exercício do contraditório e da ampla defesa previstos pelo constituinte sejam garantidos por meio dos métodos e recursos da tutela coletiva, que transforma e possibilita de forma efetiva e não apenas formal que determinados interesses sejam objeto de tutela pelo direito, que de outra forma estariam fora do sistema em verdadeiro buraco negro, onde apesar da sua existência estariam fora do alcance dos seus titulares as proteções contra violações de toda ordem.

Portanto, importa mais à garantia do acesso ao contraditório e ampla defesa previstas constitucionalmente que lhes seja interpretado mais em sentido material do que formal, em que o processo coletivo vem justamente fazer esta ponte e elo, facilitando a inclusão destes conflitos no sistema jurídico. Portanto, há fortes motivações extrajurídicas que irritaram o sistema na adoção desta solução, e seria contraditório vir numa falsa e inadequada valoração do ditame constitucional criar óbices à efetiva tutela dos interesses metaindividuais em prol de uma inadequada garantia formal ao contraditório individual, quando estes interesses individuais serão justamente mais bem tutelados a partir das técnicas do processo coletivo.

Dentro deste patamar, fica claro e nenhum óbice teórico haveria para a lei também estender os efeitos da coisa julgada para além das partes, ou seja, para atingir terceiros, que embora não tenham atuado no processo como autores ou réus, não poderiam em outro processo impugnar a decisão firmada no processo originário, embora sem a sua participação em contraditório, e que o sistema toma a decisão política de colocar a salvo de nova discussão e sem nenhuma válvula de escape.

Mesmo se tratando de situações no limite entre o político e o jurídico, como é o caso dos interesses metaindividuais, resulta lógica a resistência na colocação de limites ao exercício do contraditório e da ampla defesa pelo prisma individual, mas estas podem e devem ser afirmadas, ainda que por meios mais sutis de ampliação e novos contornos, pois as garantias ao contraditório e da ampla defesa previstos constitucionalmente vão além de uma garantia individual, configurando-se meio de garantir materialmente o acesso à justiça.

Evitando, entretanto, um conflito desnecessário, ainda que o nosso legislador constitucional tenha compreendido o contraditório para além de garantia do exercício incondicional das razões individualmente pelo sujeito dentro do processo, mas como uma garantia fundamental, o legislador pátrio criou Curvaturas de respeito ao prisma individual da garantia constitucional do acesso ao contraditório e à ampla defesa, criando novos meios e recursos inerentes a possibilitar o respeito a este, sem, no entanto, restringi-lo a este prisma, o que ficará mais claro quando fizermos o estudo da coisa julgada em sede de interesses metaindividuais.

No entanto, qual o significado das Curvaturas aqui proposto? Significa dizer que existindo determinados fenômenos jurídicos cuja visão externa aparenta ser um fenômeno uno, e possível a sua divisão sem maiores problemas, ao realizar-se este corte ou divisão, observa-se que o fenômeno volta a se produzir por motivos vários, ainda que em menor força e escala, por existirem elementos internos e externos que levam a reprodução deste fenômeno em menor graduação(1).

Fenômeno semelhante ocorre na natureza física e de semelhante forma, guardada as devidas proporções de natureza do objeto, com este conceito que pretendemos construir com simplicidade.

Assim, dentro da ciência física do estado sólido ao explicar o magnetismo, Charles August Coulomb (1736-1806), a partir das observações de Petrus Peregrinus, realizadas em 1269, de que os pólos magnéticos de um imã não podem ser isolados, isto é não existem cargas magnéticas isoladas. Realizou, o cientista, uma construção teórica explicando este fato experimental, onde os fluídos magnéticos são permanentemente presos no interior das moléculas dos corpos magnéticos (imãs), e assim, cada molécula do corpo, possui em qualquer circunstância, igual número de fluidos boreais e austrais, daí a magnetização consistia na separação desses fluídos para extremidades opostas de cada molécula, logo decorre a impossibilidade e separação dos pólos magnéticos de um imã, já que o fenômeno da magnetização era microscópico(2).

No caso do imã em linguagem simples, podemos imaginar que determinado imã de 20 cm enquanto unidade possui dois pólos magnéticos em suas extremidades. Ao homem comum seria simples e aparentemente fácil, dividi-lo em duas partes iguais, onde numa parte ficaria o seu pólo positivo e na outra o pólo negativo do imã, mas em seguida veria o nosso autor que isto não ocorreria, pois na realidade passaria a ter dois novos imãs, cada qual com os seus respectivos pólos magnéticos, ainda que com cargas reduzidas.

De fato, o resultado do experimento não foi aquele esperado pelo nosso pesquisador, pois só considerou para o resultado que pretendia obter aquilo que ele podia ver de imediato do objeto de estudo ou fenômeno, não considerava a interferência na sua pesquisa de elementos que ele não podia ver, mas que estavam ali atuando, no interior do imã, e que ele poderia até suspeitar desta forças microscópicas, mas que ignorou e levou a cabo o seu experimento sem o resultado esperado.

Com este corte demonstramos que a garantia do contraditório e da ampla defesa, existente no nosso ordenamento constitucional, deve ser compreendida como integrada pelo seu pólo individual e pólo social, onde a perfeita distinção entre eles deve ser observada a luz de fenômenos sociais muito fortes e ocultos, onde o individualismo-positivista coloca o primeiro pólo supervalorizado sobre o segundo, e qualquer experimento do legislador deve considerar tais fenômenos microscópicos do organismo social, a fim de obter um resultado mais positivo na proposição a ser feita.

Daí, o legislador nacional ao criar o sistema de tutela coletiva, como veremos a melhor vagar quando da discussão da coisa julgada, embora privilegiando aspectos do respeito ao contraditório e a ampla defesa pelo seu pólo social e de garantia material de acesso à justiça, sem esquecer os elementos microscópicos e intrínsecos a este instituto no que concerne ao aspecto individual, criou determinadas válvulas de escape para que o resultado fosse socialmente mais aceitável, provocando menores repulsa e reações de outros atores sociais contra este novo modelo de tutela.

Mesmo com estas válvulas de escape e criando circuitos próprios para o respeito ao contraditório do ponto de vista individual, ainda vemos muitas e graves resistências ao processo de tutela coletiva. Imagine-se se o nosso legislador tivesse ignorado este fenômeno. Teríamos por certo um resultado da legislação de tutela coletiva ainda mais deficitária e fragilizado por diversos atores sociais do que os atuais resultados da sua aplicação em nosso país.

Devemos compreender que a eficácia da tutela coletiva depende sim de se compreender o direito individual ao contraditório como uma garantia que pode e deve sofrer restrições para que os direitos da maioria e os mais importantes interesses sociais, do ponto de vista de maior espectro social, tenham maior e mais eficaz tutela, até mesmo para o efetivo respeito daqueles e não apenas como uma garantia abstrata e formal. Na realidade, erigir como necessários e indispensáveis em todo o caso o contraditório de forma individualizada é um expediente "lícito", mas não constitucional, como visto, para inviabilizar um contraponto de idéias e atendimento de interesses coletivos do ponto de vista material.

No campo das relações de consumo e outros mais em que cresce a necessidade da presença do Estado como mediador do conflito, ante a fragilidade dos sujeitos individuais lesados em seus interesses, forçoso é firmar a premissa de que não é o número de sujeitos interessados atingidos que lhe retira a natureza de interesse metaindividual, pois ainda que sejam apenas alguns consumidores lesados trata-se efetivamente de um direito básico, por isso que a Lei 8.078/90 no seu art. 1° insere a defesa do consumidor como de ordem pública e interesse social,que pode até não ter um efeito patrimonial imediato, mas força-nos a considerar a potencialidade do dano social caso a conduta perdure de forma injustificada, pois mesmo nesta sociedade de exclusão, ainda existirá um senso mínimo de interesses cuja violação diz respeito a um direito social e coletivo da comunidade, onde devemos inserir a defesa dos consumidores.

A menor ou maior definição dos sujeitos ou da indivisibilidade ou divisibilidade do objeto levará ao enquadramento do interesse como difuso, coletivo ou individual homogêneo, de acordo com a lei, que atua como estrutura de acoplamento e serve o manuseio destes conceitos como meio de inclusão(3) destes interesses no sistema jurídico, e por isso estes não devem e não podem substituir à finalidade do permissivo legal de melhor possibilitar a tutela de tais interesses, que é o que vem ocorrendo em muitos processos, por haver distorção de visão causada pelo paradigma normativista(4) que predomina nos tribunais.


2. LIEBMAN E A DISTINÇÃO ENTRE EFICÁCIA DA SENTENÇA E COISA JULGADA

Coube a Enrico Tullio Liebman apontar a insuficiência das construções teóricas que afirmavam a coisa julgada como um efeito próprio e específico da decisão judicial, como a imposição da verdade da declaração do direito contida na sentença(5). Liebman veio realizar a distinção entre os efeitos ou eficácia natural da sentença e a autoridade da coisa julgada ou simplesmente coisa julgada. Neste sentido lecionou o mestre italiano que:

"Uma coisa é distinguir os efeitos da sentença segundo sua natureza declaratória ou constitutiva, outra é verificar se eles produzem de modo mais ou menos perene e imutável. De fato, todos os efeitos possíveis da sentença (declaratório, constitutivo, executório), podem, de igual modo, imaginar-se, pelo menos em sentido puramente hipotético, produzido independentemente da autoridade da coisa julgada, sem que por isso se lhe desnature a essência. A coisa julgada é qualquer coisa mais que se ajunta para aumentar-lhes a estabilidade e isso vale igualmente para todos os efeitos possíveis da sentença"(6).

Para Liebman, o verdadeiro problema da coisa julgada não consiste na possibilidade maior ou menor de reforma da sentença, mas na eventualidade de uma segunda sentença sobre o mesmo objeto. Pois:

"o verdadeiro problema da coisa julgada, característico e único da atividade jurisdicional: o de que se possa um outro ato da mesma autoridade reexaminar o caso já decidido e julgar de modo diferente, sem infirmar assim a validade do ato precedente, mas criando um conflito entre duas decisões, com todos os seus conhecidos inconvenientes que daí promanam"(7).

Desta lição de Liebman se pode tirar a tradicional afirmativa de que pelo menos em tese são possíveis julgamentos contraditórios, pois o juiz ao proferir uma decisão o faz tendo em vista o que foi posto perante o seu conhecimento.Decidindo este conflito, o seu ato produzirá efeitos e uma vez que outro juízo tenha proferido decisão sobre o mesmo objeto, evidentemente que teríamos um embate entre os efeitos das decisões contraditórias, o que é, por evidente, de todo inconveniente à paz social que pretende a jurisdição obter. Por isso leciona Liebman:

"Assim a eficácia de uma sentença não pode por si só impedir o juiz posterior de investido também ele da plenitude dos poderes exercidos pelo juiz que prolatou a sentença, de reexaminar o caso decidido e julga-lo de modo diferente. Somente uma razão de utilidade política e social – intervém para evitar essa possibilidade tornando o comando imutável quando o processo tenha chegado à sua conclusão, com a preclusão dos recursos contra a sentença nela pronunciada"(8)

Logo, se observa que a eficácia da sentença, ou seja, dos efeitos que o ato estatal produz ao decidir determinado conflito é resultado do comando, quer tenha o fim de declarar, quer tenha o de constituir ou modificar ou determinar uma relação jurídica e existe independentemente da autoridade da coisa julgada.

Este raciocínio lógico permite, pelo menos em tese, considerar que a coisa julgada poderia mesmo não existir. Afinal, não seria essencial para que o ato decisório produzisse os seus efeitos, ou seja, tivesse eficácia(9).

Destaca-se, entre nós, com a sua pena civilista, Pontes de Miranda que relaciona a coisa julgada com a eficácia da sentença, estabelecendo, inclusive gradação de intensidade destes efeitos da sentença para a ocorrência da coisa julgada, assim, leciona "para que a sentença tenha eficácia de coisa julgada material é preciso que a carga de declaratividade seja 5, ou 4, ou, pelo menos 3. Se tem carga de declaratividade inferior a isso não faz coisa julgada material"(10).

Fica evidente a noção de Pontes de Miranda da coisa julgada como um efeito da sentença, inclusive estabelecendo uma carga de intensidade destes efeitos para que se tenha caracterizada a coisa julgada material. Logo, mede pelos efeitos do decisum fora do processo a ocorrência da coisa julgada material.

Considerando a existência autônoma da eficácia da sentença e da autoridade da coisa julgada ou simplesmente coisa julgada, fica fácil compreender a lição de Liebman de que "a coisa julgada nada mais é que essa indiscutibilidade ou imutabilidade da sentença e dos seus efeitos, aquele atributo que qualifica e potencializa a eficácia que a sentença naturalmente produz, segundo a sua própria essência de ato estatal".(11)

A coisa julgada define-se como a especial qualidade que se agrega ao ato estatal decisório, impedindo que o que foi decidido seja discutido novamente no mesmo ou outro processo, e a imutabilidade desta e de seus efeitos. Observe-se, no entanto, que esta imutabilidade dos efeitos não quer dizer que estes irão se produzir ad eternum ou sejam imodificáveis pela sua natural exaustão ou cumprimento, decorrência natural mesma do fato que tudo nesta vida é transitório. Significa que o ato decisório não poderá ser infirmado por todos aqueles que a lei define como no alcance dos limites subjetivos da coisa julgada.

Aliás, Liebman é claro em destacar ao se discutir os limites subjetivos que temos duas questões diversas a observar: da eficácia da sentença a terceiros e da coisa julgada em relação a terceiros.A extensão subjetiva da eficácia da sentença pode ou não coincidir com a da autoridade da coisa julgada. Assim, a sentença produz efeitos para os terceiros, evidentemente conforme a sua menor ou maior proximidade com o objeto decidido entre as partes do processo. O normal é que a coisa julgada se limite às partes do processo(12).

Observamos, que a perspectiva de trabalhar com os conceitos do direito material em sede de processo é que leva brilhantes autores a explicar de forma clara, porém equivocada, a natureza jurídica da coisa julgada como uma eficácia ou efeito da sentença, daí em geral as duras críticas à Teoria de Liebman.

O que se pode concluir da análise de teorias, em que a coisa julgada se confunde com a eficácia da sentença, apesar de mesmo nestas se reconhecer que a sentença, como ato jurídico-estatal, há de produzir efeitos para além das partes, é que trabalhando com as noções do direito material do terceiro, supervalorizam os efeitos da sentença sobre outros sujeitos que não as partes.

Entretanto, o que fica evidente é que, na realidade, mesmo nestes casos, e logicamente trabalhando com o processo individual, os autores são uniformes em afirmar que coisa julgada material só atinge as partes do processo, justamente porque raciocinam que estas estão na lide, pois se faltarem estas, sendo caso de litisconsórcio necessário, temos a extinção do processo sem julgamento do mérito, e não sendo caso deste, o sistema prevê modos de intervenção no processo.

O que nos importa concluir, neste ato, é que a coisa julgada é uma qualidade especial da sentença, atribuída por lei, a fim de que o decisum firmado não possa ser rediscutido em outro processo, conforme os limites subjetivos definidos pelo legislador, que em regra geral, se limita às partes(13). Como regra que é, permite exceção, que é o que faz o CDC, no capítulo IV, quando trata da coisa julgada em ações coletivas, como demonstraremos melhor ao sul deste trabalho.

Importante corolário lógico desta premissa, que limita exatamente a função da coisa julgada, é podermos afirmar que no caso do legislador expressar que determinada sentença tem efeitos ou eficácia ultra partes ou erga omnes, nada mais faz que expressar que pela própria natureza do pedido formulado o ato estatal vai gerar conseqüências para terceiros, ou seja, determinados sujeitos que não foram parte no processo.

Neste diapasão, o natural é que a sentença como ato estatal produza efeitos para além das partes, ainda que o legislador não expresse que ela tem efeitos ultra partes ou erga omnes, atingindo terceiros. Assim, possível é que uma decisão tenha eficácia erga omnes, como no exemplo da decretação de divórcio, sem que a coisa julgada tenha igual extensão, limitando-se esta especial qualidade da sentença como vinculativa apenas dos demandantes ou partes.


3.COISA JULGADA - INSTRUMENTO PRÁTICO E POLÍTICO DE PACIFICAÇÃO DOS CONFLITOS E TUTELA DOS INTERESSES METAINDIVIDUAIS.

Uma vez que observamos a distinção entre a eficácia da sentença e a coisa julgada ou autoridade da coisa julgada, podemos discutir qual a sua função como qualidade especial da sentença e a sua especial função e qualidade em sede de tutela dos interesses metaindividuais.

Justificar a regulamentação especial na tutela dos fenômenos coletivos e de modo especial quanto à coisa julgada na proteção dos interesses metaindividuais em termos próprios e específicos, nos possibilita afastar a confusão entre os efeitos da sentença e o fenômeno jurídico da coisa julgada, conceito maduro dentro de nossa doutrina e, por que não dizer, de nosso direito positivo, pois existe uma compreensão consolidada deste fenômeno no interpretar das nossas normas jurídicas, como já exposto.

Como exposto a doutrina de Liebman trouxe à voga a concepção de que a coisa julgada é uma especial qualidade que a lei atribui à sentença. Não é uma qualidade própria desta, assim que pelo menos teoricamente é possível existir sentença sem coisa julgada.

Destarte, como efeito especial que a lei atribui à sentença a lei pode prever e atribuir menor ou maior elasticidade a esta sua especial qualidade, neste diapasão são plenamente justificáveis as diversas espécies de coisa julgada reguladas na Lei n° 8.078/90, pois esta como uma especial qualidade que se atribui ao ato judicial decisório tornando-o imodificável e indiscutível no mesmo processo ou em outro processo, uma vez esgotadas todas as possibilidades do uso de recursos ordinários e extraordinários da decisão que encerra a relação processual, pode pela lei ter ampliado ou restringido o seu espectro de imutabilidade(14).

Por isso, indagar-se da natureza jurídica da coisa julgada é afirmá-la como a praeclusio máxima, o momento em que a decisão judicial não comporta mais ataques implicando o ponto final do processo. Assim, a lei deve ser cautelosa em atribuir tal qualidade especial da sentença àquelas pessoas que por motivos vários não tiveram a oportunidade de exercer as suas razões de per si no processo, daí a forma diferenciada que a Lei n° 8.078/90 trata os efeitos da coisa julgada conforme a espécie de interesse tutelado e sua relação com os direitos individuais dos sujeitos abrangidos na tutela coletiva.

Uma vez procedente a ação e não havendo o recurso da decisão no prazo de lei, ocorrerá o trânsito em julgado da decisão, reflexo do fenômeno de recrudescimento das decisões, e que assume relevante papel no trato dos interesses metaindividuais que afetam, simultaneamente, toda uma coletividade, grupo ou comunidade(15).

O fenômeno de recrudescimento das decisões é essencial à mecânica do poder, porque uma vez assegurada a participação dos interessados na gestação do ato decisório, quando este se realiza exaure-se a capacidade decisória da atividade jurisdicional, neste momento o poder firma uma decisão, a qual o sistema toma a resolução de não permitir a introdução de novas informações que possam levar a sua modificação(16).

A lei de ação civil pública, antes o único instrumento de tutela dos interesses difusos e coletivos, previa apenas o efeito erga omnes da coisa julgada, procedente ou improcedente a ação, ressalvando-se, porém, a improcedência da ação por deficiência de provas, neste caso, qualquer dos legitimados poderia intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova (artigo 16, da Lei n° 7.347/85).

No entanto, após o advento da Lei n° 8.078/90, por força da norma extensiva do artigo 21, da Lei n° 7.347/85, aplicam-se à LACP os preceitos do CDC quanto aos efeitos da coisa julgada e a toda ação coletiva. Assim, atualmente, dependendo da espécie de interesse metaindividual tutelado, difuso ou coletivo, o efeito da sentença será: coisa julgada erga omnes ou ultra partes, seja o provimento final de procedência ou improcedência da ação. Porém, sempre que a improcedência da ação ocorrer por insuficiência de provas qualquer legitimado poderá propor outra ação, com idêntico fundamento, apoiando-se em novos elementos de prova. Excepcionalmente, porém, quando o objeto da ação for interesses individuais homogêneos, somente ocorrem os efeitos da coisa julgada erga omnes, previstos em lei, no caso de procedência do pedido para beneficiar todas as vítimas e sucessores (artigo 103, inc. III do CDC c/c artigo 21 da Lei 7.347/85); sendo improcedente só produz efeitos de coisa julgada entre as partes do contraditório (art. 103, § 2°, da Lei 7.347/85). Todos este efeitos serão analisados com maior detenção mais ao sul.


4.COISA JULGADA & INTERESSES METAINDIVIDUAIS

4.1- COISA JULGADA MATERIAL E COISA JULGADA FORMAL

A Coisa Julgada Formal é a imutabilidade da decisão e a impossibilidade de sua impugnação dentro da mesma relação jurídico-processual, como palavra final do Estado dentro do processo, e a Coisa Julgada Material é a imutabilidade da decisão de mérito e a impossibilidade de sua discussão que se espraia para fora do processo. São os degraus da coisa julgada que possuem a natureza peculiar de representar a qualidade da decisão de ser imodificável e indiscutível, regra geral, pelos partícipes da relação processual.

Como vemos, a distinção entre coisa julgada formal e coisa julgada material responde à extensão dos efeitos da coisa julgada dentro e fora do processo, sem perquirir da extensão objetiva ou subjetiva da coisa julgada, logo é plenamente aplicável em sede de tutela dos interesses metaindividuais esta classificação.Em todo processo ocorre a coisa julgada formal, como a imutabilidade da questão dentro do mesmo processo, mesmo aqueles em que há extinção sem julgamento do mérito. A coisa julgada material somente ocorre no caso de ser julgado o mérito da lide e, na realidade, quando discutimos os limites objetivos e subjetivos da coisa julgada, estamos preocupados com esta modalidade, pois qualifica os efeitos do decisum.

4.2. LIMITES OBJETIVOS DA COISA JULGADA.

Como sabemos, em nossa legislação, somente o dispositivo da sentença transita em julgado, onde se soluciona o mérito da lide, ainda que sejam relevantes os fundamentos e pressupostos materiais para a decisão. Como não há regra especial, o mesmo corre em sede de tutela de interesses metaindividuais.

Não devemos olvidar, todavia, a lição de Liebman proferida antes da metade do século passado de que, embora exata a afirmativa de que a coisa julgada se restringe à parte dispositiva da sentença, esta expressão deve ser entendida em sentido substancial e não apenas formalístico, de modo que compreenda não apenas a frase final da sentença, mas também tudo quanto o juiz porventura haja considerado e resolvido a cerca do pedido feito pela partes. Os motivos são, pois, excluídos, por essa razão, da coisa julgada, mas constituem indispensável elemento para determinar com exatidão o significado e o alcance do dispositivo.(17)

Mais grave, portanto, a observação desta lição em sede de interesses metaindividuais, de relevância fundamental o substrato material da decisão para a compreensão exata do seu dispositivo, que visa justamente a tutelar interesses que possuem em regra na sua gênese uma mutabilidade que lhes é própria e particular, a fim de possibilitar a melhor e mais adequada tutela dos interesses sociais inclusos no sistema jurídico, antes processados apenas por outros sistemas, notadamente o político.

4.4 - OS LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA - POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS

Os limites subjetivos da coisa julgada definem as pessoas que se submetem à imutabilidade e indiscutibilidade do comando inserido na sentença. A coisa julgada nos seus clássicos limites somente atinge as partes integrantes da relação processual, isto é, os sujeitos que atuaram no processo em contraditório.Neste capítulo observaremos se ocorre o mesmo em sede de tutela de interesses metaindividuais, ou se a coisa julgada atinge terceiros ou não, como parte da doutrina afirma.

A maioria da doutrina quando estuda os limites subjetivos da coisa julgada, em sede de tutela de interesses metaindividuais, destaca o aspecto da extensão subjetiva dos efeitos da coisa julgada a terceiros, mas existe corrente doutrinária, cuja melhor expressão consideramos ser de Antonio Gidi, sustenta que não existe a extensão a terceiros dos efeitos da coisa julgada, que sempre é limitado às partes, conforme a lição clássica, embora aqui se exija especial perspectiva da análise do fenômeno.

4.4.1 - Extensão dos efeitos da coisa julgada a terceiros

A corrente da doutrina majoritária leciona que quando a Lei n° 8.078/90 define os efeitos da coisa julgada em ação em defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos como erga omnes ou ultra partes, está tratando de estender os efeitos da coisa julgada a terceiros que não fizeram parte do processo.

Assim, uma vez que a Lei define que nos interesses difusos os titulares são pessoas indeterminadas e indetermináveis, nos coletivos o titular é um grupo ou categoria de pessoas indeterminadas e nos interesses individuais homogêneos a individualização das vítimas somente ocorre no momento da execução, mas no processo de conhecimento estes são representados pelo substituto processual, teríamos que estes titulares individuais indeterminados ainda que determináveis, ou mesmo os determinados, não seriam parte no processo e, como terceiros, seriam atingidos pelos efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes, evidentemente dentro dos casos em que a lei permita esta extensão.

4.4.2 - Extensão dos efeitos da coisa julgada somente "inter partes"

Por outro lado, Antonio Gidi afirma que a coisa julgada sempre se limita às partes do conflito, e os que pensam d´outra forma incidem em erro de perspectiva, pois que nos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos o titular do direito subjetivo sempre é determinado, pois o sujeito é, respectivamente, ora a coletividade, comunidade ou o conjunto de vítimas que sofreu a lesão. Embora possam eventualmente os sujeitos integrantes individuais da coletividade ou comunidade ser indeterminados, eles estão abrangidos pela coisa julgada e não podem ser considerados terceiros.

Destarte, para Gidi a "ação coletiva é a ação proposta por um legitimado autônomo (legitimidade) em defesa de um direito coletivamente considerado (objeto), cuja imutabilidade do comando da sentença atingirá uma comunidade ou coletividade (coisa julgada)"(18).

Assim, nos interesses difusos o titular do direito subjetivo é a comunidade formada de pessoas indeterminadas e indetermináveis, nos coletivos o titular é a coletividade (grupo, categoria, classe) formada de pessoas indeterminadas, mas determináveis, e nos individuais homogêneos o titular do direito subjetivo é uma comunidade de pessoas perfeitamente individualizáveis, que também são indeterminadas e determináveis.Seguindo neste raciocínio afirma que é:

"imperativo observar que ao contrário do que de costuma afirmar, não são vários e nem indeterminados, os titulares (sujeitos de direito) dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Há apenas um titular – e muito bem determinado-: uma comunidade no caso dos direitos difusos, uma coletividade no caso dos direitos coletivos ou um conjunto de vítimas indivisivelmente considerado no caso dos direitos individuais homogêneos"(19).

Dentro deste prisma, fica fácil concluir, para este autor que em sede de tutela de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos apenas os seus sujeitos individualmente lesados é que são em geral indeterminados, embora determináveis, mas o titular do direito subjetivo é sempre determinado, pois é a comunidade, coletividade ou comunidade de vítimas afetada.

Daí decorreria a conclusão lógica que a coisa julgada sempre atinge somente as partes do conflito, pois mesmo no caso de interesses difusos a comunidade de sujeitos indeterminados afetada é a titular do direito subjetivo, e que sofre a lesão e não o indivíduo indeterminado, assim, este, mesmo não sendo parte no processo e sim a comunidade coletivamente considerada, não há como considerá-lo terceiro, pois integra a coletividade ou comunidade.

Logo, não se trata de discutir a extensão dos efeitos da coisa julgada a terceiros, o que nunca ocorre, mas sim de discutir a extensão dos efeitos erga omnes ou ultra partes aos membros integrantes da comunidade ou coletividade afetada.

4.4.3 - Nossa posição

Percebemos pelo exposto, e apesar da bem fundamentada posição de Antonio Gidi, e das doutrinas que partem para a definição da extensão da coisa julgada a terceiros, temos que ambas as posições incidem em equívocos teóricos sobre a coisa julgada e a noção de terceiros, e quando casam as noções cometem erros sutis pois, como demonstraremos, a coisa julgada em sede de tutela coletiva sempre atinge as partes do processo e atinge os terceiros sob determinados enfoques, como necessidade deste tipo de tutela.

De fato, ambas as perspectivas partem de um pressuposto teórico comum e que levam aos erros no estudo da coisa julgada em sede de tutela de interesses metaindividuais, que concerne em não fazer perfeita distinção entre as relações materiais dos sujeitos titulares das situações que legitimam o processo coletivo e a noção estritamente processual de parte e de terceiro. Neste sentido, dada a não realização desta distinção, Ricardo Braga, por exemplo, aponta no sentido de que o substituído não é tecnicamente "terceiro", pois seu direito estava defendido em juízo pelo substituto, em virtude de expressa autorização legal, assim, estando em juízo sendo defendido os seus interesses, este não poder ser considerado terceiro(20). Fica evidente, neste caso, o "tecnicamente", embora não explique o autor, refere-se ao substrato material dos interesses a que se pretende a tutela coletiva, e não em sentido técnico processual.

No presente artigo trabalhamos com os conceitos de parte e terceiro em sentido estritamente processual, até porque tratamos de conceitos próprios e específicos da ciência do direito processual, e a confusão entre as linhas tênues do direito material e processual se não forem mantidas, acabam por criar falsa noção sobre a inadequação ou mesmo a suposta inadequação de conceitos do direito processual.

Assim, qualquer sujeito que não seja parte no processo, e, portanto, não atue como autor ou réu, ou, ainda, que intervenha no processo a outro título que não seja na condição de autor ou réu, é um terceiro, e se não atua de forma alguma no processo é um terceiro também.

Fica claro, embora concordando com o ponto de vista de Gidi de que em sede de tutela dos interesses metaindividuais o que se tutela é um bem coletivamente considerado e logo o titular do direito subjetivo é sempre uma coletividade ou comunidade individualmente considerada ou conjunto de vítimas quando a lei define a possibilidade de extensão erga omnes ou ultra partes dos efeitos da coisa julgada, isto por si só não significaria que os limites subjetivos da coisa julgada não foram estendidos a terceiros, embora possam ser considerados integrantes da comunidade afetada na perspectiva de direito material - os integrantes individuais da coletividade, comunidade ou conjunto de vítimas - num enfoque processual teremos de concluir que estes são terceiros, pois de fato estes indivíduos não tiveram de per si a chance de expor suas razões no processo na condição de autores ou réus, pois o sistema veda este tipo de legitimidade.

Mesmo no caso da ação popular, o autor popular atua como substituto processual e, nesta condição atua também dentro das circunstâncias que a lei regula, os efeitos da coisa julgada que podem atingir terceiros. Aqui nos deteremos no processo especial da Lei n° 7.347/85 c/c Lei n°8.078/90.

Evidente que se afirmamos que os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes podem não atingir somente o autor e réu da demanda coletiva, seremos forçados a reconhecer que a coisa julgada atinge terceiros, havendo uma extensão dos limites subjetivos da coisa julgada, pois pela forma de construção mesma desta especial tutela coletiva, os titulares individuais nunca poderão atuar no pólo ativo na condição de autores da demanda.

Por outro lado, a coisa julgada não é um efeito necessário e essencial à sentença, podendo pelo menos em tese haver sentença sem o efeito da coisa julgada, como visto retro. Porém, mais correto e adequado é dizer que a coisa julgada enquanto especial efeito que se atribui a uma decisão, impede, em regra geral, que seja infirmada por qualquer um dos sujeitos que foram partes na demanda, é dizer, que estas possam furtar-se ao seu cumprimento e impugná-la, e possa assim, ser objeto de nova apreciação por outro magistrado.

Dentro deste prisma, somente a análise do direito processual vigente é que permitirá dizer, se no caso brasileiro, somente os autores e réus da demanda coletiva estão vinculados à autoridade da coisa julgada ou se os terceiros também estão a esta vinculada e em que condições e casos, ainda que por evidente, regra geral estejam como qualquer um sujeitos à eficácia da sentença como ato estatal, o que é coisa bem distinta, como expressamos mais ao norte. É dado mesmo que, em sede de tutela de interesse metaindividuais, sempre se busca a tutela de objetos que dizem a maior ou menor espectros de interesses sociais. Daí que a eficácia destas sentenças sempre atingirá terceiros com maior ou menor intensidade, com menor ou maior espectro social, mas disto não decorre o corolário que estes terceiros estejam em toda e qualquer situação sob os efeitos da coisa julgada. Limitar sob que enfoque se considera os terceiros atingidos pela coisa julgada é o nosso objetivo a seguir.

4.4.3.1- Interesses difusos.

Regulamenta o direito positivo brasileiro que, no caso de ação coletiva ter por objeto a tutela de interesses difusos, sendo julgada procedente ou improcedente, a sentença fará coisa julgada erga omnes(art. 103, I do CDC).

Porém, o efeito erga omnes da coisa julgada será excluído no caso de a ação ser julgada improcedente por insuficiência de provas, podendo qualquer um dos legitimados ou o mesmo legitimado intentar outra ação, com idêntico fundamento, desde que fundada em novos elementos de prova (artigo 103, inc. I, do CDC, c/c artigo 21, da LACP). É caso de extinção do processo sem julgamento do mérito.

Percebemos que pela redação do dispositivo legal fica muito claro que este declina que a "sentença fará coisa julgada". Assim, dirige-se e tem como escopo regulamentar a especial qualidade da sentença referente a sua imutabilidade no processo coletivo, e não se dirige a regulamentar a eficácia da sentença. Outro ponto a observar: como a lei somente faz exceção à improcedência por insuficiência de provas, significa dizer que a coisa julgada é erga omnes no caso de procedência ou improcedência do processo coletivo(21).

Como, pelos menos em tese, uma sentença pode ser compreendida sem o atributo da coisa julgada, sendo esta uma construção teórica da ciência do direito para maior densidade do princípio da segurança jurídica, veda o sistema que determinados sujeitos possam voltar a discutir determinada decisão do poder judiciário, esgotas as vias recursais, no mesmo ou outro processo. A regra é que esta especial qualidade da sentença se restrinja aos sujeitos que foram partes no processo, autor e réu, mas este especial atributo pode ser ampliado ou reduzido.

Dentro deste patamar fica claro que nenhum óbice teórico haveria e não há para a lei estender os efeitos da coisa julgada para além das partes, para atingir terceiros - sujeitos que não atuaram no processo como autores ou réus – e que não poderia no mesmo ou outro processo impugnar a decisão firmada no processo, excluída sua oportunidade de exercício do contraditório per si, mas que o sistema tomaria a decisão política de colocar a salvo de nova discussão, sem qualquer válvula de escape.

Teoricamente possível esta seca forma de ampliação da coisa julgada, mesmo em se tratando de situações no limite entre o político e o jurídico, o caso dos interesses metaindividuais, refletiria num conflito que, ainda que não fosse real, poderia ser contornada a sua resistência por meios mais sutis de ampliação e dos novos contornos a serem dados à coisa julgada. Onde a garantia ao contraditório e a ampla defesa previsto constitucionalmente, compreendida para além de uma garantia individual, mas como um meio de garantir materialmente o acesso à justiça. Assim que, evitando um conflito desnecessário, ainda que o nosso constituinte tenha compreendido o contraditório não apenas como uma garantia do exercício incondicional das razões individualmente pelo sujeito dentro do processo, mas como uma garantia fundamental. O legislador criou curvaturas de respeito ao prisma individual da garantia constitucional de acesso ao contraditório e à ampla defesa, criando novos meios e recursos inerentes a esta, sem, no entanto, restringi-la, como visto supra, quando da discussão sobre o contraditório e tutela coletiva, de forma que usou esta técnica para regular a coisa julgada em sede de interesses metaindividuais.

Assim, um exemplo de Curvatura pode ser verificado no preceituado no art. 103, §1o da Lei n° 8.078/90, onde prevê o legislador pátrio que os efeitos erga omnes da coisa julgada, em sentença de tutela de interesses difusos não prejudicarão os interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, que sabemos nesta espécie de interesses estão no grau máximo de indeterminabilidade dos sujeitos.

Observe-se que o § 1o. do art. 103, do CDC não estabelece nenhuma condição, uma vez seja julgada procedente ou improcedente a ação, para que os efeitos erga omnes da coisa julgada não possam prejudicar os interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade. Apenas dita regra de que os citados efeitos da coisa julgada – erga omnes (art. 103, I) - não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade dos interesses difusos.

Significa dizer que uma ação para a tutela de interesses difusos sendo julgada procedente ou improcedente a coisa julgada tem efeito erga omnes, salvo se a improcedência se der por insuficiência de provas, mas que esta mesma coisa julgada não prejudicará os interesses e direitos individuais dos integrantes da categoria.

Sem pôr nem tirar nada da lei, significa dizer que nem os autores, nem os réus, nem os terceiros que não participaram de per si do processo coletivo, mas foram substituídos processualmente pelo autor coletivo - legitimado na forma da lei - integrantes individuais da coletividade difusa, não podem infirmar o decisum do processo coletivo, uma vez presente a coisa julgada erga omnes.

Firma o sistema a resolução de que a via coletiva para a tutela daquele interesse difuso, com a mesma causa de pedir e pedido, está definitivamente fechada, após devidamente processado pela tutela coletiva em especial procedimento contraditório regulado em processo especial, pois este é o escopo da coisa julgada erga omnes.

Leciona Dinamarco que se tratando de demanda proposta por legitimado extraordinário, a sentença que a julgar improcedente terá autoridade também sobre os demais co-legitimados, pois é inerente ao instituto da substituição processual ficar o substituído vinculado à coisa julgada material produzida na causa conduzida pelo substituto(22). E outro não poderia ser o efeito, mas esta se forma na medida e circunstância de como a demanda foi posta perante o Estado-Juiz.

Assim, a Curvatura se dá por excluir o legislador a possibilidade que a coisa julgada erga omnes da tutela coletiva de interesses difusos, possa prejudicar de qualquer forma os interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade.

Significa dizer que, embora a via coletiva esteja fechada para a impugnação de todos – demais legitimados à tutela coletiva e os terceiros integrantes da coletividade, que, aliás, não tem legitimidade ativa para ajuizar estas ações - dado o efeito de caso julgado erga omnes, mas esta especial qualidade da sentença não poderá prejudicar os interesses individuais das pessoas integrantes da coletividade até porque o que se discutiu, e este é o objeto do processo de tutela de interesses difusos, foi única e exclusivamente a tutela do interesse coletivamente considerado e não os interesses individuais dos integrantes da coletividade. Evidente que a coisa julgada impede que se impugne no mesmo ou outro processo a decisão relativa ao objeto coletivamente considerado, nada mais.

Como pode o legislador dá densidade a esta exclusão da possibilidade de prejuízo dos interesses individuais dos integrantes da coletividade difusa, se fechou a possibilidade de rediscutir o decisum do processo coletivo ? A resposta é simples: a curvatura, prevista no § 1o. do art. 103, ocorre pela exclusão da possibilidade de prejuízo aos interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade difusa mediante a evocação da coisa julgada erga omnes como meio de vedar o seu direito de ação individual. Ficando mantida a possibilidade do exercício do direito de ação individual de cada um dos membros integrantes da coletividade na defesa de seus direitos e interesses individuais ainda que possam estar materialmente sobre o raio de ação dos efeitos da sentença. De fato, este direito de ação individual permanece integro, até porque não foi excluído e não foi o objeto do processo coletivo e, logo, não poderia ter sido atingido pela coisa julgada erga omnes. Evidente que o exercício deste direito somente faz sentido no caso da demanda coletiva ter sido julgada procedente para somar aos elementos que já lhe foram deferidos no processo de tutela coletiva, ou no caso deste ter sido julgado improcedente tentar uma melhor sorte por meio do processo tradicional. Se a demanda coletiva foi julgada procedente e a responsabilidade global do demandado atende às expectativas do seu interesse, não tem interesse de demandar pelo processo individual, mas tão somente de habilitar-se no processo executório da tutela coletiva.

Destaca-se, para ficar bem claro, que o regulado pela lei é apenas a extensão erga omnes da coisa julgada, ou seja, dita quais aqueles sujeitos, além das partes -demandado e legitimado coletivo, que naturalmente se submetem a autoridade da coisa julgada – que estão também impossibilitados de impugnar no mesmo ou outro processo o decisum firmado no processo coletivo. É dizer, que nenhum dos demais legitimados coletivos poderá demandar contra o réu em sede de processo coletivo, e nenhum dos integrantes individuais da comunidade difusa pode também impugnar este decisum, até porque não tem legitimidade ativa, nem foi o seu interesse isolado o objeto da demanda, mas determinado objeto comunitário onde o seu interesse estava materialmente inserido.

Verifica-se de forma clara que o contraditório e a ampla defesa fora devidamente exercido e observada no processo de tutela coletiva, pelo substituto processual em especial processo, mas o sistema atento ao microcosmo social permitiu e de forma expressa manteve a garantia do contraditório e da ampla defesa no seu aspecto individual em sua integralidade.

Pelo escopo mesmo da tutela coletiva, entendemos que seria desnecessária a previsão do § 1o. do art. 103, vez que, esta jamais poderia comprometer o direito de ação em caráter individual, pois, não é este o seu objeto, mas evitando celeumas o legislador com senso apurado e atento previu expressamente a curvatura, com lógica jurídica e tino social.

Concluímos efetivamente que a coisa julgada erga omnes em tutela difusa amplia os sujeitos alcançados pelo seu efeito, os limites subjetivos da coisa julgada, para alcançar terceiros estranhos ao processo, em sentido estritamente processual, impossibilitando-os de impugnar a decisão coletiva.

Exatamente por delimitarmos de forma clara e estritamente processual a distinção entre a coisa julgada e a eficácia da sentença, podemos afirmar que ocorrendo de determinada ação coletiva ter sido julgada improcedente, poderia em tese obrigar os integrantes individuais da coletividade difusa a ter de suportar a permanência de determinada atividade danosa aos seus interesses, ou seja, permanecer sob os efeitos ou no raio de ação da eficácia da sentença, isto na realidade não ocorre, pois embora a via coletiva esteja vedada, dado o efeito erga omnes da coisa julgada, porque não há meios para impugnar a sentença coletiva, ele não está obrigado a suportar seus efeitos materiais, podendo ajuizar ação tradicional contra o réu vencedor da demanda coletiva com vistas a excluir-se destes.

O exposto ficará mais claro, imaginando-se, por exemplo, o caso extremo de uma ação coletiva que visa responsabilizar determinada empresa Transportadora de Óleo, por poluir um rio mediante vazamento, a ressarcir os danos patrimoniais da população ribeirinha, recuperar o meio ambiente e a indenizar os danos extra-patrimoniais. A requerida consegue pelo mérito excluir-se da responsabilidade, após todos os recursos, a decisão finalmente adquire a autoridade da coisa julgada(23). Se não fosse a expressa curvatura do § 1o. do art. 103 do CDC, poderia o demandado, alegar que não pode mais ser acionado por nenhum dos ribeirinhos por danos particulares de ordem patrimonial ou moral que entendem foram decorrentes desta atividade da empresa, pois isto violaria a coisa julgada, mas tal defesa não é possível, podendo perfeitamente os ribeirinhos moverem ações individuais visando a responsabilidade civil daquela e as respectivas indenizações. Neste sentido é que se coloca que a coisa julgada erga omnes não pode prejudicar os interesses individuais dos integrantes da coletividade.

Considere-se, ainda, no mesmo exemplo retro, sendo julgada procedente a ação coletiva, mas somente condenando a empresa a ressarcir dos danos de ordem patrimonial e excluindo os danos de ordem subjetiva, por não se configurar os danos de tal natureza. Fixada na ação coletiva a responsabilidade global da empresa quanto aos danos materiais, basta ao ribeirinho fazer a sua habilitação no processo de execução coletiva e demonstrar o nexo de causalidade entre os seus prejuízos e o ato pelo qual foi considerada a demandada responsável, para ter direito a receber a quantum que lhe cabe no processo executivo. Entretanto, entendendo o ribeirinho que além dos danos patrimoniais, devidamente liquidados e objeto de satisfação na execução coletiva, tem direito a indenização por danos morais, a curvatura do § 1o. do art. 103 do CDC, ressalva integro este seu direito de ação, não podendo o réu lhe opor os limites objetivos da coisa julgada da demanda coletiva, onde não foi deferida a sua obrigação de indenizar danos de ordem extra-patrimonial, para obstar o seu direito de ação. Neste diapasão é que a coisa julgada erga omnes da tutela coletiva de interesses difusos não pode também prejudicar os interesses individuais de integrantes da coletividade difusa.

Para reforçar, consideremos outro exemplo, onde seja movida ação civil coletiva, cuja finalidade seja obrigar o SPC – Serviço de Proteção ao Crédito, a excluir do seu cadastro todas aquelas pessoas que constarem lá inscritas, cujas dívidas estejam registradas com prazo superior a cinco anos, bem como a criar um programa de computador que faça a exclusão imediata destes e de cada nova pessoa que conste em igual situação.

Assim, no caso desta ação ser julgada procedente todos aqueles indivíduos que estiverem nesta situação serão automaticamente beneficiados pela eficácia da sentença que pela natureza do provimento tem eficácia erga omnes, no sentido que beneficia todos aqueles indivíduos indeterminados que possuíssem restrições cadastrais perante o SPC, sendo que o efeito erga omnes da coisa julgada impede que este decisum seja impugnado por qualquer pessoa, outros legitimados e outros possíveis interessados de impugnar a sentença, evidente que os beneficiários individuais desta, sequer teriam interesse de impugná-la.

Considerando a mesma hipótese, ocorrendo a improcedência da ação pelo mérito, não estando obrigado o SPC de excluir os nomes inscritos a mais de cinco anos no cadastro, pelo fato de o magistrado ter concluído que legal era o registro, bem como não tendo a obrigação de criar o programa, após o trânsito em julgado. Neste caso, também estará presente o efeito erga omnes da coisa julgada, impedindo que decisão seja impugnada neste processo coletivo ou outro, pelo autor, réu e demais legitimados ativos. Observe-se, que podemos considerar que os sujeitos inscritos no SPC estão sob a eficácia erga omnes da sentença e mesmo sob os efeitos erga omnes da coisa julgada dela, mas dada a curvatura do § 1o. do art. 103 do CDC, o sistema deixa claro que esta última diz respeito ao processo coletivo, logo, não se dirige ao processos individuais, impedindo que esta exceção seja apresentada ao direito de ação individual que visa a excluir o particular do ilegal cadastro. Permanece integro o direito subjetivo público do particular de requerer a sua exclusão do ilegal cadastro.(24) Nestes termos, que podemos compreender que os efeitos erga omnes da coisa julgada na tutela de interesses difusos não prejudicam os interesses individuais dos integrantes da coletividade.

Consideremos, no mesmo caso, que o substituto processual requeira além da exclusão do SPC, que o juízo firme uma condenação pecuniária a reverter a cada sujeito a título de danos morais pelos constrangimentos de ter indeferido crédito em razão de dívida já prescrita, mas este seja indeferido por faltar elementos caracterizadores da responsabilidade da demandada quanto a este objeto. Corolário da curvatura, entendendo os consumidores que estavam na situação ilegal perante o SPC, sofreram constrangimentos e prejuízos de ordem moral por conta de indeferimento do crédito, podem perfeitamente mover ação individual pleiteando indenização, não podendo ser oposta pelo demandado defesa no sentido de que foi excluída a sua responsabilidade. Podemos, ainda, conceber que o magistrado tenha deferido a indenização por danos morais, fixando o quamtum em R$ 1.000,00 ( hum mil reais) por pessoa ilegalmente inscrita, destarte, se o particular entender que os seus prejuízos de ordem subjetiva foram de ordem muito grave, e que a indenização pelos constrangimentos devem ser estimados na ordem de R$ 10.000,00 (dez mil reais), não pode o réu opor a exceptio da coisa julgada, para impedir o direito subjetivo público do integrante da coletividade difusa de requerer esta tutela ao Estado. A curvatura prevista no § 1o. do art. 103 do CDC tem a função de excluir qualquer prejuízo aos interesses individuais da coletividade, e isto é que fundamenta a possibilidade destas ações a que fazemos referência

Ressaltamos, outrossim, embora a coisa julgada da decisão do processo de tutela coletiva não possa ser utilizada como defesa em ação para a tutela de interesse individual de integrante da coletividade difusa, na forma do art. 267, inciso V do CPC, de forma a fundamentar o pedido de extinção do processo sem julgamento do mérito, por que naquela via teria sido indeferido o direito à coletividade ou comunidade ao mesmo bem da vida, que ora se pleiteia em procedimento tradicional. Entretanto, possível e provável é que os elementos de prova produzidos no processo coletivo que levaram o estado-juiz a decretar a improcedência de uma ação coletiva, e a decisão com os seus motivos e fundamentos sirvam como elementos importantes levados pela parte ré para intervir na formação do convencimento do juízo no julgamento da ação individual, fundamentando neste aspecto particular o requerimento de que este novel pedido tome igual rota da improcedência, mas nada mais será que um elemento de prova, argumentativo, não vinculativo do magistrado, não se constituindo obstáculo para emissão de novo provimento, função própria da coisa julgada.

Evidente ainda, que, sendo procedente o pedido na ação coletiva de interesses difusos, esta beneficia as vitimas e seus sucessores que precisam somente proceder à liquidação e execução dos créditos indenizatórios a que tenham eventual direito, habilitando-se nos autos da execução e provando o nexo causal do seu dano e o direito à indenização, sendo que as indenizações individuais preferem ao valor indenizatório a reverter ao fundo público (artigos 103, § 3°, e 99, da Lei n° 8.078/90 c/c artigos 21, da Lei n ° 7.347/85).

Podemos concluir que os efeitos da sentença na tutela dos interesses difusos ultrapassam os limites subjetivos clássicos da coisa julgada, até porque se assim não fosse, não teriam utilidade(25). Emergindo o importante tema sobre a compatibilidade destes efeitos com a salvaguarda dos interesses individuais dos afetados que não participaram do contraditório, fato que decorre do respeito ao princípio constitucional de inafastabilidade da jurisdição incrustado no moderno constitucionalismo (no direito brasileiro artigo 5°, inc. XXXV da CF), é devidamente observado pela curvatura posta no circuito pelo legislador.

Destes efeitos das sentenças em sede de interesses difusos, embora destoado quanto aos tradicionais limites objetivos e subjetivos da coisa julgada, em nada afetam a essência do escopo da coisa julgada que é trazer a segurança jurídica. Ainda, que eventualmente se possa discutir a possibilidade de desconstituir o caso julgado, depois de exaurido o prazo rescisório, por motivos de outra ordem, sopesando critérios de justiça e princípios constitucionais(26).

4.4.3.2- Interesses coletivos

Ao regulamentar os efeitos da coisa julgada em ações coletivas para a tutela de interesses coletivos, o nosso legislador o realizou de forma muito semelhante da dos interesses difusos. Assim, no caso da propositura de ação coletiva cujo objeto seja a tutela de interesses coletivos stricto sensu, após o trânsito em julgado, à sentença atribui-se a qualidade da coisa julgada ultra partes, no caso de procedência ou improcedência do pedido (art. 103, II do CDC).

A opção pela noção de coisa julgada ultra partes da sentença, soa como uma forma de distinção didática entre coisa julgada dos interesses coletivos e dos interesses difusos, mas que na prática pouco se diferenciam, podemos dizer que ontologicamente em nada diferem. Aliás, em ambos os casos os titulares individuais são indeterminados, embora a espécie de interesse metaindividual coletiva, por estar ligada a um grupo, categoria ou classe, os membros sejam determináveis.

Ressalva-se que os efeitos ultra partes da coisa julgada são excluídos se a ação for julgada improcedente por insuficiência de provas, podendo, neste caso, qualquer um dos legitimados intentar outra ação ou mesmo o legitimado que moveu a primeira ação, com idêntico fundamento, desde que fundada em novos elementos de prova (artigo 103, inc. II, do CDC, c/c artigo 21, da LACP). É caso de extinção do processo sem julgamento do mérito.

Nos interesses coletivos os efeitos ultra partes da coisa julgada como especial qualidade da sentença, seja procedente ou improcedente a ação coletiva, não prejudicarão os interesses e direitos individuais dos integrantes do grupo, categoria, classe (artigo 103 § 1° da Lei n° 8.078/90 c/c artigo 21 da Lei n° 7.347/85).

Aqui, como na tutela dos interesses difusos, cabe a indagação sobre o que significa dizer que uma ação sendo procedente ou improcedente possui os efeitos ultra partes da coisa julgada, se a própria lei ressalva que não há prejudicialidade aos interesses e direitos individuais dos integrantes do grupo, classe ou categoria abrangida? A resposta pode ser construída nos mesmos moldes dos interesses difusos, até porque é inexistente a diferença ontológica entre os efeitos de coisa julgada aqui e lá.

Assim, a redação do dispositivo legal se dirige ao escopo de regulamentar a especial qualidade da sentença concernente a sua imutabilidade no processo coletivo julgado procedente ou improcedente a ação, e não se dirige a regulamentar a eficácia da sentença. Somente excluindo-se a coisa julgada ultra partes no caso de improcedência por insuficiência de provas da ação. Não há necessidade de especial regulamentação da eficácia da sentença pois estes efeitos do ato estatal ocorrerão como decorrente lógico do pedido de tutela coletiva formulada.

Novamente, embora teoricamente, fosse possível a ampliação da coisa julgada, sem ressalva, especialmente quanto aos seus limites subjetivos. Mesmo tratando-se de situações no limite entre o político e o jurídico, evitando um conflito desnecessário, o legislador criou curvaturas de respeito ao prisma individual da garantia constitucional ao acesso ao contraditório e à ampla defesa.

A Curvatura neste caso é semelhante dos interesses difusos, pois prevista no art. 103 §1o da Lei n° 8.078/90, que os efeitos ultra partes da coisa julgada em sentença de tutela de interesses coletivos, não prejudicará os interesses e direitos individuais dos integrantes do grupo, categoria ou classe.

Observe-se que o § 1o. do art. 103, do CDC não estabelece nenhuma condição, uma vez seja julgada procedente ou improcedente a ação, para que os efeitos ultra partes da coisa julgada não possam prejudicar os interesses e direitos individuais dos integrantes do grupo, categoria ou classe. Apenas, dita regra de que os citados efeitos da coisa julgada – ultra partes (art. 103, II) - não prejudicarão interesses e direitos individuais dos seus integrantes da categoria, grupo ou classe.

Questionar o modo como o legislador dá densidade a esta exclusão da possibilidade de prejuízo dos interesses individuais dos integrantes do grupo, categoria ou classe, e casar com o efeito ultra partes da coisa julgada, que fecha a possibilidade de rediscutir o processo coletivo é o objeto medular do nosso problema.

Mas, apesar disto, a resposta é simples e semelhante ao caso dos interesses difusos: a curvatura, prevista no § 1o. do art. 103, ocorre pela exclusão da possibilidade de prejuízo aos interesses e direitos individuais dos integrantes da classe, categoria ou grupo, mediante a evocação da coisa julgada ultra partes como meio de vedar o seu direito de ação individual. Ficando mantida a possibilidade do exercício do direito de ação individual de cada um dos membros integrantes da coletividade na defesa de seus direitos e interesses individuais ainda que possam estar materialmente sobre o raio de ação dos efeitos da sentença. De fato, este direito de ação individual permanece integro, até porque não foi excluído e não foi o objeto do processo coletivo logo, não poderia ter sido atingido pela coisa julgada ultra partes. Evidente que o exercício deste direito somente faz sentido no caso da demanda coletiva ter sido julgada procedente para somar aos elementos que já lhe foram deferidos no processo de tutela coletiva. Ou no caso deste ter sido julgado improcedente tentar uma melhor sorte por meio do processo tradicional. Se a demanda coletiva foi julgada procedente e a responsabilidade global do demandado atende às expectativas do seu interesse, não tem interesse de demandar pelo processo individual, mas tão somente de habilitar-se no processo executório da tutela coletiva.

Destaca-se, para ficar bem claro, que o regulado pela lei é apenas a extensão ultra partes da coisa julgada, ou seja, dita quais aqueles sujeitos, além das partes -demandado e legitimado coletivo, que naturalmente se submetem a autoridade da coisa julgada – que estão também impossibilitados de impugnar no mesmo ou outro processo o decisum firmado no processo coletivo. É dizer, que nenhum dos demais legitimados coletivos poderá demandar contra o réu em sede de processo coletivo, e nenhum dos integrantes individuais da classe, grupo ou categoria pode também impugnar este decisum, até porque não tem legitimidade ativa, e nem foi o seu interesse isolado o objeto da demanda, mas determinado objeto coletivo onde o seu interesse estava materialmente inserido.

Verifica-se de forma clara que o contraditório e da ampla defesa foram devidamente exercidos e observados no processo de tutela coletiva, pelo substituto processual em especial processo, sendo que o sistema atento ao microcosmo social permitiu e de forma expressa manteve a garantia do contraditório e da ampla defesa no seu aspecto individual em sua integralidade.

Destacamos, ainda, pelo escopo mesmo da tutela coletiva, que seria mesmo desnecessária a previsão do § 1o. do art. 103, já que, esta jamais poderia comprometer o direito de ação em caráter individual, pois, não é este o seu objeto, porém, evitando celeumas o legislador com senso apurado e atento previu expressamente esta curvatura, refletindo a mesma lógica jurídica e tino social dos interesses difusos, até por isso regulou no mesmo parágrafo da Lei n°. 8.078/90.

Concluímos efetivamente que a coisa julgada ultra partes em tutela coletiva amplia os sujeitos alcançados pelo seu efeito, ou seja, os limites subjetivos da coisa julgada, para alcançar terceiros estranhos ao processo, em sentido estritamente processual, impossibilitando-os de impugnar a decisão coletiva, embora exclua expressamente os interesses individuais dos interessados integrantes da classe, grupo ou categoria de seus efeitos, mantido em integralidade o seu direito de ação quanto a este objeto.

Exatamente por delimitarmos de forma clara e estritamente processual a distinção entre a coisa julgada e a eficácia da sentença, podemos afirmar que ocorrendo de determinada ação coletiva ter sido julgada improcedente e, que poderia em tese obrigar os integrantes individuais da classe, grupo ou categoria a ter de suportar a permanência de determinada atividade danosa aos seus interesses, ou seja, permanecer sob os efeitos decorrentes desta, isto na realidade não ocorre, pois, embora a via coletiva esteja vedada, dado o efeito ultra partes da coisa julgada, ele não está obrigado a suportar estes efeitos, podendo ajuizar uma ação tradicional com vistas a proteger os seus interesses contra o réu vencedor na demanda coletiva, visando afasta-los.

Tornando mais claro o exposto, consideremos, por exemplo, ajuizamento de ação coletiva visando obstar um aumento abusivo das parcelas por parte de administradora de consórcio, devolução dos valores indevidamente cobrados e danos reflexos, uma vez que, julgada procedente a ação o resultado beneficiará a todos os integrantes do grupo, os efeitos do ato estatal beneficiaram a todos os seus membros, ou seja, a eficácia da sentença é ultra partes porque atinge além das partes outros sujeitos – terceiros - que não atuaram no processo, e, após o trânsito em julgado, dizemos que a coisa julgada também tem efeito ultra partes porque vincula a partes e terceiros, que estão impedidos de no mesmo ou outro processo infirmar o decisório deste processo. Neste sentido não prejudicam os interesses dos integrantes individuais do grupo, cada um pode executar o seu dano individual excluindo a majoração e eventuais diferenças reflexas. Mesmo considerando, neste exemplo, que tenha sido indeferida na via coletiva o direito a danos reflexos, poderia o integrante do grupo ajuizar ação particular com o escopo de ver o demandado da ação coletiva responsabilizado por estes danos, não podendo ser lhe oposta a coisa julgada erga omnes para excluir-se o seu direito abstrato de ação, isto decorre da curvatura, prevista no § 1o. do art. 103 do CDC, onde persiste integro seu direito de ação, não podendo o réu lhe opor os limites objetivos da coisa julgada da demanda coletiva, onde não foi deferida a sua obrigação de indenizar danos reflexos da majoração abusiva, para obstar este seu direito público subjetivo. Neste diapasão é que a coisa julgada ultra partes da tutela coletiva de interesses coletivos não pode prejudicar os interesses individuais de integrantes do grupo, classe ou categoria.

Destaca-se, ainda, no mesmo caso, sendo julgada totalmente improcedente a ação coletiva, os efeitos ultra partes da coisa julgada não poderão prejudicar os interesses individuais de cada um dos membros do consórcio, que permanecem integralmente protegidos para o exercício do seu direito de ação. Com efeito, a os efeitos da coisa julgada ultra partes da sentença coletiva, onde pelo mérito o réu consegue manter o abusivo aumento, bem como não está obrigado a excluir o aumento e seus efeitos reflexos combatidos na via coletiva, se não fosse a expressa curvatura do § 1o. do art. 103 do CDC, poderia o demandado alegar que não poderia mais ser acionado por nenhum dos consorciados para excluir a majoração ilegal, pois isto violaria a coisa julgada, mas tal defesa não é possível, podendo perfeitamente os integrantes do grupo moverem ações individuais visando a responsabilidade e exclusão do abusivo aumento(27). Neste sentido é que se coloca que a coisa julgada ultra partes não pode prejudicar os interesses individuais dos integrantes da classe, grupo ou categoria.

Consideremos, ainda, o exemplo, que seja movida uma ação coletiva que visa declarar a impossibilidade de serem cobradas mensalidades escolares de alunos beneficiados pelo Crédito Educativo a partir do dia 1o de abril de 2000, por parte de universidades particulares, porque eivado de ilegalidade, sendo pleiteada a devolução do dinheiro, devidamente corrigido aos estudantes que tiverem sido cobrados ilegalmente. O pedido formulado, que pretende obter uma tutela jurisdicional que declare unicamente a impossibilidade desta cobrança pelos estabelecimentos de ensino privados, a partir da data de 1o. de abril de 2000, e a devolução a partir desta, mesmo sendo sabedores que o a cobrança ilegal já vinha sendo cobrada desde o dia 1o. de janeiro de 2000, evidente resulta que o pedido de tutela coletiva não foi formulado em toda a extensão que o caso requeria, significa dizer que sendo esta julgada procedente, os demandados devem cessar de todo a cobrança ilegal e devolver o dinheiro somente a partir daquela data e no período de referência.

Destaca-se, que apesar de mal formulado, o que não cremos aconteceria num caso concreto, não pode o demandado opor a exceção de coisa julgada, para impedir que determinado aluno requeira tutela individual visando a ressarcir o período de janeiro a março de 2000, não abrangido na tutela coletiva, até porque fora dos limites objetivos da coisa julgada.

Diga-se, ainda, na mesma hipótese, desta ação ser julgada improcedente, esta não impediria que os integrantes da coletividade pleiteassem em juízo a declaração da nulidade da cobrança e a devolução do dinheiro devidamente corrigido, por meio de ação individual, em todo o período, de janeiro de 2000 em diante, ou mesmo só a partir de abril de 2000, pois a coisa julgada ultra partes vincula apenas no sentido de que não pode ser impugnado este decisum do processo coletivo, mas esta não serve de exceção na ação particular, não podendo ser utilizado como instrumento de prejuízo aos interesses individuais dos integrantes do grupo. É dizer, que a eficácia da sentença de improcedência da ação permite as entidades particulares continuarem a cobrança "indevida", estando os estudantes, neste sentido, sobre a eficácia ultra partes de uma sentença que declarou como legítima tais cobranças, não podendo ser esta impugnada na via metaindividual, porém, esta coisa julgada não vincula o seu direito de ação particular, podendo ser decretada na via individual a ilegalidade da cobrança, excluindo-se o vencedor da indevida exação. Observe-se, que temos uma contradição lógica entre os enunciados das decisões, pois, uma afirma que a cobrança é legal, e na outra, ilegal, mas apesar disto são perfeitamente compatíveis e admitidas pelo sistema, apoiada na curvatura do § 1o. do art. 100 do CDC, onde apesar de a universidade estar amparada a globalmente permanecer com a cobrança, no particular está obrigada a cessar a cobrança e devolver os valores devidamente corrigidos.(28)

Ressaltamos, outrossim, que a coisa julgada da decisão do processo de tutela coletiva não pode ser utilizada como defesa em ação para a tutela de interesse individual de integrante da classe, grupo ou categoria, na forma do art. 267, inciso V do CPC, de forma a fundamentar o pedido de extinção do processo sem julgamento do mérito, por que naquela via teria sido indeferido o direito à coletividade ao mesmo bem da vida, que ora se pleiteia em procedimento tradicional. Entretanto, possível e provável é que os elementos de prova produzidos no processo coletivo que levaram o estado-juiz a decretar a improcedência de uma ação coletiva, e a decisão com os seus motivos e fundamentos sirvam como elementos importantes levados pela parte ré para intervir na formação do convencimento do juízo no julgamento da ação individual, fundamentando neste aspecto particular o requerimento de que este novel pedido tome igual rota da improcedência, sendo que nada mais será que um elemento de prova, argumentativo, não vinculativo do magistrado, não se constituindo obstáculo para emissão de novo provimento, função própria da coisa julgada.

Evidente, ainda, que sendo procedente o pedido na ação de interesses coletivos, esta beneficia as vitimas e seus sucessores que precisam somente proceder à liquidação e execução dos créditos indenizatórios a que tenham eventual direito, habilitando-se nos autos da execução e provando o nexo causal do seu dano e o direito à indenização, sendo que as indenizações individuais preferem ao valor indenizatório a reverter ao fundo público (artigos 103, § 3°, e 99, da Lei n° 8.078/90 c/c artigos 21, da Lei n ° 7.347/85).

Significa dizer que uma ação para a tutela de interesses coletivos sendo julgada procedente ou improcedente a coisa julgada tem efeito ultra partes, salvo se a improcedência se der por insuficiência de provas, mas que esta coisa julgada não prejudicará os interesses e direitos individuais dos integrantes da categoria. Logo, podemos perceber que nem os autores, nem os réus, nem os terceiros que não participaram de per si do processo coletivo, mas que foram substituídos processualmente pelo autor coletivo - legitimado na forma da lei - integrantes individuais de dado grupo, categoria ou classe, não podem infirmar o decisum do processo coletivo, uma vez presente a coisa julgada ultra partes. Resulta que a via coletiva para a tutela daquele interesse coletivo, com a mesma causa de pedir e pedido, está definitivamente fechada após devidamente processado pela tutela coletiva em especial procedimento contraditório regulado em processo especial, pois, este é o escopo da coisa julgada ultra partes.

Assim, a Curvatura se dá pela exclusão pelo legislador que esta coisa julgada ultra partes da tutela coletiva de interesses coletivos prevista por ele possa prejudicar de qualquer forma os interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade. Porém, observando que, neste caso, os sujeitos individuais integrantes do grupo, categoria ou classe são de mais fácil identificação, de espectro social menor, logo, podendo ter maior e melhor conhecimento destas situações, o legislador agregou outra curvatura limite àquela retro descrita.

Com efeito, prevê o legislador, que os efeitos ultra partes da coisa julgada da sentença proferida em ação coletiva para a defesa dos interesses coletivos não beneficiarão os autores das ações individuais, em que o autor, após a tomada da ciência do ajuizamento da ação coletiva, no prazo de trinta dias, não requerer a suspensão da sua ação individual (artigo 104, do CDC in fine, c/c art. 21, da Lei 7.347/85).

O legislador facultou ao autor individual decidir a opção processual que considera mais adequada à tutela dos seus interesses, escolhendo o prosseguimento pela via individual, sendo que ocorrendo da via coletiva ser julgada e solucionada antes no sentido positivo, a referida decisão não pode lhe ser aproveitada nos seus efeitos e, evidentemente, sendo julgada improcedente também não o prejudica. Entretanto, no caso da sua ação individual ser suspensa, após ciente do ajuizamento da ação coletiva, sendo esta processada e julgada procedente poderá o autor individual aproveitar os resultados da ação do processo coletivo. Por outro lado, sendo a referida ação coletiva julgada improcedente, a suspensão do seu processo permite que prossiga o trâmite individual, a fim de tentar melhor sorte nos seus interesses individuais, afinal, aqui se escuda no preceituado no § 1o. do art. 103 do CDC.

Embora a lei não seja expressa, no que concerne a procedência do pedido na ação coletiva de interesses coletivos, como o faz a tutela dos interesses difusos, considerando que naquelas as vítimas embora indeterminadas são determináveis, por fazerem parte de um grupo, classe ou categoria, temos que beneficia as vitimas e seus sucessores que precisam somente proceder à liquidação e execução dos créditos indenizatórios a que tenham eventual direito, habilitando-se nos autos da execução e provando o nexo causal do seu dano e o direito à indenização, sendo que as indenizações individuais preferem aos valores devidos pela indenização que devem reverter ao fundo público. Justifica-se por subsistirem iguais substratos do previsto nos artigos 103, § 3° e 99, da Lei 8.078/90, c/c artigos 21, da Lei 7.347/85. Usa-se a analogia.

4.4.3.3 - Interesses individuais homogêneos.

A ação coletiva para a tutela de interesses individuais homogêneos possui a peculiaridade de produzir os efeitos da coisa julgada erga omnes, previstos em lei, somente no caso de procedência do pedido, a fim de que sejam beneficiadas as vítimas e seus sucessores (artigo 103, inc III do CDC c/c artigo 21 de LACP). Verificada a improcedência da ação não há que se falar em efeitos da coisa julgada erga omnes.

A respeito da coisa julgada erga omnes a Lei n° 8.078/90 dita regra expressa, ao contrário dos demais casos de tutela de interesses metaindividuais, que somente no caso de procedência do pedido manifesta-se o especial efeito da coisa julgada erga omnes.

Logo, não ocorrerá o peculiar atributo de eficácia erga omnes da coisa julgada da sentença, atribuídos por lei, se esta sentença for de improcedência da ação. Assim, neste caso, após o trânsito em julgado, adquire os efeitos de coisa julgada para as partes presentes no processo, ou seja, a regra tradicional dos limites da coisa julgada.

Este caso reafirma de forma clara, a coisa julgada como um especial efeito que a lei atribui ao julgado, onde o legislador cria uma especial situação somente no caso de ser julgado procedente o pedido. Ocorrendo o trânsito em julgado da decisão, nenhuma das partes e outros co-legitimados ou terceiros poderão infirmar ou se opor ao julgamento da ação coletiva de tutela de interesses individuais homogêneos julgada procedente.

Aqui não ocorre o mesmo fenômeno da tutela dos interesses difusos e coletivos, sendo ressalvada pela lei a ocorrência dos efeitos erga omnes da coisa julgada no caso de procedência da ação, em que nem as partes, nem outros legitimados ou terceiros podem voltar a discutir a decisão firmada no processo. No caso de ser julgada improcedente a ação coletiva para a tutela de interesses individuais homogêneos, a via coletiva permanece aberta somente para outro legitimado coletivo. O ente social que moveu a ação coletiva ficará impedido de voltar a discutir o julgado no mesmo ou outro processo. Neste caso, aplicam-se os tradicionais limites subjetivos da coisa julgada, em que as partes que fizeram parte da demanda são atingidas pela autoridade da coisa julgada. O demandado somente poderá opor a coisa julgada que julgou improcedente a ação coletiva ao ente coletivo que lhe demandou na referida ação, não podendo opor a autoridade da coisa julgada contra outro dos legitimados concorrentes que vier a juízo defender o mesmo interesse individual homogêneo pela via coletiva.

Regulando a lei apenas a extensão erga omnes da coisa julgada, somente no caso de procedência da ação de tutela de direitos individuais homogêneos, dita quais sujeitos, além das partes - demandado e legitimado coletivo, que naturalmente se submetem a autoridade da coisa julgada - estão também impossibilitados de impugnar no mesmo ou outro processo o decisum firmado no processo coletivo, uma vez que este seja julgado procedente. É dizer, que nenhum dos demais legitimados coletivos poderá demandar contra o réu em sede de processo coletivo, e nenhum dos integrantes individuais da comunidade homogênea pode também impugnar este decisum, até porque seria desnecessário, porque se caracterizando o interesse individual homogêneo pela sua divisibilidade, e relativa facilidade de identificação dos sujeitos, decorrente de sua origem comum, o pedido de tutela coletiva deve atender a um só tempo aos seus anseios de tutela, retirando-lhe o interesse de agir.

Considerando, ainda, que a Lei n° 8.078/90 não faz ressalva expressa quanto a improcedência da ação para a tutela de interesses individuais homogêneos por insuficiência de provas, como faz nos casos de interesses difusos e coletivos stricto sensu, consideramos ser possível, neste caso, também, a aplicação da regra de que poderá ser intentada nova ação com idêntico fundamento, por qualquer dos legitimados e até mesmo pelo mesmo legitimado, desde que fundada sobre novos elementos de prova, afinal aqui teremos nova causa de pedir, e, afinal a mens legislatoris é permitir que efeitos tão relevantes, concedidos por lei, não favoreçam o violador de tais interesses de elevada significação social quando a improcedência da ação ocorrer por insuficiência de elementos probatórios.

Os efeitos erga omnes da coisa julgada da sentença de procedência, proferida em ação coletiva para defesa dos interesses individuais homogêneos, como visto retro, é conferido pela lei para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, entretanto, tais efeitos, não beneficiarão os autores da ações individuais, em que estes, após a tomada da ciência do ajuizamento da ação coletiva, no prazo de trinta dias, não requererem a suspensão da sua ação individual (artigo 104, do CDC in fine, c/c art. 21, da Lei n° 7.347/85).

A Lei n° 8.078/90 não prevê curvatura no sentido de que os efeitos erga omnes da coisa julgada da ação coletiva para a tutela de interesses individuais homogêneos, não prejudicarão os interesses e direitos individuais dos integrantes do grupo abrangido, como previsto no artigo 103, § 1°, da Lei n° 8.078/90, para os interesses difusos e coletivos stricto sensu, e nem faria sentido, afinal, somente permite tais efeitos no caso de procedência do pedido, logo, lhes faltaria mesmo interesse jurídico em promover tal impugnação.

Destarte, embora não tenhamos dito alhures quando tratamos dos direitos e interesses difusos e coletivos, também nestes casos, sendo julgada procedente a ação coletiva, não haveria como falar em possíveis prejuízos dos efeitos da sentença sobre os direitos e interesses individuais dos integrantes da coletividade ou comunidade, faltando-lhes mesmo interesse de agir para impugnar o referido decisum, ou seja, de se colocarem contra a coisa julgada, ainda que isto fosse possível.

De fato, isto seria impossível não só pela falta de interesse de agir dada a procedência, mas ainda porque o objeto decidido foi coletivamente considerado, portanto não lhe atinge os interesses individuais e ainda porque se o processo é coletivo, até mesmo o juízo rescisório teria de se dar por legitimado coletivo. Afinal, trata-se de conclusão prática de que, embora decidido de forma coletiva, estes poderão aproveitar aos seus interesses individuais, pois poderão fazer a liquidação e execução dos seus danos individuais na forma dos art. 95 a 100 do CDC.

Não podemos esquecer da especial regra do art. 103 § 2o. do CDC, pois, os interessados individuais que não atuarem como assistentes simples, podem propor as ações individuais de indenização, no caso de improcedência da ação. Destacamos que nos filiamos a corrente que leciona no sentido de que apesar de a lei se referir a litisconsortes, isto é de todo impossível, por que somente pode atuar como litisconsorte quem pode ser autor, e sendo a legitimidade da tutela coletiva deferida somente a entes sociais, admitir-se este seria burlar esta especial forma de legitimidade.

Observa-se, neste particular, que o interessado individual que atuou como assistente simples no processo, não poderá propor a ação de indenização a título individual, é o que se pode depreender contrário senso.

Aqui não se trata de efeito da coisa julgada material, mas será atingido pela eficácia preclusiva da coisa julgada, na sua projeção sobre o terceiro que interveio no processo, nos termos do disposto no caput do art. 55 do CPC, ficando o interveniente preso aos motivos da sentença, inclusive a verdade dos fatos estabelecida como fundamento desta e à apreciação dada às questões prejudiciais, à medida que tais pronunciamentos do juiz venham a ser relevantes em causa posterior na qual ele venha a figurar como parte principal. Tanto quanto as partes principais no processo em que a sentença foi dada, ele fica vinculado pela eficácia preclusiva dessa sentença. Somente em casos excepcionais (incisos I e II do art. 55 do CPC) poderá o assistente, em feito posterior, "discutir a justiça da decisão", onde se configure a chamada exceptio male gesti processu.Ele porá em discussão o acerto desses procedimentos dados incidentur tantum, obviamente sem com isso infirmar a res judicata formada no primeiro processo, o que nem sequer as próprias partes poderiam fazer, sendo que a ele faleceria legitimidade para postular reforma do que foi decidido sobre os direitos e obrigações alheios(29)


5- À GUISA DE CONCLUSÃO

Fica evidente que se poderia realizar uma crítica ao fenômeno da tutela coletiva, sobre o suposto "privilégio" na proteção dos interesses individuais, dado as regras do sistema que os excluem de serem prejudicados pelos efeitos erga omnes ou ultra partes das sentenças proferidas na tutela metaindividual, mas podem se beneficiar.As diversas curvaturas poderiam ser interpretadas como regras que ferem o princípio de isonomia, posto que, o réu, além de contrapor-se ao autor do processo coletivo, não estaria livre de ser demandado pelos interesses individuais não tutelados pela ação coletiva. Mas, como veremos, tais críticas são infundadas.

Destaca-se, entretanto, que antes de prejudicar a defesa do réu, o escopo que visa a tutela coletiva é permitir o acesso de forma mais célere a interesses que possuindo uma natureza idêntica necessitam de tutela uniforme, resultando economia de atividade processual e realização mais célere da justiça. Não se trata de sacrificar um direito, mas de sopesar interesses de relevo social. Afinal, se não fossem estas formas de tutela estes interesses provavelmente ainda estariam fora da proteção do Estado.

Ocorre nesta especial tutela um claro reflexo que este discrímen, supostamente violador do princípio da isonomia tem uma justificativa racional, um fundamento lógico, que legitima o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade proclamada entre os interesses em conflito e dos sujeitos nele envolvidos, o que está em perfeito acordo com os valores do sistema normativo constitucional(30).

Temos o encaixe prefeito das lições de Celso Antônio Bandeira de Mello, sobre as situações que justificam a discriminação, sem violação do princípio da igualdade, que se faz presente em sede de interesses metaindividuais. De fato, observa-se que existe correlação lógica entre o fator erigido em critério de discriminen, que é fragilidade dos interesses da coletividade, comunidade ou conjunto de vítimas, e a discriminação legal decidida em função desta, através de especiais regras processuais(31). Sem olvidar, ainda, que o vínculo de correlação retro está em perfeita relação de pertinência com os interesses constitucionalmente protegidos, resultado do desiderato constitucional de proteger o interesse público e bem estar comunitário, via pacificação mais rápida dos conflitos através das especiais regras de respeito das garantias do contraditório e da ampla defesa no sentido material.(32)

Devemos ainda, destacar que as curvaturas apontam para os dois lados, afinal, uma vez utilizada a via coletiva, sendo a ação julgada procedente ou improcedente, salvo se por insuficiência de provas, no caso de interesses difusos e coletivos, a via da tutela coletiva está vedada de forma definitiva e afinal era isto que o réu visava obter ao contestar a ação. Pois, mais grave seria se vencendo uma pretensão coletiva, tivesse o réu de brinde a proteção contra os interesses individuais dos membros da coletividade ou comunidade, estes sim, restariam violados em sua garantia de acesso à justiça, contraditório e da ampla defesa.

No concernente aos interesses individuais homogêneos, apesar de os especiais efeitos da coisa julgada erga omnes só ocorrerem no caso de procedência do pedido, os tradicionais efeitos da coisa julgada estão presentes, e também não seria justo recebesse de brinde o réu, uma vez vitorioso na demanda coletiva, uma proteção contra as demandas visando à tutela dos interesses individuais, que, aliás, não eram o objeto da demanda, pois o objeto era o dano coletivamente considerado. Por outro lado, visando a evitar possíveis más interpretações, dada a maior identidade dos sujeitos individuais lesados, preferiu ser expresso o legislador, criando esta curvatura específica.

De fato, o sistema promove a escolha política de evitar novas demandas individuais a partir do momento em que coloca instrumentos processuais coletivos que fixam a responsabilidade global do réu, e, assim, também acelerar a justiça, dispensando-se a multiplicação desnecessária de demandas. Mesmo estudando o processo individual, Liebman, antes da metade do século passado, já lecionava que a jurisdição tornou-se uma função pública que o Estado exerce não mais simplesmente para proteger direitos individuais, mas para satisfazer um interesse público, objetivo no qual estão compreendidos e são, portanto, indiretamente satisfeitos os interesses das partes, à medida que são legítimos.(33) Então, como poderíamos considerar injustos ou inconstitucionais normas que substanciam o interesse público na solução dos conflitos, que espelham as especiais regras do processo coletivo?.

Os casos e exceções na tutela dos interesses difusos e coletivos, expressos pelas curvaturas apontadas, em que a lei não permite o prejuízo dos interesses individuais dos integrantes da coletividade, grupo classe ou categoria, ficou claro que não se trata de excluir a extensão da coisa julgada no processo coletivo que se forma pro et contra. Não se trata de ocorrer apenas o aproveitamento in utilibus do conteúdo do julgado para os interessados individuais(34), logo, secundum eventum litis. A coisa julgada nestes casos atinge terceiros, ocorrendo que a tutela se dirige a objeto coletivo, o limite objetivo da coisa julgada se formará de acordo com este pedido, pois, evidentemente este é o conteúdo sujeito à imutabilidade e fixado no dispositivo da decisão, ele é que fixa a extensão deste conteúdo aos terceiros, ditando a extensão dos limites subjetivos da coisa julgada em sede de tutela coletiva(35).

Nestes casos, embora ocorrendo a coisa julgada dentro destes limites objetivos e subjetivos de especial configuração, o que ocorre é que sendo fixada em tutela coletiva a responsabilidade global do réu pela procedência do pedido de tutela coletiva, falta interesse de agir aos integrantes individuais de virem a juízo pleitear os seus interesses particulares, em novo processo de conhecimento. Basta-lhes apenas habilitar-se em processo coletivo de execução.

Destacamos que no caso dos interesses individuais homogêneos a lei criou um sistema especial da coisa julgada, pois, somente no caso de a ação coletiva ser julgada procedente é que será erga omnes a imutabilidade do julgado. Aqui sim, temos a coisa julgada secundum eventum litis, e efetivamente o único caso, porque, nos demais, outro é o fenômeno, onde as curvaturas é que deixam claro o perfil de interesses que por não terem sido objeto da pretensão coletiva, não poderiam ter sido alcançados pela coisa julgada.

A coisa julgada erga omnes da tutela coletiva de interesses individuais homogêneos, se forma conforme o resultado da decisão, somente no caso de a ação coletiva ser julgada procedente. Neste caso alcança terceiros para que a tutela coletiva não possa mais ser possível da análise no mesmo ou em outro processo. Porém, sendo a ação coletiva para a tutela de interesses individuais homogêneos julgada improcedente, permanece aberta a via coletiva por outro legitimado coletivo. Aqui, temos uma exceção à lição do mestre italiano. Observa-se, porém, no que tange ao autor e réu - partes do processo coletivo para a tutela dos interesses individuais homogêneos - a coisa julgada se forma em seus limites tradicionais, para vinculá-los ao decisum.

Como visto retro, nenhum empecilho há desta extensão coletiva pro et contra da coisa julgada em sede de tutela coletiva servir como impedimento à tutela dos interesses individuais, mas a cautela legal exigiu as curvaturas. Porém, no caso de ser julgada procedente a ação coletiva, falta interesse de agir ao titular particular de pretender a tutela individual, pois basta ser liquidada dentro do processo de execução da tutela coletiva já devidamente definida.

Devemos considerar ainda que, existindo a propositura de ações para a tutela de interesses individuais que já foram devidamente tutelados pela via coletiva, seja de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, a possível demanda individual ajuizada deve ser extinta sem julgamento do mérito por falta de interesse de agir, afinal a responsabilidade do réu já foi fixada, e cabe a este por lealdade processual alertar disto ao juízo e ao demandante, para que este promova a competente ação de execução para apurar os seus prejuízos particulares. Se não o fizer, o réu deve ser considerado como litigante de má-fé, na forma do art. 17 e incisos do CPC, pois o réu neste caso estaria realizando defesa contra texto expresso de lei e fato incontroverso; Alterando a verdade dos fatos; Usando o processo para conseguir objetivo ilegal; Opondo resistência injustificada ao andamento do processo; Procedendo de modo temerário no processo, correspondendo ao caso da litigância de má-fé prevista no artigo 87 do CDC c/c art. 18 do CPC.

Não se trata, por exposto, de tratamento diferenciado a beneficiar os interesses individuais de integrantes da coletividade no caso de procedência ou improcedência da ação coletiva de "somente venha a nós..,, ao vosso reino nada", mas sim, de sistemática adequada a facilitar o acesso à justiça de interesses coletivamente considerados de forma a compatibilizar o escopo pacificador do processo, salvaguardando-se os interesses individuais dos afetados em matéria de interesses metaindividuais, em respeito ao princípio constitucional de inafastabilidade da jurisdição para apreciar a lesão ou ameaça de lesão a direito (artigo 5°, inc. XXXV da CF) e valorizando-se o aspecto material do princípio do contraditório e ampla defesa, construindo formas de exercício desta garantia como meio mais célere de acesso à justiça (Art. 5o. LV), e evitando-se a multiplicação desnecessária de demandas.


NOTAS

1. A expressão "curvaturas" nos atrai para referirmo-nos a este fenômeno que procura compreender o fenômeno jurídico e explicar determinadas decisões deste, por que em ciências exatas, em física, sobretudo, também se usa conceito semelhante de curvatura para explicar fenômenos que se contrapõem ao elemento linear da geometria-euclidiana.O matemático alemão Carl Friedrich Gauss (1777-1855) – autor do conceito de curvatura – foi o primeiro a aceitar a idéia de uma geometria não-euclidiana como uma possibilidade lógica. Cfr. BASSALO, José Maria F. Crônicas da Física. Tomo 4. Belém: Editora da UFPa. 1994.Nota 20. Pág. 1.439.

2. BASSALO, José Maria F Crônicas da Física.. Tomo 4. Belém: Editora da UFPa. 1994.Pág. 1.227-1228

3. Para uma compreensão do sistema jurídico como um sistema de inclusão LUHMANN, Niklas.Introducion a la Teoria de Sistemas. Javier Torres Nafarrate. Gualajara: Universidade Iberoamericana; Iteso; Anthropos. 1996; LUHMANN, Nilklas & GEORGI, Raffaele De.Teoria de la sociedade. Guadalajara: Universidade de Guadalajara. 1993; GIORGI, Raffaele de. Direito, Democracia e Risco: vínculos com o futuro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris. 1998.

4. Sobre o significado do paradigma normativista nos tribunais, Cfr.FARIA, José Eduardo. A Crise do Poder Judiciário. In Justiça e Democracia. Revista Semestral de Informações e Debates. São Paulo: Revista dos Tribunais, no, 01. 1996.

5. LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e Autoridade da Sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. 3a. ed. Rio de Janeiro : Forense.1984. Pág.15

6.Idem. Pág. 19-20.

7.Idem. Pág. 45 e 49.

8.LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e Autoridade da Sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. 3a. ed. Rio de Janeiro : Forense.1984. Pág 55.

9. Rocco coloca-se contra esta possibilidade, criticando Chiovenda sobre este aspecto, pois considera a coisa julgada essencial e necessária à jurisdição para que esta possa atender o seu escopo.Dizer o contrário seria negar a natureza e frustrar a função jurisdicional:"Negare, infatti, l’assolutezza e la necessita della cosa giudicata,, vuol dire alterare la nature e frustare lo scopo della funzione giurisdizionalle". ROCCO, Ugo. L’autorità Della Cosa Giudicatra e i Suoi Limiti Soggettivi. Tomo I. Roma ; Athenaeum . 1917. Pág. 15. Apóia este entendimento de Rocco Guilherme Estellita, em sua clássica obra.Da Cousa Julgada: fundamento jurídico e extensão aos terceiros. Rio de Janeiro: 1936. Pág. 13.

10. MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo V. Rio de Janeiro :Forense.1974.Pág. 83.

11. LIEBMAN, EnricoTullio. Eficácia e Autoridade da Sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. 3a. ed. Rio de Janeiro : Forense.1984. Pág 53.

12. Válido lembrar o clássico exemplo da anulação de decisão de assembléia por um dos sócios, relatado por Liebman, em que a uma vez anulada a decisão por uma ação os seus efeitos ou eficácia da sentença atingem os demais sócios, mas que por não estarem submetidos à coisa julgada eles podem opor ações de impugnação contra a anulação da decisão.O exercício vitorioso de uma delas atinge o escopo comum.

13. Esta é a regra geral, pois como lecionara Guilherme Estellita limita-se às partes porque só elas participaram do processo, nele se fazendo ouvir e contribuindo para a formação da sentença. ESTELLITA, Guilherme.Da Cousa Julgada: fundamento jurídico e extensão aos terceiros. Rio de Janeiro: 1936. Página 103.

14. Existem autores que embora reconhecendo a coisa julgada constituir–se numa qualidade dos efeitos da sentença, a considera também um dos seus efeitos. Neste sentido Cfr. LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Contribuição à Teoria da Coisa Julgada. São Paulo. Revista dos Tribunais. 1997. Página 24. Um estudo simples e claro sobre a coisa julgada como qualidade especial da sentença cfr. ARAGÃO, Egas Dirceu Monis de. Sentença e Coisa Julgada. Rio de Janeiro: AIDE. 1992.

15. Podemos na esteira das lições de Celso Neves, seguindo Alfredo Rocco, afirmar que se estabelece uma relação de identidade entre o objeto da ação e o objeto da sentença, pois o objeto do juízo requerido corresponde ao objeto do juízo proferido, em que a demanda deve ser apreciada de acordo com a sua propositura perante o Estado-juiz. No caso dos interesses metaindividuais a sentença há de refletir um pedido de tutela coletiva, pois o pedido dirige-se a uma tutela desta natureza. Cfr. NEVES, Celso. Coisa Julgada Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1971. Página 359.

16. DINAMARCO, Cândido Rangel.A Instrumentalidade do Processo. 4 ed. São Paulo: Malheiros editores.1994.P.92.

17. LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudo Sobre o Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva. 1947. Página 165.

18. GIDI, Antonio. Coisa Julgada e Litispendência em Ações Coletivas. São Paulo: Saraiva. 1995.Pág. 16

19.Idem.Pág 23

20. BRAGA, Renato Rocha. A Coisa Julgada nas Demandas Coletivas. Rio de Janeiro: Lumem Júris. 2000.116

21.Como leciona Mancuso, sobre norma semelhante do art. 18 da LAP, não se trata de coisa julgada secundum eventum litis, mas não se atrita com o sistema do CPC, trata-se apenas de causa de extinção do processo sem julgamento do mérito.MANCUSO, Rodolfo Camargo de. Ação Popular.3 ed.São Paulo : Revista dos Tribunais. 1998. Pág. 243.

22. DINAMARCO, Cândido Rangel.Litisconsórcio. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 1994.Página 190

23. Aqui não aduzimos a questão da ação rescisória por considerarmos desnecessário distinguir esta possibilidade, para dizer que há coisa soberanamente julgada., esta mesma premissa está implícita nos demais exemplos.

24. O presente exemplo foi construído a partir do Acórdão do TJSP, 11a. C. Cível , Ac. n° 218.909-2/0, j. em 16.12.1993, rel. Des. Itamar Gaiano, vu;. RT 706/82-84, colhido por João Carlos Menezes. Cfr. In. Código do Consumidor: jurisprudência selecionada. Campinas: Bookseller.1996. Pág. 705 a 712.

25. No que pertine aos efeitos erga omnes da coisa julgada em sede de tutela coletiva, não podemos deixar de fazer referência à nova redação do art. 16 da Lei de Ação Civil Pública, dada pela Lei n° 9494/97, ficando assim redigido:Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada "erga omnes", nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.Mas que é de todo inviável a mudança legislativa, pois alterou um ponto legislativo, insuficiente para alterar o sistema legislativo formado da conjugação da Lei 8.078/90 e Lei 7.347/85, via art. 21., permanecendo em vigor os efeitos como regulados pelo CDC, porque estabelece confusão jurídica entre coisa julgada e jurisdição.

26. A este propósito, o extenso artigo "Efeitos da Coisa Julgada e os Princípios Constitucionais" do Ministro do STJ José Augusto Delgado, que discute a tese do ponto de vista do processo individual In Revista da Procuradoria Geral do Estado do Pará. Belém: Centro de Estudos.Jan/Jun.2001. Curiosa, é a distinção feita por Guilherme Estellita, onde diferencia a sentença justa da injusta, que neste último caso, leciona que "a injustiça da sentença decorre de haver reconhecido existente uma pretensão a verdade inexistente, ahi, a decisão crêa, não uma nova regra de direito substantivo, mas sempre um vínculo de natureza processual, que impedindo as partes de discutir o julgado, impõe-lhes a observância da pretensão reconhecida pela sentença injusta" .Embora mais à frente faça a ressalva de que "Merecem mesmo elogio de representarem o sentimento comum que a sentença é justa baseado no cálculo das probabilidades e na fé ordinariamente inspirada pelos juízes e por suas decisões" ESTELLITA, Guilherme. Da Cousa Julgada: fundamento jurídico e extensão aos terceiros. Rio de Janeiro: 1936. Páginas 115 e 148

27.De forma equivocada da sistemática do CDC, Motauri Ciocchetti de Souza, construindo exemplo semelhante, afirma que:"Caso a ação seja julgada procedente, o benefício atingirá a todos, pois a ilegalidade impedirá o aumento seja aplicado a qualquer dos integrantes do grupo de consórcio; na hipótese oposta, no entanto, todos terão de arcar com o sobrepreço da contribição mensal"In.Interesses Difusos em Espécie. São Paulo :Saraiva.2000. Pág. 150

28. Este exemplo foi construído a partir de um caso concreto colacionado por João Carlos Menezes, transcrevendo acórdão do TAMG, 3a. C, Civil, AC no. 130.665-2., j. 30.9.1992., relator Juiz Abreu Leite. Cfr In.Código do Consumidor : jurisprudência selecionada. Campinas : Bookseller.1996. Pág. 400 a 402.

29. DINAMARCO,Cândido Rangel.Listisconsórcio. 3 ed. São Paulo:Malheiros,1994.Página 46, nota 18. Dinamarco realiza esta mesma lição em nota 56 ao Livro de Liebman Manual de Direito Processual.Vol. I. Rio de Janeiro: Forense. 1985.

30.MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3a. ed. 7a. tiragem. São Paulo : Malheiros.1999.Pág 22

31. Idem.Pág 37

32. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3a. ed. 7a. tiragem. São Paulo : Malheiros.1999.Pág.41

33. LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva. 1947. Página. 53

34. Neste sentido LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Contribuição à Teoria da Coisa Julgada. São Paulo. Revista dos Tribunais. 1997. Páginas 78-79

35. Seria o caso de aplicar-se a Bernhard Doctrine, que faz referência Federico Carpi, onde segundo a qual seria possível ao Estado superar o requisito formal da participação em juízo, e reconhecer a eficácia da sentença a favor de um terceiro interessado, mas não contra esse. CARPI, Federico.L’efficácia "Ultra Parts" Della Sentenza Civile. Millano – Dott. A . Giffré Editore.1974. Página 120.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Ibraim José das Mercês. Contraditório e coisa julgada em sede de tutela de interesses metaindividuais. Uma leitura sobre o prisma das curvaturas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2084. Acesso em: 23 abr. 2024.