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IPVA: do domicílio tributário do sujeito passivo

IPVA: do domicílio tributário do sujeito passivo

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Domicílio tributário do proprietário do veículo é local onde o IPVA será devido. Identifica o Estado credor. Domicílio, no direito privado, determina o lugar onde a obrigação deve ser paga a credor já identificado em contrato celebrado entre as partes. Os institutos cuidam de obrigações de naturezas diversas.

1.    Resumo

Domicílio tributário do sujeito passivo do IPVA é importante porque determina a lei tributária estadual aplicável à relação de propriedade e, por consequência, o sujeito ativo da relação jurídica tributária. No entanto, regras sobre domicílio tributário da Lei paulista 13.296/2008 têm provocado questionamentos jurídicos de proprietários ou possuidores de veículos com mais de um domicílio ou residência, e que registraram seus veículos em órgãos de trânsito de Estados com alíquotas de IPVA inferiores à do Estado de São Paulo. A matéria é ainda mais polêmica quando o contribuinte é empresa locadora de veículos. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4376, ora pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo questiona a constitucionalidade das regras aplicáveis às locadoras. São causas da discussão jurídica: o IPVA ter sido instituído por emenda constitucional posterior à edição do CTN, de modo que este não cuidou do domicílio tributário de contribuintes de imposto sobre a propriedade de bens móveis; a diferença de alíquotas do IPVA entre os Estados; a inexistência de alíquota mínima do IPVA, conforme está previsto na Constituição; a complexidade do tema domicílio no direito civil; a relação de propriedade, conceito jurídico abstrato que se manifesta no mundo real por meio de direitos constitutivos distintos, exercidos muitas vezes em locais diversos, por uma ou mais pessoas. Comentar aquelas regras é o objeto deste artigo.

2.    Palavras-chave

IPVA; domicílio tributário; sujeito ativo; critério espacial da hipótese de incidência; domicílio civil; direito de propriedade; direitos constitutivos da propriedade.


3.    Da criação do IPVA

O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) foi instituído pela Emenda Constitucional 27/1985, na vigência da Constituição de 1967, já com as substanciais modificações efetuadas pela Emenda 1/1969. O artigo 2º da Emenda Constitucional acrescentou ao artigo 23 da Constituição de 1967 o inciso III, de modo que aos impostos de competência dos Estados e do Distrito Federal foi adicionado o imposto sobre a “propriedade de veículos automotores, vedada a cobrança de impostos ou taxas incidentes sobre a utilização de veículos”. Ao artigo 23 foram também acrescentados os parágrafos 13 e 14; o primeiro deles prescrevia a destinação de 50% (cinquenta por cento) do produto da arrecadação do imposto ao Município onde estivesse licenciado o veículo.

O inc. III do art. 155 da Constituição de 1988 manteve a competência dos Estados e do Distrito Federal para instituir o imposto sobre a propriedade de veículos automotores. No entanto, na nova redação do dispositivo não mais consta a vedação à cobrança de impostos ou taxas incidentes sobre a utilização de veículos.


4.    Do critério espacial da hipótese da regra-matriz de incidência tributária

Critério espacial é o lugar onde deve ocorrer o fato descrito na hipótese de incidência do tributo. Ajuda a verificar se determinado evento do mundo real-social se subsume àquele fato. Em alguns tributos identifica o sujeito ativo da obrigação.

No texto de lei instituidora de determinado tributo, encontramos alguns critérios espaciais elaborados com mais cuidado que outros. No entanto, mesmo que pareça ter o legislador se esquecido de definir o critério espacial, “haverá sempre um plexo de indicações, mesmo tácitas e latentes, para assinalar o lugar preciso em que aconteceu aquela ação, tomada como núcleo do suposto normativo” (CARVALHO, 2008, p. 288).

Na definição do locus facti, Carvalho (2008, p. 289) vislumbra três níveis de elaboração. No nível superior, estão os Impostos de Importação e Exportação; no nível médio, o IPTU e o ITR; no inferior, os demais tributos (CARVALHO, p. 289-290), neles incluído o IPVA.

A anterior Lei do IPVA do Estado de São Paulo (6.606/1989[1]) não especificava o local de ocorrência da relação de propriedade do veículo (critério espacial da hipótese de incidência), mas sim o local onde o imposto era devido. A regra básica estava no art. 2º:

“Art. 2° - O imposto será devido no local onde o veículo deva ser registrado e licenciado, inscrito ou matriculado, perante as autoridades de trânsito, da marinha ou da aeronáutica.

Parágrafo único - Não estando o veículo sujeito a registro e licenciamento, inscrição ou matrícula, o imposto será devido no local de domicílio do seu proprietário” (grifamos).

Conforme se vê, o legislador teve o cuidado de referir-se ao local em que o imposto era devido, visto que não se pode vincular, de plano, propriedade de certo veículo a determinado local. De fato, na data definida em lei como a de ocorrência do fato gerador, a relação de propriedade existe independentemente do lugar em que o veículo esteja. Na realidade, a relação de propriedade do veículo existe durante todo o exercício ou parte deste. No entanto, “desponta a natural necessidade de que a norma tributária revele o marco de tempo em que se dá por ocorrido o fato, abrindo-se aos sujeitos da relação o exato conhecimento da existência de seus direitos e de suas obrigações” (CARVALHO, 2008, p. 292). Por essa razão, em caso de veículo usado, convenciona-se adotar para aquele marco temporal a data de primeiro de janeiro do exercício.

Mamede (2002, p. 64-65) entende que o critério espacial da hipótese de incidência do IPVA é dado pela própria Constituição, já que o inc. III do art. 158 prevê destinação de 50% (cinquenta por cento) do produto da arrecadação do IPVA ao Município onde o veículo estiver licenciado. Logo, o fato descrito na hipótese de incidência ocorre no Município onde o veículo está licenciado. Entendemos, porém, que a regra constitucional apenas fixa critério para repartição da metade da arrecadação do IPVA efetuada pelo Estado, entre os Municípios que o integram.

O problema descrito não existe para bem imóvel. Com efeito, como a propriedade de bem imóvel está vinculada ao local de sua situação, é este o critério espacial da hipótese de incidência do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) e do imposto sobre a propriedade territorial (ITR).

Para os veículos automotores terrestres, a regra do caput do art. 2º remetia para a aplicação de regra da legislação de trânsito. Esta regra está no art. 120 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB – Lei 9.503/1997), com a seguinte redação:

“Art. 120. Todo veículo automotor, elétrico, articulado, reboque ou semi-reboque, deve ser registrado perante o órgão executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, no Município de domicílio ou residência de seu proprietário, na forma da lei”.

Assim, o IPVA era devido ao Estado de domicílio ou residência do proprietário do veículo, de acordo com regras postas por lei válida e vigente no território daquele Estado. O domicílio ou residência do proprietário determinava a lei tributária aplicável à relação de propriedade.

Presume-se que proprietário de veículo utiliza-o predominantemente no Município em que se situa seu domicílio ou residência. No entanto, constatou-se registro indevido de veículos em órgãos de trânsito de Estados com menores alíquotas de IPVA por:

a)            pessoa natural que, mais por desconhecimento da lei do que por má-fé, entendia possuir domicílios ou residências no Estado de São Paulo e em outro Estado;

b)            empresa locadora que alterou seu contrato social, a fim de registrar a abertura de novo estabelecimento no Estado do Paraná ou do Tocantins, mas simulado, já que localizado no endereço de despachante conhecido como Rosa Negra, com escritórios em Curitiba e em Palmas;

c)            empresa locadora com estabelecimentos no Estado de São Paulo e em outro Estado, por entender que o registro do veículo deve ou pode ser feito no órgão de trânsito do Estado em que se situa respectivamente a sede da empresa ou o estabelecimento que escolheu como domicílio tributário.

De acordo com o disposto no inc. I do § 6º do art. 155 da CF, o IPVA terá alíquotas mínimas fixadas pelo Senado Federal. Essas alíquotas mínimas, porém, ainda não foram fixadas. Se o Senado Federal as tivesse fixado, poderia não ter havido perda de arrecadação do IPVA pelo Estado de São Paulo ou poderia a perda ter sido de menor monta.

A fim de impedir a perda de arrecadação do IPVA para outros Estados, o Estado de São Paulo editou a Lei 13.296/2008[2], que tratou diretamente e de forma mais bem elaborada do domicílio do proprietário do veículo, uma vez que, nos termos do disposto no caput do art. 4º da Lei, o imposto será devido no local desse domicílio.

Além disso, o § 1º do art. 9º da Lei prescreve redução em 50% (cinquenta por cento) da alíquota para automóveis flex ou com motor especificado para funcionar à gasolina, destinados à locação, de propriedade de empresas locadoras, ou de que estas sejam possuidoras em decorrência de contrato de arrendamento mercantil, desde que a atividade de locação de veículos represente no mínimo 50% (cinquenta por cento) de sua receita bruta, mediante reconhecimento, segundo disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda (§ 2º do artigo). Assim, a alíquota daqueles veículos passa de 4% (quatro por cento) – cf. o inc. IV do art. 9º da Lei – para 2% (dois por cento)[3]. No entanto, a redução foi insuficiente para que locadoras passassem a registrar no órgão de trânsito do Estado de São Paulo veículos colocados à disposição para locação neste Estado. É que, por exemplo, as alíquotas de IPVA de veículos de propriedade ou posse de locadoras são de 1% (um por cento) nos Estados do Rio Grande do Sul[4], Santa Catarina[5], Paraná[6], Minas Gerais[7], e Tocantins[8], e de 0,5% (meio por cento) no Estado do Rio de Janeiro[9].

O critério material da hipótese de incidência do IPVA é estado do sujeito passivo (“ser proprietário de veículo automotor”) e não ação por ele executada (como, p. ex., “vender mercadorias”, “industrializar produtos”). Porque aquele estado existe em qualquer local que o veículo esteja, o legislador paulista editou regras sobre domicílio tributário do proprietário do veículo, em vez de regras sobre critério espacial da hipótese de incidência.

“Ser proprietário de veículo automotor” é situação jurídica que, relatada no antecedente de norma individual e concreta de lançamento, torna-se fato jurídico tributário. É estado, do sujeito passivo, não vinculado a determinado local. No entanto, ele se materializa por atos que denotam o efetivo exercício de um ou mais direitos constitutivos da propriedade (de usar, de gozar e de dispor do bem), esses sim vinculados a um ou mais locais determinados ou determináveis.


5.    Da propriedade

O direito de propriedade é “o mais importante e o mais sólido de todos os direitos subjetivos, o direito real por excelência” (MONTEIRO, 1993, p. 88).

Direito real é o exercido sobre uma coisa erga omnes, isto é, “em face de qualquer um ou perante todos indeterminadamente”. Não é uma relação entre pessoa e coisa, mas uma relação entre pessoas. O proprietário exerce uma faculdade perante todos, que se refere à obrigação universal e negativa de todos em absterem-se, de não perturbarem o uso e gozo da coisa, pelo proprietário (FERRAZ JR., 1990, p. 146-147).

O conteúdo positivo do direito de propriedade é constituído por direitos elementares: de usar, de gozar e de dispor do bem, que correspondem ao jus utendi, jus fruendi e jus abutendi, atributos da propriedade romana (MONTEIRO, 1993, p. 91).

“O direito de usar compreende o de exigir da coisa todos os serviços que ela pode prestar, sem alterar-lhe a substância”. O direito de gozar é fazer frutificar a coisa, para auferir-lhe os produtos. O direito de dispor é poder consumir a coisa, aliená-la, gravá-la de ônus e submetê-la ao serviço de outrem (MONTEIRO, 1993, p. 91). Assim, usar de um veículo é utilizá-lo como meio de transporte de pessoas ou coisas de um lugar para outro; dele gozar é arrendá-lo ou alugá-lo; dele dispor é aliená-lo ou dá-lo a outrem, em usufruto.

A propriedade é plena, quando todos os seus direitos elementares estão reunidos no direito do proprietário; limitada, quando tem ônus real ou é resolúvel.

Alf Ross, apud Ferraz Jr. (1990, p. 144), assinala que a função primeira do direito subjetivo de propriedade “é a de um instrumento teórico que permite apresentar situações reguladas por normas de uma forma operacional”.

A expressão “transferir o direito de propriedade” funciona como uma espécie de abreviatura teórica que evita o árduo trabalho de descrever todas as normas aplicáveis à situação (FERRAZ JR., 1990, p. 144). Quando se diz “o indivíduo A tem a propriedade do bem imóvel ou móvel”, a impressão que se tem é a de que o conceito identifica conjunto determinado de normas que outorgam direitos ao indivíduo e lhe impõem obrigações. No entanto, o conjunto de normas não será o mesmo se A tiver a propriedade plena, a propriedade resolúvel[10] ou a nua propriedade[11]. Na propriedade de veículo automotor, portanto, é preciso examinar, em cada caso, que direitos elementares constitutivos da propriedade tem o proprietário ou possuidor e em que local, ou locais, esses direitos estarão sendo exercidos durante o ano civil.

5.1.    Diferença entre propriedade e domínio

Propriedade e domínio são conceitos que não devem ser confundidos. Propriedade é o gênero de que domínio é espécie. Propriedade é o conjunto de direitos reais e pessoais. Domínio, porém, compreende somente os direitos reais, ou seja, o direito de propriedade em relação às coisas materiais ou corpóreas (SILVA, 1973, p. 565).

Tal como o direito de propriedade, o domínio é direito absoluto, porque oponível erga omnes. Excluído seu titular, todas as demais pessoas estão na condição de sujeito passivo de uma obrigação negativa, ou seja, “no dever jurídico de abster-se de qualquer ato que possa embaraçar ou impedir o uso, gozo e disposição da propriedade sobre que recai” (SILVA, 1973, p. 566).

5.2.    Correlação entre propriedade e posse

De acordo com Ihering, apud Monteiro (1993, p. 19), há estreita correlação entre propriedade e posse. Para Ihering, a posse é a exteriorização da propriedade, a visibilidade do domínio. Possuidor é todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do Código Civil – CC). “A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto” (art. 1.197 do CC).

Durante a vigência de contrato de locação, o locatário tem o direito pessoal de usar o veículo, a posse direta. Ele tem o poder físico sobre o veículo, o corpus, que, segundo a teoria objetiva de Ihering, é o quanto basta para constituir a posse. Para Ihering é dispensável o animus, “a intenção de ter a coisa como sua” e segundo elemento constitutivo da posse pela teoria subjetiva de Savigny, pois ele está implícito no poder de fato exercido sobre a coisa (MONTEIRO, 1993, p. 17-19). Na realidade, porém, Ihering não eliminou o elemento volitivo em sua concepção de posse. Para ele, basta a vontade de proceder como proprietário (a affectio tenendi), independentemente da intenção de ter a coisa como sua (LEITE, 2009). Assim, para Ihering, o locatário é possuidor; para Savigny, é mero detentor.


6.    Do domicílio

6.1.    Do domicílio tributário

Domicílio tributário é o local em que o contribuinte manterá suas relações com o fisco (MACHADO, 2009, p. 149). A Fazenda Pública enviará comunicações, intimações e notificações ao domicílio tributário, pois é nesse lugar que espera encontrar o sujeito passivo, para a satisfação dos mútuos interesses (CARVALHO, 2008, p. 334-335).

Todas as regras sobre domicílio tributário estão previstas no art. 127 do CTN, que tem a seguinte redação:

“Art. 127. Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal:

I - quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconhecida, o centro habitual de sua atividade;

II - quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento;

III - quanto às pessoas jurídicas de direito público, qualquer de suas repartições no território da entidade tributante.

§ 1º Quando não couber a aplicação das regras fixadas em qualquer dos incisos deste artigo, considerar-se-á como domicílio tributário do contribuinte ou responsável o lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação.

§ 2º A autoridade administrativa pode recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo, aplicando-se então a regra do parágrafo anterior”.

Pela leitura isolada do caput do art. 127, parece haver liberdade de escolha do domicílio tributário pelo contribuinte ou responsável. No entanto, o sentido da regra do caput deve ser construído em harmonia com o da regra do § 2º do artigo, que prevê a possibilidade de a autoridade administrativa recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo, situação em que se deve aplicar a regra do § 1º. Logo, “existem tributos cuja legislação específica exclui ou restringe a faculdade de escolha, pelo sujeito passivo, de seu domicílio tributário” (MACHADO, 2009, p. 150). É o que ocorre com o IPVA do Estado de São Paulo, cuja Lei 13.296/2008 tem regras que determinam o domicílio tributário do proprietário do veículo, aplicáveis, sobretudo, aos casos de ele também ter domicílio ou residência em outro Estado.

O local do domicílio tributário do contribuinte do IPVA deve estar no âmbito espacial de validade da lei tributária aplicável. Definida essa lei, identificado estará o sujeito ativo da relação tributária. Por ser o lugar onde deve ocorrer o fato descrito na hipótese de incidência, o critério espacial identifica, no caso do IPTU e do ITR, o sujeito competente para a exação. Há, portanto, estreita correlação do domicílio tributário com o critério espacial (CARVALHO, 2008, p. 336).

Por tais razões, o legislador do CTN criou regras para definir apenas 1 (um) domicílio para a pessoa natural ou jurídica. Nesse aspecto, o CTN aproxima-se mais do direito francês, que não admite a inexistência ou a pluralidade de domicílios. Essas regras estão na escolha:

a)            do centro habitual de atividade da pessoa natural, se sua residência habitual for incerta ou desconhecida (segunda parte do inc. I do art. 127);

b)            do lugar da sede da pessoa jurídica de direito privado (primeira parte do inc. II do art. 127);

c)            do lugar do estabelecimento em que ocorreram os atos ou fatos que deram origem à obrigação, em caso de pluralidade de estabelecimentos (segunda parte do inc. II do art. 127);

d)            do lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação, se inaplicáveis as regras dos incisos I e II do art. 127 (§ 1º do art. 127).

6.2.    Da inexistência de regras gerais sobre domicílio tributário do sujeito passivo do IPVA

O IPVA foi instituído durante a vigência do CTN. Na época de edição do Código, havia os seguintes impostos sobre o patrimônio: IPTU, de competência dos Municípios; ITR, de competência da União; e imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos (ITBI), de competência dos Estados e do Distrito Federal[12]. Para os três impostos, domicílio tributário do contribuinte é o lugar de situação do bem imóvel (primeira parte do § 1º do art. 127 do CTN). O local do imóvel é o critério espacial da hipótese de incidência do IPTU (parte final do caput do art. 32 do CTN) e do ITR (parte final do art. 29 do CTN)[13].

Se o IPVA fosse de competência da União, não haveria conflito de competências. Apesar de o IPVA ser de competência dos Estados e do Distrito Federal e de incidir sobre a relação de propriedade de bem móvel, não foram acrescentadas ao CTN regras gerais sobre domicílio tributário do sujeito passivo desse imposto, principalmente para o caso de o contribuinte ter domicílios ou residências em mais de um Estado, ou para o caso de contribuinte e responsável terem domicílios em diferentes Estados. Assim, por inexistirem regras gerais sobre domicílio tributário do sujeito passivo do IPVA, poderá haver incompatibilidade entre regras das leis dos Estados e do Distrito Federal que dispuserem sobre a matéria.

6.3.    Do domicílio

De acordo com Silva (1973, p. 564), domicílio

“indica o centro ou sede de atividades de uma pessoa, o lugar em que mantém o seu estabelecimento ou fixa sua residência com ânimo definitivo.

É a residência mantida com o animus manendi, capaz de gerar uma situação de direito, objetivada pelo domicílio.

Daí porque entre domicílio e residência há certa diferença.

A residência, apresentando uma situação meramente de fato, é o local em que a pessoa vive, sem esse caráter definitivo ou de tê-lo como centro de atividades, advindo da permanência ou efetividade, e a intenção de mantê-la nesse sentido.

O domicílio, assim, pode compreender a residência.

Mas, esta nem sempre indica o domicílio, por vezes tido como a sede legal, ou eleita, da pessoa, para nele centralizar todos os seus negócios ou atividades”.

Por ser o centro ou sede de atividades da pessoa natural ou jurídica, domicílio é imperativo da segurança jurídica (LEITE, 2006). Por exemplo: a regra geral de competência territorial é o foro do domicílio do réu (caput do art. 94 do Código de Processo Civil – CPC); no direito das obrigações, o pagamento será efetuado no domicílio do devedor, salvo se as partes convencionarem diversamente, ou se o contrário resultar da lei, da natureza da obrigação ou das circunstâncias (art. 327 do CC).

No direito civil, domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo (art. 70 do CC); se tiver diversas residências onde, alternadamente, viva, cada uma delas será considerada domicílio (art. 71 do CC); para relações concernentes à profissão, domicílio será o lugar onde esta é exercida (caput do art. 72); se exercer profissão em lugares diversos, cada um deles será domicilio para as relações que lhe corresponderem (parágrafo único do art. 72); se não tiver residência habitual, domicílio será o lugar onde for encontrada (art. 73).

Domicílio da pessoa jurídica de direito privado é o lugar onde funciona a respectiva diretoria e administração, ou onde ela elege domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos (inc. IV do art. 75); se tiver estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados (§ 1º do art. 75); se a administração ou diretoria da pessoa jurídica tiver sede no estrangeiro, o lugar do estabelecimento de cada agência será considerado domicílio para as obrigações por ela contraídas (§ 2º do art. 75).

O Código Civil brasileiro adotou o sistema do direito alemão, que admite a inexistência de domicílio ou residência (vide art. 73 do CC), a unicidade daquele ou desta, bem como a pluralidade de domicílios ou residências, para a pessoa natural (vide art. 71 do CC), e de (somente) domicílios, para a pessoa jurídica (vide §§ 1º e 2º do art. 75 do CC).

No entanto, é flexível o conceito de domicílio da pessoa natural ou jurídica adotado pelo Código Civil, conforme se depreende da análise das regras do art. 71, do caput e do parágrafo único do art. 72 e dos §§ 1º e 2º do art. 75.

6.4.    Domicílio do contribuinte do IPVA

Para escolha do domicílio tributário do contribuinte do IPVA, regra posta por lei tributária deve prevalecer sobre regra do Código Civil. É a aplicação do critério da especialidade. Afinal, obrigações tributárias decorrem da lei (são ex lege), enquanto obrigações do direito privado decorrem da autonomia da vontade (são ex voluntate). Carvalho (2008, p. 26-27) não concorda com a divisão das obrigações em ex lege e ex voluntate, visto que não se pode imaginar, no direito brasileiro, obrigações que não tenham resultado da lei. No entanto, o autor reconhece que “algumas requerem, de fato, a presença do elemento ‘vontade’ na configuração típica do acontecimento, enquanto outras não”.

Por dispor sobre normas gerais de direito tributário, o CTN tem status de lei complementar a que se refere o inc. III do art. 146 da Constituição Federal – CF. Conforme vimos, não há no CTN regras sobre domicílio tributário do sujeito passivo do IPVA. Podem os Estados e o Distrito Federal, portanto, legislar sobre a matéria (inc. I do art. 24 da CF, combinado com o seu § 3º), até que a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspenda a eficácia das regras da lei estadual que forem contrárias às da lei federal (§ 4º do art. 24 da CF). Além disso, os Estados e o Distrito Federal podem editar as leis necessárias à aplicação do sistema tributário nacional previsto na Constituição (§ 3º do art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da CF).

No entanto, não pode regra posta por lei tributária ordinária alterar a definição, o conteúdo e o alcance que o conceito domicílio tem no direito privado (art. 110 do CTN[14]), pena de ter de ser aplicada regra sobre domicílio do Código Civil.


7.    Da ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela CNC

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4376, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) questiona a constitucionalidade de regras sobre domicílio tributário para empresas locadoras de veículos, postas pela Lei 13.296/2008. Foram apontadas como inconstitucionais as regras do art. 3º, inc. X, alíneas “a”, “b” e “c”, e parágr. único; art. 4º, § 1º, item 2, alíneas “a”, “b” e “c”, §§ 4º, 6º e 7º; art. 6º, incisos VIII, IX e X, e § 2º.

Passemos a examinar os dispositivos concernentes a locadoras. São as seguintes as regras sobre domicílio tributário questionadas:

“Art. 4º - O imposto será devido no local do domicílio ou da residência do proprietário do veículo neste Estado.

§ 1º - Para os efeitos desta lei, considerar-se-á domicílio:

( . . . )

2 - se o proprietário for pessoa jurídica de direito privado:

a) o estabelecimento situado no território deste Estado, quanto aos veículos automotores que a ele estejam vinculados na data da ocorrência do fato gerador;

b) o estabelecimento onde o veículo estiver disponível para entrega ao locatário na data da ocorrência do fato gerador, na hipótese de contrato de locação avulsa;

c) o local do domicílio do locatário ao qual estiver vinculado o veículo na data da ocorrência do fato gerador, na hipótese de locação de veículo para integrar sua frota;

( . . . )

§ 4º - No caso de pessoas jurídicas de direito privado, não sendo possível determinar a vinculação do veículo na data da ocorrência do fato gerador, nos termos do item 2 do § 1º deste artigo, presume-se como domicílio o local do estabelecimento onde haja indícios de utilização do veículo com predominância sobre os demais estabelecimentos da mesma pessoa jurídica.

 ( . . . )

§ 6º - Em se tratando de veículo de propriedade de empresa de arrendamento mercantil (leasing), o imposto será devido no local do domicílio ou residência do arrendatário, nos termos deste artigo.

§ 7º - Para os efeitos da alínea “b” do item 2 do § 1º deste artigo, equipara-se a estabelecimento da empresa locadora neste Estado, o lugar de situação dos veículos mantidos ou colocados à disposição para locação”.

As alíneas “a”, “b” e “c” do inc. X do art. 3º especificam critérios temporais para três diferentes situações de veículos de propriedade de locadora[15]. Se regra sobre domicílio tributário da locadora prevista na alínea “a”, “b” ou “c” do item 2 do § 1º do art. 4º for inconstitucional, não poderá ser aplicada regra-matriz de incidência do IPVA que se constrói a partir daquela regra e de outras da Lei 13.296/2008, de modo que ficará prejudicada a aplicação da regra que contém o respectivo critério temporal, previsto em alínea do inc. X do art. 3º.

Os incisos VIII, IX e X do art. 6º cuidam de regras sobre responsabilidade tributária (de pessoas naturais ou jurídica) pelo pagamento do IPVA e acréscimos legais de veículos locados ou colocados à disposição para locação no Estado de São Paulo[16]. Cada regra traz implícito dever administrativo cometido a pessoa, que, descumprido, dá ensejo ao surgimento de outra relação jurídica, de natureza sancionatória, que tem no polo passivo a pessoa (ou responsável), no polo ativo o Estado de São Paulo e por prestação o pagamento do IPVA que não foi pago pela locadora (CARVALHO, 2008, p. 347-348). Assim, se o IPVA não puder ser exigido da locadora por inconstitucional regra sobre domicílio tributário do art. 4º, também não se poderá exigi-lo de suposto responsável tributário segundo regra de inciso do art. 6º que, em princípio, seria aplicável ao caso.

Alega a CNC que, ao editar regras sobre responsabilidade e benefício de ordem, a Lei 13.296/2008 tratou de direito civil, de competência privativa da União. No entanto, responsabilidade tributária e responsabilidade civil são conceitos distintos. Esta “designa a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando injustamente causado a outrem. Revela-se, assim, ou melhor, resulta da ofensa ou da violação de direito, que redundam em dano ou prejuízo a outrem” (SILVA, 1973, p. 1368). A responsabilidade tributária decorre do descumprimento de dever administrativo, de interesse da Fazenda Pública, imputado por lei a determinada pessoa. Tem, portanto, natureza de sanção administrativa.

Afirma a CNC que a lei paulista, contrariamente a todo arcabouço constitucional do IPVA, dispôs que a simples circulação do automóvel em território paulista configura elemento espacial do IPVA e a mera colocação do veículo à disposição para locação em território paulista configura o elemento temporal. Não tem razão. A Lei 13.296/2008 não define o lugar em que o fato descrito na hipótese de incidência deve ocorrer, mas sim o local em que o imposto é devido. A data em que o veículo é colocado à disposição para locação em estabelecimento situado em território paulista marca o início do período em que a empresa locadora poderá celebrar contratos de locação do veículo nesse estabelecimento, de modo que a Fazenda do Estado de São Paulo exija o IPVA do exercício, calculado de forma proporcional ao número de meses restantes do ano civil, incluído na contagem o mês relativo àquela data (art. 11 da Lei 13.296/2008). É a manifestação do direito de a empresa locadora usufruir o veículo, constitutivo de seu direito de propriedade.


8.    Do domicílio tributário da pessoa jurídica de direito privado

8.1.    Regra da alínea “a” do item 2 do § 1º do art. 4º da Lei

Esta regra se aplica a veículos de propriedade de pessoa jurídica de direito privado com estabelecimentos neste e em outro(s) Estado(s). A regra considera domicílio da pessoa jurídica seu estabelecimento situado em território paulista, para os veículos a este vinculados na data de ocorrência do fato gerador.

Se registro de determinado veículo for parte da Conta “Veículos”, do Ativo Imobilizado, do balanço patrimonial do exercício, de estabelecimento situado em território paulista, demonstrada estará a vinculação. No entanto, se a contabilidade da empresa for centralizada em estabelecimento situado em outro Estado, ou a empresa não atender a notificação fiscal para entrega do detalhamento de citada Conta, deve-se aplicar a regra do § 4º do art. 4º da Lei.

Dispõe referida regra que, não sendo possível determinar a vinculação do veículo na data da ocorrência do fato gerador, presume-se como domicílio o local do estabelecimento onde haja indícios de utilização do veículo com predominância sobre os demais estabelecimentos da mesma pessoa jurídica. Na realidade, houve pequeno deslize na redação do parágrafo, pois a predominância é “sobre os demais locais dos estabelecimentos ...”. É do fisco, porém, o ônus de provar que no local do estabelecimento situado no Estado de São Paulo houve predominância na utilização do veículo, durante o exercício.

8.2.    Regra da alínea “b” do item 2 do § 1º do art. 4º

Esta regra considera domicílio da pessoa jurídica de direito privado o estabelecimento onde o veículo estiver disponível para entrega ao locatário na data da ocorrência do fato gerador, na hipótese de contrato de locação avulsa.

Contra essa regra, pode-se alegar que, para empresa locadora com diversos estabelecimentos, a propriedade de veículo é da empresa e não do estabelecimento, de modo que a empresa pode registrá-lo no órgão de trânsito do Estado onde se situa o estabelecimento que escolheu como domicílio tributário. A argumentação não convence porque cada estabelecimento tem liberdade para firmar contrato de locação de veículo que nele se encontra. Assim, analogamente ao que se faz no ICMS e no IPI, deve-se aplicar o princípio da autonomia dos estabelecimentos.

Domicílio da pessoa jurídica de direito privado é o lugar de sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que deram origem à obrigação, o de cada estabelecimento (inc. II do art. 127 do CTN). Disposição semelhante à da segunda regra do inc. II está no § 1º do art. 75 do CC, pela qual cada estabelecimento da pessoa jurídica será considerado domicílio para os atos nele praticados.

No IPVA, o que dá origem à obrigação é a relação de propriedade do veículo, situação de fato, que por já ter sido contemplada pelo direito, adquiriu a dignidade de situação jurídica. Na relação de propriedade não há atos ou fatos que dão origem à obrigação, mas sim conjunto de atos que denotam o efetivo exercício de um ou mais direitos constitutivos da propriedade, que dá origem à obrigação.

Ante o exposto, para que se pudesse aplicar a regra do CTN na determinação do local de domicílio de locadora, seria preciso dar a ela interpretação flexível. No entanto, é no estabelecimento da locadora situado em território paulista que são celebrados contratos de locação dos veículos disponíveis para entrega a locatários. Esses contratos são atos jurídicos que denotam o direito de fruição dos veículos por parte da locadora, forma predominante pela qual seu direito de propriedade está se manifestando. Em relação a esses atos jurídicos, pode-se perfeitamente aplicar a regra sobre domicílio do § 1º do art. 75 do CC.

A regra da alínea “b” do inc. X do art. 3º da Lei visa impedir que empresa locadora registre em órgão de trânsito de outro Estado veículo que adquiriu para colocar à disposição para locação em estabelecimento seu situado em território paulista[17]. No entanto, a regra deve ser aplicada com cautela para que não implique bitributação[18] nem impeça a empresa locadora de alocar eficientemente seus recursos, prerrogativa da livre iniciativa, fundamento da ordem econômica (cf. caput do art. 170 da CF). Com efeito, se, em resposta a notificação fiscal prévia, a locadora demonstrar que veículo registrado em outro Estado foi colocado à disposição para locação no Estado de São Paulo porque, no ano, aumentou a demanda por serviços de locação neste Estado e diminuiu naquele, somente no exercício seguinte é que o IPVA deverá ser exigido. Se a demonstração somente ocorrer em impugnação ao lançamento, deverá este ser julgado improcedente.

Para os efeitos da alínea “b” do item 2 do § 1º do art. 4º da Lei, a regra do § 7º do mesmo artigo equipara a estabelecimento de empresa locadora no Estado de São Paulo o lugar de situação dos veículos mantidos ou colocados à disposição para locação. O que realmente importa para a determinação do estabelecimento da empresa locadora no Estado de São Paulo não é o local em que o contrato de locação de veículo é celebrado, mas sim o lugar de situação dos veículos mantidos ou colocados à disposição para locação. Assim, mesmo que o contrato seja celebrado em pequeno escritório, sem espaço algum para abrigar veículos, estabelecimento da empresa locadora no Estado de São Paulo será o lugar (próprio, alugado ou cedido por terceiro) em que os veículos forem mantidos ou colocados à disposição para locação.

8.2.1.   Veículo com IPVA já quitado em outro Estado

Na inscrição de veículo no Cadastro de Contribuintes do IPVA do Estado de São Paulo, não se exige novo pagamento do imposto já quitado em outro Estado (caput do art. 26 da Lei 13.296/2008). Essa regra tem como exceções as situações previstas nas alíneas “b” e “c” do inc. X do art. 3º da Lei (inc. II do art. 26), quando a empresa locadora terá de pagar o IPVA do exercício de inscrição proporcionalmente ao número de meses restantes do ano civil (caput do art. 11). Como se vê, apenas para empresas locadoras, foi criada a proporcionalidade no pagamento do IPVA no exercício em que o veículo é transferido de outro Estado.

Para ser coerente com a proporcionalidade, a regra do inc. I do art. 15 da Lei prevê dispensa de pagamento do IPVA de veículo de propriedade de empresa locadora a partir do mês seguinte ao da transferência do veículo para operação em outro Estado, em caráter não esporádico (ou seja, com continuidade na utilização do veículo em outro Estado), desde que seja comprovado o pagamento proporcional aos meses restantes do ano civil em favor do Estado de destino e assim esteja previsto na legislação desse Estado. Preenchidas as condições, o imposto pago ao Estado de São Paulo será restituído proporcionalmente ao número de meses em que o IPVA foi pago ao Estado de destino.

8.2.2.   Veículo destinado a locação avulsa e com permanência temporária no Estado de São Paulo

Haverá dispensa de pagamento do IPVA de veículo destinado à locação avulsa e cuja permanência no Estado de São Paulo seja temporária, conforme disposição regulamentar, desde que a empresa locadora forneça os dados necessários à inscrição no Cadastro de Contribuintes do IPVA (inc. II do art. 15 da Lei).

Apesar de o conceito de “permanência temporária” ainda não ter sido fixado em regulamento, é provável que o legislador quis contemplar casos em que veículo locado em outro Estado é devolvido em estabelecimento situado em território paulista, não devendo, porém, neste permanecer à disposição para locações subsequentes.

8.3.    Regra da alínea “c” do item 2 do § 1º do art. 4º

Esta regra considera domicílio da pessoa jurídica de direito privado o local do domicílio do locatário a que o veículo estiver vinculado na data da ocorrência do fato gerador, na hipótese de locação de veículo para integrar sua frota.

Suponhamos que empresa locadora sem estabelecimento em território paulista celebre contrato de locação de frota de veículos com locatário domiciliado no Estado de São Paulo. Durante a vigência do contrato, os veículos locados deverão estar registrados em que órgão de trânsito: do Estado em que se situa o domicílio do locatário, ou do Estado em que se situa a sede da empresa locadora?

O contrato outorga à locadora o direito de fruição dos veículos de sua propriedade ou posse. Embora seja um só contrato, os aluguéis são recebidos mensalmente. Fatos verificados diariamente denotam o direito de usar os veículos por parte do locatário. Ambos os direitos são constitutivos do direito de propriedade. Pela regra ora analisada, os veículos deverão estar registrados no órgão de trânsito do Estado de São Paulo. Afinal, é neste Estado onde os veículos serão utilizados, onde poluirão o meio ambiente, onde causarão problemas de trânsito, onde seus condutores poderão praticar infrações à legislação de trânsito ou até atos ilícitos. Por que então registrá-los em órgão de trânsito de outro Estado?

A legislação de trânsito é decisiva. De fato, o art. 7º da Resolução CONTRAN 664/1986 dispõe que “o locatário ou arrendatário é equiparado ao proprietário do veículo, para fins do Art. 117 e do Parágrafo Único do Art. 209 do Regulamento do Código Nacional de Trânsito, podendo o veículo ter renovado seu licenciamento anual, no município de residência ou domicílio do locatário ou arrendatário”[19].

Se o veículo circula predominantemente em municípios do Estado de São Paulo, mas é registrado em órgão de trânsito de outro Estado, em favor deste será recolhida a taxa de licenciamento anual do veículo. Essa taxa, porém, não é devida apenas pela emissão do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV), mas principalmente pelo efetivo exercício de poder de polícia da autoridade de trânsito, que consiste em o Estado movimentar sua máquina a fim de verificar se determinado obstáculo erigido ao administrado pode ou não ser superado, para o uso de sua propriedade (OLIVEIRA, 2004, p. 42). Exemplos de obstáculos são IPVA, multa por infração à legislação de trânsito ou a própria taxa de licenciamento pendente de pagamento, existência de bloqueio do registro do veículo por furto ou roubo, ou por ordem judicial. O pagamento do IPVA, da multa ou da taxa libera o veículo para o licenciamento; no bloqueio por uma daquelas causas, o obstáculo somente será superado quando o veículo sinistrado for encontrado e devolvido a seu legítimo proprietário ou quando a lide que pendia sobre o veículo for a final resolvida e este for entregue ao vencedor da demanda.

No que concerne às multas por infração à legislação de trânsito, o registro do veículo em Estado indevido causaria distorção se não houvesse o Registro Nacional de Infrações de Trânsito (RENAINF), sistema coordenado pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN). Esse sistema permite que multa por infração à legislação de trânsito cometida em Estado diverso do de registro do veículo ou imposta pela Polícia Rodoviária Federal ou pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) seja exigida pelo órgão autuador mediante notificação ao proprietário do veículo, ou que o pagamento da multa seja requisito para licenciar o veículo.

No entanto, haverá distorção na inspeção veicular ambiental obrigatória a todos os veículos registrados no Município de São Paulo, pois não estará obrigado à inspeção veículo de propriedade de empresa locadora ou por ela arrendado, registrado em órgão de trânsito de outro Estado, locado para integrar frota de veículos de locatário com estabelecimento no Município de São Paulo ou colocado à disposição para locação em estabelecimento da locadora situado nesse Município.

Ante o exposto, é no órgão de trânsito do Estado em que se situa o domicílio do locatário que o veículo deve ser registrado e licenciado.

É preciso atentar para o fato de que apenas para veículos novos de frota locada durante o exercício é que se pode aplicar o critério temporal previsto na alínea “c” do inc. X do art. 3º da Lei. Para veículo já utilizado em locações avulsas por estabelecimento de locadora situado em outro Estado, deve-se aplicar o critério temporal prescrito na alínea “a” do inc. X do art. 3º da Lei, de modo que somente a partir do exercício seguinte ao de celebração do contrato de locação, é que o Estado de São Paulo deverá exigir o IPVA.

A regra do § 6º do art. 4º, apontada como inconstitucional, afina-se com a do art. 7º da Resolução CONTRAN 664/1986. Afinal, é o arrendatário quem efetivamente usa o veículo.


9.    Do domicílio tributário da pessoa natural

O art. 71 do CC considera domicilio da pessoa natural qualquer das residências onde ela, alternadamente, viva. O inc. I do art. 127 do CTN, porém, fixa critério para escolha ao dispor que, sendo incerta a residência habitual da pessoa natural, considera-se domicílio tributário desta o centro habitual de sua atividade. A Lei 13.296/2008 considera domicílio do proprietário pessoa natural: o centro habitual de sua atividade onde o veículo esteja sendo utilizado[20], se a residência habitual do proprietário for incerta ou desconhecida (alínea “b” do item 1 do § 1º do art. 4º); o local onde, cumulativamente, este possua residência e exerça profissão (item 1 do § 2º do art. 4º); ou o endereço constante da Declaração do Imposto de Renda, se o proprietário possuir residência e exercer profissão em mais de um local (item 2 do § 2º do art. 4º). Se as regras anteriores não forem suficientes para precisar o domicílio tributário da pessoa natural, a autoridade administrativa poderá fixá-lo tomando por base o endereço que vier a ser apurado em órgãos públicos, nos cadastros de domicílio eleitoral e nos cadastros de empresa seguradora e concessionária de serviço público (§ 3º do art. 4º).

Ao fixar critérios para escolha de apenas 1 (um) domicílio tributário do sujeito passivo do IPVA, regra alguma do art. 4º da Lei 13.296/2008 alterou a definição, o conteúdo e o alcance do conceito domicílio, no direito privado. Domicílio tributário do proprietário do veículo é local onde o IPVA será devido. Identifica o Estado-credor. Domicílio, no direito privado, determina o lugar onde a obrigação deve ser paga a credor já identificado em contrato celebrado entre as partes. Além disso, conforme já enfatizamos, os institutos cuidam de obrigações de naturezas diversas: não regulada pelo princípio da autonomia da vontade, na obrigação tributária; regulada por esse princípio, na obrigação entre particulares.

Na apelação 0132496-53.2008.8.26.0053, a 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), por votação unânime, entendeu não ser domicílio do Autor (de ação declaratória de inexistência de relação jurídica) o imóvel que este tomou em locação em município do Estado do Paraná, para servir de residência da filha que lá foi estudar. Na apelação 0029868-23.2009.8.26.0482 (em mandado de segurança contra ato de autoridade administrativa), a 13ª Câmara de Direito Público do TJSP, por votação unânime, reconheceu ter a Autora comprovado: possuir residência, exercer atividade de produtor rural e utilizar habitualmente o veículo em município do Estado de Mato Grosso do Sul, a quem competia, portanto, o recolhimento do IPVA, embora a Autora tivesse declarado à Secretaria da Receita Federal o endereço de sua residência em São Paulo. (decisões disponíveis em:

<https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/consultaCompleta.do> Acesso em: 31/01/2012).


10.     Conclusões

Ao tratar de domicílio tributário, o CTN não contemplou o do sujeito passivo do IPVA. Enquanto a matéria não for tratada de modo uniforme por lei complementar federal, poderão Estados e o Distrito Federal editar regras sobre domicílio tributário, desde que não alterem a definição, o conteúdo e o alcance que o conceito domicílio tem no direito privado. Se legislarem sobre a matéria, porém, as regras postas poderão acarretar conflito de competência entre eles. Seja por alteração da definição, do conteúdo ou do alcance do conceito, seja por conflito de competência, o STF poderá ser provocado diretamente: por entidade sindical representativa de pessoas jurídicas de direito privado sujeitas à exação, no primeiro caso; por Governador de Estado ou do Distrito Federal que for prejudicado, no segundo. Contribui para aumentar a complexidade do tema o caráter operacional do conceito “direito subjetivo de propriedade”, instrumento teórico que permite apresentar situações reguladas por conjunto de normas que varia conforme a propriedade do bem seja plena ou limitada. Em cada caso, é preciso analisar por que direitos elementares constitutivos a relação de propriedade do veículo se manifesta no mundo real durante o exercício, sem descurar do exame de regras postas pela legislação de trânsito, aplicáveis ao caso. Entendemos improcedentes os questionamentos jurídicos que levariam à inconstitucionalidade das regras apontadas na ADI, mas identificamos situações em que a regra-matriz de incidência do IPVA somente pode ser aplicada a partir do exercício subsequente ao em que ocorrer o fato descrito no antecedente da regra sobre domicílio tributário da Lei paulista 13.296/2008, sob pena de ferir princípios constitucionais. Aguardemos então a decisão do STF, a fim de verificar se ela simplesmente vai se ater ao conceito operacional e abstrato do direito subjetivo de propriedade, ou se, para o fato típico descrito no antecedente de cada regra, ela vai examinar por que direitos elementares o direito de propriedade do veículo estará se manifestando durante o exercício.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito – técnica, decisão, dominação. São Paulo: Atlas, 1990.

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<http://www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/1792898>

Acesso em: 31/01/2012.

___________. Domicílio: um complexo conceito do Direito Civil. Revista Jus Vigilantibus, 10 de outubro de 2006. Disponível em:

<http://jusvi.com/artigos/22701> Acesso em: 31/01/2012.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2009.

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MONTEIRO, Washington de Barros, Curso de direito civil – direito das coisas, 3º Vol. São Paulo: Saraiva, 1993.

OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Taxas de polícia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, Vols. II e IV. Rio de Janeiro: Forense, 1973.


NOTAS

[1] Disponível em: <http://www.pfe.fazenda.sp.gov.br/> / Legislação / Tributária / Atos anteriores a 2002 / Ato: “Leis”, Ano: “1989” / 6.606, de 20-12 Acesso em 31/01/2012.

[2] Disponível em: <http://www.pfe.fazenda.sp.gov.br/> / Legislação / Tributária / Atalhos IPVA / Lei 13.296/08 Acesso em 31/01/2012.

[3] Na vigência da Lei 6.606/1989, as alíquotas eram de 3% (três por cento), para automóveis de passeio movidos a álcool (inc. III do art. 7º), e de 4% (quatro por cento), para automóveis de passeio (inc. II do art. 7º). Como apenas a primeira regra especificava o combustível, ela era especial. Porque era geral, a segunda regra aplicava-se a automóveis de passeio flex e movidos à gasolina.

[4] Cf. o inc. V do art. 9º da Lei Estadual 8.115, de 30/12/1985.

[5] Cf. o inc. IV do art. 5º da Lei Estadual 7.543, de 30/12/1988.

[6] Cf. a alínea “b” do inc. I do art. 4º da Lei Estadual 14.260, de 22/12/2003.

[7] Cf. o inc. III do art. 10 da Lei Estadual 14.937, de 23/12/2003.

[8] Cf. a alínea “d” do inc. I do art. 78 da Lei 1.287, de 28/12/2001 (Código Tributário do Estado do Tocantins). No entanto, o Estado isenta do IPVA o veículo novo no exercício em que é adquirido. De fato, a alínea “b” do inc. XV do art. 71 da Lei isenta do IPVA o veículo novo, desde que adquirido por empresa cuja atividade principal seja a locação de veículo sem condutor. Dispõe o § 7º do art. 71 que a empresa perde o benefício da isenção do IPVA na transferência da propriedade do veículo no mesmo exercício de sua aquisição.

[9] Cf. o inc. VIII do art. 10 da Lei Estadual 2.877, de 22/12/1997.

[10] Como é a propriedade do credor fiduciário, durante a vigência de contrato de alienação fiduciária em garantia.

[11] Como é a propriedade daquele que dá coisa sua a outrem, em usufruto. Aquele é o nu-proprietário, que faz jus à substância da coisa; este, o usufrutuário, que, durante certo tempo, está autorizado a retirar da coisa alheia os frutos e utilidades que ela produz. O usufrutuário tem o jus utendi e o jus fruendi; o nu-proprietário faz jus apenas à substância da coisa (MONTEIRO, 1993, p. 302-303).

[12] A Constituição de 1988 atribuiu as seguintes competências para instituir imposto sobre transmissão:

a) inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis: aos Municípios (art. 156, II);

b) causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos: aos Estados e ao Distrito Federal (art. 155, I).

[13] O critério espacial da hipótese de incidência do ITBI não seria o local do imóvel se a mutação patrimonial decorresse de sucessão aberta em Estado diverso do de situação do imóvel ou no exterior. Ainda assim, o imposto competiria ao Estado de situação do imóvel transmitido (art. 41 do CTN). Nesse caso, o critério espacial da hipótese de incidência não estaria no campo espacial de validade da lei aplicável.

[14] “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias” (grifamos).

[15] “Art. 3º - Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto:

( . . . )

X - relativamente a veículo de propriedade de empresa locadora:

a) no dia 1º de janeiro de cada ano, em se tratando de veículo usado já inscrito no Cadastro de Contribuintes do IPVA deste Estado;

b) na data em que vier a ser locado ou colocado à disposição para locação no território deste Estado, em se tratando de veículo usado registrado anteriormente em outro Estado;

c) na data de sua aquisição para integrar a frota destinada à locação neste Estado, em se tratando de veículo novo.

Parágrafo único - O disposto no inciso X deste artigo aplica-se às empresas locadoras de veículos qualquer que seja o seu domicílio, sem prejuízo da aplicação das disposições dos incisos II a IX, no que couber”.

[16] “Art. 6º - São responsáveis pelo pagamento do imposto e acréscimos legais:

( . . . )

VIII - a pessoa jurídica de direito privado, bem como o sócio, diretor, gerente ou administrador, que tomar em locação veículo para uso neste Estado, em relação aos fatos geradores ocorridos nos exercícios em que o veículo estiver sob locação;

IX - o agente público responsável pela contratação de locação de veículo, para uso neste Estado por pessoa jurídica de direito público, em relação aos fatos geradores ocorridos nos exercícios em que o veículo estiver sob locação;

X - o sócio, diretor, gerente, administrador ou responsável pela empresa locadora, em relação aos veículos locados ou colocados à disposição para locação neste Estado;

( . . . )

§ 2º - A responsabilidade prevista nos incisos I, II, III, VII, VIII, IX, X, XI e XII deste artigo é solidária e não comporta benefício de ordem.

 . . . ”.

[17] Se locadora adquirir veículo novo de concessionária com o fim de colocá-lo à disposição para locação em estabelecimento seu situado no Estado de São Paulo mas registrá-lo em órgão de trânsito de outro Estado, em favor deste será indevidamente pago o ICMS relativo às operações subsequentes, retido antecipadamente pelo fabricante.

[18] Exigência, por dois sujeitos ativos, de tributo relativo ao mesmo fato jurídico tributário.

[19] A Resolução CONTRAN 664/1986 dispõe sobre os modelos dos documentos de Registro e Licenciamento de Veículos e dá outras providências. Apesar da edição do Código de Trânsito Brasileiro em 23/09/1997, a Resolução ainda está vigente, já que alterada pelas resoluções 721/1988, 729/1989, 766/1993, 779/1994, 802/1995 e 16/1998. A Resolução 16/1998 foi alterada pela 187/2006, ainda em vigor.

[20] Embora o critério material da hipótese de incidência do IPVA seja a relação de propriedade do veículo automotor e não a utilização deste, o direito de uso é um dos direitos constitutivos da propriedade, de modo que o efetivo exercício daquele direito é o modo pelo qual esta se manifesta no mundo real.


Autor

  • Wagner Pechi

    Agente Fiscal de Rendas do Estado de São Paulo aposentado. Ex-Delegado Tributário de Julgamento de São Paulo. Ex-integrante do Tribunal de Impostos e Taxas. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PECHI, Wagner. IPVA: do domicílio tributário do sujeito passivo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3169, 5 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21219. Acesso em: 29 mar. 2024.