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Intuição e o conhecimento do Direito

Intuição e o conhecimento do Direito

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Os magistrados usam a intuição para elaborar a sentença judicial. Muitos deles têm vergonha de confessar que julgam desta forma, como se essa confissão demonstrasse uma fragilidade daquele homem julgador que precisa maravilhar-se com a imagem pretensiosa de sua própria racionalidade.

Qual é esta intuição? Se o filósofo não pôde formulá-la, não somos nós que o faremos. Mas o que chegaremos a apreender e fixar é uma certa imagem intermediária entre a simplicidade da intuição concreta e a complexidade das abstrações que a traduzem, imagem fugitiva e esvaecente, que ronda, talvez inapercebida, o espírito do filósofo, que o segue como sua sombra por entre os meandros de seu pensamento, e que, se não é a própria intuição, dela se aproxima muito mais do que a expressão conceitual, necessariamente simbólica, à qual a intuição tem que recorrer para fornecer ‘explicações’. Observemos bem esta sombra: adivinharemos a atitude do corpo que a projeta. E se nos esforçarmos para imitar esta atitude, ou melhor, para nos inserirmos nela, veremos de novo, na medida do possível, aquilo que o filósofo viu.

 Henri Bergson

SUMÁRIO:I – O conhecimento e a intuição.1. 1. Advertências ao espírito do leitor.1. 2. Considerações preliminares sobre o conhecimento e a intuição.II – O conhecimento intuitivo.2.1 Intuição: origem etimológica.2.2 Intuição: dimensão conotativa.2.3 Características da intuição.2.4 O conceito de intuição na doutrina..2.5 O intuicionismo.2.6 Espécies de intuição.Espécies em sentido amplo.2.6.1 Intuição empírica.2.6.1.1 Intuição sensível.2.6.1.2 Intuição psicológica.2.6.2 Intuição intelectual.2.6.2.1 Intuição racional.2.6.2.2 Intuição heurística e/ou criativa.2.6.2.3 Intuição filosófica. 2.6.2.3.a Intuição essencial ou eidética. 2.6.2.3.b Intuição existencial ou volitiva. 2.6.2.3.c Intuição essencial e existencial . 2.6.2.3.d Intuição axiológica ou dos valores.2.6.3 Intuição metafísica.Espécies em sentido estrito..2.7 Quadro sinótico das espécies de intuição. 2.8 O funcionamento da intuição e seus fundamentos: percepção, imagem.  e inteligência... III - A intuição e o conhecimento do Direito. 3.1 A intuição como método no Direito. 3.2 O conhecimento intuitivo do justo.. 3.3 Os limites do emprego da intuição na elaboração das decisões judiciais. Conclusões. Referências


I - O conhecimento e a intuição

A esfera do saber é enormemente alargada...

Fritz Heinemann[1]

1.1 Advertências ao espírito do leitor

Escrever sobre intuição, relacionando-a ao Direito – ser especial, objeto do nosso conhecimento e do nosso afeto – não é tarefa fácil. Embora prazerosa, constitui-se em um grande desafio e nos instiga particularmente, já que estamos a tratar de um ato do espírito.

Contudo, no esforço para introduzir o estudo da intuição na consciência, este ato pode provocar certo estranhamento, diríamos mesmo, certa resistência, por parte do leitor. Isto porque, como bem aponta Rizzatto Nunes, quem fala de intuição acaba tendo diante de si, muitas vezes, um auditório incrédulo, como se o orador estivesse falando do “assombroso, de algo sobrenatural, mítico”[2].

No que se refere à resistência que ela – a intuição – produz, é interessante observar a resistência do próprio Bergson, considerado, o “filósofo da intuição”, que chegou mesmo a confessar no início de seus estudos sobre o tema que “a intuição é uma palavra ante a qual hesitamos durante muito tempo” [3].

Bergson indica, na verdade, com essa assertiva uma característica muito especial da intuição, qual seja: o poder de negação que ela traz em si[4].

A respeito desta particularidade da intuição, vale observar o pensamento bergsoniano[5]:

Diante de ideias aceitas habitualmente, diante de teses que pareciam evidentes, de afirmações que até então haviam passado por científicas, ela sopra na orelha do filósofo a palavra: Impossível. Impossível, mesmo quando os fatos e as razões parecem convidar a crer que isto não é possível, real e certo. Impossível, porque certa experiência, talvez confusa, mas decisiva, te diz por minha voz que ela é incompatível com os fatos que se alegam e as razões que se dão, e que, por isso, estes fatos devem ter sido mal observados, estes raciocínios devem ser falsos. Força singular, este poder intuitivo de negação! Não é visível que o primeiro movimento do filósofo, quando seu pensamento está ainda mal assentado e ele não tem nada de definitivo em sua doutrina, é rejeitar certas coisas definitivamente?

Desta forma, é preciso advertir ao leitor que, antes de externar qualquer atitude de negação face à aplicação da intuição na seara jurídica, o agente[6] do Direito deve encarar este tipo de conhecimento sem preconceitos, numa atitude tolerante, e de desmistificação, portanto, estar de olhos e espírito aberto para o novo.

Por outro lado, entende-se que é indispensável enfocar o tema sub examen sob uma perspectiva interdisciplinar[7]. Ou ainda, para cunhar a expressão kantiana[8], é preciso compreender[9] o objeto de nossa investigação com uma “mentalidade alargada” sem, todavia, pretender, neste tempo e espaço, esgotar o riquíssimo tema.

Não se pretende, no entanto, apresentar aqui um discurso conceitual recheado de verdades absolutas sobre o significado[10] e alcance da intuição no campo do Direito.

Pretende-se, tão somente, levar algumas reflexões ao espírito do leitor e a ele ser útil, de alguma maneira, sem, contudo, desmerecer quem pense de forma diferente da nossa.

O presente trabalho não propõe, entretanto, a expressão de uma visão reducionista sobre a matéria, numa visão exclusivamente psicológica[11] sobre a intuição no campo do Direito. Nesse compasso, convém ressaltar que o Direito não se restringe ao mundo psicológico.

Por outro lado, não podemos desconsiderar que na elaboração da decisão judicial, por exemplo, o juiz não está totalmente isento de outros fatores que não exclusivamente racionais, quer sejam eles psíquicos, sociais, econômicos, religiosos, políticos.

É evidente que, no processo de conhecimento do Justo – é o caso da elaboração da sentença judicial – faz-se imprescindível e, portanto, absolutamente necessário ao discurso do juiz, não somente o conhecimento intuitivo do Justo, mas também, a devida fundamentação judicial.

Fundamentação racional essa, fruto do conhecimento mediato do magistrado (discursivo), necessária ao juiz para embasar a própria decisão e demonstrar sua não-arbitrariedade, ex vi, das disposições constitucionais constantes no artigo 93, inciso IX, que assim determinam:

Art. 93: -

Inciso IX - “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.” (...) [12] (g.n.).

A problemática é, de toda sorte, interessantíssima, pois o juiz, ainda no curso do processo poderá ter uma visão intuitiva do direito a ser aplicado, intuição que, a nosso ver, muitas das vezes, pode ser captada de forma emocional.

Mas, como observa Luiz Guilherme Marques[13], as intuições não são, de toda sorte, destituídas de objetividade, isto porque:

São baseadas em valores admitidos pelo meio em que se vive, já que o magistrado imagina primeiro a solução que irá, efetivamente, dar ao caso, mas só depois de encontrada a solução, por esta forma de conhecimento, é que irá procurar dispositivos legais e autoridades doutrinárias ou princípios de direitos para fundamentá-la.

Esse tipo de conhecimento, contudo, conforme bem recorda Marques, foi confessada por juízes da envergadura de Bártolo, Hutcheson, Kent, Cardozo e é aceita como correta por Jerome Frank, Karl Llewellyn, Dualde, Luis Recaséns Siches, Joaquim Dualde[14].

Karl Llewellyn, por exemplo, acredita que, geralmente, a mente do juiz primeiro antecipa a decisão considerada justa e depois procura a norma que pode servir de fundamentação a essa solução, atribuindo aos fatos narrados a qualificação mais apropriada[15].

Como aponta Maria Garcia[16], a intuição é aceita por muitos filósofos, indicando que o conhecimento intuitivo seria o método por excelência de muitos pensadores, desde Platão até os pensadores das Escolas filosóficas do século XX.

Destaca-se, especialmente, as doutrinas da intuição-emocional de Henri Bergson, a filosofia intuicionista-sidética, ou fenomenológica de Husserl e Heidegger, esse último, criador do Existencialismo.

Grande parte dos filósofos hesitou por muito tempo assumir o caráter amoroso do conhecimento. Essa resistência e recusa, geralmente, estão associadas a uma visão preconceituosa do amor, já que a noção de amor sempre esteve ligada à irracionalidade, ao descontrole de si, e a tudo que é contrário à razão. Seria então, como confessar uma fragilidade, uma carência. Contudo, para amar, a sabedoria é indispensável à consciência e percepção de nossa própria ignorância.

Diante disso, comecemos por reavaliar e reconhecer a dimensão amorosa na filosofia, desvendando, assim, nossa ignorância perante a intuição ou, para empregar as palavras de Nunes[17], “retirar o véu e a névoa que a envolvem”...

1.2 Considerações preliminares sobre o conhecimento e a intuição

O homem é um ser que pensa. Parte integrante da ordem do universo, o que o distingue dos demais seres viventes - além da sua específica e notável capacidade de pensar – é, também, sua capacidade de sentir e querer e, em querendo, agir dentro do cosmos e de sua realidade.

Com efeito, como sujeito cognoscente, o homem possui um órgão cognoscente: o pensamento. Como ser que sente, o sujeito cognsocente possui sentimento, e sentindo afetivamente, o homem participa de qualquer ato ou circunstância da realidade. Ainda, como ser dotado de querer, o sujeito cognoscente possui a vontade.

Desta forma, o homem – constituído de corpo e espírito – é um ser dotado de três potências ou forças fundamentais do ser espiritual: o pensamento, o sentimento, e a vontade. Todavia, como ser pensante e racional, o homo sapiens é peregrino na busca do saber e do conhecimento, visando exatamente construir e explicar a realidade que o cerca.

Essa busca pelo saber e pelo conhecimento, sempre se constituiu, entretanto, numa relação. Entende-se que o conhecimento é relação: uma relação entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido. Contudo, nesse relacionamento sujeito-objeto, o sujeito cognoscente ora gira em torno do objeto, ora o objeto gira em torno do sujeito.

Assim, o nosso espírito, para captar sua realidade vivente e a essência[18] das coisas, para conhecer seu próprio mundo, ronda seu objeto, dá voltas, faz idas e vindas em sua mente.

Nesse processo cognitivo de apreensão espiritual do conhecimento, o homem, contudo, poderá ou não se realizar, num único ato, pois o sujeito cognoscente poderá captar o conhecimento de forma imediata ou de forma mediata. De uma única vez, por um ato simples (simplex), ou ainda, poderá realizar inúmeras operações mentais para perceber o objeto do conhecimento.

Essa preocupação constante do homem, a busca pelo conhecimento, entretanto, não é recente. A maioria dos povos da antiguidade desenvolveu formas diversas de conhecimento, não se restringindo, portanto, a uma exclusiva espécie de saber. Entre os egípcios, por exemplo, desenvolveu-se o conhecimento da trigonometria, entre os romanos o da hidráulica, entre os gregos da geometria e o da lógica. Ainda, pode-se citar, entre os indianos, o conhecimento da matemática e entre os árabes o da astronomia.

Quase todos esses povos, entretanto, na busca pelo saber e pelo conhecimento, visavam o atendimento de necessidades práticas e cotidianas (práxis), o que, frequentemente, contribuía para o seu desenvolvimento socioeconômico, político, jurídico e cultural. Entre todos os povos da antiguidade se destacaram, de forma especial, os gregos, cujas preocupações se voltaram para a própria formação do conhecimento, processo este denominado, teoria do conhecimento[19], ou ainda, gnosiologia[20].

Segundo definição de Lalande[21], a teoria do conhecimento é o estudo dos problemas que a relação entre o sujeito cognoscente e o objeto cognoscível levanta, ou ainda, na expressão de André Comte-Sponville[22], entre a relação do “espírito e o mundo”, e ainda, entre a veritas intellectus (verdade do entendimento) e a veritas rei (verdade da coisa).

Hessen[23] adverte, entretanto, que embora a teoria do conhecimento se traduza numa interpretação e numa explicação filosófica do conhecimento humano, faz-se necessário, antes de filosofar sobre um objeto, examiná-lo com atenção. Assim sendo, qualquer explicação ou interpretação deve ser precedida de uma observação e de uma descrição adequada sobre o objeto.

De outro lado, para melhor apreensão da essência do objeto a ser conhecido, o sujeito cognoscente deve voltar-se para o objeto com “olhar penetrante”, com simpatia, e, portanto, com amor.

Aliás, vale ressaltar, neste ponto, que a própria expressão “filosofia” originou-se da associação dos termos gregos philia (amor, amizade) e sophia (sabedoria), significando, então, “amor pela sabedoria”.

Nesse sentido, o próprio filósofo seria alguém constantemente à procura do conhecimento. Porém, neste exercício de filosofar, há um tal envolvimento do sujeito pensante com a vida, com sua realidade, com sua existência[24] e com o mundo que o cerca, que isso se traduz numa entrega, num encantamento[25]. Contudo, desse compasso, é preciso amor...

Por isso mesmo, não podemos resistir à tentação de registrar aqui, nesse sentido, os versos inesquecíveis de Olavo Bilac[26]:

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto,

Que, para ouvi-las, muita vez desperto

E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto

A via láctea, como um pálio aberto,

Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,

Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: Tresloucado amigo!

Que conversas com elas? Que sentido

Tem o que dizem, quando estão contigo?

E vos direi: “Amai para entendê-las!”

Pois só quem ama pode ter ouvido

Capaz de ouvir e de entender estrelas.

Entregar-se ao amor pelo saber ou por alguém, exige, contudo, certa disposição, para vertigem, para perda provisória do autocontrole. Na vertigem corre-se o risco do perigo da queda, abrindo-se, entretanto, a possibilidade de ter prazer com o movimento. Ou, como disse um poeta: Só é capaz de amar quem tem coragem de perder o prumo.

Desta forma, o conhecimento jamais será alcançado sem uma ascese erótica (de Eros, o Deus do Amor), o sujeito pensante, portanto, namora o seu objeto de amor. Portanto é impossível, por tudo isso, não se render ao enlevo que o pensamento produz: uma combinação de emoção e razão, um querer conhecer. E isso só descobre quem ousa exercitar, só sabe o que é o amor quem se dispõe a amar para além de qualquer discurso ou teoria.

Com efeito, é justamente por meio da sensação amorosa que o sujeito experimenta, em relação aos objetos belos com os quais se depara no quotidiano, que o ser pode chegar à contemplação das ideias.

Os gregos sabiam bem disso e empregavam este método no processo de conhecimento de sua realidade. Eles relacionavam o objeto a ser percebido pela consciência, comparavam aos outros objetos, relacionavam, decompunham, esmiuçavam, sintetizavam[27] e apresentavam as suas conclusões. Enfim, teorizavam sobre o conhecimento.

Platão[28], por exemplo, na obra Teeteto enfoca o problema da teoria do conhecimento estruturando, de forma sistemática, a ciência (episteme) em contraste com a mera opinião (doxa). Nesta obra, o personagem - que dá nome ao diálogo - provocado por Sócrates, tenta responder em que consiste o conhecimento (145, e).

Entretanto, além do conhecimento racional e paralelamente ao conhecimento empírico[29] baseado na experiência e voltado ao saber direto do objeto, legado pelos povos do Oriente, Egito e Mesopotâmia, os gregos admitiam outra forma de conhecimento, visando compreender e captar a realidade: o conhecimento intuitivo.

Neste ponto surgem as seguintes questões: afinal, o que vem a ser intuição? O que é o conhecimento intuitivo? Ainda, pode o conhecimento ser, de fato, adquirido mediante a intuição? Não seria a razão o caminho mais adequado para o homem compreender sua realidade e seus fenômenos?

No universo do nosso “mecanismo cinematográfico do pensamento”, para empregar uma expressão de Bergson[30], outras questões vão surgindo em nossa mente. Assim, por exemplo, no campo do Direito, será possível o conhecimento dos fenômenos jurídicos e da percepção do justo mediante o emprego da intuição? Ou, ainda, a intuição é adequada e válida como método no processo de conhecimento e de investigação filosófica do Direito? Quais seus limites de atuação na seara jurídica?

A dúvida razoável também surge no pensamento de Michel Villey[31] que coloca a mesma questão da seguinte forma: Qual será o método, o procedimento pelo quais os juristas atingem a solução jurídica?

Pelo exposto, estas reflexões objetivam, em apertada síntese, apontar e refletir sobre algumas dessas questões.


II – O conhecimento intuitivo

O trabalho supremo do físico é o de desenvolvimento das leis elementares, mais gerais, a partir das quais pode ser deduzida logicamente a imagem do mundo. Porém, não existe um caminho lógico para o descobrimento dessas leis elementares. Existe unicamente a via da intuição, ajudada por um sentido para a ordem que jaz atrás das aparências. Eu penso 99 vezes e nada descubro, deixo de pensar e eis que a verdade me é revelada pela intuição.

Albert Einstein[32]

2.1 Intuição: Origem etimológica

A palavra intuição (grego, ?πιβολ?; inglês, intuition; francês, intuition; alemão anschauung; italiano, intuizione) provêm do latim intueri, que significa “ver em”; ainda intuitus, visão, contemplação; e intuitio que, por sua vez, significa ato de ver, contemplar. Logo, intuição é a visão direta de um objeto que se dá de modo imediato ante nossa consciência, sem nada de permeio, do objeto dentro do sujeito cognoscente[33].

Na acepção etimológica, a intuição significa um conhecimento direto, uma espécie de visão imediata dos objetos e de suas relações com outros objetos da realidade. Nesse sentido, pode-se dizer que a intuição é uma percepção, visão, contemplação, sem a mediação conceitual racional: é o conhecimento imediato e direto de um objeto.

2.2. Intuição: dimensão conotativa

A palavra intuição concentra um significativo conjunto polissêmico, e, portanto, passível de interpretações e usos subjetivos. Para comprovarmos a multiplicidade semântica alocada ao termo “intuição” e, consequentemente, a produção de múltiplas conotações ao espírito do sujeito cognoscente, transcrevemos aqui alguns exemplos colhidos, em sala de aula, por alunos do Curso de Filosofia de Direito da PUC/SP, exemplos estes, citados na clássica obra de Rizzatto Nunes[34].

Assim, vejamos: premonição, adivinhação, magia, pressentimento, agouro, prognóstico, presságio, previsão, predição, prenúncio, vaticínio, antevisão, sensação estranha, visão, visão imediata, caminho sem curso, introspecção, conhecimento direto, sexto sentido, descoberta, consciência, automatismo, instinto, impulso, reação súbita, reflexo, discernimento, sorte, inteligência rara, raciocínio rápido, ideia veloz, apreensão imediata, compreensão, clarão, a fala do espírito, a razão da alma, percepção imperceptível, iluminação da consciência, emoção que atrai, ilusão, inspiração, criação, invenção, uma luz na escuridão, entre outros exemplos.

De todos os termos citados, podemos considerar alguns bem próximos da adequada definição do termo, porém, outros, percebemos que são muito vagos e imprecisos. Daí, a necessidade de um maior aprofundamento sobre o tema.

2.3 Características da intuição

Segundo o Dicionário de Filosofia de J. Ferrater Mora[35], o vocábulo “intuição”, geralmente, designa a visão direta e imediata de uma realidade ou a compreensão direta, imediata e interna de uma verdade. Assim sendo, é possível inferir da definição ora apresentada, uma primeira característica da intuição: é que para sua ocorrência não existam elementos intermediários que se interponham a essa “visão direta”.

Outra característica da intuição é não ser ela uma faculdade do espírito irracional, supra-racional, ou tampouco um dom sobrenatural, privilégio de alguns em detrimento de outros, assim defendido por algumas doutrinas espiritualistas, místicas ou esotéricas.

A intuição é, contudo, uma faculdade que todos os seres humanos, homens ou mulheres, possuem. Corrobora esta assertiva o posicionamento de Bazarian[36], quando assim afirma: “A capacidade intuitiva é um fenômeno natural que todos os homens têm, em maior ou menor grau, conforme certas condições”.

Neste particular, é preciso diferenciar intuição de instinto. Esse último, como aponta Jessy Santos[37] é característico e atributo conferido aos animais irracionais, já que instinto cogita do finalismo biológico, ao passo que a intuição é a espiritualização do conhecimento.

Configura-se assim a terceira característica da intuição: a intuição é um ato do espírito. Uma quarta característica de quem intui é a percepção primeira do próprio “Eu”, da nossa própria consciência individual como ser existencial. Outra característica da intuição é que ela se apresenta como uma importante forma de conhecimento, cujas espécies veremos mais adiante.

Nesse passo, como uma forma de conhecimento, a intuição é o conhecimento imediato da realidade. Sua característica consiste em que, nele o objeto é imediatamente apreendido, como ocorre, por exemplo, na visão[38]. Quando comparo, por exemplo, o verde e o amarelo e expresso um juízo “verde e amarelo são diferentes”, esse juízo baseia-se claramente numa intuição espiritual imediata.

A intuição acentua o aspecto imediato do conhecimento ou o caráter auto-evidente de certas ideias. Segundo afirma Hessen[39], é também numa intuição espiritual imediata que se baseiam os juízos que temos das leis da lógica do pensamento.

Por outro lado, o conhecimento racional é um conhecimento mediato, discursivo. No campo da Ciência do Direito, o racionalismo marca forte presença, não obstante as inúmeras as críticas apontadas contra uma pretensiosa atitude filosófica frente ao conhecimento, pois que parte da razão, mas nela se limita.

Segundo indica o estimado Professor Armando Câmara, o racionalismo, como postura filosófica frente ao conhecimento, entende que só é valioso o conhecimento que se origina exclusivamente na razão. Para os racionalistas somente o conhecimento racional é universal e necessário e, portanto, apresenta valor científico. Para Hugo Grócio, por exemplo, as verdades constitutivas do Direito Natural, são obras da razão humana.

2. 4. O conceito de intuição na doutrina

Platão[40] foi o primeiro filósofo a desenvolver uma teoria sobre o mundo utilizando-se da intuição, num sentido restrito, como forma de pensamento superior, entendendo-a como sendo “um olhar espiritual”, pois segundo Platão, as ideias imediatamente percebidas pela razão são vistas espiritualmente.

 Com efeito, a sua Teoria das formas, é um exemplo disso, e revela uma tentativa de fundamentar um conhecimento verdadeiro, além do mundo fugaz dos fenômenos.

Plotino[41] – considerado o renovador do platonismo – também reconhece outra forma de visão que não puramente intelectual. Em seu tratado “Da contemplação”, descreve uma contemplação sublime do divino: a de uma intuição imediata do uno embebido em elementos emocionais. Plotino apresenta, entretanto, uma visão mística de Deus, da qual tomam parte não somente o entendimento, mas também a capacidade humana de sentimento.

Aristóteles admite a intuição dizendo que o intelecto alude imediatamente à essência. Porém, enquanto Platão inclinou-se a destacar o valor supremo do pensar intuitivo (ν?ησις), e a destacar o pensar discursivo (δι?νοια) como auxílio para alcançá-lo, Aristóteles, procura estabelecer um equilíbrio entre essas duas formas do conhecimento.

Santo Agostinho[42], cuja teoria do conhecimento é influenciada por Plotino, fala também de uma “visão do inteligível”, no seio da verdade imutável ou numa visão dessa própria verdade, embora entenda que se trata de uma intuição puramente racional.

Santo Agostinho reconhece um nível superior da visão de Deus. Mediante a experiência religiosa, vêmo-la de “modo imediato” e o seu processo de conhecimento é, também, emocional.

Os Escolásticos[43] reconhecem, porém, um conhecimento de tipo racional-discursivo, defendendo, todavia, um posicionamento especial quanto à intuição religiosa.

Para Descartes, a intuição é um ato único, simplex, ao contrário do discurso, que consiste em uma série de atos. Segundo Descartes, são dois os atos do entendimento que nos permitem conhecer as coisas sem receio de errar: a intuição e a dedução.

Por intuição Descartes entende: “não o testemunho instável dos sentidos, nem o juízo enganoso da imaginação que produz composições sem valor, mas uma representação, que é assunto da inteligência pura e atenta, representação tão fácil e distinta que não subsiste nenhuma dúvida sobre o que se compreende nela, ou ainda, - o que é o mesmo - uma representação inacessível à dúvida, que nasce apenas da luz da razão e, por ser mais simples que a dedução, é ainda mais exata que ela. A intuição implica certo movimento do nosso espírito compreendido em um único momento”. (loc. cit. Regulae, III).

Desta forma, encontramos no “cogito, ergo sum” de Descartes, o reconhecimento da intuição enquanto forma autônoma de conhecimento, uma intuição imediata de si.

Em Pascal, também, deparamo-nos com um reconhecimento da intuição como fonte autônoma na sentença “Le coeur a ses raisons, que la raison ne connaît pas”, portanto, o reconhecimento de um conhecimento emocional. A intuição é também, segundo Pascal, uma virtude de ver os problemas “d' un seul regard”.

Locke diferencia o conhecimento intuitivo e o demonstrativo, defendendo que o segundo é mais imperfeito que o primeiro (Essay, IV, i, 9). No conhecimento intuitivo a “mente percebe o acordo ou desacordo, entre ideias, imediatamente, por si mesmas, sem nenhuma intervenção de outra” (Ob. cit, IV, ii, 1). Não há lugar, segundo Locke, para vacilações no conhecimento intuitivo. Dele, “depende toda a certeza e evidência de nosso conhecimento” (loc. cit.).

Kant, embora tenha empregado o termo intuição (Anschauung) em vários sentidos: intuição intelectual, intuição empírica, intuição pura rejeita a intuição intelectual, por meio da qual se possa conhecer diretamente certas realidades que se encontram fora da experiência possível.

O filósofo de Könisberg entende que a intuição, assim como o conceito, é elemento de todo nosso conhecimento (Crítica da Razão Pura, A 50/B74; B 75/ A 51). Mas, para Kant, no entanto, a intuição não basta para o juízo, pois o segundo o entendimento de Kant, sobre a teoria do conhecimento, “os pensamentos sem conteúdo são vazios; as intuições sem conceitos são cegas”.

Kant fala, ainda, no tempo e no espaço[44] como condições a priori da sensibilidade. Mediante essas formas é possível unificar as sensações e constituir percepções que necessitam de conceitos, os quais são produzidos pelo entendimento. Neste diapasão, para Kant só há o conhecimento racional-discursivo.

De outra forma entende Hutcheson, segundo o qual nossos juízos de valor(,) não se baseiam na reflexão e sim na intuição. O valor ou a falta de valor ético de uma ação não é conhecido pela aplicação de um padrão universal ou de uma norma superior de costume, mas de modo imediato e intuitivo.

Poincaré, dizia, com referência à matemática: “demonstra-se com a lógica, mas só se inventa com a intuição. A faculdade que nos ensina a ver é a intuição. Sem ela, o geômetra seria como o escritor bom de gramática, mas vazio de ideias” (Science et méthode, 1909, p. 137).

 Passando ao século XX, encontramos a intuição desempenhando um papel importante no idealismo alemão. Se Kant, como apontamos, só conhecia uma intuição sensível, rejeitando a intuição supra-sensível (intelectual), Fichte, seu sucessor, pensava diferente. Segundo Fichte, há uma intuição espiritual, intelectual, ela é o órgão por meio do qual o “Eu absoluto” conhece a si mesmo e suas ações. Para Fichte, a intuição apresenta um caráter volitivo.

No mesmo sentido de Fichte, também em Schelling a intuição descobre o absoluto mediante o conhecimento de um sujeito que se põe a si mesmo como objeto do “Eu” puro que é a absoluta liberdade.

Schopenhauer concorda com Kant, cujo pensamento é de que nosso entendimento, e, portanto, nosso conhecimento racional-discursivo, está aprisionado nos limites do fenomênico, mas esse conhecimento existe. Schopenhauer apresenta, entretanto, diferentemente de Kant, uma visão espiritual da intuição, já que é por meio dela que apreendemos a essência das coisas.

No neokantismo, sobretudo para a Escola de Marburg[45], especialmente com H. Cohen, a intuição é rejeitada. Segundo Cohen[46], a intuição é um embuste, personificando a própria contradição ao pensamento científico, não podendo, de forma alguma, ser considerada como método científico para se chegar ao conhecimento.

A Escola de Baden[47] defende o mesmo posicionamento contrário à intuição como instrumento metódico e, portanto, válido para o conhecimento.

Um posicionamento contrário à aplicação da intuição como forma de conhecimento da realidade é encontrado em alguns filósofos do realismo crítico. É o caso, v.g., de J. Geyser, que neste sentido afirma:

Eu me posiciono com as maiores reservas frente à intuição como fonte de conhecimento, pois esse conceito não é de maneira alguma unívoco nem está clara e distintamente definido para os que vivem falando em intuição e vêem nela a verdadeira fonte de conhecimento e de luz para o nosso espírito [48].

Diferentemente de J. Geysen, Messer, representante do realismo crítico[49], aceita a intuição, especialmente no campo dos valores[50]. Segundo ele, não somente os valores estéticos, mas também os valores éticos são apreendidos de maneira imediata e intuitiva.

Para Edmond Husserl a intuição (Anschauung) pode ser individual, mas essa intuição pode se transformar – não empiricamente, mas como “possibilidade essencial” – em uma visão essencial (Wesenserschauung).

O objeto dessa última é uma pura essência ou eidos desde as mais elevadas categorias até o mais concreto. Assim a visão essencial (intuitiva) capta uma pura essência, que é dada a essa intuição. A intuição categorial é, para Husserl, a intuição de certos conteúdos não sensíveis, tais como estruturas ou números.

Johannes Hessen entende que a intuição é uma espécie de conhecimento, produto de uma visão espiritual. É uma captação imediata do objeto. É um conhecimento imediato diferentemente do conhecimento discursivo. Segundo Hessen, o homem é dotado de um “intelectus infinitus”.

Max Scheler, por seu turno, acredita numa intuição como percepção imediata e essencialmente emocional que descobre valores. Segundo Scheler, valores são essências, isto é, entidades auto-existentes que são emocionalmente intuídas”.

Pela emoção e razão nós discernimos os valores de modo tão objetivo e direto quanto nós percebemos o mundo através da percepção sensorial, também entendendo assim N. Hartmann, Meinong, Urban e outros.

Contrariamente a Kant, que é um racionalista, Scheler enfatiza e acentua no homem a esfera emocional de seu espírito. Scheler, em contraste com os valores formais kantianos, [51] sustenta um conhecimento intuitivo-emocional dos valores, uma percepção afetiva na sua forma de apreensão, já que essa percepção afetiva dos valores se realiza em atos emocional-cognoscitivos.

Compartilha-se do pensamento deste fecundo filósofo alemão, quando afirma que o homem se difere dos animais, não somente pela inteligência, pela capacidade de escolha, mas também pela vontade, e pela emoção[52].

Scheler[53] sustenta que ao lado da intuição racional, há uma intuição emocional, vendo nela o órgão para o conhecimento dos valores. Os valores são apreendidos imediatamente por nosso espírito do mesmo modo que as cores são apreendidas pelos olhos.

Scheler caracteriza essa forma de conhecimento como um “sentir intencional”, em que os valores iluminam-se para nós. O mesmo se dá no campo religioso, pois segundo Scheler, também Deus é intuitivamente conhecido.

Ainda, segundo Scheler, a essência do homem, encontra-se muito além do que se denomina inteligência e vontade (capacidade de escolha), também se encontra na intuição, e numa determinada classe de atos emocionais, tais como: a bondade, o remorso, a veneração, a ferida espiritual, a bem aventurança e o desespero, a decisão livre, ou seja, numa única palavra: no “espírito”.

Scheler nos adverte, contudo, que é preciso “coragem para o homem desenvolver essas capacidades de conhecimento” – aproveitando, ao mesmo tempo, os ricos tesouros de saber singular, conquistados através do trabalho das diversas ciências do homem – uma nova forma de sua autoconsciência e de sua auto-intuição”.

Em síntese, é preciso se conhecer! É a velha máxima socrática: “conhece-te a si mesmo”!

2.5. O intuicionismo

O intuicionismo indica a doutrina ou atitude filosófica que tem como base em comum o recurso ao conhecimento intuitivo, atribuindo-se à intuição um lugar privilegiado no conhecimento.

O intuicionismo acentua o aspecto imediato do conhecimento ou ainda o caráter auto-evidente de certas ideias. Assim, sugere uma resposta integral do conhecedor, à integralidade das coisas.

O intuicionismo ensina o caráter inseparável do conhecedor e da coisa conhecida, sustentando que os objetos e os conhecedores pertençam um ao outro, portanto, eles são um.

Segundo aponta Hunnex[54] são formas de intuicionismo:

O Platonismo: a intuição ou percepção (noesis) é o objeto do filósofo. O conhecedor apreende a realidade como um todo em termos das ideias e especialmente em termos da mais elevada e abrangente ideia do bem.

O Bergsonismo: essa forma de intuicionismo considera a intuição como a fonte superior do conhecimento, porque coloca o conhecedor em relação de identidade e simpatia inteligente com o objeto conhecido.

O Cartesianismo: Essa forma de racionalismo ensina a capacidade da mente de intuir ideias inatas. Descartes afirma, por exemplo, que todo o conhecimento pode ser deduzido de ideias claras e auto-evidentes por intuição. Spinoza fez da intuição o alvo do conhecimento, como uma visão da realidade sub specie aeternitatis, na perspectiva da eternidade.

Aborda-se aqui, no entanto, o Intuicionismo de Henri Bergson, que entende a intuição como o órgão e método próprio da filosofia, já que Bergson[55] faz da intuição um verdadeiro método de investigação filosófica ao encontro do conhecimento.

Segundo Bergson, a intuição é uma “simpatia intelectual” através da qual nos transportamos para o interior do objeto, para coincidir com o que ele tem de único.

Entende Bergson que o intelecto não é capaz de penetrar a essência das coisas, é capaz apenas de apreender a forma matemática e mecânica da realidade, nunca seu núcleo e conteúdo íntimos. Somente a intuição é capaz disso.

Na intuição apreendemos a realidade a “partir de dentro, penetramos a intimidade da vida, entramos em contato com o núcleo e o centro das coisas e, respiramos um pouco desse oceano da vida”.

A intuição, no diapasão bergsoniano, seria, portanto, a chave para a metafísica. O que se distingue no pensamento deste grande filósofo francês, para além de seu intuicionismo, é sua penetrante vida espiritual.

Charles Péguy, corroborando essa afirmação, refere-se a Bergson como sendo “o homem que reintroduziu a vida espiritual no mundo”.

Em conferência proferida em 1911, sobre a Intuição Filosófica[56], Henri Bergson faz menção à metáfora de uma imagem para que o leitor pudesse se compreender um filosófo. Esta imagem, segundo Bergson estaria exatamente entre a “simplicidade da intuição concreta e a complexidade das abstrações que a traduzem”.

A explicação do real estaria, assim, contida num ato simples do espírito, numa imagem simples, infinitamente simples, tão extraordinariamente simples que o filósofo nunca conseguiu dizer "[57].

É desta forma que ele introduz a revelação da intuição. A intuição é um ato simplex, é uma “imagem”[58], movimento, tempo, duração. É um ato do espírito no seu esforço para introduzir-se na consciência. Ela, entretanto, nos mostra uma ligação entre o corpo e o espírito[59], ligação entre presente e passado.

Para Bergson a intuição, contudo, consegue operar lembranças por similitude e continuidade da memória, dentro da duração, isto é, fora do tempo e do espaço. É o que ele denomina de “intuição de duração”, uma intuição que permite ao homem colocar-se na mobilidade, de se aproximar da própria subjetividade, pois na intuição o homem pode ver-se por completo.

A intuição para Bergson é, portanto, a única forma de atingir o “absoluto”. Pela intuição o espírito do homem se coloca em contato com o mundo interior e exterior, numa conexão completa entre o indivíduo e o mundo.

Bergson parte da ideia de que é preciso reconciliar a filosofia com a vida e fazer a percepção das coisas prevalecerem sobre a conceitualização, sem, entretanto, renunciar a esta última. A duração da intuição se revela no ato de tomarmos consciência dela, em nós mesmos.

Em apertada síntese, a teoria do conhecimento de Bergson decorre das seguintes premissas:

a) A natureza do objeto a ser conhecido é que determina a maneira específica de conhecer, e esta pode ser intuitiva ou discursiva; b) A gnosiologia está na dependência da ontologia: do ser, que é duração.

A vida, segundo Bergson, adapta-se a outra forma de inteligência, por consistir em ver o “interior” das coisas, em via de fazer-se. Assim, enquanto a inteligência gira em torno de seu objeto, enquanto assume “de fora o maior número possível de perspectivas sobre esse objeto que atrai para si” a intuição, naturalmente em consonância com o próprio movimento da vida, esforça-se por entrar em seu objeto e afinar-se com ele a ponto de “coincidir com aquilo que ele tem de único e, consequentemente, de inexprimível”.

A função da intuição, segundo aponta o bergsonismo é desenvolver em reflexão “aquilo que resta de instintivo no homem”. Por isso, segundo Bergson, a intuição está apta a “abarcar a vida de modo cada vez mais completo”.

Entende-se assim, das leituras de Henri Bergson, que este filósofo, combate um racionalismo e um intelectualismo[60] cego e avesso à realidade e à riqueza da vida e do espírito, propondo assim que uma teoria do conhecimento não pode se distanciar da vida.

2.6. Espécies de intuição

Na história da filosofia encontramos inúmeras classificações de espécies de intuição. Contudo, nos restringiremos a fazer menção a duas classificações mais usuais.

Em sentido amplo, encontramos em Jacob Bazarian[61], as espécies de intuição, segundo os objetos captados por ela, são:

2.6.1. Intuição empírica, que capta diretamente, pelos sentidos e pela consciência, os fatos sensíveis e os fenômenos das coisas, mas não suas essências. São assim tipos de intuição empírica:

2.6.1.1. Intuição sensível – que capta pelos sentidos os fatos físicos: as formas, cores. Citando como exemplo, a percepção que temos das qualidades de uma laranja como um todo: a forma, a cor, o cheiro, o gosto.

A intuição sensível é, contudo, a base de todo conhecimento empírico, tem caráter pessoal e intransferível e é a primeira via de acesso ao real[62].

2.6.1.2. Intuição psicológica – que capta pela consciência os fatos ou fenômenos psíquicos: o desejo, a alegria, a tristeza. São assim sinônimos de intuição empírica: sensação, percepção, representação, imaginação, visão, consciência.

2.6.2. Intuição intelectual – que capta diretamente pela razão não somente os fenômenos, mas também os conteúdos não-sensíveis, as essências, das coisas e suas relações entre si. São tipos de intuição intelectual:

2.6.2.1. Intuição racional – que capta pela razão de evidência as relações de semelhança, igualdade, sucessão, conseqüência, os princípios lógicos e racionais, os axiomas. É, assim, uma visão sintética, global, holística do conjunto. Exemplo: Duas quantidades iguais a uma terceira são iguais entre si. São, ainda, sinônimos de intuição racional: intuição retrospectiva, recapituladora, sintética.

 2.6.2.2. Intuição heurística e/ou criativa – que capta, descobre ou adivinha as relações ocultas, que não são percebidas explícita e conscientemente e que, por isso mesmo, não poderiam ser estabelecidas racionalmente senão por complexas operações discursivas. Por exemplo: a hipótese científica, a intuição do médico fazendo um diagnóstico imediato com base em alguns dados elementares.

Saliente-se que grande parte das descobertas científicas e criações no campo das artes devem-se ao papel da intuição criativa. De fato, a intuição heurística ocorre toda vez que o sujeito está preocupado em resolver algum problema.

Desta forma, esta espécie de intuição possibilita a descoberta como um “salto”, um estalo repentino, resolvendo de uma vez a busca em que o sujeito estava empenhado. Exemplo clássico é o da “Eureka” de Arquimedes. São sinônimos de intuição criativa: intuição descobridora, inventiva, antecipadora, prospectiva.

 2.6.2.3. Intuição filosófica – que capta pela razão a essência e a existência das coisas reais, bem como os valores éticos, estéticos, emocionais. Conforme o objeto captado, pode-se distinguir:

2.6.2.3 a) Intuição essencial ou eidética (eidos = essência) (Platão, Husserl);

2.6.2.3 b) Intuição existencial ou volitiva (Heidegger, Sartre);

 2.6.2.3 c) Intuição essencial e existencial simultaneamente (Bergson);

2.6.2.3 d) Intuição axiológica ou intuição de valores: éticos (morais), estéticos (artísticos), emocionais (sentimentos).

Registre-se que a intuição axiológica, de valores é especialmente importante, no campo de estudo do Direito, sobretudo para a apreensão do Justo. Para grande número de pensadores existem aspectos do real que somente podem ser captados por vias emocionais – o mundo dos valores, considerado inatingível por atos exclusivamente da razão.

Na intuição axiológica, os valores do Belo, do Verdadeiro, ou do Justo somente seriam captáveis pela experiência da emoção, num contato direto do ser humano com uma ordem sentimental, já que somente a pessoa humana é o único ser que tem aptidão para captar valores.

Com efeito, dessa participação humana na aferição dos valores, pode-se apreender a importância da experiência intuitiva axiológica, no trabalho do advogado, do jurista, do jusfilósofo e, especialmente, do juiz.

2.6.3. Intuição metafísica – também chamada mística ou religiosa, que captaria diretamente e de modo infalível, sem auxílio de conhecimentos empíricos e racionais, por meio de uma contemplação espiritual, a verdade absoluta, a essência das coisas atemporais, transcendentais, tais como a essência de Deus, imortalidade da alma.

Na teologia medieval, a intuição era considerada um conhecimento sobrenatural, obtido pela graça divina. Contudo, não nos ocuparemos desta espécie, pois transcende o objeto de nosso estudo.

Em sentido estrito, apontamos a classificação das espécies de intuição apontada por Johannes Hessen[63], na sua obra “Teoria do Conhecimento” em que distingue 3 (três) espécies de intuição, relacionando-as com as três forças fundamentais do ser humano (pensamento, sentimento e vontade), a saber: a) intuição racional; b) intuição emocional; c) intuição volitiva.

Essa classificação corresponderia à estrutura do objeto a ser conhecido na sua essência, existência e valor. Segundo Johannes Hessen haveria um modo de conhecimento adequado para cada estrutura do objeto a ser apreendido.

Concluímos daí que poderia se falar em uma intuição da essência (racional), uma intuição da existência (volitiva) e uma intuição do valor (emocional).

Armando Câmara[64] entende, de forma restrita, que somente existem duas espécies fundamentais de intuição: a) intuição sensorial; b) intuição intelectual, conforme o tipo de ser, a forma de saber e o modo de ser, objeto da apreensão.

2.7. Quadro sinótico das espécies de intuição:

De forma esquemática o Prof. André Franco Montoro[65] designa a intuição como sendo uma modalidade de conhecimento imediato e direto, e apresenta as seguintes espécies:

 Intuição → Sensível

 → Espiritual → Formal

 → Material → Racional (Da essência)

 → Emocional (Do valor)

 → Volitiva (Da existência)

2.8 O funcionamento da intuição e seus fundamentos: percepção, imagem e inteligência.

Bergson entende que a intuição é um ato do espírito, um ato simples. Entretanto, ousamos discordar de tal posicionamento. Pois, entendemos que o processo de funcionamento da intuição se dá no homem de uma forma bastante complexa, embora sua duração seja realizada em nosso espírito num infinitesimal espaço de tempo.

Muito embora seja difícil descrever em palavras, exatamente, como a intuição funciona – pois, quando se pretende transmitir em palavras ou expressar essa intuição, ela se decompõe e se deforma na pobreza dos conceitos, já que ela é uma operação do nosso espírito – tentaremos descrever aqui, este especial e importante processo cognoscitivo do homem.

Para compreender o fenômeno natural da intuição, é preciso registrar que seu funcionamento se dá a partir de seus próprios fundamentos, que são: percepção, imagem e memória. Alguns filósofos entendem que são, também, fundamentos da intuição: inteligência, vontade e emoção.

A primeira etapa deste processo se dá com a percepção. Nossas percepções, contudo, são frutos das impressões causadas pelos objetos do mundo existente sobre este específico órgão sensorial. Por sua vez, a percepção, como órgão sensorial, é formada pelo tato, olfato, paladar, visão e audição. No processo da intuição, nosso espírito e mente recebem as impressões através da percepção do dado existente, ou seja, do objeto real.

Entretanto, é bom que se diga que este processo também ocorre quando tentamos compreender e perceber o Ser “Justo”, no campo dos fenômenos jurídicos, já que este é o objeto do conhecimento dos que lidam com o Direito.

Corrobora esta afirmação o posicionamento de Maria Garcia[66] quando diz que: “pode-se apreender a importância da experiência intuitivo-axiológica no trabalho do juiz, do advogado, do jurado, do jurista e do jusfilósofo, enfim de todos os partícipes do mundo da Ciência do Direito, em caráter especial”.

Após a percepção do objeto, do dado existente, uma imagem, é produzida em nossa consciência, interiormente, dentro do nosso ser. Segundo aponta Goffredo Telles Jr.[67], a imagem formada no nosso íntimo é “o sinal pelo qual e no qual a consciência atinge um objeto sensível ausente”, objeto que o sujeito quer conhecer.

Depois desta etapa, essa imagem do ser real é conferida à nossa inteligência que após apreendê-la, começa a trabalhar com ela, na tentativa de descobrimento de sua essência, que é a captação do universal (o geral).

Neste ponto, é preciso dizer que durante a etapa de encaminhamento da imagem → inteligência, ocorre em nossa mente a abstração (do latim abtrahere = tirar, separar mentalmente). Ou seja, neste ato de descoberta intuitiva durante, o processo cognitivo, nosso intelecto deixa de lado as particularidades do objeto, preocupando-se tão somente com as características universais do objeto estudado. O universal do ser conhecido configura-se, por evidência, a essência daquele ser.

Goffredo Telles Jr.[68] indica que este ato, nesta etapa do processo de funcionamento da intuição é, assim, “o ato de descobrir o que é sempre o mesmo em coisas diversas, deixando de lado os caracteres singulares, pois que a abstração leva a inteligência ao mundo dos universais”.

Logo, percebemos que durante essa etapa, a mente leva à imagem as características universais do objeto estudado propiciando, desta maneira, à inteligência conseguir “ver”, “visualizar” o geral, e, portanto, o universal. Melhor dizendo, a essência do objeto.

Esse é, em suma, o funcionamento da intuição mediante seus fundamentos: percepção, imagem, inteligência. A ideia formada do ser real é resultado da abstração do nosso ser. A ideia do ser, nesse processo cognitivo, é geral e universal.

Na tentativa de desmistificar o funcionamento da intuição elaborado pelo nosso espírito, Bazarian[69] afirma que o “fundamento filosófico material dessa capacidade intuitiva de penetrar no íntimo das coisas e captar sua essência reside, no fato de que nós também somos feitos da mesma substância e dos mesmos elementos da natureza”. O ser humano é a natureza consciente de si mesmo.

Ainda segundo Bazarian, nós somos produto da longa evolução da substância cósmica, eterna e infinita, embora sejamos um produto superior e diferente do pó cósmico. E, justamente, por não sermos estranhos à natureza, é que nossa mente (nosso pensamento) e nosso espírito podem refletir corretamente os fenômenos, os objetos e as leis que os regem. O pensamento (ideias) e o ser (as coisas) concordam assim, plenamente, pois a ordem e a conexão das ideias são a mesma que a ordem e a conexão das coisas.


 III – A intuição e o conhecimento do Direito

Para sentir a vida, vivê-la em sua plenitude concreta, vive-la nela mesma, por dentro de nós, ao invés de tê-la passado por nós, é necessário nos tomar por nós mesmos, por dentro, pelo interior, sentindo o correr contínuo da duração do real a qual pertencemos, aspirando, encontrando e respirando, enfim nosso próprio EU. Ora esse EU, nosso espírito que domina ao centro nossa personalidade, nos torna pessoa, que aflui no mundo, revelando-se pelo corpo na convivência com todos os demais corpos (e espíritos). Nesse convívio reinam os objetos, os valores, as normas, o direito. Seria possível atingir alguma essência: do EU que fosse? Do espírito? Do próprio corpo? Dos objetos, valores, normas? Do Direito? Seria possível atingir alguma consciência, que se desse como um movimento do espírito sobre o mundo? Talvez pela intuição. A intuição parece-nos apontar para a possibilidade não só da descoberta da vida do espírito, mas também para elementos fundamentais da experiência científica e filosófica e, em particular – o que nos interessa -, da ciência do Direito e da Filosofia do Direito.

Luiz Antônio Rizzatto Nunes[70]

3.1 A intuição como método no Direito

Entende-se como método o caminho a ser percorrido para a aquisição do conhecimento.

O método constitui-se a maneira de apreensão do real, ou de outro modo, o iter pelo qual o sujeito cognoscente chegou a determinado resultado, mesmo quando esse caminho não foi previamente fixado de uma maneira premeditada e refletida.

O método é, ainda, a maneira pela qual se ordenou à ação do espírito sobre um mesmo assunto, as diversas ideias, diversos juízos, diversos raciocínios. O método, portanto, dispõe esses dados da maneira mais adequada para conhecer o todo.

Segundo aponta Maria Helena Diniz[71], o método pode ser:

a) discursivo – quando o espírito marcha por etapas mediante um procedimento escalonado de verificações e inferências mediatas ou indiretas (p. ex; o dedutivo e o indutivo)

b) intuitivo – quando a apreensão do objeto se efetua de modo direto e imediato. Desta maneira, é aquele que consiste numa operação total, única e indivisa do espírito. Que se projeta assim sobre o objeto e o domina abrangendo, com uma só visão, sem que nada se interponha entre o sujeito que conhece e o objeto que se procura conhecer.

No campo da investigação do Direito, contudo, a busca de um ideal lógico-dedutivo que tem como postulados a coerência e a completude do sistema[72] tornou-se infrutífera e insuficiente, uma vez que o Direito não consegue superar a ideia dialética entre Razão e Intuição, ou ainda, Razão e Vontade.

Nesse sentido a crise do positivismo jurídico tem acompanho a crise da própria razão formal como instrumento metodológico para a compreensão do Direito. No entanto, a Filosofia do Direito talvez possa acarretar como a via do conhecimento intuitivo, um olhar diferente, ou talvez um novo caminho de completude para a compreensão do Justo.

3.2 O conhecimento intuitivo do Justo

No campo do Direito, assim, como a norma, também o Justo, são Seres que pertencem como objetos do real, ao mundo existencial. Logo, podemos afirmar que:

O Direito é um Ser, o Justo é um ser. São seres, que, assim como a norma jurídica, podem ser conhecidos pelo sujeito cognsocente. São seres, portanto, perceptíveis racionalmente. Ou, de outro modo, e discordando de Kant, entendemos que o Direito e a Justiça são seres cognoscíveis. Esses seres são, todavia, como objetos existenciais, passíveis de matéria para a produção do conhecimento.

 Colocadas essas premissas conceituais, resta-nos saber se nós, investigadores do Direito, podemos, para melhor alcançar o conhecimento do ser Direito e do ser Justo, empreender somente o caminho do método discursivo. Ou, será que é possível a apreensão desses seres mediante a investigação que trilha também o caminho do método intuitivo?

No campo jurídico, percebemos que muitos magistrados aplicam no seu dia a dia, o método intuitivo para elaborar a sentença judicial. Porém, muitos deles têm vergonha de confessar que julgam desta forma, como se essa confissão demonstrasse uma “fragilidade” daquele homem julgador que precisa a todo custo maravilhar-se com a imagem pretensiosa de sua própria racionalidade.

Entende-se, que o homem julgador, não se encontra separado da natureza e da sua própria natureza, pois o homem é dotado de razão, vontade, mas também de emoção. É verdade que existem obstáculos que impedem que o homem perceba de maneira mais sóbria e sem idealizações o que existe típico nele. Todavia, não queremos aqui, construir uma teoria do direito calcada exclusivamente no acento afetivo na elaboração do valor Justo, mas, não podemos nos esquecer que este lado é apenas um aspecto do homem, uma parte essencial da sua natureza. O homem é, – na sua “peculiar posição no cosmos”[73], um ser de múltiplos estratos, e há de encará-los em completude.

Como bem enxerga Scheler[74]:

o homem não se diferencia dos outros entes pelo fato de ser dotado de uma razão ou de uma subjetividade. Ao contrário, sua diferencialidade radical aponta para o afeto que o liga originalmente à totalidade e mobiliza a dinâmica do conhecimento.

 Modernamente, a lógica aristotélica silogística e a atitude filosófica exclusivamente racionalista, segundo a qual só é valioso o conhecimento que se origina exclusivamente na razão, não mais explicam de forma convincente, o ato de julgar.

Luis Recaséns Siches[75] acompanha este modo de pensar intuitivo do magistrado quando afirma que:

A lógica tradicional não serve ao jurista para compreender e interpretar de modo justo os conteúdos das disposições jurídicas; não serve para criar a norma individualizada da sentença judicial ou ainda da decisão administrativa [...]

Realmente o juiz decide por intuição e não por uma inferência ou silogismo dos que se estudam na lógica; decide por uma certeza que se forma de modo direto e não em virtude de um raciocínio [...].

Nessa mesma direção, o famoso juiz Hutcheson[76] confessa que:

depois de haver ponderado minuciosamente sobre todos os dados à sua disposição e haver meditado cuidadosamente sobre eles, deixa que sua imaginação intervenha. Dorme sobre o processo; espera que se lhe apresente uma espécie de premonição, uma suspeita, uma iluminação intuitiva que aclare a conexão entre o problema e a decisão e que indique qual a decisão justa [..] Assim, o magistrado decide por intuição e não por silogismo dos que se estudam na lógica. Decide pela convicção que ocorre de modo direto e não em virtude de um raciocínio. O raciocínio é articulado pelo juiz, que só depois passa a redigir sua sentença. O impulso que motiva sua decisão é um sentido intuitivo do justo e do injusto a respeito do caso particular que tem diante de si. O juiz astuto, depois de haver decidido dessa maneira, põe todas as suas faculdades mentais a postos para justificar aquela intuição diante da própria razão e para afrontar as críticas que possam ser dirigidas a sua sentença.

Seria oportuno que se lembrassem, nesse sentido, as palavras de Armando Câmara: “a intuição está na base de todo discurso, todo discurso começa sempre por uma intuição e termina por outra intuição” [77].

Na elaboração do Justo vista sob a ótica da sentença, o importante, contudo, são as premissas de fato que o juiz aceita, já que os fatos quase nunca chegam ao seu conhecimento tal como de fato aconteceram. Frequentemente, os fatos são distorcidos pelas versões apresentadas nas petições e demais peças processuais pelas partes interessadas.

Ao juiz, na elaboração da sentença judicial, cabe dar aos fatos a qualificação jurídica que lhe proporcionará a adequada indicação da norma jurídica aplicada ao fato. Todavia, não é possível dizer antecipadamente qual seja esta indicação, pois isto dependerá da exegese e a lei não dá nenhum método ao juiz para que ele escolha entre os diversos caminhos de interpretação das leis que são apontados pela doutrina, o que dependerá, entendemos, da sua intuição.

Via de regra, porém, os juízes escondem, disfarçam ou não confessam este modo de conhecimento, justificando seu discurso, na solução do caso concreto, de forma unicamente racional.

3.3 Os limites do emprego da intuição na elaboração das decisões judiciais

No exercício de elaboração intelectual o juiz sistematiza, coordena, une as ideias, as imagens, as percepções. Nesse processo, influencia, obviamente, os órgãos sensoriais e cerebrais do magistrado, influindo, inclusive, a própria personalidade do juiz nas sentenças.

A intuição, neste sentido, é um caminho inicial de investigação de captação do Justo e, muitas vezes, dá resultados preciosos, podendo por isso ser um útil instrumento de justiça. É o resultado de uma voz íntima do juiz, que percebe e capta o justo, imagem que nasce de sua natureza fruto de suas suas experiências, enquanto ser vivente na terra.

É necessário, no entanto, que o juiz analise inteligentemente o processo, averiguando corretamente as circunstâncias, os fatos, a lei, a doutrina, a jurisprudência, a própria sociedade que ele vive para prolatar a decisão. Devendo a intuição ser seguida, assim, pela verificação serena, mediante exame objetivo do que se apurou no decorrer da instrução judicial.

Desta forma, o limite da via intuitiva, como método e instrumento de captação do justo, na elaboração da sentença, deve ser a preocupação do juiz, de registrar racional e, serenamente, com exatidão os fenômenos externos, os fatos que lhe são conferidos, de maneira a obter uma fixação precisa de tudo o que ocorreu no âmbito de seus sentidos.

Isto para evitar que a intuição possa ser produto de enganadora impressão ou mera simpatia ou antipatia pelo réu, gerando um apressado juízo de valores de inocência ou culpabilidade, resultando, ao contrário, no desvalor injusto.

É preciso ainda, e até preliminarmente, que o juiz também se conheça e o faça profundamente, pois suas experiências anteriores, como homem, também podem acarretar injustiças.

É a velha máxima, inscrita pelos Sete Sábios, como epígrafe, no templo de Delfos: “nosce te ipsum”, ou seja: conhece-te a si mesmo.


Conclusões:

O conhecimento humano é problemático, porque o homem é um animal racional homo sapiens, mas também homo demens. Seu modo de percepção do real, não pode ser reduzido somente à pura intelecção dos seres nem à pura sensação dos irracionais, já que o ser humano constitui-se de pensamento, vontade, mas também, de sentimentos.

Os conflitos entre razão e intuição frequentemente preocuparam os pensadores, o que nos permite encontrar na História da Filosofia defensores do primado ora da razão ora da intuição ganhando dimensões, neste último caso, com inúmeros filósofos, dentre eles, Henri Bergson e Max Scheler.

A dimensão do conhecimento intuitivo surge, contudo, como um caminho novo filosófico substancial e imprescindível de investigação do conhecimento no campo do Direito, já que o conhecimento intuitivo constitui-se num possível instrumento para a justiça, desde que, através de posterior exame objetivo, seguido de comprovação e verificação do que se apurou durante a instrução processual e que depende em grande parte do investimento que o julgador faça no conhecimento de si próprio. Contudo, a pretensão do Direito de assimilar critérios científicos; dedutivos e indutivos, têm aplicação limitada no âmbito jurídico, já que nenhuma ciência oferece segurança absoluta no aspecto de certeza de verdade de suas proposições.

Dessa forma, não entende-se que no caminho do conhecimento do Direito haja uma única verdade, uma verdade absoluta. Tão pouco, acreditamos que o conhecimento se dá exclusivamente pela via do racional, como querem crer os racionalistas. Nesse sentido, como advertem os filósofos, “a esfera do saber é enormemente alargada!”. Há, contudo, múltiplos pontos de vista gnosiológicos, muitos outros acessos diferentes ao conhecimento, caminhos que talvez “a própria razão desconheça”.

Por tudo isso, entende-se que a intuição, como forma do conhecimento do valor justo é especialmente importante para o espírito do jurista, já que ela pode ser um novo caminho, uma nova ferramenta metodológica no campo do Direito, na captação e na percepção do Justo.

Isto porque, o juiz decide, não exclusivamente, pela inferência do silogismo, na sentença, mas também, e inicialmente, pela intuição. Decide, pois, por uma certeza inicial que se forma no seu espírito, de modo direto, e não por um raciocínio, ato este posterior no processo cognitivo do julgador.

Por tudo isso, entende-se que a intuição é um caminho metodológico de investigação filosófica no campo do Direito. Certamente, um tipo de conhecimento imediato, importante e complementar, porém, não superior, e não exclusivo no processo cognitivo.

Dessa maneira, admite-se a intuição como forma de conhecimento, não, porém, como exclusiva é única forma de conhecimento do Direito. A fórmula, para o conhecimento do Justo no Direito – se é que ela existe – não deve ser Razão versus Intuição, mas sim, Intuição + Razão, de modo que os conhecimentos se integrem e se complementem. Talvez, pudéssemos apontá-la como sendo um gérmen inicial da descoberta para o conhecimento, uma semente em movimento para a floração do conhecimento, tal qual a natureza, aponta para a descoberta da vida do espírito e do ser vivente.

Não se pode, contudo, negar que na história do pensamento jurídico ocidental um formalismo exagerado, um racionalismo extremista, segundo o qual somente é legítimo e válido o conhecimento que se origina, exclusivamente, na razão.

A própria doutrina clássica do Direito vê ainda hoje, a sentença como um produto de conhecimento racional pela via do silogismo, esquecendo-se que, por baixo da ponte da justiça, passam seres humanos com todas as suas diferenças, misérias, medos e angústias. Nós, homens do Direito, esquecemo-nos, absortos, no sono da razão, que a realidade da natureza humana é colorida, integral e vivaz.

Pensar intuitivamente significa, também, proferir a sentença, no caso do juiz, com mais sentimento, com mais humanidade, não reduzindo o magistrado a um mero burocrata, visto somente como um julgador máquina, um robô repetidor de decisões alheias.

Talvez fosse o caso de refletir-se que, paralelamente, à falácia da “segurança” e “certeza” do Direito, é preciso embasar a verdade jurídica com a realidade social, com a realidade do homem que tem corpo, pensamento, vontade, mas, também, alma e sentimento.

Finalmente, entende-se ser improvável, hodiernamente, alguém de cultura científica falar de uma “única verdade” que abarque tudo, nem tão pouco que abarque verdades exclusivamente oriundas da razão. Pois, cada vez mais, se comprova que os limites do nosso saber, não podem se reduzir a um único ponto de vista, ante todas as novas descobertas no desenvolvimento científico moderno, do microscópio ao telescópio.

De fato, descobrimos que o cosmos aumentou, e vem cada vez aumentando, e alargando consideravelmente nossas perspectivas ante o universo. Sobretudo, face à complexidade do mundo moderno, acreditamos que a expressão “pensar racional” seja insuficiente como instrumento, exclusivo, de compreensão do Direito.

Vamos além, acreditamos, por derradeiro, que é preciso, ademais de um “pensar racional”, de um “pensar intuitivo”, é preciso aos que trabalham com o Direito, um “pensar tolerante”, não no sentido daquele que “tout compendre c'est tout pardonner”, mas daquele que indica a simples sabedoria, a do “pensar amoroso”.

Finalizamos nossas reflexões, propondo-se como método a viabilidade da intuição como forma de conhecimento, embora não exclusiva, no campo gnosiológico da elaboração e aplicação do Direito, em especial, da elaboração da sentença judicial, ainda que me chamem, no caminho, de “tresloucado amigo”.


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Notas

[1]HEINEMANN, Fritz. A Filosofia no século XX. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,1993. p. 297.

[2] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. A intuição e o direito: um novo caminho. Belo Horizonte: Livraria Del Rey Editora, 1997. (Coleção Acesso à Justiça: uma visão do século XX). p. 21-2.

[3] BERGSON, Henri. A intuição filosófica. In: Cartas, Conferências e outros escritos. 1974, p. 61-74.

[4] BERGSON. Idem ibidem.

[5] BERGSON, Henri. Idem, p. 62-3.

[6] Adota-se, aqui, a expressão “agente do direito” e não “operador”, pois entendemos, como o Prof? Paulo Lopo Saraiva, que “operador” seria um termo apto a identificar quem trabalha com máquinas. Segundo Saraiva “quem trabalha com máquinas não é operador, é agente, pois não apenas o manipula como também o transforma, por meio de sua ação.” Apud SANTOS, André Luiz Lopes dos. Ensino Jurídico: uma abordagem político-educacional. Campinas: Edicamp, 2002. [S.l.: s.n.], p. 5. [Nota de rodapé n? 1].

[7] Segundo Hilton Japiassú, a interdisciplinaridade corresponde a uma nova etapa do desenvolvimento do conhecimento científico e de sua divisão epistemológica, exigindo que as disciplinas científicas, em seu processo constante e desejável de interpenetração, fecundem-se cada vez mais reciprocamente. Assim, a interdisciplinaridade é um método de pesquisa e de ensino suscetível de fazer com que duas ou mais disciplinas interajam entre si. Esta interação pode ir da simples comunicação das ideias até a integração mútua dos conceitos, da epistemologia, da terminologia, da metodologia, dos procedimentos, dos dados e da organização da pesquisa. Ela torna possível a complementaridade dos métodos, dos conceitos, das estruturas e dos axiomas sobre os quais se fundam as diversas práticas científicas. O objetivo utópico do método interdisciplinar, diante do desenvolvimento da especialização sem limites das ciências, é a unidade do saber. Unidade problemática, sem dúvida, mas que parece constituir a meta ideal de todo saber que pretende corresponder às exigências fundamentais do progresso humano. JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editor, 1996, p. 145.

[8] KANT, Immanuel. Crítica da Faculdade do Juízo. Trad. Valério Rohen e Antonio Marques, Rio de Janeiro: Forense Universitária. p. 140-1.

[9] O termo “compreensão” envolve inúmeras acepções. Para Goffredo Telles Júnior: “compreender um objeto de conhecimento é saber seu sentido, seu significado, é descobrir o que ele é em si mesmo e em confronto com o que deve ser” TELLES Jr., Goffredo. Palavras do amigo ao estudante de direito: bosquejos extracurriculares, proferidos no escritório do professor em 2002. 2003, p. 138). Para Miguel Reale: “compreendemos um fenômeno quando o envolvemos na totalidade de seus fins, nas suas conexões de sentido. Assim, compreender não é ver as coisas segundo nexos causais, mas é ver as coisas na integralidade de seus sentidos ou de seus fins, segundo conexões vivenciadas valorativamente” (REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 1986, p. 86). Em acréscimo, adverte Emílio Betti: “O propósito básico do jurista não é simplesmente compreender um texto, como faz, por exemplo, o historiador ao estabelecer-lhe o sentido e o movimento no contexto, mas também determinar-lhe a força e o alcance, pondo o texto normativo em presença dos dados atuais de um problema” Apud FERRAZ Jr., Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. 1980. p. 73.

[10] Deve-se salientar, desde o início, que não há como, rigorosamente falando, dizer que existe “um” único significado, ou ainda “o” significado de uma palavra, ou ainda “um” ou “o” único conceito, no caso o conceito de intuição. Quando se faz referência ao significado de uma palavra, refere-se aos elementos significativos que aparecem nos numerosos e variados usos da palavra, tornando-a compreensível e sobre a qual a maioria dos usuários concorda. Da mesma forma, quando se fala sobre “o” conceito de intuição, trata-se de todos os diferentes conceitos daquele objeto que os indivíduos tenham, na medida em que todos coincidam. Cf. WILSON, John. Pensar com conceitos. São Paulo: Martins Fontes. 2001, p.52.

[11] Conforme aponta Lídia Reis de Almeida Prado, foi sob o influxo da Psicanálise, de Dewey e de Bergson que o psicologismo jurídico negou que a elaboração jurídica feita pelos juízes e tribunais seja fundada em qualquer processo racional. Segundo Prado, o psicologismo defende a tese de que tal elaboração consiste num processo intuitivo, comandado por fatores irracionais (sentimento e preconceitos). PRADO, Lídia Reis de Almeida. O Juiz e a emoção. 2003. p. 23. Nota de rodapé n. 20.

[12] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). São Paulo: Saraiva. 2005, p. 78.

[13] MARQUES, Luiz Guilherme. A psicologia do juiz. Disponível em: http://www.apriori.com.br. Acesso em: 14/jan.2010.

[14] MARQUES. Idem, p. 6, n. 1/5.

[15] Apud SICHES, Recaséns Luis. Panorama del Pensamento jurídico en el siglo XX, p. 242, 536, 547.

[16] GARCIA, Maria. Possibilidades e limitações ao emprego da intuição no campo do Direito. In: Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. São Paulo: Revista dos Tribunais. Ano 5, n. 19, abr./jun.1997.

[17] NUNES, Rizzatto. Idem, ibidem.

[18] O termo “essência” e seus sinônimos, “quididade” (quidditas, quid sit res?) e “natureza” (ad quid nata est res?) tem dois sentidos: a) lato – designa tudo o que é um ser é: tudo o que é da natureza, quer seja ou não importante; b) estrito – essência é o que é fundamental num ser, o que lhe constitui a natureza profunda. É nesta acepção que procuramos a essência da norma. Essência é aquilo pelo qual uma coisa é o que é. VAN ACKER, Leonardo. Curso de Filosofia do Direito. Revista da Universidade Católica de São Paulo. n. 34, 65-66: 143, 1968. Na filosofia grega, a essência, no entanto, significa substância (ousia), aquilo que é visível, mas é verdadeiramente real a respeito das coisas – o que pode ser concebido, o que é universal. Em Platão, são as formas ou ideias.

[19] O estudo da Teoria do Conhecimento é chamado epistemologia (do grego episteme, conhecimento + logos, teoria). O termo foi usado pela primeira vez em 1854 por J. F. Ferrier, que distinguiu os dois ramos da filosofia como ontologia (do grego on, ser + logos, teoria) e epistemologia. No entanto, a epistemologia compreende o estudo sistemático da natureza, fontes e validade do conhecimento.

[20] A Gnosiologia, do grego gnosis, conhecimento, e logos, teoria, ciência, também chamada de teoria do conhecimento, tem por objetivo buscar a origem, a natureza, o valor e os limites da faculdade de conhecer. Muitas vezes, porém, o termo gnosiologia é tomado como sinônimo de epistemologia, conquanto, aquele seja mais amplo, pois abrange todo o tipo de conhecimento em sentido mais genérico. (JAPIASSÚ, Hilton. Dicionário Básico de Filosofia. 1996, p.117).

[21] LALANDE, André. Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia. Tradução: Fátima Sá Correia et alli. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 192-3.

[22] COMTE-SPONVILLE, André. Dicionário Filosófico. 2003, p. 122.

[23] HESSEN, Johannes. Teoria do conhecimento. 2003, p. 19.

[24] O termo “existência” é a asserção de que uma coisa é, não o que ela é como conceito de essência. Para o existencialismo, existência é consciência e precede a essência do homem, o qual se vê existindo e então se torna uma essência por escolha e ação.

[25] PAIVA, Vanildo. Filosofia, encantamento e caminho: introdução ao exercício de filosofar, São Paulo: Paulus, 2002. (Coleção Filosofia), p. 8.

[26] BILAC, Olavo. Poesias. São Paulo: Martins Fontes. 2001, p. 53.

[27] Kant define a síntese como “o ato de juntar, umas às outras, diversas representações e conceber o que é múltiplo num só ato” (ato de conhecimento). Diante dessa definição, pode-se entender que, quando a diversidade é representada, a síntese é posta como representação. Assim, a síntese é também base para o conhecimento, que poderá ser reportado a um ato original. Para ela é que se deve dirigir primeiro a atenção. Neste sentido Kant também afirma que a síntese de um múltiplo “é o que dá origem ao conhecimento”. (KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura.Trad. Manuela Pinto dos Santos, Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1980, p. 103). Por outro lado, Gilles Deleuze, ao analisar criticamente o pensamento de Kant, afirma que, “o que constitui o conhecimento não é, simplesmente, o ato pelo qual se faz a síntese do diverso, mas o ato pelo qual se relaciona a um objeto o diverso representado”. (DELEUZE. Gilles. Para ler Kant. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1976, p. 29).

[28] PLATÃO. Teeteto. In: Diálogos. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: EDUFPA, 2001, p. 34-141, 2001.

[29] Segundo o estimado professor de Filosofia do Direito da PUC/SP, Dr. Jacy de Souza Mendonça, este tipo de conhecimento é empírico, exatamente porque foi adquirido e acumulado exclusivamente pela experiência, pela empiria da vida, de maneira mais ou menos caótica, sem nenhum método, distante de qualquer sistema, sem nenhuma análise crítica. (MENDONÇA, Jacy de Souza. Introdução ao Estudo do Direito. 2002, p. 13).

[30] BERGSON, Henri. A evolução criadora. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

[31] VILLEY, Michel. Histoire de la logique juridique. p. 63.

[32] EINSTEIN, Albert. In: Carta escrita por Einstein a Jacques Hadamard, respondendo a um questionário para L' Enseignement Mathematique (Apud GHISELIN, Brewster. The Creative Process. New York: Mentor Book, 1952, p. 43).

[33] Neste sentido, aponta Luiz Recaséns Siches. In: SICHES. Tratado general de filosofia del derecho. p.150.

[34] NUNES, Rizzatto. Manual de Filosofia do Direito. 2004, p. 196.

[35] MORA, J. Ferrater. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Edições Loyola, 2001, tomo II, p. 1550, [verbete intuição].

[36] BAZARIAN, Jacob. Intuição Heurística: uma análise científica da intuição criadora, 1896, p. 42.

[37] SANTOS, Jessy. Instinto, Razão e Intuição. São Paulo: Martins Fontes, 1950, p. 22-3. (Natureza e Espírito, v. VIII).

[38] Em sentido contrário, encontramos na doutrina o posicionamento de Jacob Bazarian que entende que a intuição, no sentido lato, não poderia ser um órgão sensorial (como visão, audição, olfato), como pressupõem muitos filósofos. BAZARIAN, Jacob. Idem, p. 41. De outro lado, encontramos o posicionamento de Johannes Hessen, para quem o conhecimento intuitivo é um conhecimento pelo olhar. HESSEN, Johannes. Teoria do conhecimento. 2003, p. 97.

[39] HESSEN, Johannes. Idem, p. 98.

[40] PLATÃO. Teeteto; Fédon. In: Diálogos. 2001.

[41] PLOTINO (205-270) filósofo neoplatônico. Nascido em Licópolis (Egito). Plotino nos legou ensinamentos em seis livros, de nove capítulos cada, chamados de As Enéadas. Desenvolveu as doutrinas aprendidas de Amônio Saccas numa escola de filosofia junto a seleto grupo de alunos. Pretendia fundar uma cidade chamada Platonópolis, baseada nos ensinamentos de A República de Platão. A influência de Plotino sobre o pensamento cristão, islâmico e judaico, bem como sobre os pensadores do Renascimento, foi enorme. Foram direta ou indiretamente influenciados por ele, Gregório de Nazianzo, Gregório de Nissa, Santo Agostinho, Pseudo-Dionísio, o Areopagita, Boécio, João Escoto Erígena, Alberto Magno, Santo Tomás de Aquino, Dante Alighieri, Mestre Eckhart, Johannes Tauler, Nicolau de Cusa, São João da Cruz, Marsílio Ficino, Pico de la Mirandola, Giordano Bruno, Avicena, Ibn Gabirol, Espinosa, Leibniz, Coleridge, Henri Bergson e Máximo, o Confessor.

[42] Aurélio Agostinho (em latim: Aurelius Augustinus), dito de Hipona, é conhecido como Santo Agostinho (Tagaste, 13 de novembro de 354 - Hipona, 28 de agosto de 430), foi um bispo, escritor, teólogo, filósofo e é um Padre latino e Doutor da Igreja Católica. Agostinho é uma das figuras mais importantes no desenvolvimento do cristianismo no Ocidente. Em seus primeiros anos, Agostinho foi fortemente influenciado pelo maniqueísmo e pelo neoplatonismo de Plotino, mas depois de tornar-se cristão (387), ele desenvolveu a sua própria abordagem sobre filosofia e teologia e uma variedade de métodos e perspectivas diferentes. Ele aprofundou o conceito de pecado original dos padres anteriores e, quando o Império Romano do Ocidente começou a se desintegrar, desenvolveu o conceito de Igreja como a cidade espiritual de Deus (em um livro de mesmo nome), distinta da cidade material do homem. Seu pensamento influenciou profundamente a visão do homem medieval. A Igreja se identificou com o conceito de "Cidade de Deus" de Agostinho, e também a comunidade que era devota de Deus. Na Igreja Católica, e na Igreja Anglicana, é considerado um santo, e um importante Doutor da Igreja, e o patrono da ordem religiosa agostinha. Muitos protestantes, especialmente calvinistas, o consideram como um dos pais teólogos da Reforma Protestante ensinando a salvação e a graça divina. Na Igreja Ortodoxa Oriental ele é louvado, e seu dia festivo é celebrado em 15 de junho, apesar de uma minoria ser da opinião que ele é um herege, principalmente por causa de suas mensagens sobre o que se tornou conhecido como a cláusula filioque. Entre os ortodoxos é chamado de "Agostinho Abençoado", ou "Santo Agostinho o Abençoado”.

[43] A Escolástica é a mais alta expressão da filosofia cristã medieval. Desenvolveu-se a partir do século IX, teve seu apogeu entre o século XIII e início do XIV, entrando em decadência até o surgimento do Renascimento. Chama-se escolástica por ser a filosofia ensinada nas escolas medievais que eram monacais, episcopais ou palatinas. No século XII, entretanto, surgem as universidades, como associações corporativas livres de alunos e professores. (LINHARES, Mônica Tereza Mansur. Autonomia Universitária no Direito Educacional Brasileiro. São Paulo: Segmento, 2005. p. 24). São alguns representantes da escolástica: Boécio, João Escoto Eriúgena, Anselmo de Aosta, Abelardo, Tomás de Aquino, S. Boaventura, João Duns Escoto e Guilherme de Ockham.

[44] O conceito de tempo e espaço em Kant foi abordado durante o seminário sobre o Criticismo, apresentado por nós, no programa de Pós-Graduação em Direito, na PUC/SP, durante o Curso de Filosofia de Direito, ministrado pelo Professor Dr. Jacy de Souza Mendonça. Segundo Kant, o tempo e o espaço não existem fora de nós, são formas de nossa sensibilidade interna ou externa. (KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. A 23/B 38; B41; A 30/B 46; A 33/ B50).

[45] A Escola de Marburg insurgiu-se também contra o materialismo, o relativismo e o psicologismo na busca pela procura de uma base mais sólida para o conhecimento.

[46] H. COHEN. Logik der reinen Erkenntnis. Helmut Holzhey (Hrsg.). Hildesheim/New York: Georg Olms Verlag, 1977.

[47] A Escola de Baden liga-se ao neokantismo. O neokantismo ou neocriticismo é uma corrente filosófica desenvolvida principalmente na Alemanha, a partir de meados do século XIX até os anos 1920. Preconizou o retorno aos princípios de Immanuel Kant, opondo-se ao idealismo objetivo de Georg Wilhelm Friedrich Hegel, então predominante, e a todo tipo de metafísica, mas também se colocava contra o cientificismo positivista e sua visão absoluta da ciência. O neokantismo pretendia portanto recuperar a atividade filosófica como reflexão crítica acerca das condições que tornam válida a atividade cognitiva - principalmente a Ciência, mas também os demais campos do conhecimento - da Moral à Estética. As principais vertentes do neocriticismo alemão foram a Escola de Baden, que tendia a enfatizar a lógica e a ciência, e a Escola de Marburgo, que influenciaram boa parte da filosofia alemã posterior, particularmente o Historicismo e a Fenomenologia). Seus principais representantes são Hermann Cohen, o líder da Escola de Marburgo, Paul Natorp e Ernst Cassirer. É importante salientar, no entanto, que embora a Escola de Baden (ou escola do sudoeste alemão ou escola axiológica) compartilhe com a de Marburgo as ideias fundamentais do kantismo, em muitos aspectos difere dela profunda e essencialmente. Seus sequazes não se orientam tão exclusivamente para as ciências da natureza, mas partem da totalidade da cultura e concentram a atenção no desenvolvimento da mesma e, portanto, na história. É notória neles a influência do historicismo alemão. Por outro lado, segundo eles o ponto crucial do kantismo reside mais na Crítica da Razão Prática do que na Crítica da Razão Pura. O idealismo deles é tão radical como o dos marburgenses, mas não são racionalistas radicais e admitem a existência de um elemento irracional na realidade. O que para eles constitui o fundamento do ser objetivo não são as leis lógicas, mas as leis axiológicas, baseadas em valores. Por isso, a teoria deles é pluralista e revela uma compreensão mais profunda do valor peculiar do fato religioso.

[48] Apud, Johannes Hessen. Teoria do Conhecimento. p. 105.

[49] O realismo crítico atribui um papel essencial à mente na formulação do conhecimento. Ao contrário do objetivismo, ele faz distinção entre os dados sensoriais e os objetos que eles representam (dualismo epistemológico). Mas os objetos ou coisas conhecidas são independentes da mente ou do conhecedor no sentido de que o pensamento se refere a eles – não meramente aos dados sensoriais ou às ideias do conhecedor. Ideias representam objetos.

[50] O estudo da teoria dos valores é a axiologia (do grego axios), de igual valor + logos, teoria). A teoria do valor teve sua origem no debate travado entre Alexius Meinog e Christian von Ehrenfels, na década de 1890, acerca da fonte do valor. Meinog viu a fonte do valor como sentimento, por seu turno Ehrenfels viu a fonte do valor no desejo.

[51] Esse posicionamento encontra-se traçado no livro de Karol Wojtyla, dedicado à obra de Scheler. (WOJTYLA, Karol. Max Scheler e a Ética Cristã. Curitiba: Champagnat, 1993, p. 22).

[52] SCHELER. Da Diferença entre o homem e o animal. In: A Posição do Homem no Cosmos. Trad. Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003 (Coleção Fundamentos do Saber). p. 34-6.

[53] SCHELER. Idem, p. 35.

[54] HUNNEX, Milton. Filósofos e correntes filosóficas. Trad. Alderi S. de Matos, São Paulo: Ed. Vida, 2003.

[55] BERGSON, Henri. Cartas, Conferências e outros Escritos. Trad. Franklin Leopoldo e Silva do original francês Écrits e Paroles, 1974, (Coleção Os Pensadores).

[56] BERGSON, Henri. Cartas, Conferências e outros Escritos. Trad. Franklin Leopoldo e Silva do original francês Écrits e Paroles, 1974. (Os Pensadores).

[57] BERGSON, Idem, ibidem.

[58] Por imagem, Bergson entende uma existência situada entre a “coisa” e a “representação” da coisa, de tal modo que o cérebro também pode ser apresentado como imagem – uma imagem como as outras, envolta pela massa das outras imagens. (BERGSON, In: Matéria e Memória).

[59] BERGSON. Matéria e Memória: ensaio sobre a relação do corpo com o espírito. Trad. Paulo Neves, São Paulo: Martins Fontes, 1999. (Tópicos).

[60] Como aponta o professor Armando Câmara, o intelectualismo afirma que nosso conhecimento começa pela experiência e se completa com a razão – nihil est in intellectu quod prius non fueri in sensibus, aforismo ao qual Leibniz acrescentou nisi ipse intellectus, a não ser o próprio intelecto. A origem de nosso conhecimento, segundo defende o intelectualismo, inicia-se pelos sentidos, mas não fica na experiência do ser. A razão elabora o dado da experiência e gera o conhecimento universal. O conhecimento é assim, uma elaboração racional do dado da experiência. (Apud Jacy de Souza Mendonça. O Curso de filosofia do Direito do Professor Armando Câmara. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor,1999, p. 100-1).

[61] BAZARIAN, Jacob. Intuição heurística: uma análise científica da intuição criadora. São Paulo: Alpha-Ômega,1986.

[62] GARCIA, Maria. Possibilidades e limitações ao emprego da intuição no campo do Direito. p. 113.

[63] HESSEN, Johannes. A Teoria do Conhecimento. Trad. João Vergílio Gallerani Cuter. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

[64] MENDONÇA, Jacy de Souza. O Curso de Filosofia do Direito do Professor Armando Câmara. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999, p. 132.

[65] MONTORO, André Franco. Dados preliminares de lógica jurídica. Apostila de Curso de Pós-Graduação em Direito - PUC/SP, 1994, p. 107.

[66] GARCIA, Maria. Possibilidade e limitações ao emprego da intuição no campo do Direito: considerações para uma interpretação da Constituição, In: Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. Ano 5, n. 19 abr./jun, 1997, p. 115.

[67] TELLES Jr., Goffredo. Filosofia do Direito. São Paulo: Max Limonad, 1966, v. 1, p. 37, 51-3 e 67.

[68] Idem, ibidem.

[69] BAZARIAN, Jacob. Intuição heurística: uma análise científica da intuição criadora, 1986, p. 68.

[70] NUNES, Rizzatto. A intuição e o Direito: um novo caminho, 1997, p. 15.

[71] DINIZ, Maria Helena. Conceito de norma jurídica como problema de essência. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 9-17.

[72] A palavra sistema, do grego systema, tem inúmeros significados. No léxico, indica, dentre outras possibilidades: “Combinação de partes coordenadas para um mesmo resultado, ou de maneira a formar um conjunto. Conjunto de elementos relacionados entre si de modo coerente. Conjunto organizado de princípios coordenados de modo a formar um todo científico ou um corpo de doutrina. Conjunto de procedimentos, de práticas organizadas, destinadas a assegurar uma função definida”. (SISTEMA. In: Grande Dicionário Larousse Cultural da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 832). Para J.J. Canotilho, o sistema é o conjunto de elementos em interação, organizado em totalidade, que reage às interações de tal forma que, quer no âmbito dos elementos constitutivos, quer no âmbito do conjunto, aparecem fenômenos e qualidades novas não reconduzíveis aos elementos isolados ou à sua simples soma. CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1993, p. 45. Ainda, segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr., o conceito de sistema para a Ciência Jurídica, no fim do século XVIII, no jusnaturalismo se resumia na noção de um conjunto de elementos ligados entre si pelas regras de dedução, entendendo-se com isto a unidade das normas a partir de princípios dos quais eram deduzidas. Interpretar o Direito significava então a inserção da norma em tela na totalidade do sistema” (FERRAZ JR., Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. São Paulo: Atlas, 1977. (Coleção Universitária de Ciências Humanas), p.69.) Cf. Id. Conceito de Sistema no Direito: uma investigação histórica a partir da obra jusfilosófica de Emil Lask. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Ed. Revista dos Tribunais, 1976. O Direito, visto como um sistema, também encontra suporte no pensamento de Eros Roberto Grau, quando afirma: “Devemos reconhecer o direito como um sistema, o que o transforma em objeto de um pensar sistemático, e, em especial, permite-nos interpretá-lo no contexto sistemático, ou seja, sistematicamente”. (GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 23).

[73] SCHELER, Max. A Posição do Homem no Cosmos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, p. VIII.

[74] SCHELER, Max. Idem, ibidem.

[75] SICHES, Luis Recaséns. Panorama del pensamento jurídico em siglo XX. Primier Tomo México: Editorial Porrua, 1963. p. 242, (tradução livre nossa). Nueva filosofia de la interpretación y incertidumbre. Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1968.

[76] Apud PRADO, Lídia Reis de Almeida. O Juiz e a emoção: aspectos da lógica da decisão judicial. Campinas: Millennium, 2003, p. 15.

[77] MENDONÇA, Jacy de Souza. O Curso de Filosofia do Direito do professor Armando Câmara. p. 132. 


Autor

  • Mônica Tereza Mansur Linhares

    Mônica Tereza Mansur Linhares

    Doutora em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – IBDC. Avaliadora ad hoc de cursos de Graduação em Direito designada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP/MEC. Professora de Filosofia do Direito do Curso de Graduação Bacharelado em Direito do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU. Professora do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Direito do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU. Advogada na área de Direito Educacional.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LINHARES, Mônica Tereza Mansur. Intuição e o conhecimento do Direito . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3195, 31 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21407. Acesso em: 20 abr. 2024.