Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/30949
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A aplicação da teoria subjetiva no contexto da responsabilidade do Estado

A aplicação da teoria subjetiva no contexto da responsabilidade do Estado

Publicado em . Elaborado em .

O presente trabalho tem o objetivo de discorrer brevemente sobre a aplicação da teoria subjetiva no âmbito da responsabilidade civil do Estado.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o objetivo de discorrer brevemente sobre a aplicação da teoria subjetiva no âmbito da responsabilidade civil do Estado.

2. DESENVOLVIMENTO

Como regra temos que o Estado responde objetivamente pelos danos causados aos administrados, isto é, para a responsabilização da Administração Pública por danos gerados por seu agentes, basta ao lesionado comprovar o dano, a conduta estatal e o nexo causal entre um e outro. Desnecessário, pois, demonstrar a culpa ou o dolo na conduta estatal.

Nas palavras de KIYOSHI HARADA:

A responsabilidade civil do Estado, por atos comissivos ou omissivos de seus agentes, é de natureza objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa. Neste particular, houve uma evolução da responsabilidade civilística, que não prescinde da culpa subjetiva do agente, para a responsabilidade pública, isto é, responsabilidade objetiva. Esta teoria é a única compatível com a posição do Poder Público ante os seus súditos, pois, o Estado dispõe de uma força infinitamente maior que o particular. Aquele, além de privilégios e prerrogativas que o cidadão não possui, dispõe de toda uma infra-estrutura material e pessoal para a movimentação da máquina judiciária e de órgãos que devam atuar na apuração da verdade processual. Se colocasse o cidadão em posição de igualdade com o Estado, em uma relação jurídica processual, evidentemente, haveria um desequilíbrio de tal ordem que comprometeria a correta distribuição da justiça. (Responsabilidade civil do Estado. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 41[1] maio [2000]. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/491>. Acesso em: 30 ago. 2012).

Todavia, ressalte-se que, excepcionalmente, o Direito Administrativo consagra a aplicação da teoria subjetiva na apuração da responsabilidade estatal, notadamente nos casos de dano gerado por omissão do ente público e na responsabilidade do agente público apurado por ação regressiva.

Em caso de omissão, o Estado só pode ser responsabilizado se comprovada sua culpa ou dolo, na medida em que a doutrina e jurisprudência têm aplicado, nessa hipótese, a teoria da responsabilidade subjetiva. Dessa maneira, a vítima, além de comprovar o dano, a conduta omissa e nexo causal entre eles, deverá demonstrar que a não prestação da atividade estatal tendente a evitar o dano suportado pelo particular resultou de culpa ou dolo da Administração.

Confira-se, nesse particular, a lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO:

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser o autor do dano. E se não foi o autor, só pode responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo. Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conseqüências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E sendo responsabilidade por ilícito é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente modalidades de responsabilidade subjetiva. (Curso de Direito Administrativo Brasileiro. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 976-977).

A outra situação em que se verifica a aplicação da teoria subjetiva no contexto da responsabilidade estatal é a do agente público em ação regressiva.

Dispõe o § 6o do art. 37 da Carta Magna:

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Verifica-se, pois, que o particular que sofrer um dano em razão da ação de determinado agente público deve acionar diretamente a entidade estatal àquele vinculada (teoria do órgão), sendo que ao particular bastará comprovar o dano, a conduto do agente público e nexo causal entre eles.

A Administração, por sua vez, tem o poder/dever de acionar regressivamente o agente público para se ver ressarcida daquilo que despendeu com a indenização do prejuízo sofrido pelo administrado. Nesse caso, porém, deverá demonstrar o dolo ou a culpa do agente. É o que se depreende da leitura do dispositivo constitucional transcrito acima.

A propósito, confiram-se os ensinamentos de HELY LOPES MEIRELLES:

A ação regressiva da Administração contra o causador direito do dano está instituída pelo § 6o do art. 37 da CF como mandamento a todas as entidades públicas e particulares prestadoras de serviços públicos. Para o êxito desta ação exigem-se dois requisitos: primeiro, que a Administração já tenha sido condenada a indenizar a vítima do dano sofrido; segundo, que se comprove a culpa do funcionário no evento danoso. Enquanto para a Administração a responsabilidade independe da culpa, para o servidor a responsabilidade depende da culpa: aquela é objetiva, esta é subjetiva e se apura pelos critérios gerais do Código Civil. (Direito Administrativo Brasileiro. 29 ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 636).

3. CONCLUSÃO

Vê-se, pois, que a regra no Direito Público Brasileiro é a aplicação da teoria objetiva no contexto da responsabilidade estatal, sendo prescindível, portanto, a demonstração da culpa ou do dolo por parte do ente público para sua responsabilização.

A referida regra, todavia, comporta exceções. Vimos acima que há casos em que a responsabilidade do Estado só é existente se comprovada sua conduta dolosa ou culposa, o que faz incidir, por essa razão, a teoria subjetiva.

Como exemplos da aplicação da teoria subjetiva, temos a responsabilidade por conduta omissa e a do agente público causador do dano em ação regressiva.

A adoção da teoria objetiva para todos os casos de responsabilidade do Estado poderia gerar injustiças, ao passo que não seria adequada a responsabilização do ente público se, por exemplo, a omissão da prestação do serviço estatal tendente a evitar o dano causado ao particular não decorreu de dolo ou culpa da Administração. Da mesma maneira, a responsabilização do agente público de forma objetiva ocasionaria uma quebra de isonomia em relação aos funcionários particulares sem qualquer razão que justificasse esse tratamento desigual, na medida em que estes responderiam apenas nos casos de dolo ou culpa, na forma consagrada no Código Civil, e aqueles independentemente de culpa.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HARADA, Kiyoshi. Responsabilidade civil do Estado. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 41[1] maio [2000]. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/491>. Acesso em: 30 ago. 2012.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo Brasileiro. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.


Autor

  • Rodrigo Cerezer

    Já atuou como escrevente técnico judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e analista judiciário dos Tribunais Regionais Eleitorais do Estado de Minas Gerais e de São Paulo. Procurador da Fazenda Nacional desde de 2009. Pós-graduado em Direito Administrativo.

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.